Poder Judiciário
JUSTIÇA FEDERAL
Seção Judiciária do Paraná
1ª TURMA RECURSAL – JUÍZO A
JUIZADO ESPECIAL (PROCESSO ELETRÔNICO) Nº201070500146672/PR
RELATOR
: Juiz Federal José Antonio Savaris
RECORRENTE : DEJANIRA SELLES SANTOS
RECORRIDO
: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
VOTO
Trata-se de recurso interposto pela parte autora contra sentença que
julgou improcedente o pedido de concessão de benefício assistencial a pessoa idosa
desde a data do requerimento administrativo – DER 27.04.2010.
A decisão recorrida não acolheu a pretensão orientada na inicial ao
entendimento de que o grupo familiar possui renda mensal per capita superior a ¼ do
salário-mínimo.
A parte recorrente alega, em síntese, que a renda da família é composta
apenas pela aposentadoria por invalidez recebida pelo marido da autora, “que se trata
de valor mínimo acrescido do adicional de 25% em razão de o segurado necessitar de
assistência permanente de outra pessoa”. Alega que o benefício deveria ser excluído
do cômputo da renda familiar, por aplicação analógica do artigo 34, parágrafo único,
do Estatuto do Idoso. Pugna pela reforma da decisão recorrida.
Assiste-lhe razão.
O grupo familiar da recorrente, 71 anos, é composto por ela, seu cônjuge,
73 anos, e uma neta curatelada. A renda familiar é composta unicamente pela
aposentadoria por invalidez que seu marido recebe, no valor de R$ 638,00 mensais,
que equivale a um salário mínimo acrescido do adicional de 25% previsto pelo Art. 45
da Lei 8213/91.
Esta Turma Recursal tem admitido a aplicação analógica do art. 34 da
Lei nº 10.741/2003 para excluir da renda do grupo familiar, também, os benefícios
provenientes de incapacidade (auxílio-doença, aposentadoria por invalidez ou
benefício assistencial), independentemente da idade do beneficiário, sob o fundamento
de que o incapaz, assim como o idoso, necessita do benefício para garantir seu mínimo
vital (RI 200570510026140, Juiz Rony Ferreira, 1ª Turma Recursal, 28.09.2006).
Neste sentido, também já decidiu a Turma Nacional de Uniformização:
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PREVIDENCIÁRIO.
PEDIDO
DE
UNIFORMIZAÇÃO.
BENEFÍCIO
ASSISTENCIAL. APLICAÇÃO ANALÓGICA DO PARÁGRAFO ÚNICO DO
ART. 34 DO ESTATUTO DO IDOSO (LEI Nº. 10.741/2003) NO CASO DE
CÔNJUGE QUE RECEBE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ DE VALOR
MÍNIMO RECEBIDO POR OUTRO MEMBRO DO GRUPO FAMILIAR.
EXCLUSÃO DA RENDA DO GRUPO FAMILIAR PARA FINS DE BENEFÍCIO
ASSISTENCIAL. ACÓRDÃO MANTIDO.
1. Para fins de concessão de benefício assistencial à pessoa portadora de deficiência, o
disposto no parágrafo único do art. 34 do Estatuto do Idoso (Lei nº. 70.741/2003)
aplica-se por analogia para a exclusão de um benefício previdenciário de
aposentadoria por invalidez de valor mínimo recebido por membro do grupo familiar,
o qual também fica excluído do grupo para fins de cálculo da renda familiar per capta.
2. Pedido de uniformização conhecido e improvido.
(TNU, PU 2008.70.54.001122-9, Rel. Juíza Federal Rosana Noya Alves Weibel
Kaufmann j. 12.08.2010)
Note-se que, apesar de haver um acréscimo de 25% sobre o salário
mínimo na aposentadoria por invalidez recebida pelo cônjuge da autora, não há como
fazer qualquer diferenciação entre o presente caso e hipóteses em que o titular recebe
qualquer benefício por incapacidade de valor mínimo. Isto porque tal acréscimo é
devido justamente porque o titular necessita de auxílio permanente de outra pessoa,
vale dizer, o benefício é pra seu titular apenas e, por isso, deve ser excluído do cálculo
da renda familiar per capita.
Tal linha de entendimento, acrescente-se, é confortada a partir de uma
perspectiva constitucional da questão colocada à análise.
Com efeito, o paradigma de exclusão da renda mensal familiar do valor
mínimo de seguridade social (benefícios da Previdência ou Assistência Social) em
substituição à noção literal limitadora de exclusão do benefício assistencial recebido
pelo idoso é aplicável também a partir da inteligência operada pelo Supremo Tribunal
Federal, quando do julgamento da ADI 3.105-DF (Rel. Min. Cezar Peluso, Tribunal
Pleno, j. 18.08.2004, DJ 18.02.2005, RTJ 193/137), decisão em que ficou assentada a
imunidade dos proventos dos servidores públicos inativos e pensionistas até o limite da
renda mensal dos benefícios do Regime Geral da Previdência Social.
Nessa célebre e polêmica decisão conduzida pelo voto do Ministro Cezar
Peluso, o Supremo Tribunal Federal adotou a manifestação deste eminente jurista no
sentido de que o postulado da isonomia implicava o reconhecimento de que não era
importante, para a definição da imunidade, se os valores de inatividade eram recebidos
pelo Regime Próprio dos Servidores Públicos ou pelo Regime Geral da Previdência
Social, concluindo que todos os beneficiários que recebessem prestações
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previdenciárias até o limite máximo do RGPS escapariam da tributação, nos termos do
artigo 195, inciso II, da Constituição Federal.
Ora, o que estava o Supremo Tribunal a orientar era justamente que “o
critério da igualdade normativa, aqui, é o valor, não a pessoa” (excerto do voto
condutor, p. 244) e que
“as distinções arbitrárias violariam a Constituição, transplantando para o julgamento
da referida ação direta de inconstitucionalidade, no que tocava ao limite da imunidade
sobre os proventos dos servidores inativos e pensionistas, a experiência constitucional
alemã, colhida por CANARIS, de que ‘o princípio da igualdade é violado quando não
se possa apontar um fundamento razoável, resultante da natureza das coisas, ou
materialmente informado para diferenciação legal ou para o tratamento igualitário,
ou, mais simplesmente, quando a disposição possa ser caracterizada como
arbitrária’” (p. 249).
Também a relevante lição do constitucionalista português Vital Moreira
foi lembrada pelo eminente Ministro Relator em outro excerto de seu substancioso
voto:
“Se o legislador exclui das vantagens ou dos encargos uma parte dos que
constitucionalmente tinham direito às primeiras ou deveriam estar obrigados, então a
decisão de inconstitucionalidade da lei, na parte em que operou a exclusão, é
admissível, apesar do conseqüente alargamento do âmbito da norma, visto que o
legislador não podia constitucionalmente excluir uma parte dos constitucionalmente
elegíveis para beneficiar do direito ou suportar as obrigações em causa” (p. 249).
Não vejo, assim, como deixar de excluir da renda mensal familiar o
benefício de valor mínimo da seguridade social quando o legislador, em relação à
prestação assistencial, para a qual o beneficiário não contribuiu (necessariamente) com
qualquer valor para a seguridade social, determinou expressamente a não integração
desses valores para fins de cálculo da renda mensal definida pelo artigo 20, § 3º, da
LOAS.
Talvez não seja desimportante acrescentar algo elementar da
hermenêutica da seguridade social, para o que transcrevo ensinamento da eminente
Desembargadora Maria Lúcia Luz Leiria:
“A jurisdição previdenciária está ligada diretamente ao fim social; seu objetivo tem
nítido caráter alimentar e, tanto na interpretação dos textos que regulam a matéria,
quanto no exame do pedido, necessária a utilização de uma interpretação com
temperamentos, com filtragem constitucional e assentada nos princípios norteadores
de proteção e garantia aos direitos fundamentais, uma vez que tais benefícios se
constituem em direitos sociais protegidos pela Constituição Federal. Estão
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consagrados na Constituição, como fundamentos, entre outros, a cidadania e a
dignidade da pessoa humana. A combinação desses dois amplos princípios é, sem
sombra de dúvida, o que motiva a existência da seguridade social, fomentada pelo
Estado, e, mais especificamente, da previdência social.”
(LEIRIA, Maria Lúcia Luz. A interpretação no direito previdenciário. In: Revista do
Tribunal Regional Federal da 4ª Região, n. 43, 2002, p. 53).
Dessa forma, excluindo-se do cálculo o marido da recorrente, tem-se que
a renda mensal familiar é considerada inexistente.
Por outro lado, a jurisprudência da TNU se firmou no sentido de que:
“O modo de aferição da necessidade econômica já foi estabelecido pela legislação de
regência, pautando-se basicamente em critérios objetivos de miserabilidade.
O principal critério objetivo é a renda familiar per capita igual ou inferior a ¼ do
salário mínimo.
E também é objetivo o critério previsto no parágrafo único do art. 34 do Estatuto do
Idoso.
Ambos os critérios se pautam exclusivamente pela renda do grupo familiar, sem
qualquer tipo de perquirição acerca de outros sinais de miserabilidade.
Por isso, a existência de renda familiar per capita igual dou inferior a ¼ do salário
mínimo gera presunção absoluta de miserabilidade.
Portanto, se após a aplicação do disposto no parágrafo único do art. 34 do Estatuto do
Idoso a renda familiar per capita resultar igual ou inferior a ¼ do salário mínimo,
então aí haverá presunção absoluta de miserabilidade.
Trata-se de um imperativo hermenêutico.
Ou a aplicação analógica cabe em função de igualdade de razões normativas, ou não
cabe.
Cabendo dita aplicação, como no contexto do caso do autor, não cabe avaliar qualquer
outro sinal de miserabilidade. (omissis)
Somente se o patamar for superior a ¼ do salário mínimo, aí então a presunção de
miserabilidade não será absoluta.”
(TNU, PU 2008.70.51.001848-9, Rel. Juíza Federal Jacqueline Michels Bilhalva, DJ
04.09.2009, sublinhou-se)
Nada obstante o entendimento da TNU acima exposto, penso que excluir
do juiz a análise subjetiva de cada caso é impedi-lo de dar à norma uma constituição
equitativa para o problema concreto.
Neste sentido, buscando aproximar o entendimento da TNU com as
exigências de justiça para o caso, esta 1ª Turma Recursal parte da premissa de que “se
a renda familiar do pretendente ao benefício é inferior a ¼ do salário mínimo,
presume-se a carência econômica do grupo familiar, salvo evidentes sinais de
desnecessidade da proteção assistencial” (1ª TR/PR, RCI 2008.70.50.025354-8, Rel.
Juiz Federal José Antonio Savaris, j. 02.06.2010).
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No caso em questão, não há elementos que permitam afastar a presunção
relativa da carência econômica, sendo devida a concessão de benefício assistencial,
com efeitos desde a data do requerimento administrativo (27.04.2010), quando já
presentes os pressupostos para o seu deferimento
- Tutela antecipada
Conforme exposto acima, existe o convencimento do direito da parte
recorrente ao recebimento do benefício assistencial, o que supera o requisito da
verossimilhança exigido para a antecipação da tutela no artigo 273 do Código de
Processo Civil. A antecipação de tutela, no âmbito dos juizados especiais federais,
pode ser concedida, inclusive, de ofício, nos termos do artigo 4º da Lei 10.259/2001.
O receio de dano irreparável decorre da natureza alimentar do benefício
em tela, conduzindo à segura presunção, notadamente em relação aos que necessitam
da Assistência Social, de que a supressão do benefício assistencial compromete a
subsistência da parte.
Por essas razões, determino a antecipação de tutela, para o fim de
determinar à autarquia ré que implante, no prazo de 10 (dez) dias a contar da ciência
desta decisão, o benefício assistencial.
Ante o exposto, voto por DAR PROVIMENTO AO RECURSO, para
condenar o INSS a implantar o benefício assistencial em favor da parte autora desde
27.04.2010, bem como a pagar os atrasados respectivos, respeitada a prescrição
quinquenal e o valor máximo da causa no JEF.
Os valores atrasados deverão ser acrescidos de correção monetária,
incidente a partir do vencimento de cada parcela devida, a ser calculada pelos índices
oficiais e aceitos pela jurisprudência, quais sejam: IGP-DI (05.1996 a 03.2006, artigo
10 da Lei 9.711/1998, combinado com o artigo 20, §§ 5º e 6º, da Lei 8.880/1994) e
INPC (04.2006 a 06.2009, conforme o artigo 31 da Lei 10.741/2003, combinado com a
Lei 11.430/2006, precedida da MP 316, de 11.08.2006, que acrescentou o artigo 41-A
à Lei 8.213/1991, e REsp 1.103.122/PR). Os juros de mora devem ser fixados à taxa
de 1% (um por cento) ao mês, a contar da citação, com base no artigo 3º do DecretoLei 2.322/1987, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em
vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento
consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 do TRF/4.
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A contar de 01.07.2009, data em que passou a viger a Lei 11.960, de
29.06.2009, publicada em 30.06.2009, que alterou o artigo 1º-F da Lei 9.494/1997,
para fins de atualização monetária e juros haverá a incidência, uma única vez, até o
efetivo pagamento, dos índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à
caderneta de poupança.
Esclareço que as duas Turmas Recursais do Paraná têm entendimento no
sentido de que a expressão “uma única vez”, constante do artigo 1º-F da Lei
9.494/1997, com a redação da Lei 11.960/2009, quer dizer que os índices da poupança
substituem, a uma só vez, correção e juros moratórios. Não significa, todavia,
impedimento à aplicação capitalizada dos juros, até porque a intenção do legislador foi
criar equivalência entre a remuneração da poupança (onde os juros são capitalizados) e
a correção do débito da Fazenda. Precedentes: 2009.70.51.012370-8 (1ª TR/PR, sessão
de 01.07.2010 e 2009.70.51.006445-5 (2ª TR/PR, sessão de 31.05.2010).
Sem honorários.
Curitiba, (data do ato).
Assinado digitalmente, nos termos do
art. 9º do Provimento nº 1/2004, do
Exmo. Juiz Coordenador dos Juizados
Especiais Federais da 4ª Região.
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