A NEGOCIAÇÃO NO PROCESSO DE GESTÃO EMPRESARIAL: DA NECESSIDADE À ARTE Negociar é arte que se aprende e se aprimora na prática Historicamente, a negociação tem sido considerada um processo intimidante, frustrante e opressivo, principalmente se utilizada como ferramenta para resolver desentendimentos pessoais ou de negócios, pois acaba por mexer com as nossas emoções e percepções – questões subjetivas, as quais nos causam muito desgaste. Por conta desse enfoque, sustentado anos e anos, muitas pessoas deixam de negociar, acreditando que essa condição seria prerrogativa de negociadores habilidosos, que sabem preservar suas emoções, valendo-se de comportamentos frios e impessoais. Kassem Mohamed El Sayed O certo é que, sem nenhum conhecimento técnico, ou de forma atabalhoada, negociamos o tempo todo. As únicas situações em que não podemos negociar são as que envolvem o nosso nascimento físico e, posteriormente, o nosso nascimento para o mundo espiritual. Gestão Negociação e relacionamentos Hoje, negociação é encarada como uma arte, que, neste caso, é entendida como aquilo que se aprende e se aprimora na prática , sendo formada por três elementos: a criatividade, a sensibilidade e a intuição. Para desenvolvermos uma negociação bem-sucedida, devemos: • aprender sobre o processo de negociação; • compreender a si mesmo; e • buscar a construção de melhores relacionamentos. 40 r e v i s t a F A E B U S I N E S S , n.7, nov. 2 0 03 Desse modo, a negociação deve ser considerada como a oportunidade tão almejada para nos desenvolver e fortalecer os nossos relacionamentos em todos os aspectos da vida. Um processo de negociação bem conduzido não faz somente um vencedor, mas gera condições de satisfazer todas as pessoas envolvidas, com os resultados atingidos Com base nesse desenvolvimento e fortalecimento das relações é que os melhores negociadores atuam, procurando fazer muitas perguntas, ouvir cuidadosamente, concentrar-se no que desejam, manter-se sintonizados com o que está ocorrendo e descobrir o que a outra parte envolvida no processo pretende conseguir. Esses mesmos negociadores encaram a negociação com seriedade, jogam limpo e preservam uma perspectiva profissional no relacionamento, buscando manter o seu equilíbrio independentemente do modo como procede o outro lado. Precisamos compreender que o processo de negociação não faz somente um vencedor, mas tem condições de satisfazer todas as pessoas envolvidas, com os resultados alcançados. • avaliar todas as variáveis envolvidas; • conduzir o processo de forma a perceber qual o melhor momento para a tomada de decisão; • reforçar, depois de tomada a decisão, o compromisso acordado, de preferência registrando-o. Saber ouvir é uma habilidade que permite obter muitas respostas e identificar os interesses envolvidos na negociação, facilitando a decisão Conceito de negociação Certamente a maioria das pessoas tem conhecimento de vários conceitos de negociação, que vão desde obter um sim, passam pela prerrogativa de se saber usar a informação e o poder que a mesma gera e chegam até a tomada de decisão para se otimizar interesses. Negociação também é entendida como um processo de comunicação que se desenvolve quando queremos algo de uma outra pessoa. Note-se que, em todos esses conceitos, o comportamento mais marcante é o de conquista, o de persuasão da outra parte. O conceito que, de nosso ponto de vista, caracteriza a negociação como uma arte a ser treinada e desenvolvida é: um processo que envolve uma ou mais partes com interesses comuns e/ou antagônicos, que se sentam para confrontar e discutir propostas explícitas com o objetivo de alcançar um acordo. Por ser concebida como um processo, precisamos ter a definição do objeto da negociação e, principalmente, saber de onde extrair as informações para o adequado planejamento e condução da negociação. Para tanto, é necessário considerarmos mais algumas questões importantes: • identificar os aspectos em comum para ambas as partes; • perceber os interesses múltiplos que estão envolvidos; • manter o foco voltado para as soluções, em vez de desperdiçá-lo nos problemas; • focalizar os benefícios para ambas as partes; Etapas do processo de negociação Existem quatro etapas que são consideradas as mais importantes no processo de negociação. Planejamento É a etapa mais importante e também a mais negligenciada pelos negociadores. Mais de 60% do êxito de uma negociação depende de um planejamento bem feito. Nesta etapa, iremos: • examinar interesses e definir metas; • definir a relação a ser estabelecida após a negociação; • supor quais serão os interesses e objetivos do outro; • coletar as informações necessárias; • prever possíveis impasses e como evitá-los e superá-los. Abertura Nesta etapa, as partes interessadas estão frente a frente. Por isso, é extremamente importante criarmos um clima favorável ao entendimento desde o início e também: 41 r e v i s t a F A E B U S I N E S S , n .7, nov. 2 0 0 3 • “quebrar o gelo” e reduzir eventuais tensões; • buscar consenso entre a pauta e o tempo disponível para a negociação; • apresentar seus propósitos e estimular o interlocutor a fazer o mesmo. Desenvolvimento Muitas vezes iniciamos a negociação nesta etapa, esquecendo-nos das anteriores. No entanto, isso é um erro, pois o desenvolvimento será muito mais fácil se precedido da etapa de planejamento. Nesta etapa devemos nos preparar para: • explorar e compreender variáveis envolvidas; • perguntar e ouvir atentamente, clarificando pontos obscuros; • pesquisar e criar alternativas de ganho mútuo; • buscar concordância de posição vantajosa para ambos; • evitar e/ou superar impasses. Acordo Este momento requer muita sensibilidade. Devem-se evitar a impaciência e a precipitação. Ainda, precisamos estar atentos aos sinais emitidos pelo outro e: • resumir o que ficou combinado; • recapitular os benefícios mútuos; • verificar se não há mal-entendidos ou resistências; • formalizar o compromisso; • registrar o que foi acordado; • combinar (se houver) os próximos passos e definir o cronograma. Gestão Principais habilidades na negociação Entre as habilidades exigidas no processo de negociação, destacamos o distanciamento emocional, uma vez que sem esse distanciamento podemos prejudicar o andamento da negociação, principalmente se a outra parte envolvida 42 r e v i s t a F A E B U S I N E S S , n.7, nov. 2 0 03 resolver utilizar a tática do apelo emocional. Outra habilidade é o saber ouvir sabiamente, pois esta prática permite obter muitas respostas e identificar os interesses envolvidos na negociação, facilitando a decisão. Um capítulo à parte no tocante às habilidades consiste em utilizar a comunicação de forma clara e correta, incluindo-se aí todo movimento corporal e gestual no processo de persuasão, que caracteriza o ponto central da negociação. Frases como: “ Mande para mim que eu negocio qualquer coisa a qualquer momento” soam infantis, pois levam a uma negociação sem a preparação e concentração necessárias para se alcançar um acordo vantajoso para ambas as partes Personalidade dos negociadores Os filósofos gregos, em seus estudos de retórica, definiram os seguintes traços essenciais na personalidade dos negociadores e em ordem de importância: • ethos ou ética - conjunto de valores construtivos e presentes, como respeito, integridade, justiça, responsabilidade, digno de confiança, senso de humor e autodisciplina; • pathos ou empatia - forte emoção que comove a alma, o que inclui paciência, flexibilidade, energia pessoal e ego suficientemente qualificado para uma disposição de ficar em segundo plano e saber lidar com as diferenças. Esta característica foi explorada por Daniel Golleman em sua obra Inteligência Emocional; e • logos ou inteligência racional - característica resultante do processo de educação formal, da preparação do negociador e da sua capacidade de buscar o contínuo aperfeiçoamento. Erros comuns no processo de negociação A grande maioria dos negociadores insiste em repetir os mesmos erros. Entre os mais comuns, está aquele que mais compromete o sucesso da negociação: a falta de planejamento do que deverá ser realizado durante os encontros negociais. Saibamos que frases como “Mande para mim que eu negocio qualquer coisa a qualquer momento” soam infantis ou sem sentido, pois levam a uma negociação sem a devida preparação e concentração necessárias para se alcançar um acordo vantajoso para ambas as partes. Alguns outros erros podem ser: • negociar com a pessoa errada; • insistir em uma posição; • sentir-se impotente durante uma negociação; • perder o controle da negociação; • afastar-se das metas e limites estabelecidos; • preocupar-se demais com o outro; • pensar na “resposta certa” no dia seguinte; • culpar-se pelos erros dos outros. se dar ênfase ao outro lado que está negociando ou de preocupar-se em garantir os próprios interesses. Consideram-se também, entre os estilos de negociação, as características de formalidade ou de informalidade. A bem da verdade, o processo de negociação deve contemplar a busca da mútua satisfação. Mais do que o simples resultado da negociação, o que importa é o nível de prazer em ter participado dela e o quão gratificante ela foi em termos de realização pessoal e de melhoria das relações, além da possibilidade de se estabelecerem laços de respeito mútuo. Independentemente de quem ou do que priorizar no processo de negociação, o mais importante e praticá-lo e não ter medo dos resultados que dele poderão advir. Só a prática permitirá que alcancemos o estado de arte, pois as técnicas de negociar e as táticas a serem utilizadas, todas elas são fruto da experiência do dia-a-dia em qualquer situação da nossa vida.n Prioridades no processo de negociação Todos os grandes estudiosos do assunto, sejam eles especialistas americanos (da Harvard, Wharton, Richmond, Califórnia, etc.), ou especialistas brasileiros, destacam como definidores dos estilos de negociação as características de Kassem Mohamed El Sayed é psicólogo, especialista pela Universidade do Texas e pelo Japan Productivity Center for Social and Economic Development, mestre em Engenharia de Produção pela UFSC e professor da FAE Business School. E-mail: [email protected] REFERÊNCIA GOLEMAN, Daniel. Inteligência emocional. Rio de Janeiro: Objetiva, 1996. 43 r e v i s t a F A E B U S I N E S S , n .7, nov. 2 0 0 3