ENTREVISTA Wagner Gomes faz um balanço dos 5 anos da CTB C L A S S I S T A Revista da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil Nº 12 – Dezembro de 2012 AFINAL, QUE NOVA CLASSE MÉDIA É ESSA? REFORMA AGRÁRIA A dura realidade fundiária do país INTERNACIONAL As razões para a nova vitória de Chávez E D I TO RI AL ÍNDI CE DIREÇÃO EXECUTIVA Presidente Wagner Gomes DIRETORIA Nivaldo Santana, David Wylkerson de Souza, Vicente Selistre, Márcia Almeida Machado, Pascoal Carneiro, Salaciel Fabrício Vilela, Vilson Luiz da Silva, Gilda Almeida, Celina Arêas, Joílson Antonio Cardoso, Carlos Rogério Nunes, Severino Almeida, João Batista Lemos, Eduardo Navarro, Raimunda Gomes (Doquinha), Paulo Vinicius Santos da Silva, Valmira Luzia da Silva, Maia do Socorro Nascimento Barbosa, Elias Bernardino, Sérgio de Miranda, Hildinete Pinheiro Rocha, Fátima dos Reis e João Paulo Ribeiro. CONSELHO EDITORIAL Altamiro Borges, André Cintra, Augusto Cesar Petta, Eduardo Navarro, Fernando Damasceno, Gilda Almeida, Madalena Guasco, Joilson Antonio Cardoso, Márcia Almeida Machado, Nivaldo Santana, Umberto Martins, Wagner Gomes. REDAÇÃO Secretário de Imprensa e Comunicação Eduardo Navarro Equipe Cinthia Ribas, Fernando Damasceno, Láldert Castello Branco e Paula Farias. Colaboradores desta edição Deborah Moreira, Joanne Mota, Priscila Lobregatte e Vanessa Silva. Diagramação Luciana Sutil Projeto gráfico Caco Bisol Fotos de capa Shutterstock Impressão HR Gráfica Tiragem 15 mil exemplares UM DEBATE QUE SE FAZ NECESSÁRIO NO MOVIMENTO SINDICAL Carimbo sobre parte emergente da população tem forte conotação ideológica PÁGINA 4 PAUTA SINDICAL Pelo desenvolvimento do Brasil, CTB defende investimentos em educação, ciência e tecnologia ENTREVISTA WAGNER GOMES Presidente da CTB faz um balanço positivo dos 5 anos da Central PÁGINA 10 COMPORTAMENTO “Nova classe média” altera o padrão de consumo no país PÁGINA 16 PERFIS Três brasileiros da “nova classe média” contam suas histórias PÁGINA 20 RURAIS Desenvolvimento exige uma ampla reforma agrária PÁGINA 24 PÁGINA 28 APOSENTADOS O desrespeito contra aqueles que serviram ao país durante décadas PÁGINA 32 INTERNACIONAL As razões que deram a Chávez um novo mandato na Venezuela PÁGINA 36 ACONTECEU O 8º Congresso da Contee e a luta da CTB pela unicidade sindical PÁGINAS 40 E 41 CULTURA O drama familiar retratado em “Gonzaga – de pai para filho” PÁGINA 42 AGENDA SINDICAL As principais atividades do mundo sindical entre os meses de dezembro e fevereiro PÁGINA 43 ARTIGOS EDITORIAL Wagner Gomes Av. Liberdade, 113 – 4º andar – Liberdade, São Paulo – SP CEP 01503-000 Fone (11) 3106-0700 E-mail: [email protected] PÁGINA 3 CONJUNTURA Eduardo Navarro PÁGINA 15 WAGNER GOMES Visão Classista é uma revista trimestral, publicada pela CTB – Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil. A “nova classe média” e a velha ideologia burguesa D ezenas de milhões de pessoas foram resgatadas da condição de extrema pobreza no Brasil desde a eleição de Lula em 2002, graças às políticas de redistribuição de renda instituídas pelo governo, com destaque para a valorização do salário mínimo, e à salutar expansão do mercado de trabalho. O fenômeno é inegavelmente positivo. Falsa, porém, é a interpretação que o caracteriza como a emergência de uma nova classe média no Brasil, amplamente disseminada pela mídia nativa. Num livro recente em que refuta tal caracterização, o economista Marcio Pochmann mostra que a causa principal dessa mobilidade social foi a criação de 21 milhões de novos postos de trabalho nos últimos dez anos, sendo 94,8% deste total com salários equivalentes a 1,5 mínimo. O nível de desemprego, que tinha subido a 20% com FHC, despencou. Mas não se pode falar com seriedade em nova classe média. “Seja pelo nível de rendimento, pelo tipo de ocupação, pelo perfil e atributos pessoais, o grosso da população emergente não se encaixa em critérios sérios e objetivos que possam ser claramente identificados como classe média”, argumenta Pochmann. Trata-se, na realidade, de classe trabalhadora – e de baixa remuneração. Os dois conceitos conduzem a estratégias políticas diferentes, uma vez que os interesses e objetivos históricos da classe trabalhadora não coincidem com os da classe média Embora pareça inofensivo, o falso conceito de classe média serve a um propósito ideológico e político reacionário, que é o de incutir neste novo contingente de assalariados a cultura do consumismo e do individualismo. É uma operação ardilosa da velha ideologia liberalburguesa, hoje travestida de neoliberalismo, cujo objetivo é obscurecer a identidade e a consciência de classe das trabalhadoras e trabalhadores, afastandoos com isto da busca de soluções coletivas para problemas sociais comuns, das lutas solidárias e das bandeiras classistas, que desde sempre inspiraram e guiaram o movimento operário e sindical. Podemos notar em tudo isto um significado análogo ao do novo idioma que o patronato usa para caracterizar o empregado, chamando-o de “parceiro” ou “colaborador”, como se já não existisse a subordinação do trabalho ao capital (atestado pelos altos índices de rotatividade) e (como se) o trabalhador tivesse sido alçado à condição de sócio da empresa. O sindicalismo classista deve não só rechaçar o falso conceito em voga como também, e ao mesmo tempo, procurar compreender com maior rigor científico o fenômeno social em questão, de forma a abordar este novo contingente da classe trabalhadora com espírito classista, visando sua conscientização, sindicalização e incorporação nas lutas sociais. Desta forma, daremos à Agenda da 2ª Conclat por um novo projeto nacional de desenvolvimento com soberania e valorização de trabalho a energia e a força de amplas massas. Embora pareça inofensivo, o falso conceito de classe média serve a um propósito ideológico e político reacionário Wagner Gomes é presidente nacional da CTB. VISÃOClassista 3 C A PA AFINAL, QUE “NOVA CLASSE MÉDIA” É ESSA? Fernando Damasceno “B em-vindo ao mundo do carnê, do consórcio, do SPC. Bem-vindo ao mundo do metrô, do buzão, da lotação, da CBTU, do seminovo zerado. Bem-vindo ao mundo do vale-refeição, do PF e da marmita. [...] Bem-vindo ao mundo do Ratinho, Raul Gil, Bruno & Marrone, Banda Calypso, Calcinha Preta, MC Leozinho e da Rádio Tupi. [...] Bem-vindo ao mundo surpreendente da economia da base da pirâmide”. Com essa apresentação, aqui reproduzida parcialmente, o instituto Data Popular se propõe a oferecer serviços de pesquisa em relação ao nicho populacional brasileiro que, nos últimos anos, se convencionou chamar de “nova classe média” – NCM. Com bom humor, o sócio-diretor da empresa, Renato Meirelles (veja o BOX na PG 7), procura mostrar para companhias, órgãos governamentais e demais interessados qual o perfil desses cidadãos que, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), já correspondem a mais de 50% dos brasileiros. Mas por que foi colocado tal 4 VISÃOClassista Shutterstock Carimbo sobre parte emergente da população traz consigo forte viés político-ideológico carimbo sobre determinada parte da população? Quais os interesses envolvidos? A quem convém a existência de uma “nova classe média”? Existe alguma justificativa real para isso? Afinal, que classe media é essa? Marcio Pochmann, economista e ex-presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), defende, na obra “Nova classe média?”, que não houve no Brasil a emergência de nenhuma nova classe – “muito menos de uma classe média”, de acordo com seu texto. “O que há, de fato, é uma orientação alienante sem fim, orquestrada para o sequestro do debate sobre a natureza e a dinâmica das mudanças econômicas e sociais, incapaz de permitir a politização classista do fenômeno de transformação da estrutura social”, complementa. Fenômeno na cidade e no campo O conceito de “nova classe média” gera debates a partir de diferentes vieses, mas certos números são incontestáveis. Segundo dados reunidos pela Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE) do governo federal, entre 2004 e 2010, 32 milhões de pessoas ascenderam à categoria de classes médias (A, B e C) e 19,3 milhões saíram da pobreza. Ainda segundo a SAE, esse nicho em 1992 era composto por 34,96% da população. Em 2009 chegou a 50,5% e dados de 2010 apontam para aproximadamente 52%. Em 2009, a NCM foi responsável por R$ 881 bilhões dos gastos com consumo – a maior fatia do total de R$ 2,2 trilhões do país. Ela também é responsável por 78% de tudo que é comprado em supermercados. Estima-se que, ao longo desta década, a cada ano esse grupo (constituído fundamentalmente por jovens e negros) crescerá 4%. No campo, entre 2003 e 2012 a “nova classe média” cresceu 72% e hoje equivale a 9,1 milhões entre os cerca de 25,7 milhões de habitantes rurais do país, segundo o pesquisador Marcelo Neri, atual presidente do Ipea. “A redução da desigualdade foi mais forte e mais rápida na área rural, sobretudo nas regiões mais pobres”, diz o autor do estudo Pobreza e a Nova Classe Média no Brasil Rural. “Houve uma visível elevação da renda rural, algo que antes só ocorria na área urbana. Há mobilidade social mais dinâmica no meio rural, o que melhorou a vida das pessoas”, complementa o ministro do Desenvolvimento Agrário, Guilherme Cassel, em depoimento para o seminário “A Nova Classe Média Brasileira”, promovido pela SAE. Governo Lula e suas prioridades DIVERSIDADE Rótulo sobre parte específica da classe trabalhadora atende a interesses do mercado Sob qualquer ponto de vista, os dados referentes às mudanças sociais no Brasil na última década esbarram nas políticas adotadas pelo governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, iniciado em 2003. Roberto Amaral, vicepresidente do PSB, é crítico do VISÃOClassista 5 C A PA termo “nova classe média”, mas vê como inquestionável a ascensão social de parte da população. “O conceito de ‘classe-média’ não é rigoroso e se presta a manipulações. O fundamental, e isto é o que precisa ser posto em destaque, é que os governos de centro-esquerda iniciaram o processo (negado pela direita) de distribuição de renda, responsável pela emergência das massas na cidadania, que compreende, de saída, o direito ao consumo. São milhões de brasileiros que estão mudando a paisagem de nossas ruas, de nossos aeroportos, de nossas lojas e sustentando o consumo que impediu a recessão”, sustenta Amaral, referindo-se à crise financeira de 2008/09, cujos efeitos chegaram ao Brasil, mas não com a mesma intensidade sentida por outras nações. No momento, a preocupação do dirigente socialista, diante dos avanços obtidos por esse contingente populacional, é criar as condições necessárias para que o país não permita qualquer tipo de retrocesso. “O Brasil só tem uma alternativa: o desenvolvimento econômico, mãe e pai de tudo o mais. Sem desenvolvimento não há geração de emprego, não há distribuição de renda, não há igualdade social, não há saúde pública, não há escola pública e não há soberania. E, como a esquerda brasileira sempre defendeu, nosso desenvolvimento depende do crescimento do mercado interno. Aí a relação é siamesa: um alimenta o outro”, defende. Crítica conceitual Arquivo CTB CLASSISMO Para Nivaldo, sindicatos devem se contrapor à ótica do mercado 6 VISÃOClassista Tanto no campo político quanto acadêmico, não faltam críticos à forma como esse debate vem sendo travado. “Essa classe média é uma fantasia que está se criando”, critica Eduardo Fagnani, do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). “Não se define a classe média pela renda, mas pela posição na estrutura populacional”, explica o economista, que também participa do núcleo de estudos Plataforma Política Social. Segundo ele, o conjunto da população em ascensão ainda depende muito do sistema público de saúde, previdência e ensino e não tem entre as suas despesas o pagamento de escola particular para os filhos, a manutenção de previdência complementar, acesso a planos de saúde privados ou o costume de fazer viagens ao exterior. Fagnani recorda, em entrevista à “Agência Brasil”, que a noção de classe média é associada a determinados padrões de consumo e de formação educacional “que não temos no Brasil, como amplo acesso ao curso superior”, disse o economista, mencionando a situação da Europa Ocidental na fase logo após a Segunda Guerra Mundial, quando a maior parte da população se torna classe média. Crítica semelhante é feito por Augusto Petta, coordenador técnico do Centro de Estudos Sindicais (CES). Para o sociólogo, quando se fala em classes sociais, menciona-se um grupo Ponto de vista Entrevista com Renato Meirelles, sócio-diretor do Data Popular, instituto especializado em pesquisas e estudos sobre a “nova classe média”. Visão Classista: Analisando as políticas adotadas pelo governo federal ao longo da última década, quais delas mais influíram para o surgimento desse fenômeno da “nova classe média”? Renato Meirelles: A estabilidade econômica, que contribuiu para o aumento dos empregos formais serviu como alavanca para que o brasileiro da antes tida como Classe C, pudesse ter acesso ao crédito, e com isso, realizar seus sonhos de consumo. Visão Classista: A partir de sua experiência, qual é a visão que o cidadão da chamada “nova classe média” tem a respeito do sindicalismo no Brasil? Este cidadão pouco escolarizado começa a se conscientizar dos seus direitos através dos jovens da família, aqueles que são os primeiros universitários e descobriram na internet uma janela para o mundo e para as informações. Visão Classista: Até que ponto os sindicatos e outras associações populares não conseguem se comunicar adequadamente e atender as demandas dessa grande parcela da população? A maioria dos erros cometidos consiste na falta de didatismo, pois parcela desta população não compreende a diferença de esquerda e direita. O que eles precisam mesmo saber é o que esta ideologia vai mudar na prática em suas vidas. A conscientização dos direitos também é importante. Visão Classista: Passadas as eleições municipais, já é possível fazer alguma análise sobre como a “nova classe média” foi às urnas ou não é possível vê-la como um grupo homogêneo em termos de posicionamento político? Com a entrada dos jovens emergentes nas universidades e o acesso à informação, também encontrada através da internet, podemos dizer que já contamos com parcela da classe média indo até as urnas conscientes do que esperam de seu candidato. Visão Classista: O cientista político André Singer, em artigo recente, afirmou que o cidadão da “nova classe média” é, em geral, individualista e que é atraído mais facilmente para um evento religioso do que para uma reunião de associação de bairro ou de um sindicato. Até que ponto essa visão é correta? Por quê? Levando em consideração as pesquisas de campo que vivenciei em algumas comunidades, discordo parcialmente da afirmativa. O cidadão da NCM tem uma visão de coletividade muito grande e é nisso que se difere das classes altas. O fato dele se atrair mais pelo evento religioso do que para uma reunião de associação de bairro tem mais a ver com uma dissonância cognitiva, gerada por uma comunicação equivocada do que com a ideologia política em si. Visão Classista: É possível dizer que a ascensão social por meio do consumo enfraquece a luta por melhorias em serviços públicos em geral? Ao conseguir um plano de saúde ou pagar por uma creche particular, o brasileiro deixa de lado tais demandas? Acredito que o acesso ao consumo, principalmente o de serviços, torna esse brasileiro mais consciente das suas reais necessidades. Tanto de ensino, como de saúde pública. Visão Classista: Ao constatarem essa ascensão social dos últimos anos, é exagero dizer que governo, mídia e empresas passaram a ver esses brasileiros muito mais como consumidores do que como cidadãos? Na verdade, esses brasileiros só passaram a ser enxergues como cidadãos quando passaram a consumir, infelizmente. VISÃOClassista 7 C A PA 8 VISÃOClassista pelo viés da renda, como sendo segmentos das classes sociais. Para certos estudiosos, alguém que ganha R$ 1000,00 por mês entra na classe média, para outros não. Há ainda os que não consideram apenas a questão salarial, mas também o acesso a serviços como educação, cultura e outros fatores”, salienta. “Quer seja de um jeito ou de outro, no meu entendimento não existe uma nova classe média, mas sim pessoas com certa mobilidade em função de políticas implementadas, sobretudo, a partir do governo Lula, que fazem com que elas tenham uma condição de vida melhor, sem mexer naquilo que se determina como classes sociais”, defende o sociólogo. Arquivo CTB de pessoas que se situam em posição semelhante num processo econômico. Entre os que são classificados como burguesia e proletariado existiria uma “classe média que também faz parte da classe trabalhadora”, segundo o ele, “pois são pessoas que vendem seu trabalho ou fazem parte de uma pequena burguesia, dona de pequenas e médias empresas”. A partir dessa premissa, Petta entende que, quando se começa a falar de uma “nova classe média”, não existe nenhum elemento que justifique tal terminologia. “Entende-se que uma determinada classe social é formada por pessoas com uma determinada posição no processo de produção. Parece que o que ocorreu é simplesmente um processo de melhoria de vida dessas pessoas, com salário melhor. Elas passaram a se situar melhor, a consumir mais. Mas elas continuam fazendo parte da classe trabalhadora”, explica. Por sua vez, Nivaldo Santana, vice-presidente da CTB e secretário Sindical do PCdoB, é mais direto ao definir como “incorreta” a expressão “nova classe média”. O sindicalista entende que se trata de um termo com forte conteúdo ideológico conservador. “Tratase de uma perspectiva capitalista a ideia de identificar o cidadão meramente como um consumidor, valorizá-lo por sua capacidade de consumo. Dessa forma, acaba por prevalecer a ótica do mercado, na qual o Estado deixa de ser o provedor e somente quem tem recursos obtém determinados serviços e benefícios”, critica. Nesse sentido, Petta entende que, na verdade, não existe qualquer “nova classe média” no Brasil. “Alguns começam a utilizar essa terminologia somente Agenda classista Para Nivaldo Santana, é papel dos sindicatos e dos partidos políticos fomentar uma discussão que reorganize a busca por determinadas demandas na O comando do Ipea e as diferentes visões sobre a “nova classe média” No último dia 12 de setembro, tomou posse como novo presidente do Ipea o economista Marcelo Neri, em substituição ao também economista Marcio Pochmann. Além de uma disputa partidária envolvendo o PT e o PMDB, a troca de comando do órgão do governo federal chamou a atenção pela diferença de perfis entre seu comandante anterior e o atual. Os pontos de vista de Neri (FGV) e Pochmann (Unicamp) sobre o fenômeno da “nova classe média” simbolizam a substituição. Enquanto o primeiro foi o principal nome acadêmico a bancar a existência desse suposto nicho populacional, o segundo adotou uma postura crítica a essa denominação. Oficialmente, a saída de Pochmann do Ipea, após cinco no cargo de presidente, se deu por conta de sua candidatura à Prefeitura de Campinas (terminou o pleito na segunda colocação). Guido Mantega, ministro da Fazenda, teria sido um dos grandes apoiadores do nome de Neri, que DISSONÂNCIA Petta não vê qualquer justificativa para o uso da expressão “nova classe média” só passou a ser bem-visto entre os petistas justamente por conta de seus trabalhos sobre a “nova classe média”. Para Augusto Petta, coordenador-técnico do Centro de Estudos Sindicais (CES), o trabalho realizado por Pochmann à frente do Ipea foi de grande valia para o Brasil, mas é prematuro fazer qualquer tipo de diagnóstico sobre como será a gestão de Neri diante do órgão federal. “Pochmann fez um trabalho muito importante para a compreensão da classe trabalhadora, algo que se tornou uma base fundamental para a atuação dos sindicatos. Esperamos que o Ipea continue nessa linha. Há uma preocupação de que esse caminho se altere, mas precisamos aguardar para ver o que acontecerá”, afirmou. sociedade. “Ao prevalecer o atual formato, ao invés de defender a classe trabalhadora e demandas como educação, saúde, lazer, e cultura, o que temos visto é o incentivo cada vez maior ao consumo”, critica. “Existe uma real necessidade de se alterar a agenda de preocupações que essa parte da população deveria ter”, completa o dirigente da CTB e do PCdoB. Petta entende como natural, em uma sociedade capitalista, o fato de que, à medida em que as pessoas passam a receber mais, elas aumentam seu padrão de consumo. “No entanto, estão aparecendo determinados valores que essas pessoas passam a assumir. Elas deixam uma vida de miséria, de pobreza muito grande e, ao ter um novo padrão de consumo, isso também mexe em seus valores, naquilo que elas querem adquirir. A posição que você ocupa na economia tem muita força sobre as ideias que as pessoas têm. Existe uma relação dialética entre as ideias e o material, mas a força do material predomina muitas vezes sobre as ideias”, argumenta o pesquisador. Diante desse cenário, Petta define como “o grande desafio do movimento sindical hoje” a busca por um canal efetivo de diálogo junto à população que se convencionou chamar de “nova classe média”. Ele se recorda da década de 1980, quando os sindicatos conseguiram encontrar esse caminho, baseados em uma relação de bastante credibilidade. “Hoje estamos vivendo uma nova fase. Estamos tentando entender como interferir neste atual cenário. Outro dia encontrei com alguns dirigentes do Sindicato dos Bancários de Sergipe. Eles me contaram que, em uma recente campanha salarial, o uso da internet foi fundamental, pois quando os sindicalistas foram conversar com os trabalhadores, muitas informações já eram conhecidas e estavam assimiladas. Então acho que precisamos entender essas mudanças, tanto na estrutura econômica quanto nas ideias que as pessoas têm. Ao entender o que ocorre, precisamos ter uma política mais adequada para conseguir essa mobilização”, defende Petta. VISÃOClassista 9 EN T R EVISTA WAG N E R G OM ES EM 5 ANOS, CTB CONSEGUIU CRESCER E SE CONSOLIDAR Fernando Damasceno “A tendência da CTB, sem dúvida, é de crescimento contínuo nos próximos anos” Visão Classista: Falar em avaliação positiva desses cinco anos de fundação da CTB é algo natural. Dessa forma, em sua opinião quais são os aspectos mais relevantes dessa trajetória? Wagner Gomes: Desde que fundamos a CTB, tínhamos como objetivo principal ter uma central que pudesse não apenas opinar nas questões trabalhistas, mas também em questões mais amplas do Brasil. Entendíamos que essas duas características seriam fundamentais, pois precisamos estar antenados à vida política do país, prontos para opinar e participar, no sentido de ajudar o Brasil a se desenvolver e gerar mais empregos. Na questão sindical, a expectativa era a de que nossa Central pudesse ser mais um instrumento dos trabalhadores na defesa de suas bandeiras mais específicas. Com essas duas questões, estaríamos bem preparados para atuar no cenário nacional. Assim, felizmente o balanço é muito bom nesses cinco anos. A CTB sem dúvida conseguiu se fortalecer, se firmar e se consolidar. Hoje a CTB tem cerca de 900 sindicatos filiados, sendo que desse total há cerca de 600 já registrados no Ministério do Trabalho e Emprego. Podemos dizer que foram cinco anos bem agitados. O debate foi intenso, passamos por uma disputa presidencial na qual apoiamos um projeto progressista para o Brasil e, no campo sindical, eu destacaria a luta pela política de valorização do salário mínimo como nossa maior conquista, com seu reajuste vinculado à inflação mais a metade do Produto Interno Bruto (PIB) do país. Isso fez com que o salário Jesus Carlos VISÃOClassista Chico Alves 10 “N asce na cidade de Belo Horizonte a CTB – Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil”. Diante de 1.400 delegados, de todos os estados brasileiros e do Distrito Federal, Wagner Gomes anunciava, às 20h34 de uma quartafeira, 12 de dezembro de 2007, a criação da entidade. Na condição de seu primeiro presidente, após cinco anos de fundação, o dirigente sindical avalia como extremamente positivo o balanço desse período inicial. “A CTB sem dúvida conseguiu se fortalecer, se firmar e se consolidar”, afirma. Natural de Araçatuba, interior do estado de São Paulo, Wagner Gomes tem 55 anos e é metroviário. Foi um dos fundadores do Sindicato dos Metroviários de São Paulo em 1983 e seu presidente de 1989 a 1995 e de 2007 a 2010. Integrou a Executiva Nacional da Central Única dos Trabalhadores (CUT) de 1994 a 2007. É membro titular do Comitê Central do Partido Comunista do Brasil (PCdoB) desde 1997. Nesta entrevista, ao fazer um balanço positivo sobre a trajetória da CTB, Wagner Gomes destaca o compromisso da Central em prol da unidade do movimento sindical, analisa como positiva a campanha em defesa da unicidade e da contribuição sindical, define como fundamental o papel dos trabalhadores rurais dentro da entidade e traça uma perspectiva bastante otimista para o futuro da CTB. Confira abaixo: VISÃOClassista 11 WA GN E R G OM ES Visão Classista: A unidade dentro do movimento sindical sempre foi uma bandeira defendida pela CTB. Pensando nesses cinco anos, a segunda Conferência Nacional da Classe Trabalhadora (Conclat) foi o ápice dessa política? com as outras centrais no sentido de realizar um grande encontro, durante o qual aprovaríamos essa plataforma, que serviria como base para a unidade das centrais. E foi o que ocorreu na Conclat, em 2010, com a presença de cerca de 30 mil dirigentes sindicais de todo o país, aqui no Estádio do Pacaembu, em São Paulo. Aprovamos na ocasião a Agenda da Classe Trabalhadora, entregue no mesmo ano à candidata Dilma Rousseff. Até o presente momento, o conteúdo dessa Agenda segue norteando nossas atividades. Olhando para trás, a Conclat sem dúvida foi uma grande vitória para a classe trabalhadora. O futuro da CTB é de bastante otimismo. Nossa tendência é sermos cada vez mais um instrumento valoroso para a classe trabalhadora Wagner Gomes: Desde nossa fundação achávamos que os trabalhadores só teriam alguma chance de influir no destino do país se as centrais atuassem de forma unificada. Se cada uma das centrais ficasse para um lado, certamente não conseguiríamos muita coisa. Diante disso, propusemos uma plataforma de luta com questões nacionais e sindicais. Conversamos Valcir Rosa 12 VISÃOClassista Visão Classista: Outra bandeira fundamental da CTB tem sido a defesa da unicidade e da contribuição sindical. Como você avalia a campanha feita neste ano? Que resultados ela trouxe? Wagner Gomes: Essa bandeira é praticamente uma cláusula pétrea para nós da CTB. A unicidade garante o mínimo de unidade para que os trabalhadores tenham apenas um sindicato por município. E a contribuição garante que os próprios trabalhadores sustentem suas entidades, a partir do pagamento de um dia de trabalho por ano. Essa bandeira é polêmica, mas se mostrou majoritária no movimento sindical. Hoje já vemos outras centrais defendendo a unicidade. Nossa campanha veio em uma hora decisiva [março de 2012], pois foi quando o assunto começou a aparecer. A CUT, por exemplo, defendeu a chamada “liberdade sindical” e o fim da contribuição sindical, também a partir de uma campanha, mas me parece que os companheiros recuaram e vão deixar essa questão meio de lado. Isso ocorreu, no meu modo de ver, por conta da força que essas bandeiras têm. Sem elas, muitos sindicatos fechariam e não poderiam mais fazer a defesa dos trabalhadores. Apesar de certa divulgação de que haveria um plano para acabar com a unicidade sindical, ainda não apareceu nada realmente de concreto nesse sentido. Sei que há companheiros que defendem essa proposta, mas não temos qualquer indício de que haja uma campanha de verdade contra a unicidade. Nossa campanha fortaleceu isso, pois centrais que não defendiam essas bandeiras agora passaram a defendê-las. Sem dúvida foi uma posição vitoriosa da CTB, pois ajudamos a firmar certas convicções em defesa daquilo que acreditamos. E entendo que agora no começo de 2013, com a publicação de uma nova Portaria do Ministério do Trabalho, em substituição à Portaria 186, nossa posição sairá ainda mais fortalecida. Visão Classista: Nesta edição, estamos tratando na capa da questão da chamada “nova classe média”. Como você tem percebido esse debate? Até que ponto ele corresponde à realidade? Wagner Gomes: Há uma polêmica muito grande, sem dúvida. Para mim, classe média era quem tinha casa própria, dois carros na garagem, apartamento na praia, filhos na escola particular, dinheiro no banco. Mas agora enquadraram na classe média cidadãos que ganham em torno de R$ 1100 – e isso para mim não é classe média. São pessoas que precisam lutar intensamente para pagar suas contas e que fazem parte da classe trabalhadora. É claro que durante os governos Lula e Dilma – que tiveram Arquivo CTB mínimo ganhasse uma grande força e se tornasse, atualmente, um dos principais instrumentos de renda da classe trabalhadora. Foram sem dúvida cinco anos de muita batalha. Não podemos esquecer também de lembrar que conseguimos nosso reconhecimento junto ao governo federal, mantendo filiados em nossa base mais de 9% do total de trabalhadores do país. Era uma meta que alcançamos e que pretendemos ampliar nos próximos anos. nosso apoio, mas também foram alvos de nossas críticas – o Brasil melhorou, mas ainda não consigo compreender que classe média é essa. Trata-se apenas de uma classe trabalhadora que teve uma pequena melhora. Minha convicção é a de que, dentro da questão central do capital, essa classe média recebe salários muito baixos. Visão Classista: Pensando ainda nesse balanço de cinco anos de fundação, qual a importância conquistada pelos trabalhadores rurais dentro da CTB? Wagner Gomes: A CTB é uma central de trabalhadores urbanos e rurais. Oito federações de trabalhadores rurais são filiadas à CTB e mais duas devem se filiar em breve. Temos na direção da Contag [Confederação Nacional de Trabalhadores na Agricultura] vários companheiros cujas entidades também são filiadas à CTB. A Contag tem cerca de quatro mil sindicatos filiados e, por isso, é a mais legítima representante dos trabalhadores rurais. E nós estamos conseguindo ter um trabalho unificado. A Contag precisa ter suas bandeiras específicas e sua vida própria. Nesse sentido, as centrais devem apoiar suas iniciativas. Podemos dizer que a maioria do movimento sindical rural está filiada à CTB. Trata-se de uma grande vitória, pois os companheiros rurais têm dado VISÃOClassista 13 C ON J U NT U RA E NT R E V IS TA Visão Classista: Um tema que ainda precisará de muitas discussões internas é a situação das CTB’s estaduais. Que análise você faz dessa questão? Wagner Gomes: Essa é uma das nossas grandes preocupações. Precisamos estimular o papel que as estaduais podem ter. Teremos nosso Congresso em agosto de 2013 e essa será uma das questões principais. Precisamos discutir como as estaduais podem ter uma vida política mais ativa, tornando a CTB mais conhecida em cada estado e passando a filiar mais sindicatos. É claro que em algumas localidades existe um cenário diferente, onde as CTBs estaduais já possuem uma vida política muito intensa. Mas a maioria tem problemas e precisamos enfrentálos. No Congresso iremos tomar decisões específicas em relação a isso. Estamos neste momento discutindo a criação de uma Secretaria de Organização específica para enfrentar essa demanda e para participar diretamente nos estados. Esse é um desafio para o futuro, pelo qual brigaremos para valer, no sentido de melhorar a situação das CTBs estaduais. de vista classista da entidade a que somos filiados. Mas falando de forma mais específica do Congresso, iremos debater o que acertamos e erramos e, a partir disso, tocar a bola pra frente para sermos maiores do ponto de vista política e também pelo viés da quantidade de sindicatos. Visão Classista: Você acabou de mencionar o 3º Congresso da CTB. O que mais já pode ser adiantado sobre esse tão importante evento? Wagner Gomes: Iremos fazer um balanço desse período de existência da CTB, ver quais pontos de pauta da Agenda da Conclat foram encaminhados e quais ainda não foram, discutiremos a situação internacional e nacional. Inclusive na véspera do congresso haverá um encontro de dirigentes sindicais internacionais, para ouvir um pouco os companheiros que atuam em outros países. Junto com a Federação Sindical Mundial (FSM), estamos fazendo um trabalho importante na América Latina, com o propósito de difundir o ponto Valcir Rosa 14 VISÃOClassista Visão Classista: Passados os cinco primeiros anos de história da CTB, que perspectiva é possível vislumbrar para daqui a cinco anos? Qual papel a CTB terá no sindicalismo nacional? Wagner Gomes: A tendência da CTB, sem dúvida, é de crescimento contínuo nos próximos anos. Ainda temos muitos sindicatos para filiar. Temos condição de aprovar no próximo Congresso uma meta de filiação, para chegarmos no 4º Congresso com o dobro de sindicatos filiados. Achamos que a CTB ainda está no caminho da estruturação. Temos muito campo a desenvolver e também para fazer com que nossa Central jogue um papel político cada vez mais importante. Temos conseguido, a partir da unidade com as outras centrais, batalhar pelas principais causas do país. Isso tem gerado um respeito muito grande em relação à CTB – tanto no Brasil quanto no exterior. A CTB hoje é uma central que goza da confiança das outras entidades sindicais. O futuro da CTB é de bastante otimismo. Nossa tendência é ser cada vez mais um instrumento valoroso para que a classe trabalhadora possa defender seus direitos e também para influenciar no destino do país, do ponto de vista do crescimento e das reformas necessárias. Acho que chegamos agora ao terceiro Congresso com um capital político importante. EDUARDO NAVARRO uma grande ajuda ao restante do movimento sindical. Nesse sentido, precisamos conhecer mais a realidade do campo e suas dificuldades para podermos ajudálos e nos integrarmos. Ao olhar para esses cinco anos, podemos dizer que se trata de uma grande vitória política e organizativa ter essa proximidade e confiança dos trabalhadores rurais. Sujeitos dos seus destinos N os últimos meses o Brasil tem discutido muito sobre a nova classe média – a parcela de brasileiros que teriam ascendido a essa posição no intervalo dos dois mandatos de Lula e metade do mandato de Dilma. Uma parte desse debate refere-se à validade dos conceitos utilizados, se está correto o enquadramento – enquanto classe média – das pessoas com renda familiar per capita de R$ 291, 00 a R$ 1.019,00 ou se isso se refere a uma elevação do padrão de consumo. Pode variar o método ou o instrumental empregado, o referencial utilizado pode ser da economia ou da sociologia, ou pode ser dada uma ênfase mais otimista ou pessimista ao assunto, porém um dado é concreto: a melhor distribuição de renda levou 40 milhões de brasileiros e brasileiras a mudarem de vida no período e, o mais importante, a adquirirem sonhos e esperanças, vontade de participar, garra para transformar suas vidas e das pessoas ao seu redor. Essas questões devem ser consideradas seriamente pelo movimento sindical, pois este imenso contingente – comparável a um país da dimensão da Alemanha – tem implicações profundas para o mundo do trabalho. É preciso considerar que entre os fatores para essa inclusão estão mudanças demográficas, transferências públicas governamentais, acesso ao trabalho e ganhos de produtividade. Nesse sentido, a ampliação da taxa de ocupação e o crescimento da renda do trabalhador estão relacionados diretamente à lide sindical. Essa inclusão produtiva traz um ambiente diferenciado do que foi vivido pela classe trabalhadora na década de 90, de forte matriz neoliberal, quando as taxas de desempregados eram elevadas e a ameaça de demissão era uma constante. Esse cenário levou os trabalhadores a buscar saídas individuais, se distanciando do movimento sindical. O cenário agora se inverte. Segundo o IBGE, 14 milhões de novos empregos foram criados e o salário médio do trabalhador cresceu cerca de 20%. A taxa de sindicalização também aumentou – passou de 16,7% em 1992 para 19,1% em 2009 (se considerarmos somente o índice dos trabalhadores rurais estes vão de 13,9% para 23,4% no mesmo período). Esse crescimento expressa a luta dos sindicatos pela representação dos trabalhadores, por seu poder de negociação, pelo aumento dos níveis de emprego formal, pela expansão dos serviços, pela política de valorização do salário mínimo e, para o campo, por iniciativas como o Pronaf. No seu conjunto, os sindicatos se tornaram mais presentes para os trabalhadores, porém o nível de cobrança amplia-se com a alteração da base da pirâmide, pois estes novos atores trazem valores culturais diferenciados, fortemente amparados em uma visão de futuro em que eles se tornam protagonistas. São cidadãos conscientes de seus direitos e de suas possibilidades, com um sentimento de pertencimento maior, e com um orgulho de suas conquistas, que lutarão para preservar essa condição de acesso e de inclusão social. São sujeitos mais afeitos aos princípios de coletividade propugnados pelos sindicatos. Porém, não devemos nos descurar das questões dos outros 71 milhões de brasileiros em idade ativa que estão no desemprego ou na inatividade, como aposentados ou pensionistas. Esse crescimento expressa a luta dos sindicatos pela representação dos trabalhadores, pelo seu poder de negociação, pelo aumento dos níveis de emprego formal Eduardo Navarro é secretário de Imprensa e Comunicação da CTB. VISÃOClassista 15 C OM PORTA M EN TO DO BOM E DO MELHOR Poder de escolha da “nova classe média” muda padrão de consumo no país e gera frutos para a economia Deborah Moreira A classe média chegou para ficar. Deixou de ser vista como um mero segmento de mercado, que transita entre pobres e ricos, e passou a ser protagonista, a partir do salto de 40 milhões de brasileiros para esse segmento social nos últimos dez anos, somando cem milhões de pessoas e responsável por movimentar cerca de R$ 1 trilhão ao ano. A elevação no padrão de consumo foi o que acabou chamando a atenção do mercado. A denominada nova classe média quer consumir mais e melhor. Os números fazem parte do estudo da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República (SAE), intitulado ‘’Vozes da Classe Média’’, uma compilação de dados lançada em setembro deste ano. De acordo com a publicação, a classe média é formada por famílias que possuem renda per capita entre R$ 291 e VORACIDADE Televisores modernos se tornaram símbolo de consumo no país 16 VISÃOClassista R$ 1.019 e dependem da renda do trabalho para ascender. Seus rendimentos chegam a ser 2,5 vezes maior que a da classe baixa, mas quatro vezes menor do que a da classe alta. Dentro do grave quadro de desigualdade social do país, esse segmento já alcançou quase 40% da renda total do consumo das famílias. Ampliando para o cenário internacional, o Brasil representa hoje o oitavo mercado consumidor, logo depois da Itália. Se a classe média fosse um país, representaria o 18º mercado consumidor mundial, logo abaixo da Argentina e da Turquia e acima da Holanda. Boa parte dessa mudança está INCLUSÃO Mundo virtual se populariza por meio de celulares multifuncionais nas condições econômicas criadas a partir da valorização da renda, geração de emprego, estabilização da moeda, controle da inflação, redução de juros com crescimento do Produto Interno Bruto (PIB). A ausência da inflação, somada ao aumento da população, com redução no tamanho das famílias e a oferta abundante de crédito para o mercado interno fizeram com que uma legião de consumidores vorazes despertasse de um sono profundo. No entanto, a modalidade preferida dessa parcela da população ainda faz pouco uso do sistema financeiro, já que 77% preferem pagar suas despesas em dinheiro. A ascensão da classe média não é novidade. Os mais velhos devem lembrar que na década de 1970, quando houve a migração de milhões do campo para cidade, o país passou por crescimento significativo a partir da aquisição de bens de consumo duráveis, como automóveis. No entanto, há uma diferença bastante significativa na forma com a qual o consumidor se relaciona com os produtos. Há uma consciência maior, se comparado com a classe baixa, sobre suas necessidades e sobre o que é preciso para formular e expressar suas demandas. O consumidor típico da classe média é aquele que lota os Procons em busca de seus direitos. Nesse sentido, também é capaz de se mobilizar em níveis políticos organizados, como na campanha pela lei da ficha limpa. Há mais perspectiva de futuro, diferente dos pobres que se ocupam em formular estratégias para sobrevivência. E isso abre o apetite para o consumo de bens, essenciais e supérfluos, que agreguem valores. Segundo a Pesquisa de Orçamentos Familiares, POF, realizada pelo IBGE, entre 2003 e 2009, o consumo médio mensal de carne de primeira aumentou 4,2% no país. Enquanto isso, o de frango caiu 11,8%. A compra de azeite subiu 13,8% e a de óleo de soja, recuou 45,5%, mesmo o primeiro sendo, em média, três vezes mais caro. O setor de produtos tecnológicos também comemora as vendas. Os smartphones, por exemplo, cresceram 179% em 2011 – para se ter uma ideia, no mercado estadunidense a alta não chegou a dois dígitos no mesmo período. As TVs com tecnologia 3D já respondem por quase um quarto dos negócios fechados. Dos 12 milhões de aparelhos vendidos por ano, 92% são de telas finas (LED, LCD), que custam o dobro do valor, pelo menos, dos modelos mais antigos. Outro segmento que está sentindo a ferocidade do consumo é o automobilístico. A participação de carros com motor 1.0 no total de automóveis emplacados em fevereiro de 2012 foi de 42,6%, o que corresponde ao menor percentual em 17 anos. Há dez anos, os carros populares tinham mais de 70% da preferência dos brasileiros. Atualmente, quando o país já é o quarto maior mercado global de veículos, modelos com motor 1.6 e 1.8, airbag, câmbio automático e banco de couro começam a ocupar mais as garagens dessas famílias. O crescimento de adesões a planos de saúde e previdência privada também é uma característica desse novo consumidor, que é exigente e prefere pagar um pouco mais para ter qualidade em assistência médica, da mesma forma que escolhe marcas com mais qualidade. “Acredito que o acesso ao VISÃOClassista 17 C OM PORTA M EN TO consumo, principalmente ao setor de serviços, torna esse brasileiro mais consciente das suas reais necessidades. Tanto de ensino, como de saúde pública”, afirma Renato Meirelles, pesquisador e sócio diretor do Data Popular, instituto de pesquisa pioneiro no estudo do Brasil emergente. A tudo isso se agrega o aumento da escolaridade e a democratização do acesso à informação por meio da internet e da TV por assinatura (que também passou a ser item básico de consumo). O que dá a essa nova classe média mais liberdade de escolha. “Este cidadão pouco escolarizado começa a se conscientizar dos seus direitos através dos jovens da família, aqueles que são os primeiros universitários e descobriram na internet uma janela para o mundo e para as informações”, explica o pesquisador. Sua experiência bem próxima a agentes dessa nova classe média lhe permite afirmar que a mesma define seus sonhos de consumo e passam a enxerga-los como metas, com perspectiva real de conquista. Escolaridade É perceptível uma expansão das ocupações de maior escolaridade nas duas últimas décadas, com elevação no nível escolar dos que recebem salário de base. Segundo estudo publicado pelo economista Marcio Pochmann, nos anos 1980 entre esse grupo a maior parte possuía Ensino Fundamental (8,3 milhões). Segundo a PNAD, em 1990 houve forte redução do número de analfabetos (menos quatro milhões) e predominância de trabalhadores com Ensino Médio (4,1 milhões). Já nos anos 18 VISÃOClassista 2000, a formação em Ensino Médio disparou para 11,4 milhões e o número de empregados com Ensino Superior já é considerável, de 3,5 milhões – superior aos 269 mil da década anterior. Nos anos 2000, foram criados 21 milhões de postos de trabalho e a grande maioria (94,8%) com rendimento de até 1,5 salário mínimo mensal, chegando a representar 47,8% da classe trabalhadora em 2009. Para Pochmann, esse é um indicador forte de que houve avanço maior nas ocupações localizadas na base da pirâmide social do país. Contudo, o economista não acredita que esse segmento possa ser associado ao conceito de classe média, uma vez observadas suas ocupações e remunerações. O consumidor típico da classe média é aquele que lota os Procons em busca de seus direitos. Nesse sentido, também é capaz de se mobilizar em níveis políticos organizados, como na campanha pela lei da ficha limpa. Dança das cadeiras Seis milhões de brasileiros cruzaram a linha da miséria durante os oito anos do governo Lula. De acordo com o professor e pesquisador Waldir Quadros, colaborador do Cesit (Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho), do Instituto de Economia da Universidade d0e Campinas (Unicamp), houve efetivamente uma redução na população de miseráveis (com rendimentos abaixo de R$ 350), que migrou para o que ele classifica como “massa trabalhadora” ou pobres (com rendimentos entre R$ 350 e R$ 700 mensais). Por sua vez, essa categoria também ficou menor, já que boa parte passou a integrar a baixa classe média (com rendimentos declarados entre R$ 700 a R$ 1.750 mensais). A partir da análise de dados do Censo Demográfico de 2000 e 2010, o economista chegou à STATUS Classe C já não se contenta com modelos populares de automóveis conclusão de que os cerca de 30% de miseráveis (em 2000) caíram pela metade. A outra metade migrou para as camadas superiores (em 2010). Assim, a massa de trabalhadores passou de 27% para 30% e a da baixa classe média de 25% para 36%. O analista econômico e político também questiona o surgimento de uma nova classe média a partir da elevação do padrão de consumo. “Não é possível olhar esse movimento social somente pelo consumo. É claro que teve uma explosão de consumo. Mas todo mundo consumiu, não só a classe média, o pobre e o rico também”, explica o professor. Ele ressalta que deixar de ser miserável não significa pertencer a uma nova classe média: “É preciso levar em conta outros aspectos, além da renda. É preciso medir politicamente e socialmente as ocupações, muitas delas precarizadas como um dos efeitos das crises. Algumas perderam espaço, valor e até a renda, que está diretamente relacionada à qualidade e padrão de vida.” Formalização do trabalho O número de postos de trabalho formal cresceu de forma expressiva na década de 2000. Para cada vaga informal, três outras foram criadas no mercado formal. Além disso, houve elevação de cerca de 20% da renda do trabalhador (entre 2003 e 2010), tendo em vista uma política de aumento do salário mínimo. Para todas essas ações no cenário econômico, o movimento sindical esteve presente, cobrando de governos e empresas o compromisso com o crescimento estrutural. Também há um número crescente de trabalhadores sindicalizados, pelo menos nas categorias profissionais com de salário de base, que atualmente respondem por metade da massa trabalhadora brasileira. Destes, pelo menos um terço se sindicalizou. “Há uma mistificação dessa classe média. Mas, do ponto de vista sindical, essa população que ascendeu economicamente está de fato mais empregada, ganhando mais, e com consciência sobre seus direitos trabalhistas”, observa Eduardo Navarro, secretário de Imprensa e Comunicação da CTB. Navarro ressalta o círculo virtuoso, descrito em estudos do Ipea, que surgiu a partir de quatro fatores importantes que vieram à tona com a atual política econômica: geração de emprego, valorização do salário mínimo, políticas sociais de transferência de renda e demografia – redução do número de pessoas na família e o bônus demográfico registrado no país, quando a população economicamente ativa (PEA) supera a de dependentes, composta por idosos e crianças, o que gera mais força de trabalho, dando condições de uma maior dinamização da economia. “Levando em conta essa parcela de trabalhadores que adentraram no mercado de consumo, esse próprio mercado passa a ficar mais aquecido porque as empresas terão que contratar novos funcionários, gerando novos salários. Com a mudança no padrão de consumo, a estrutura produtiva (das empresas) terá que ampliar a oferta de emprego para atender a nova classe trabalhadora, desde que garantida a produção nacional”, explica o dirigente da CTB, referindose à adoção de uma política de reindustrialização. VISÃOClassista 19 PERF I S TRÊS BRASILEIROS E SUAS HISTÓRIAS Fotos: Cinthia Ribas EVOLUÇÃO Relatos de Marquinhos, Edélsia e Sônia demonstram grande otimismo em relação ao futuro de suas famílias e do país Estabilidade financeira e busca por qualificação profissional marcam trajetória da “nova classe média” Cinthia Ribas O crescimento da classe média brasileira nos últimos anos é um dos assuntos mais discutidos por especialistas da área. Não é para menos. No Brasil, ao longo da última década, o número de pessoas que entraram para a chamada classe C, de acordo com a Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE), chegou a 37 milhões – passando de 38% (2002), para 53% (2011) da população, somando 20 VISÃOClassista atualmente mais de 100 milhões de brasileiros. Conforme avaliação da Comissão Ministerial para Definição da Nova Classe Média coordenada pela SAE, a divisão da sociedade brasileira se dá em três grandes grupos (classes baixa, média e alta). Foram considerados pertencentes à classe média os que vivem em famílias com renda per capita entre R$ 291 e R$ 1.019 por mês. No entanto, apesar de ser classificada como nova classe C, um olhar mais próximo sobre essa parcela da sociedade, oriunda das camadas mais humildes, que ainda habita comunidades, conjuntos habitacionais, favelas e a periferia, revela o sacrifício feito para o almejado desenvolvimento dentro de uma conjuntura que hoje permite o crescimento profissional e econômico, diante da queda da desigualdade social. Estudar é preciso Para Marcos Lopes, de 30 anos, a evolução que veio a partir do crescimento econômico do país permitiu centrar forças nos estudos. Casado e pai de uma menina de dois anos, Marquinhos, como é conhecido, viu sua vida mudar quando conseguiu voltar a estudar. Vindo do Rio Grande do Sul para São Paulo há apenas seis anos, o rapaz franzino e de fala calma já foi servente de pedreiro, eletricista e repositor em supermercado. Ganhava um salário mínimo trabalhando em obras e hoje coordena uma equipe que inclui cinco supervisores em uma renomada empresa de segurança patrimonial. “Percebi que sem estudo continuaria no mesmo lugar. Vi que era a hora de voltar a estudar”, destaca o gaúcho. Marquinhos exemplifica o fenômeno que ocorre na sociedade nos últimos dez anos. Com um emprego estável, carteira assinada e melhor remuneração, o trabalhador encontra condições para se qualificar e voltar a ocupar as cadeiras de faculdades e cursos. Hoje, o rapaz assiste satisfeito à evolução de sua família. Ao lado da esposa Suellen de Oliveira Lopes, de 25 anos, ambos conquistaram o sonhado emprego com estabilidade, carro novo e conseguem conciliar família, trabalho e estudos, em prol de seus objetivos. Nos últimos anos as coisas mudaram no Brasil. O aumento da renda e do emprego formal, a consequente expansão do crédito, o aumento da escolaridade e a democratização da informação por meio da internet e da TV por assinatura deram à “nova classe média” liberdade de escolha. Os sonhos de consumo deram lugar às Marcos: “Tive que me esforçar para fazer um curso superior. Ganhava pouco e ajudava com as despesas em casa”. metas, a partir de uma perspectiva real de conquista. “Vi que a partir dos estudos viria meu enriquecimento. Esforceime e fui fazer um curso de gestão em segurança privada. Minha esposa, que antes tinha um salário de R$ 700,00, hoje, formada, conseguiu duplicar seu salário”, avalia Marquinhos. Questionado sobre seus sonhos, se engana quem pensa que ele, que mora de aluguel, tem como principal objetivo a casa própria. O objetivo do casal é dar continuidade aos estudos. “Eu quero fazer uma pós-graduação e cursar inglês. E ela, medicina (aponta para a esposa)”, explica. Para ir além Questionada sobre fazer parte da chamada “nova classe média”, Sônia Regina da Costa pensa um pouco, antes de concordar satisfeita. Mãe de quatro filhos e com uma vida confortável, Sônia, contudo, lembra que lutou – “e muito!” – para chegar ao atual patamar. Mulher, negra e moradora do Conjunto Habitacional (Cohab) Cidade Tiradentes, periferia da zona leste São Paulo, Sônia é professora de educação infantil. Mas para chegar ao cargo, a carioca, que veio para São Paulo aos 12 anos de idade, “comeu o pão que o diabo amassou”. VISÃOClassista 21 PERF I S “Fui criada em um internato no Rio de Janeiro, pois perdi minha mãe muito nova. Vim para São Paulo com meu pai e minha madrasta”, lembra Sônia, que após o falecimento do pai começou a trabalhar como doméstica. “Depois de casada percebi que aquilo não era vida para mim. Eu tinha filhos e casa para cuidar, mas queria ir além. Então dei continuidade aos estudos”, revela. Sônia percebeu que com estudo poderia ampliar seus conhecimentos e evoluir. “Com estímulo das amigas, decidi então fazer faculdade de pedagogia”, relembra a carioca, que, para chegar onde queria, teve ajuda de um programa do governo, o Bolsa Escola da Família. Por intermédio do programa, milhares de universitários dedicam seus finais de semana à comunidade e, em contrapartida, têm seus estudos custeados por meio da concessão de bolsas de estudos. Sônia percebeu que essa era a chance para a conclusão do ensino superior. “Eu trabalhava em dois empregos. Trabalhava na escola como agente escolar e como recepcionista no Hospital Municipal do Tatuapé. Cuidava da casa, dos filhos e estudava. Sem contar que tinha meus finais de semana tomados pelo programa Escola da Família. Foi um sacrifício”, confessa ao se lembrar de sua rotina à época. Fazendo uma avaliação de tudo que passou e dos desafios que enfrentou, Sônia conclui que valeu a pena. Formada e com a situação financeira estabilizada, a professora ainda mora em seu apartamento da Cohab. Reformado, o imóvel exibe uma televisão de LED de 55 polegadas, hometheater (amplificador de áudio), computador, televisões nos quartos e carro novo na garagem. A filha, pós-graduada em administração, recentemente comprou o primeiro imóvel financiado pelo programa do governo federal Minha Casa Minha Vida e aguarda as chaves do apartamento de dois dormitórios. “Vejo com muita satisfação a evolução dos meus filhos. Acredito que eles se espelharam em mim. Batalhei muito para chegar até VISIBILIDADE Pelo Brasil afora, periferia começa a ser vista por outra perspectiva 22 VISÃOClassista Edélsia: “Faço isso para que meus filhos tenham melhores oportunidades. Eles só vão trabalhar após terminar os estudos”. aqui e eles seguiram pelo mesmo caminho. O governo deu as oportunidades. Mas sem força de vontade para correr atrás do que eu queria tudo isso não valeria para nada”, analisa a professora. Mobilidade social As trajetórias do coordenador e da professora ilustram a explicação de especialistas da área, quando afirmam que a educação é um dos fatores para a mobilidade social presenciada na última década. Há dez anos, o Instituto de Pesquisas Datafolha registrava que havia mais brasileiros que não tinham completado o Ensino Fundamental do que aqueles que possuíam ao menos o nível médio completo. A Cartilha “Vozes da Classe Média” da SAE explica que essa mudança pode estar relacionada ao conjunto dos fatores voltados à inclusão produtiva (expansão no acesso ao trabalho e ganhos de produtividade), que explicam a maior parte (mais de 51%) do crescimento na renda per capita da classe média. Dessa forma, pode-se dizer que a expansão da classe média resulta muito mais de um sólido processo de inclusão produtiva. A partir dessa análise, enquanto os menos favorecidos miram o presente e adotam estratégias defensivas de sobrevivência, a classe média se concentra no futuro, buscando formas de promover ou preservar sua ascensão. Salário x Estabilidade Apesar de ainda pensar em voltar a estudar, a vida de Edélsia Gomes de Jesus a levou para outro caminho. Nascida em Feira de Santana (Bahia), ela veio para São Paulo ainda criança e não conseguiu concluir os estudos. A baiana já trabalhou com a carteira assinada em casa de família e hoje se dedica à faxina diária pelo dobro do valor recebido na condição anterior. “Apesar de abrir mão da segurança eu consigo ganhar mais dessa forma”, revela a diarista, que veio do Nordeste com dois anos de idade em companhia da mãe para morar no município de Itapecerica da Serra. No entanto, Edélsia que começou a trabalhar como babá, revela saudosa que seu sonho sempre foi ser professora. “No entanto, a vida a levou para este lado”, revela. A diarista conta que largou os estudos após a 8ª série do Ensino Fundamental para trabalhar e nunca mais conseguiu retornar. Revela também que todo esforço feito hoje é para que os filhos tenham a oportunidade de estudar. Mesmo trabalhando mais, a diarista acredita que não tem do que reclamar. Suas condições Sônia: “Eu trabalhava em dois empregos e ainda tinha que dar conta da casa, dos filhos e estudar”. financeiras melhoraram, assim como a de seu marido, que hoje trabalha como verdureiro. “Nesses últimos anos, conseguimos dobrar nossa renda. Algo impensável há uma década. Agora temos mais oportunidades e o que não me falta é serviço”, comemora. Aumento da demanda Na última década a profissão de empregada doméstica passou por uma evolução, devido ao crescimento da economia. Com o aumento da geração de emprego e a melhora da educação, muitas trabalhadoras se especializaram e passaram a exercer outras funções. Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD2008), o trabalho doméstico representa 15,8% do total de ocupados no país. Nesse cenário, 93,6% das vagas são ocupadas por mulheres; 61% são negras e 26,8% não têm carteira assinada. Como a renda das famílias também aumentou, a demanda pelo serviço doméstico cresceu. Por outro lado, com cerca de 7,2 milhões de trabalhadoras e trabalhadores em todo o país, a categoria sofre com a precarização e os baixos salários. A maioria (mais de 70%) não possui carteira assinada, de acordo com a PNAD. Dos 34 direitos trabalhistas assegurados na Constituição, apenas nove são garantidos aos domésticos. Esses fatores pesaram na decisão de Edélsia. Casada e mãe de três filhos (13, 12 e 3 anos), a diarista foi na contramão do que deseja a maioria. Por semana, trabalha em cinco casas diferentes. Resultado: o valor que ganhava por mês (equivalente a um salário mínimo), ganha agora por quinzena. “Nosso Curva ascendente e “amortecedor interno” – A despeito das discussões que se desenrolam na sociedade sobre a existência ou não dessa nova classe média, entidades renomadas como a Fundação Getúlio Vargas (FGV) afirmam que a expansão da classe média brasileira segue robusta, conforme dados apurados até junho de 2012. – De acordo com declarações do economista e presidente do Instituto de Política Econômica Aplicada (Ipea), Marcelo Neri, a projeção é de que mais 12 milhões de pessoas ascenderão para esse segmento até 2014. – Para Neri, foi a nova classe média que estabilizou a economia brasileira e fez crescer o Produto Interno Brunto (PIB) nos últimos anos, mesmo em um cenário marcado pela crise internacional. “A classe média é o amortecedor interno da economia. Se ela quebrar, não sabemos para onde vai o país”, afirma. próximo objetivo é comprar um carro, mesmo que seja usado e popular”, declara a dona de três televisores, dois aparelhos de DVD e outros eletrônicos. No entanto, o maior sonho de Edélsia é a conquista da casa própria. Questionada sobre o programa Minha Casa Minha Vida, ela revela que ainda pretende se inscrever. “Quem sabe não consigo realizar mais esse sonho”, confidencia a trabalhadora, que ainda não tem um computador para fazer sua inscrição no programa. VISÃOClassista 23 RU RA I S Arquivo CTB EMPENHO Contag e CTB se mantêm na linha de frente das reivindicações Recentes avanços no campo não podem mascarar a dura realidade fundiária do país Paula Farias 24 VISÃOClassista O Brasil se consolidou em 2012 como a sexta maior economia do mundo, deixando para trás o Reino Unido. Para completar o momento de “prosperidade”, milhares de brasileiros ascenderam para a chamada “nova classe media”. Mesmo diante desse quadro atual, o país permanece como devedor de sua própria história. Atrelado à Lei de Terras nº 601, de 1850 (responsável pela implantação da propriedade privada territorial e por abrir espaço para a proliferação do latifúndio), seu povo até hoje sofre com os efeitos de uma injusta estrutura fundiária. Sendo assim, o termo “questão agrária” pode ser interpretado de diversas maneiras. Para Sérgio de Miranda, secretário de Política Agrícola e Agrária da CTB, o processo de desenvolvimento Diante desse quadro, a indagação se torna mais forte ao se analisar os motivos pelos quais o país não consegue se libertar de uma lei do século 19. Para o dirigente da CTB, a falta de interesse do Estado brasileiro é um dos principais entraves. “Falta convicção do governo para tratar esse tema como prioridade. Os próprios órgãos governamentais encarregados deste assunto, como o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) e o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), não conseguem cumprir suas funções por falta de estrutura. Por outro lado, os latifundiários brasileiros, representados pela bancada ruralista no Congresso Nacional, conseguem barrar as iniciativas que possam trazer avanços nas questões fundiárias”, analisa. Já para o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), além da falta de coragem do governo ainda há a ofensiva do agronegócio na exploração das terras. “O avanço do agronegócio na agricultura brasileira, que não produz alimento, precisa de muita terra para manter o modelo de produção de commodities agrícolas e é baseado numa agricultura com grande utilização de veneno. O Brasil é o maior consumidor de agrotóxicos do mundo, com 20% de toda produção mundial. Aliado ao modelo de agricultura brasileira, que está desnacionalizado, com as transnacionais dominando tudo, incluindo as sementes transgênicas, a produção e a exportação. Além disso, existe a questão da desnacionalização, por meio da qual as empresas estrangeiras, através de fundos de pensões, têm adquirido muitas terras”, pontua Alexandre Conceição, membro da Coordenação Nacional do MST. Agricultura Familiar A falta de uma política de reforma agrária é algo que afeta diretamente a mesa dos brasileiros, mesmo que muitos ainda não se deem conta disso. Segundo o engenheiro agrônomo Gerson Luiz Mendes Teixeira, autor de um estudo sobre o perfil da estrutura fundiária do Brasil entre 2003 e 2010, existem no país 69,2 mil MST DESENVOLVIMENTO EXIGE REFORMA AGRÁRIA pleno do país já está há anos sendo debatido pelos movimentos sociais. “O movimento sindical dos trabalhadores e trabalhadoras rurais liderados pela Contag vem debatendo há vários anos o Projeto Alternativo de Desenvolvimento Rural Sustentável e Solidário (PADRSS). Ele tem como pilares de sustentação o fortalecimento e a valorização da agricultura familiar, bem como a realização de uma massiva reforma agrária. Em se tratando de desenvolvimento existe uma grande diferença entre as regiões de latifúndio e as que têm como modelo a agricultura familiar”, analisa. A necessidade de realizar a reforma agrária, proporcionando justiça no campo com a diferenciação entre o agronegócio e a agricultura familiar, se torna algo tão relevante dentro do contexto histórico brasileiro que atinge diversos aspectos do país. “A reforma agrária tem um papel importante para minimizar a desigualdade histórica social, econômica e política vivenciada pelos sujeitos do campo”, ressalta Maria Lúcia Moura Santos, presidenta da Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado de Sergipe (Fetase). Se o Brasil por um lado tornouse o país mais importante da América Latina, em contraponto nações como o México, Bolívia, Cuba e Venezuela conseguiram durante o século 20 realizar algum tipo de reforma agrária. Mesmo os que não concretizaram totalmente esses processos, ao menos obtiveram êxito em mudanças estruturais rurais, em grandes latifúndios herdados da época colonial. Dessa maneira, a consolidação já se torna algo possível em curto prazo. COBRANÇA Sem terra exigem medidas para fixar a população no campo VISÃOClassista 25 RU RA I S Mulheres, jovens e idosos A questão da reforma agrária não é algo restrito apenas ao campo. Com o avanço do latifúndio, inúmeros camponeses são obrigados a migrarem para as grandes cidades, em busca de melhores condições de vida. 26 VISÃOClassista “O não esvaziamento do campo só é possível mediante o acesso dos sujeitos sociais as políticas públicas que garantam qualidade de vida. Além disso, a manutenção do homem do campo no campo requer um projeto alternativo de desenvolvimento rural que não replique o modelo imposto pelo agronegócio, oferecendolhes condições de produção que garantam a consolidação e o fortalecimento da agricultura familiar”, analisa a presidenta da Fetase, Maria Lucia. O MST, por sua vez, entende e defende a reforma agrária como um modelo econômico e social de desenvolvimento do interior do país, alterando sua estrutura fundiária a partir do assentamento das famílias, seguido da construção de cooperativas de produção, com infraestrutura nos assentamentos, escolas, estradas para escoar a produção, áreas de esporte e lazer, postos de saúde e um grande programa nacional de agroindústria para gerar mais trabalho e renda para a produção de alimentos sem agrotóxicos. “Essas são medidas que fixam as populações no campo, gerando emprego, renda e cultura, ajudando a combater os graves problemas das cidades, que atualmente estão tomadas pela violência, fruto da desigualdade social, levando a juventude a caminhos perversos”, conclui Alexandre Conceição. A juventude trabalhadora rural, afetada diretamente por esse cenário, segue mobilizada em vários estados. “Nós queremos sim a reforma agrária, pois muitos jovens acabam saindo do campo por falta de terra e de estrutura para formar sua própria família. A reforma agrária é fundamental para acabarmos com a miséria no país. Essa não é a meta da presidenta Dilma?”, questiona Dorenice Cruz, secretária da Juventude Rural da Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado de Mato Grosso (Fetagri-MT). Maria Lúcia, da Fetase, faz um alerta também para a causa dos trabalhadores rurais idosos, que já contribuíram muito para o país. “Eles reivindicam espaço na reforma agrária. Inclusive há uma proposta para que haja lotes em menores áreas para viabilizar o trabalho na terra pelos trabalhadores rurais da terceira idade. Porém, alguns entraves legais dificultam esse acesso. Algumas normativas do Incra e do MDA não permitem que trabalhadores rurais aposentados sejam beneficiados”, destaca. Contradições Mesmo diante dos inúmeros fatores favoráveis à reforma agrária, listando seus benefícios para toda a sociedade, os movimentos campesinos têm pouco a comemorar. Dados oficiais do Incra sobre o tema revelam que o governo Dilma alcançou em 2011 a pior marca dos últimos 17 anos. A pesquisa ainda mostra que a gestão atual está bem atrás dos governos anteriores (FHC e Lula). Em 2011, mais de 22 mil famílias conquistaram lotes em assentamentos, o que representa 51% da marca de FHC em 1995, quando mais 42 mil foram assentadas. Já em relação ao primeiro ano do governo, Dilma atingiu 61% do resultado obtido em 2003, quando 36,3 mil famílias foram assentadas. De acordo com a Comissão Pastoral da Terra (CPT), o número de mortes de trabalhadores rurais cresceu 50% nos primeiros meses Arquivo CTB grandes propriedades improdutivas, com área equivalente a 228,5 milhões de hectares. Para Sérgio de Miranda, uma forma de pressionar o governo para a realização da reforma agrária é justamente o fortalecimento da agricultura familiar, com ênfase no pequeno e médio agricultor. “A população cresce no Brasil e no mundo. Atualmente, segundo informações da FAO, mais de um bilhão de pessoas passam fome. Então, é fundamental criar as condições para aumentar a produção de alimentos. O Brasil pode fazer isto, através da desapropriação das áreas improdutivas e que não cumprem com a função social da terra. Outra política importante que precisa ser fortalecida como complementar a reforma agrária é o crédito fundiário, especialmente para a manutenção dos jovens no meio rural”, acrescenta. O líder do MST também questiona o governo quanto à destinação de suas verbas. “Estamos diante de uma fragilidade agrícola e agrária colocando em risco a nossa soberania alimentar. Na agricultura familiar, geram-se oito vezes mais emprego por hectare do que nas monoculturas envenenadas do agronegócio. E, mesmo assim, no orçamento da União deste ano foram destinados R$ 118 milhões para o agronegócio e apenas R$ 18 milhões para agricultura familiar”, critica. CLASSISMO Para Maria Lúcia e Sergio de Miranda, governo Dilma precisa olhar com mais atenção para o campo de 2012 em comparação ao mesmo período de 2011. “Os latifundiários brasileiros continuam mandando matar trabalhadores e lideranças que lutam para mudar a estrutura fundiária no país. Por outro lado, a Justiça brasileira tem sido muita lenta na apuração dos fatos, muitos crimes demoram anos para serem julgados.”, analisa Sérgio de Miranda. Além dos agravantes já existentes, nos últimos meses outra questão foi levantada por parte do governo federal, que durante o lançamento do Plano Safra 2012/2013 afirmou que a reforma agrária no momento não é prioridade, mas sim as famílias que já estão assentadas. “Nós sabemos que os assentamentos existentes enfrentam muitas dificuldades, especialmente no que se refere à infraestrutura, como falta de estradas em boas condições, moradias, energia elétrica, escolas e condições de transporte. No entanto, este não pode ser motivo para deixar de realizar a reforma agrária. É preciso solucionar os problemas, avançar nas desapropriações e nos assentamentos. É preocupante ver o governo dizer que a reforma agrária não é prioridade no momento, ficando claro que o movimento sindical precisa retomar a mobilização para colocar novamente o assunto em pauta”, retruca Sérgio de Miranda. Valorização dos avanços A questão agrária nacional vem sendo debatida pelo sindicalismo rural há décadas, e perante os desafios que ainda persistem é importante reconhecer os avanços obtidos pelos trabalhadores e trabalhadoras rurais, como forma também de abastecer as lutas que ainda continuam. “Primeiro conquistamos a aposentadoria a partir da Constituição Federal aprovada em 1988. Embora seja de apenas um salário mínimo, é algo muito importante para a categoria. Depois, conquistamos o Pronaf, que é uma linha de crédito diferenciada para agricultura familiar; o crédito fundiário, habitação rural, seguro da agricultura familiar, programa de garantia de preços, entre outros. Todas essas conquistas são frutos das mobilizações, especialmente do Grito da Terra Brasil, que é realizado todos os anos em Brasília”, afirma Sérgio de Miranda. “No entanto, isso não significa que tudo esteja resolvido. Muitos problemas ainda estão sem solução e precisamos continuar a luta na busca de novas políticas públicas para a categoria”, pondera. Dessa forma as expectativas sobre o campo brasileiro permanecem efervescentes dentro da luta dos trabalhadores rurais. “Nossas expectativas são que os governantes possam se atentar para a importância da agricultura familiar para a produção de alimentos no país e com isso possam ‘frear’ o avanço do agronegócio e seus impactos negativos sobre a sociedade. Esperamos ainda que a matriz agroecológica seja amplamente difundida e que haja subsídios governamentais que fortaleçam a agricultura familiar, para que dessa forma possamos favorecer a sucessão rural e garantir a permanência dos sujeitos do campo no campo”, sustenta a presidenta da Fetase, Maria Lucia. VISÃOClassista 27 PAUTA S IN DICA L Divulgação TRIPÉ PARA O DESENVOLVIMENTO CTB defende investimentos em educação, ciência e tecnologia para elevar o país a um novo patamar socioeconômico Joanne Mota A s últimas décadas nos apresentaram mudanças significativas em todos os setores da sociedade, com uma forte redefinição do lócus, padrão e dinâmica dos processos de produção de riqueza e agregação de valor. O marco central dessas mudanças está na evolução das necessidades do setor econômico, que demanda novos conhecimentos, tecnologias e mão de obra em contínua especialização. E no Brasil não é diferente. Diante desta realidade social, a qual as carências econômicas e sociais da população desafiam-nos e onde cada vez mais os jovens são chamados a participar, mais cedo, da renda familiar. Investir em Educação, sobretudo em formação profissional, torna-se chave para dar conta desse novo paradigma sócio-econômico. O assessor técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), da Subseção da Confederação Nacional 28 VISÃOClassista dos Trabalhadores Metalúrgicos (CNTM), Roberto Anacleto, explica que estas mudanças demandam uma reposta rápida do Estado, a qual deve estar diretamente ligada a um projeto de desenvolvimento concreto, que leve em conta a valorização do trabalhador e a modernização do setor industrial. Anacleto, que também é economista, explica que no caso do Brasil, o setor industrial, por exemplo, ainda carece de uma proposta mais contundente neste sentido. Ele frisa que investir em inovação, ciência e tecnologia e formação da mão de obra significa investir em desenvolvimento. “O setor industrial precisa rever sua postura no que se refere ao investimento em pesquisa e na formação dos trabalhadores. E se falta um cenário favorável, tal como o fomento do governo na diminuição de impostos, nós devemos – trabalhadores, empresas e governo – reavaliar e pensar numa proposta que garanta esse cenário”, explica Anacleto. Segundo ele, o Brasil vive um novo panorama econômico. “Estamos em outro patamar, só que precisamos fazer transformações internas no setor produtivo para que passemos a crescer de forma sustentada. Então, por que não pensar em uma ação na qual o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), por exemplo, entre com um financiamento na questão do aprimoramento de PERSPECTIVA Capacidade de empresas como a Embraer serve de parâmetro: por que não apoiar uma montadora de automóveis com DNA nacional? nossa base tecnológica, reduzindo assim nossos níveis de importação de produtos nesse setor, para assim garantir o aumento dos postos de trabalho?”, questiona o assessor. Gilson Reis, presidente do Sindicato dos Professores do Estado de Minas Gerais (Sinpro-MG) e da CTB-MG, lembra que o país vive um processo de desindustrialização e que precisa retomar o processo de reindustrialização nacional, o fortalecimento e fomento de uma nova indústria, novas tecnologias. “Urge discutimos o papel da ciência hoje, de forma a dar condições à modernização do nosso parque industrial, dando conta dessa nova indústria do século 21. E todo esse processo passa, necessariamente, pela educação. Seja a educação de nível superior, seja a de nível médio e técnico”. Segundo Reis, é preciso que o Estado brasileiro tome consciência da necessidade desse investimento, de forma que os entes sociais possam, assim, desenvolver a educação nessa perspectiva. “Penso que estamos avançando e que medidas já estão sendo pensadas e atingidas, como, por exemplo, a defesa dos 10% PIB para educação e o compromisso do governo federal em realizar políticas de fortalecimento e construção de universidades públicas e a ampliação e fomento da formação técnica. Mas, mesmo com estas medidas positivas é preciso muito mais, e penso que o grande desafio é a ampliação dos investimentos para a educação. Para Luiz Fernandes, secretário executivo do Ministério do Esporte e ex-presidente da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), órgão público vinculado ao Ministério de Ciência e Tecnologia, o atual cenário do país é resultado de um modelo implementado no pósguerra, orientado pela política de industrialização via substituição de importações e que não incorporava a geração de tecnologia nacional como dimensão crítica. “A lógica desse modelo fez com que não se trouxesse o tema da inovação para o coração das estratégias empresariais de competitividade no esforço de industrialização nacional. E como resultado colhemos os frutos de uma sistema complexo, carente e sedento de políticas que reconfigurem o setor e o coloque em um novo circuito de desenvolvimento”, defende Fernandes. Que modelo de desenvolvimento queremos? Wagner Gomes, presidente Nacional da CTB, lembra que é preciso definir que modelo de desenvolvimento queremos, e essa escolha passa por repensar modelos de educação de qualidade e políticas de desenvolvimento. VISÃOClassista 29 PAUTA S IN DICA L Arquivo CTB MUDANÇA Gilson vê o país em nova fase “Para podermos investir em educação, precisamos ter uma política econômica que tenha essa ideia como foco. E na avaliação da CTB a política macroeconômica brasileira não possui, nem de longe, esse foco. A educação é hoje, juntamente com a inovação e a ciência e tecnologia, um setor fundamental para o nosso país, por isso deve ter toda a atenção e ampliação dos investimentos. E investir em educação significa preparar e formar o povo, tornar soberana a sociedade, colocar o país em um circuito amplo de desenvolvimento com inclusão e distribuição de renda”, diz Wagner. 30 VISÃOClassista O presidente da CTB lembra que a educação não se mede por uma régua. “Ela não pode ser tida como qualquer setor. Ela é política estruturante, e como tal, necessita de um olhar macro. Ou seja, é a educação que estrutura o setor de desenvolvimento dos estados, do país. É ela quem dá a base para as futuras gerações que governarão nosso Brasil, e como tal deve ser prioridade tanto para o Estado como para o setor produtivo”. Gilson Reis entende a modernização do país para torná-lo competitivo, como tem defendido a presidenta Dilma Rousseff, será possível somente quando setores como a educação – com foco na formação dos trabalhadores – e industrial forem reestruturados. “Com essa medida colocaremos o país em um novo patamar”. Roberto Anacleto acrescenta que a discussão sobre qual modelo de desenvolvimento queremos deve estar na ordem do dia das discussões dos trabalhadores. Segundo ele, “essa é uma discussão que os trabalhadores devem pautar, não é o governo e nem os empresários que devem delimitar isso somente, mas sim todos e conjuntamente. Precisamos entender que quando melhoramos a vida do trabalhador, geramos um efeito em outros setores. Ou seja, geram-se serviços, aumenta-se o consumo e a roda gira. Você só tem comércio e serviços se você tem uma industria forte, e ter industria forte significa ter um trabalhador qualificado e valorizado”. Modelos de crescimento Luis Fernandes, que também é professor do Instituto de Relações Internacionais da PUC-Rio, explica que o Brasil possui vários horizontes para o desenvolvimento, mas este só será alcançado com o investimento maciço em educação e inovação tecnológica. “Um dos segredos do impressionante e sustentado desempenho da China e da Índia no último quarto de século é a adoção de políticas estatais de forte indução nas empresas. A China, no período em questão, tornou-se o segundo maior investidor em Pesquisa e Desenvolvimento no mundo, atrás apenas dos Estados Unidos”. Fernandes destaca que “o principal desafio brasileiro é o de assegurar a sustentabilidade econômica do novo ciclo de desenvolvimento nacional, seja via a transformação da inovação em alavanca estratégica para a competitividade, seja com o fomento de mão de obra qualificada e com a ampliação de investimentos nacionais em pesquisa, desenvolvimento e inovação”. Para reforçar essa ideia, Roberto Anacleto cita como exemplo a experiência implantada pelos sulcoreanos. “Que caminhos seguiu a Coreia do Sul? Este país definiu que não tinha como o Estado não assumir seu papel como indutor de crescimento. Então, o governo investiu em educação, criou empresas nacionais fortes e investiu em ciência e tecnologia. Hoje a Coreia do Sul é uma referência na produção de produtos com valor agregado”, exemplifica. “E no Brasil? Nós conseguimos ter uma fábrica de aviões brasileira, mas não conseguimos ter uma montadora de veículos. Então, precisamos vencer as barreiras políticas para assim pensar em um projeto real de desenvolvimento. Exportar soja, suco de laranja, frango, minério é bom, já provamos que somos bons nisso, mas é chegada a hora de abrir novas frentes, nas quais o Brasil desponte com força tanto no mercado interno como no externo”, finaliza. Gilson Reis pontua que, em um cenário internacional de muita competitividade, o Brasil precisa se colocar em outro patamar – e esse patamar está na ciência e na tecnologia. Desse modo, “o Brasil precisa, definitivamente, investir grandes volumes de recursos na área de Ciência e Tecnologia para que a gente possa disputar essa nova economia mundial em outro patamar. E que essa nova economia possibilite o desenvolvimento de uma nova indústria, que a gente possa projetar em áreas como a nanotecnologia, a bioquímica, a biofísica, a genética e na área da tecnologia da informação, por exemplo”, enfatiza o dirigente. Unidos pelo Brasil De acordo com Gilson Reis, o movimento sindical vive um novo momento, o qual aponta outro nível de maturidade. “Considero que o conjunto dos trabalhadores compreende, hoje, a necessidade da formação. Basta olhar para as indústrias automotivas e de capitais, pode-se observar que grande parte dos trabalhadores hoje são jovens e que muitos deles Agência Brasil Urge discutimos o papel da ciência hoje, de forma a dar condições à modernização do nosso parque industrial, dando conta dessa nova indústria do século 21. INOVAÇÃO Fernandes sugere alterações na política industrial brasileira estão preocupados em cursar nível superior. Então, a base da representação sindical no país tem também adquirido essa consciência da necessidade da formação permanente e da qualificação profissional”. Porém o dirigente explica que ainda estamos em um patamar muito baixo no que se refere ao percentual de trabalhadores que buscam um nível de conhecimento e formação maior. “Penso que estamos aquém no que se refere às discussões com o governo e com o setor produtivo sobre as alternativas que viabilizem um cenário motivador para os trabalhadores. Mesmo o debate realizado ao longo desse ano, quando discutimos a questão da desindustrialização, não tivemos grande retorno para os trabalhadores”, reflete Reis. Segundo ele, é preciso aprimorar o debate entre os entes sociais que se debruçam sobre esse setor. “Penso que o governo, setor produtivo e trabalhadores devem sentar e pensar esta questão e, sobretudo, é preciso que os trabalhadores sejam ouvidos e que suas propostas sejam, efetivamente, incorporadas aos programas discutidos entre as três partes. Então, penso que precisamos amadurecer mais e precisamos impor de forma mais firme as nossas posições para que a gente tenha êxito, não só nesse projeto de desenvolvimento nacional, no qual todos saiam ganhando”. Wagner Gomes pondera que diante da conjuntura mundial não há outro caminho senão o da ampliação dos investimentos em educação, Ciência e Tecnologia com a perspectiva da reindustrialização do país e uma retomada de um novo projeto nacional de desenvolvimento. “Ao investir nestes setores, o Estado não só absorve a mão de obra existente no mercado, como também viabiliza sua qualificação, desenvolve o mercado interno, que amplia as condições de salário e de trabalho de um universo maior de brasileiros”, reforça o dirigente. VISÃOClassista 31 AP OS E N TA DOS MOBILIZAÇÃO CONTRA O DESRESPEITO Apesar de seu papel fundamental para o desenvolvimento, aposentados ainda lutam para exercer seus direitos junto ao Estado brasileiro Priscila Lobregatte U ma vida de muito suor, incontáveis obstáculos e diversas superações resumida a um cálculo injusto e a um interminável processo de desvalorização de sua aposentadoria. Esta é a realidade enfrentada por milhões de brasileiros tão logo deixam de receber o salário para ganhar o seu benefício previdenciário. No momento em que param de fazer parte do mercado de trabalho, esses homens e mulheres passam a enfrentar uma nova batalha: sobreviver com rendimentos cada vez mais baixos e numa sociedade que ainda não dá ao idoso o valor que ele merece. A situação deles é paradoxal. Por um lado, os aposentados do INSS estão à mercê de uma política previdenciária que encolhe seus benefícios e sua dignidade; por outro, essa população é responsável por parte importante da economia nacional. Estima-se que mais de 15 milhões de idosos com mais de 60 anos respondam pelo sustento de suas famílias em todo o Brasil. De acordo com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad 2011), em setembro do ano passado os idosos brasileiros movimentaram R$ 28,5 bilhões, dos quais 69,5% têm origem na seguridade social. O valor corresponde a 19,4% da renda de todos os brasileiros e a 64,5% da renda das casas onde vivem. Segundo o Instituto, “acredita-se que os idosos brasileiros de hoje estão invertendo a tradicional relação de dependência apontada pela literatura. A grande maioria deles tem assumido o papel de provedor, mesmo dependendo de cuidados”. Além disso, a economia de cerca de 64% das cidades depende desses rendimentos, dinheiro curto, mas certo, que mês a mês aquece o comércio e os serviços locais. Em muitos casos, o montante advindo dos benefícios é maior do que os recursos que chegam às prefeituras por meio do Fundo de Participação dos Municípios. Pensar uma política de reajuste e valorização das aposentadorias e de extinção do fator previdenciário, portanto, é pensar também no desenvolvimento sócio-econômico especialmente das pequenas e médias cidades e da população mais pobre. Envelhecimento da população Agência Brasil EXPERIÊNCIA No Congresso Nacional, aposentados cobram o fim do fator previdenciário 32 VISÃOClassista No que diz respeito à melhoria das condições previdenciárias, a dívida do Estado com os brasileiros grisalhos ainda é grande e tende a aumentar com o envelhecimento da população. Enquanto o número de brasileiros cresceu de 70 milhões em 1960 para mais de 190 milhões em 2010, o número de pessoas com mais de 60 anos saltou de 3,3 milhões naquele ano – ou 4,7% do total – para mais de 20 milhões, o que corresponde a 10,8% do total. Também é importante salientar o importante papel que teve no país, especialmente no que diz respeito aos idosos, o estabelecimento do salário mínimo como piso da aposentadoria, bem como a sua valorização, experimentada a partir do governo Lula. Esses fatores permitiram uma forte queda no número de idosos pobres e indigentes. Em 1992, os do sexo masculino eram 32,7%; hoje eles são 6,2%. Entre as mulheres, estes índices foram de, respectivamente, 28,9% e 5,4%. Porém, é urgente que o Estado brasileiro enfrente os problemas relativos à Previdência Social no que diz respeito ao achatamento das aposentadorias. Além de ser necessário enfrentar o envelhecimento natural da população, o Brasil pode aproveitar os bons ventos da economia interna para estabelecer uma nova lógica em seu sistema previdenciário enquanto é possível administrar os impactos de tais mudanças. Um indicador de que o país está hoje – e nos próximos anos – em condições mais confortáveis de rever tal situação pode ser visto na publicação “A situação do trabalho no Brasil na primeira década dos anos 2000”, editado pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese). Os níveis da razão de dependência demográfica – que mede a proporção entre o número de pessoas que, pela idade, estão aptas a produzir riquezas e o daquelas que potencialmente apenas consomem – “deverão ser os menores no período que se estende de agora até aproximadamente 2025 do que em qualquer outro momento da história brasileira recente”, explica. Ainda de acordo com o levantamento, “o período atual é considerado uma oportunidade para o ‘enriquecimento’ da sociedade ou um bônus demográfico, como definem os especialistas: relativamente muitas pessoas podem trabalhar e relativamente menos pessoas dependem da produção das que trabalham. O excedente econômico que pode ser gerado em situações como esta, dependendo da política econômica e do modelo de desenvolvimento adotado, pode ser transformado em aumento nos níveis da poupança, investimento e produção, resultando em um crescimento econômico e possibilidade de superação das desigualdades sociais”. Apesar disso, o que ainda se vê é resistência, dentro do próprio governo, para corrigir as distorções causadas pela falta de uma política de reposição das aposentadorias superiores a um salário mínimo e VISÃOClassista 33 AP OS E N TA DOS Agência Brasil pelo fator previdenciário. Soma-se a isso o impacto que pode ter sobre a Previdência as desonerações sobre as folhas de pagamento anunciadas recentemente. Fator previdenciário em pauta 34 VISÃOClassista PREOCUPAÇÃO Para o presidente da Cobap, aposentados estão escaldados Boas, secretário de Previdência da Federação Interestadual de Metalúrgicos e Metalúrgicas do Brasil (FitMetal) e integrante da Secretaria de Previdência da CTB, “não se vê em nenhum momento dessa discussão a garantia de que o trabalhador vai poder trabalhar até o último dia de sua carreira para se aposentar. Em muitos países da União Europeia não existe aposentadoria por tempo de serviço, só por idade, mas há estabilidade. O trabalhador garante o rendimento de maneira que ao se aposentar receba um valor adequado. No Brasil, há uma tendência à renovação do efetivo nas empresas e consequentemente o empregado antigo, quando chega numa certa idade, é demitido”. A preocupação dos dirigentes sindicais é respaldada pela análise do Dieese publicada em “A situação do trabalho no Brasil na primeira década dos anos 2000”. Em 2004, a taxa de rotatividade foi de 43,6%; em 2008, 52,5% e em 2010, 53,8%, incluídas nestes percentuais tanto as demissões feitas conforme os interesses dos empregadores quanto aquelas ocorridas a pedido do trabalhador, por aposentadoria ou morte. Excluindo estes últimos fatores, o maior índice da década seria o de 37,5%, verificado no ano de 2008. Recomposição Além da questão do fator previdenciário, outra preocupação dos trabalhadores é a recomposição das aposentadorias daqueles que ganham mais de um salário mínimo. Afinal, se por um lado a política de valorização prestigiou, com justiça, os trabalhadores e aposentados mais pobres, por outro aqueles que ganham acima do mínimo tiveram perdas consideráveis por terem recebido apenas os reajustes inflacionários. Até o momento, não há nenhuma indicação concreta de que a partir de 2013 os aposentados terão algum reajuste acima dos 4,5% de reposição. Mantido este quadro, a perda acumulada será de 10,4%. “Defendemos que a política de valorização das aposentadorias atinja todas as faixas salariais. Além da recuperação da inflação, podese adotar uma fórmula equivalente à de reajuste do salário mínimo. O governo deveria avançar nesta matéria porque é uma dívida que ele tem com essa parcela de estima-se que ao invés de R$ 21,5 bilhões, a União passará a arrecadar R$ 8,74 bilhões anuais. “Existe um compromisso do governo de ressarcir essa diferença com recursos do Tesouro. Só que já temos um histórico no Brasil de o dinheiro da Previdência ser usado para outras finalidades. Com isso, você diminui a capacidade previdenciária de bancar uma política mais avançada. Precisamos de uma definição mais clara de quais recursos orçamentários serão usados para cobrir esse déficit”, argumenta Santana. O desafio da mobilização Para fazer frente a tantos desafios, a CTB tem buscado ampliar o diálogo com as demais centrais a fim de estabelecer alguns objetivos comuns na luta dos aposentados, entre os quais se destacam o fim do fator previdenciário com uma alternativa adequada aos interesses dos trabalhadores; uma política de reposição das perdas para quem recebe benefícios maiores que um FitMetal Com a retomada dos trabalhos na Câmara Federal após o recesso e as eleições municipais, voltou à pauta nacional o Projeto de Lei 3299/08, do deputado licenciado Pepe Vargas (PT-RS), atual ministro do Desenvolvimento Agrário, que propõe a extinção do mecanismo usado na concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, conhecido como fator previdenciário, com a implantação da regra conhecida como 85/95. Nos debates sobre o tema, o governo tem colocado que aceita acabar com o famigerado dispositivo introduzido durante o governo de Fernando Henrique Cardoso desde que seja estabelecida uma idade mínima para se pedir aposentadoria. Diante da única alternativa apresentada até o momento, estabelecendo a regra 85/95, as centrais sindicais têm se posicionado no sentido de apoiar a medida para atenuar as perdas dos aposentados. “É melhor do que o fator previdenciário, mas também tem problemas. O Brasil é um país com muita rotatividade e quem muda muito de emprego ao longo de sua vida laboral pode enfrentar dificuldade de atingir a soma estipulada”, explica o vicepresidente da CTB, Nivaldo Santana. Segundo a regra, o trabalhador poderá se aposentar quando a soma da idade e do tempo de contribuição for de 95 anos para homens e de 85 para mulheres. Na avaliação de Uriel Villas aposentados que ganham acima de um salário mínimo”, explica Nivaldo Santana. “O governo diz que se der aumento ao aposentado, vai quebrar a Previdência. Desde os meus 15 anos ouço falar isso. Estamos escaldados. E se a Previdência está sob risco de quebrar, como pode se desonerar a folha de pagamento? E estamos ainda mais preocupados porque sabemos que o governo deve continuar esse processo, diminuindo assim a arrecadação da nossa previdência”, alerta Warley Martins, presidente da Confederação Brasileira dos Aposentados e Pensionistas (Cobap). A preocupação de Martins é outra questão que tem tirado o sono dos movimentos sindicais e ligados aos aposentados. Afinal, como alternativa para aquecer a produção e estimular a economia, o governo tem ampliado a desoneração da folha de pagamento em diversos setores. Ao todo, 45 deixarão de pagar a contribuição de 20% ao INSS em troca de pagar um percentual que fica entre 1% e 2% sobre o seu faturamento. Com isso, ESTRATÉGIA Villas Boas (à dir.) diz que centrais devem exigir nova postura do governo salário mínimo e a garantia de que a desoneração não acarretará perdas em médio e longo prazo. Porém, na avaliação de Villas Boas, a atuação das centrais deve se focar numa mudança na relação entre movimento sindical e governo, com maior poder de interferência daquele nas decisões deste. “Estamos numa situação muito grave. Quando a Previdência foi criada, em 1943, o governo Vargas juntou as propostas que estavam sendo pleiteadas pelo movimento sindical. De lá para cá, até hoje, o movimento sindical nunca apresentou propostas concretas em relação à Previdência, limitando-se a discutir as que vêm do governo”. Para lidar com tamanhos desafios, a CTB busca ainda ampliar a mobilização da própria base – envolvendo aposentados e trabalhadores da ativa – para, assim, aumentar o poder de pressão do movimento, tarefa difícil diante do afastamento natural que acaba acontecendo entre o trabalhador e o sindicato quando ele se aposenta. Neste sentido, os cetebistas defendem que os aposentados estejam inseridos na própria estrutura sindical de sua categoria, postura diferente da CUT e da Força Sindical, por exemplo, que estimulam a criação de sindicatos próprios para aposentados. Sem prejuízo de ampliar o diálogo com todas as centrais, Nivaldo Santana salienta que “o aposentado deve manter o vínculo com o sindicato de sua origem e a forma mais comum é a criação de uma associação de aposentados vinculada ao sindicato ou a criação de um departamento pelo próprio sindicato. Acreditamos que, para dar mais força e eficácia à luta ele deve estar vinculado à entidade de sua categoria”. VISÃOClassista 35 I NT E R N A CION A L POR QUE CHÁVEZ VENCEU AS ELEIÇÕES NA VENEZUELA? Agência Brasil Conquistas da revolução bolivariana ajudam a explicar o triunfo do presidente reeleito Vanessa Silva E ssa é uma pergunta recorrente no Brasil. Por não conhecerem a realidade venezuelana, muitos não entendem como pode um “ditador” vencer as eleições com mais de 1,5 milhão de votos de diferença e falar em aprofundamento do socialismo em pleno século 21. A questão é que, como os brasileiros, os venezuelanos não estão preocupados com rótulos e não se deixam manipular pela imprensa. O raciocínio é: “Nossa vida melhorou, Chávez governa para nós, então estamos com ele”. A famosa frase de Lula também é válida no país vizinho. “Nunca antes na história daquele país” um governo fez tanto pelo povo. Apesar da intensa campanha opositora, as eleições foram celebradas de maneira limpa. Como reconheceu o instituto Jimmy Carter, o país tem um dos processos eleitorais mais seguros do mundo. Organismos internacionais como a Organização dos Estados Americanos (OEA), a Organização das Nações Unidas (ONU) e a Comissão Econômica para 36 VISÃOClassista CONSAGRAÇÃO Apoio popular garante mais um mandato para o Comandante revolução democrático-nacional, com o “objetivo de libertar os venezuelanos da elite corrupta e degenerada que atuava como representante local do imperialismo estadunidense”, como esclareceu o escritor e político britânico Alan Woods em artigo sobre o processo conduzido no país. É este o processo defendido pelos venezuelanos, que reelegeram Chávez com 55% dos votos válidos, contra 44% de seu opositor, Henrique Capriles. “Amor com amor se paga”, diziam os venezuelanos para justificar o voto durante a campanha chavista. Solidariedade e fraternidade são a tônica do socialismo construído ao sul dos trópicos. Missões América Latina e Caribe (Cepal) reconhecem os avanços realizados pelo governo bolivariano. Entre as conquistas de mais destaque estão o fortalecimento da democracia, a redução da pobreza, da desigualdade, da desnutrição infantil e do desemprego; o aumento da escolaridade; a maior igualdade de gênero; mais acesso aos serviços de saúde; a democratização dos meios de comunicação e o fortalecimento da integração latino-americana. “Por 14 anos votamos no Chávez. Outro presidente como ele não vamos ter nunca mais. Ele é um homem bom e digo isso pelo que dá ao povo, que sempre esteve miserável. Com Chávez, a vida é muito melhor para todos”, declarou Gertrudes Fuentes, pouco depois de votar, no dia 7 de outubro. O socialismo bolivariano Chávez, ao falar de seu projeto, enfatizou: “Cada dia estou mais convencido de que é necessário transcender o capitalismo. Mas o capitalismo não pode ser transcendido desde o próprio capitalismo, mas através do socialismo, do verdadeiro socialismo, com igualdade e justiça. Também estou convencido de que é possível fazê-lo na democracia, mas não na democracia imposta [pelos Estados Unidos]”. A revolução bolivariana é um projeto que se propõe a superar o capitalismo. Ela começou como uma O grande projeto do governo para mudar a Venezuela na verdade são 23. As chamadas missões são programas sociais desenvolvidos em diversas áreas do país. O maior projeto e de mais visibilidade é o Grande Misión Vivenda, ou Grande Missão Habitação, em português. Até o final de 2012, terão sido construídas 353.404 casas e apartamentos, sendo que 90% dessas residências já foram entregues. Para 2014, a meta é alcançar a cifra de 978.404. Para financiar as moradias, não é necessário dar entrada, o que garante que os mais pobres também tenham acesso ao programa. Além disso, recursos como geladeira e fogão já vêm com a casa e entram no financiamento geral. Diferentemente do Brasil, na Venezuela as casas são construídas no centro da cidade e não nas distantes periferias. Caracas é um verdadeiro canteiro de obras. Nas principais avenidas do país é possível encontrar os vários prédios vermelhos da Misión Vivienda. Com uma concepção socialista, 50% dessas moradias são construídas por conselhos comunais, onde o povo autogestiona o processo. Assim, quebra-se com a lógica das grandes empreiteiras e ainda há o controle dos meios de produção por parte dos trabalhadores, como avalia o especialista em habitação, que integra a missão do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas na Venezuela, Flávio Higuchi Hirao. “Quando se usam apenas as empreiteiras, avança-se na construção de casas, mas não no processo organizacional revolucionário, nas relações de trabalho, tecnologia e propriedade dos meios de produção. Do modo como estão fazendo na Venezuela, podem ser colocados como expoentes mais avançados no campo da construção civil”, avalia o técnico. Mas o projeto também incomoda porque expõe a divisão de classes que existe no país. “Hoje, a todos os venezuelanos estão sendo dadas casas, que são construídas em lugares onde os ricos nunca pensaram. Então, no bairro de Florida, que é de classe média e média alta, há três edifícios ‘de pobres’. Os moradores estão começando a vender seus “Cada dia estou mais convencido de que é necessário transcender o capitalismo. Mas o capitalismo não pode ser transcendido desde o próprio capitalismo, mas através do socialismo, do verdadeiro socialismo, com igualdade e justiça”. apartamentos por um preço menor porque não querem viver ao lado dos pobres”, conta a economista venezuelana Melisa Maytín Marquez. Educação Garantir que todos tenham acesso à educação é outro objetivo central do projeto bolivariano. Desde 2005 não existem analfabetos no país, que já conta com a quinta maior taxa de matrículas universitárias do mundo. Essas conquistas se devem às missões educativas. Conversando com jovens caraquenhos é fácil ver o alcance desses projetos. “Graças ao meu comandante, este país agora é outro. O programa de inclusão universitária nos abriu portas. Progredir não é mais um sonho, e sim uma realidade”, diz a universitária Yeisa Rodriguez. No mesmo bairro, o emblemático 23 de Enero – um dos maiores conjuntos habitacionais de Caracas – o estudante de medicina Dany Fuentes manifesta seu voto em Chávez e conta que estuda ali mesmo: existe uma faculdade no bairro que forma os profissionais VISÃOClassista 37 I NT E R N A CION A L Direitos trabalhistas ampliados Ao contrário do projeto neoliberal de “flexibilização” dos direitos trabalhistas, sob Chávez as conquistas dos trabalhadores foram ampliadas. O texto da lei, vendido – como todas as demais leis e a própria Constituição – em formato de livrinho por camelôs nas bancas de Caracas, garante que “o processo social de trabalho tem como objetivo essencial superar as formas de exploração capitalista, a produção de bens e serviços que assegurem nossa independência econômica, satisfaçam as necessidades humanas mediante a justa distribuição da riqueza e criem as condições 38 VISÃOClassista materiais, sociais e espirituais que permitam à família ser o espaço para o desenvolvimento integral das pessoas e conquistar uma sociedade justa e amante da paz, baseada na valorização ética do trabalho e na participação ativa, consciente e solidária dos trabalhadores e trabalhadoras nos processos de transformação social, consubstanciados com o ideal bolivariano”. Neste sentido, as terceirizações foram proibidas, direitos como licença-maternidade e paternidade foram consolidados e, bandeira dos movimentos sindicais brasileiros, a Venezuela aprovou a redução da jornada para 40 horas semanais, sem alteração salarial. Outro ponto importante, que vai na contramão da cartilha de Washington, é a redução da idade mínima para aposentadoria. Homens se aposentam com 60 anos, e as mulheres, com 55. Além disso, todos agora têm seguro social, com direito ao salário integral. Não é à toa que muitos venezuelanos, quando questionados sobre qual é a principal conquista Para o debate... O projeto Grande Misión Vivienda possibilita a quebra da lógica das empreiteiras e garante aos trabalhadores, o controle dos meios de produção, em uma experiência das mais avançadas no campo da construção. da revolução citam a “Missão Amor Maior”, que garante aposentadoria aos idosos independentemente de terem ou não trabalhado formalmente. Relações com a imprensa Não se pode dizer que os veículos na Venezuela são censurados ou que o governo cometa ingerências para restringir a liberdade de expressão. Abundam manchetes contra o presidente Chávez e na TV aberta vê-se todo tipo de notícia, geralmente contra o mandatário. Mas, diferentemente da liberdade de empresa que temos no Brasil, os venezuelanos têm liberdade de imprensa, com jornais de esquerda como opção, somados a rádios e TVs comunitárias que dividem o espectro com as emissoras comerciais. Esse é um grande trunfo de Chávez. Na avaliação da jornalista, escritora, advogada e pesquisadora venezuelano-americana, Eva Golinger, “os meios comunitários são fundamentais para garantir a soberania do país”. Apesar dos avanços na área, “eles não são a maioria, nem têm a maior audiência, mas através da internet, das redes sociais, podem assegurar que a voz do povo seja escutada, que se expressem e ocupem os espaços que antes não tinham”. Essas conquistas vieram com a Constituição da República Bolivariana da Venezuela, aprovada em 1999, que criou a figura dos meios de comunicação comunitários, como lembra Eva. “Antes de Chávez, não existiam meios comunitários, alternativos, como existem agora. Estavam na clandestinidade, tinham que trabalhar de maneira secreta e não havia nenhum apoio”. Hoje, o Estado passou a ter que apoiar e fortalecer esses meios, garantindo sua sobrevivência. E esses meios, por sua vez, garantem a soberania popular ao servir como contrainformação e contraponto às calúnias e tentativas desestabilizadoras da grande imprensa venezuelana. Para o debate... CONQUISTA Popularização de moradias leva dignidade a milhares de venezuelanos Ao contrário da receita neoliberal de “flexibilização” dos direitos trabalhistas, na Venezuela as conquistas dos trabalhadores foram ampliadas e, com a Missão Amor Maior, a aposentadoria passou a ser um direito de todos. Vanessa Silva que vão atuar no atendimento primário, como fazem hoje os médicos cubanos. Para garantir a democratização do ensino, algumas universidades que aceitam o ingresso de jovens e adultos proveniente das missões, realizam estudos preparatórios para esses alunos. Diferentemente dos “cursinhos” brasileiros, os Centros de Iniciação Universitária oferecem aulas, já na faculdade, para nivelar eventuais deficiências que os estudantes possam ter antes de começar os estudos acadêmicos. Para entrar na universidade o processo é também mais democrático. De acordo com a professora, especialista em educação de adultos, Inocencia Orellana Hidalgo, para ingressar em uma faculdade na Venezuela, basta inscrever-se no Conselho Nacional de Universidades. Para isso, é preciso ter concluído o Ensino Médio e estar inscrito no Ensino Universitário. Segundo ela, algumas universidades ainda mantêm os vestibulares, mas não são a regra. INVESTIMENTO Desde 2005, país se orgulha de não ter nenhum analfabeto Integração O projeto socialista é também internacionalista. Com esse entendimento, Chávez deu início a uma revolução que afetaria toda a América Latina. Eleito pela primeira vez em 1998, era uma voz dissonante contra o imperialismo estadunidense. Até que em 2003, Néstor Kirchner, na Argentina, e Luiz Inácio Lula da Silva, no Brasil, passam a integrar o time de presidentes progressistas. Juntos, em 2005 dizem não à proposta dos EUA de criar a Área de Livre Comércio das Américas (Alca). A partir daí tem início o despertar para a integração latino-americana. O Mercosul então ganha força e um viés à esquerda. São criadas novas propostas como a Aliança Bolivariana para os Povos de Nossa América (Alba), a União das Nações Sul-Americanas (Unasul) e a Comunidade dos Estados LatinoAmericanos e Caribenhos (Celac). Com a visão de que a integração deve ser feita do e para o povo, Chávez pautou o debate por mudanças no Mercosul. De acordo com o deputado venezuelano do PSUV, Roy Daza, em entrevista concedida logo após a entrada da Venezuela no bloco, “esse foi um passo a mais na unidade latinoamericana em um momento de crise mundial do capitalismo”. Com a exceção temporária do Paraguai, devido ao golpe parlamentar que destituiu o presidente Fernando Lugo, “todos os presidentes do Mercosul são de esquerda, e orientam seus governos para resolver o problema da inclusão”. Segundo o deputado, “todos temos um mínimo denominador comum: desenvolver uma política econômica dirigida a solucionar os graves problemas da desigualdade que há em nossos países e acabar com a pobreza, tanto geral quanto crítica”. A revolução não é exportável, mas pode influenciar positivamente outras experiências pelo continente, como vem fazendo nitidamente nações como Equador, Bolívia, Nicarágua e Cuba. VISÃOClassista 39 AC O NT ECEU Chapa da CTB se reelege no 8º Congresso da Contee P rofessores e professoras de todas as regiões do país estiveram reunidos na cidade de São Paulo entre os dias 31 de agosto e 2 de setembro para participar do 8º Congresso da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino (Contee), que elegeu a nova diretoria da entidade e aprovou a desfiliação da Central Única dos Trabalhadores (CUT). Durante os três dias de debates e tomadas de decisões, os 671 delegados e delegadas presentes, de 78 entidades e federações filiadas, elegeram a Chapa 3, da CTB, encabeçada pela professora Madalena Guasco Peixoto, e aprovaram as diretrizes que nortearão a entidade na próxima gestão (2012-2016). Três chapas concorreram ao pleito: a chapa 1 (CUT), encabeçada por Cassio Bessa, recebeu 160 votos; a chapa 2, liderada por Fabio Zambon, obteve 192 votos; e a chapa 3, chamada “Ação Classista”, que reelegeu Madalena Guasco, consagrou-se vitoriosa com 304 votos. Resoluções Além da vitória massiva da CTB, importantes deliberações foram aprovadas durante a atividade. Resoluções a respeito da conjuntura nacional e internacional apontaram as posições políticas e a forma de enfretamento à crise econômica mundial e seus efeitos na luta da classe trabalhadora. 40 VISÃOClassista Direção da CTB reforça sua luta em defesa da Unicidade Sindical Contee VITÓRIA Combatividade cetebista obteve destaque durante os debates A pauta educacional também definiu as prioridades da luta da Confederação na defesa da educação pública, democrática, de qualidade socialmente referenciada, e da regulamentação do setor privado de ensino. A posse da diretoria eleita no 8º Conatee foi realizada após a divulgação do resultado e contou com a presença de centenas de sindicalistas. Além da desfiliação à CUT, entre as principais decisões do 8º Conatee destacam-se ainda as alterações estatutárias que mudaram a composição da diretoria executiva e o tempo de gestão da próxima direção, passando para quatro anos. “Foi um congresso democrático e representativo, pois adotou resoluções no sentido de fortalecer a Contee, aprofundando a unidade da categoria”, afirmou o vicepresidente da CTB, Nivaldo Santana, que acompanhou todo o processo ao lado dos dirigentes cetebistas, entre eles Gilson Reis (presidente da CTB-MG e do Sinpro-MG) e da secretária nacional de Formação Sindical, Celina Arêas. Para o sindicalista, o congresso representou uma vitória para os trabalhadores do setor. “Como corrente majoritária, a CTB se mantém à frente da entidade e aprovou a desfiliação a CUT para permitir uma convivência unitária de todos os segmentos que compõem a confederação. Foi uma vitória”, disse Santana. O s últimos meses foram bastante intensos na luta da CTB pela Unicidade Sindical. Nos dias 12 e 13 de setembro, o secretário de Imprensa e Comunicação Eduardo Navarro esteve à frente da delegação cetebista que participou do Seminário sobre Tabela de Categorias, iniciativa do Conselho de Relações do Trabalho (CRT), com o propósito de iniciar um processo para estabelecer regras mais claras sobre a organização sindical no país e a cessão dos registros sindicais para novas entidades. A CTB, desde sua fundação, tem essa postura porque até a promulgação da Constituição de 1988, o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), por meio da Comissão de Enquadramento Sindical, realizava a tarefa de determinar o sindicato que representaria cada categoria profissional ou mesmo econômica. “Temos que fazer um esforço para atualizar a tabela de categorias, no sentido de respeitar e garantir a unicidade sindical prevista na Constituição”, afirmou Navarro. possibilidade de entendimento entre as partes e podem ter tarefas sobrepostas em alguns casos. Pascoal Carneiro, secretáriogeral da CTB, tem visto com bons olhos o trabalho feito pelo ministro do Trabalho, Brizola Neto. “Esse esforço para combater os sindicatos fantasmas vem ao encontro daquilo que defendemos desde nossa fundação”, explica. Para ele, a palavra-chave para definir o papel dos sindicatos que vierem a ser criados a partir da publicação da nova Portaria é o “respeito” ao princípio da unicidade sindical. Fim da Portaria 186 Entre dezembro e janeiro, o MTE deve publicar uma Portaria que substitua a de número 186, com a intenção de sistematizar com maior rigidez as regras para a criação de entidades sindicais no país e acabar com as organizações fantasmas. O governo quer barrar também o desmembramento das associações existentes, que se tornam menos representativas, diminuem a VISÃOClassista 41 C ULT U R A A GEN D A SIN D IC A L Filme retrata drama familiar de dois ídolos da música brasileira Divulgação Fernando Damasceno “A verdade é que a gente nunca se entendeu”. A frase de Gonzaguinha, logo no começo do filme, dá o tom de acerto de contas que permeará a narrativa de “Gonzaga – De Pai Para Filho”, filme dirigido por Breno Silveira (“2 Filhos de Francisco” e “À Beira do Caminho”). Mais do que uma tentativa de contar as trajetórias de dois expoentes da música popular brasileira, a obra aborda um drama familiar, com nuances pouco conhecidas do grande público – e até mesmo por parte dos fãs de ambos. Em um tempo no qual o cinema brasileiro encontra dificuldade para encontrar uma narrativa original para as biografias de seus grandes artistas, a opção adotada por Silveira é bastante válida. A partir de uma boa escolha de atores para interpretar Luiz Gonzaga e seu filho, o diretor expõe alguns momentos-chave da trajetória de ambos, de modo a explicar por que o já referido acerto de contas tornase necessário em uma fase delicada de suas vidas. Proposta clara Algumas questões são apresentadas de maneira dura: a pobreza na infância de Luiz Gonzaga no interior de Pernambuco, o racismo por sua cor mulata, o preconceito contra nordestinos, a morte da mãe de Gonzaguinha (grande paixão de 42 VISÃOClassista integração latino-americano e os trabalhadores”, com a presença de sindicalistas de diversos países da região. Direção Plena CTB DEZEMBRO Seminário Internacional JANEIRO Curso de Gestão Sindical DEZEMBRO CTB Bahia capacita sindicalistas sua vida), os tempos de ostracismo após o sucesso arrebatador e, sobretudo, as falhas do Rei do Baião enquanto pai – retratado como exemplar provedor, mas ausente na criação do filho. Para contrapor tantos dramas, uma trilha sonora riquíssima, com os principais clássicos da história do forró, atenua o peso da narrativa e permite ao espectador saber como o Rio de Janeiro, então capital federal, se rendeu a ritmos como o xaxado e o baião entre os anos 1940-50. Apesar da efeméride dos cem anos de nascimento de Gonzaga, completados em 2012, Breno Silveira não se propôs a fazer uma biografia sobre o Rei do Baião ou Gonzaguinha. A proposta do diretor é clara e, por sua singeleza, eficaz. Ao contar uma história entre pai e filho, carregada de rancor, ressentimento e um tipo de carinho represado por décadas de distanciamento, a fama de ambos passa a ser coadjuvante diante de seus dramas. Espera-se, portanto, que cada um deles mereça no futuro um trabalho específico (documental ou não), que aborde com maior riqueza de detalhes suas trajetórias, de modo a permitir que as novas gerações tomem consciência da importância de suas obras para a cultura nacional. A CTB Bahia irá realizar entre os dias 3 e 7 de dezembro o “Curso Básico de Formação Sindical e o Seminário de Atualização Política”, com o objetivo de preparar a militância para enfrentar os desafios da agenda política de 2013. Nas discussões, os temas Conjuntura, Sindicalismo, Política e Economia darão sentido a uma análise da realidade mundial frente à grave crise econômica. Nas mesas de debate estão previstas a participação diversos palestrantes. Seminário Internacional A CTB irá realizar nos dias 11 e 12 de dezembro, em São Paulo, no Hotel Excelsior, o Seminário “O processo de Na sequência do seminário internacional, será realizada, também em São Paulo, nos dias 13 e 14 de dezembro, a 10ª Reunião Plena da CTB, com a participação de toda sua Executiva Nacional. Na pauta, um balanço das atividades de 2012 e uma discussão sobre as perspectivas para 2013, ano em que será realizado o 3º Congresso da Central. JANEIRO Curso Nacional de Gestão Sindical O Centro de Estudos Sindicais e do Trabalho (CES), em parceria com a CTB, realizará entre os dias 14 e 18 de janeiro o “2º Curso Nacional de Gestão Sindical”, em São Paulo. A atividade tem como foco sindicalistas e ativistas sindicais que queiram aprofundar a compreensão sobre e o funcionamento e organização das entidades sindicais, o que implica em aulas direcionadas à gestão das mesmas. Formação de formadores Durante o período em que será realizado o Curso de Gestão Sindical, também ocorrerá, no mesmo local, o curso de Formação de Formadores. A atividade, no entanto, será destinada apenas a sindicalistas que já participaram de outras edições e para aqueles que são responsáveis pelo setor de formação em seus estados ou municípios. FIQUE DE OLHO: Contag realiza seu 11º Congresso O 11º Congresso da Contag acontecerá entre os dias 4 e 8 de março, em Brasília. O evento vai reunir dirigentes rurais de todo o país, que elegerão a nova a diretoria e o Conselho Fiscal da Contag, para a gestão de 2013/2017. Fórum Social Mundial 2013 será na África Entre os dias 26 a 30 de março acontecerá o Fórum Social Mundial 2013, na Tunísia, com o lema “Por uma outra Tunísia, por um outro Magreb-Machrek, por outra África, por um outro mundo”. O FSM permitirá um reencontro de homens e mulheres que estão lutando contra a gestão neoliberal da economia, que lutam pela igualdade de todos e todas, a solidariedade, justiça, paz, pela preservação do meio ambiente e a defesa dos bens comuns. VISÃOClassista 43