Pediatria CASO CLÍNICO: Fibrose Cística Hospital Regional da Asa Sul – HRAS Internato em Pediatria – 2007 Laura Ferraz Escola Superior de Ciências da Saúde (ESCS) /SES/DF Coordenação: Luciana Sugai www.paulomargotto.com.br CASO CLÍNICO • Identificação: – RN de Eminilva G. dos Santos – Data de Nascimento: 18/07/07 – Parto hospitalar pré-termo (IG = 33 sem) – Peso de nascimento: 2.620 g – Estatura: 45 cm – Perímetro cefálico: 35 cm Adequado para a idade gestacional CASO CLÍNICO • Pré-natal: – – – – – – – – Mãe: G II P 0 A I Nº consultas: 05 VRDR (2º trim) = NR HIV (2º trim) = NR Rubéola : IgG + e IgM – TS (mãe) = O + Gestante não fumante US gest realizada em 12/07/07: feto com distensão abdominal e imagem sugestiva de peritonite meconial CASO CLÍNICO • Condições de Nascimento: – Parto cesariano devido a polidrâmnio e distensão abdominal fetal – Gestante em pródromos de TP: 1 contração / 10´ – Apgar: 5 – 8 – Exame físico: • Distensão abdominal + silêncio abdominal + bradicardia CASO CLÍNICO • Conduta imediata: – Aspiração de traquéia – Intubação e ventilação com CFR Melhora da bradicardia→ Hood 100% – – – – UTI neonatal Radiografia de abdômen Parecer cirurgia pediátrica Iniciados cefepime e amicacina CASO CLÍNICO • Parecer da cirurgia pediátrica: presença de significativa distensão abdominal e hiperemia em epigástrio • Rx abd (1h vida): ausência de peneumoperitônio, com massa calcificada em epigástrio • Rx abd (6h de vida): pneumoperitônio • CONDUTA: – Ventilação mecânica – Associação de metronidazol – laparotomia CASO CLÍNICO • Laparotomia (realizada com 10h de vida): – Ressecção de parte de jejuno e íleo – Retirada de mecônio endurecido e esbranquiçado em topografia de jejuno (rolha meconial) – Ileostomia em dupla boca EVOLUÇÃO CLÍNICA • No pós-operatório, evoluiu com episódios de hipotensão, sendo iniciadas dobutamina e dopamina • 20/07: supensão de dopamina; retorno ao HOOD • 21/07: suspensão dobutamina • 22/07: suspensão HOOD → catéter nasal • 23/07:iniciada nutrição parenteral total (NPT), suspensa após 5h pois RN apresentou hipercalemia (k+ = 7,4) EVOLUÇÃO CLÍNICA • 24/07: ar ambiente • 26/07: suspensa a ATB • 27/07: • BT = 11,9 • BI = 3,7 • BD = 8,2 ICTERÍCIA COLESTÁTICA • 26/07: Resultado de biópsia intestinal→ presença de células ganglionares em plexo nervoso EVOLUÇÃO CLÍNICA • 29/07: (11 dias de vida-264 hs). Queda estado geral +Hemograma alterado (dois, de três índices de Manroe e cl alterados (consultem gráficos*) – Leu = 21.500 » Seg = 52% » Bastões: 6% » Linf = 40% » Eos = 1% » TN » Relação I/TN: N » Imaturos:: CONDUTA: Vancomicina *Interpretação do leucograma no recém-nascido: valores para neutrófilos, linfócitos, monócitos e eosinófilos Autor: Barbara Manroe e cl. Apresentação: Ana Carla H.V. de Andrade, Candice Cristina Q. de Araújo, Flávia Gomes de Campos, Camila Amaral Venuto, Paulo R. Margotto EVOLUÇÃO CLÍNICA • 01/08: melhora progressiva do estado geral, inicia-se seio materno, mantendo a NPT, pois RN perdia peso (Síndrome do Intestino Curto???) • 14/08: Novo hemograma – Leu = 9.500 (35 %, 2%, 47%, 4%) – Hm = 3,31 – Hg= 8,9 – Ht= 27,6 » CONDUTA: CONCENTRADO DE HEMÁCIAS Evolução clínica • 20/08: suspensão vancomicina • 28/07: reconstrução do trânsito intestinal, sem intercorrências • 03/09: dieta exclusivamente VO (seio e copo) • 13/09: transferência ALCON patológico • 15/09: ganho de peso de 25 – 30 g/dia, sugando bem o seio • 26/09: alta hospitalar para acompanhamento ambulatorial EXAMES COMPLEMENTARES • Teste do suor (31/08 e 25/09): o RN não apresentou sudorese à estimulação • TIR (tripsina imunorreativa) e Gordura fecal (02/09): negativos Condições de Alta • Bom estado geral, sugando firmemente o seio materno, com ganho ponderal progressivo, diurese satisfatória, evacuações diárias sem anormalidades, icterícia discreta, sono fisiológico. Resumo • RNPT AIG - Polidrâmnio e distensão abdominal intra-útero • Peritonite Meconial → íleo meconial (rolha meconial) • Icterícia Colestática Existe alguma doença de base em que devemos necessariamente pensar ??? Fibrose Cística – Revisão Atualizada Fibrose Cística • Conceito – Doença multissistêmica autossômica recessiva – Mutações no gene CFTR (Cystic Fibrosis Transmembrane Conductance Regulator)→ alterações no transporte transmembrana epitelial de Cl-, Na+ e água • glândulas exócrinas, tratos respiratório, GI e reprodutivo. Fibrose Cística • Fisiopatologia de conhecimento recente: – Avanços biologia molecular, conhecimento transporte iônico, imunologia – Seqüenciamento do gene da Fibrose Cística (FC): 1985 Fibrose Cística • Epidemiologia – A forma mais comum afeta predominantemente caucasianos • Incidência = 1:2.000 ou 3.000 nascimentos • 1 em cada 25 é portador assintomático – Negros = 1:17.000 – Asiáticos = 1: 90.000 Genética – Mutação mais comum (70%): • Deleção de três pares de bases do gene CFTR, o que resulta na perda do aminoácido fenilalanina – CFTR : canal de cloro • as mutações resultam em alteração da seletividade para o íon Cl- : redução da sua excreção, aumento da eletronegatividade celular e do fluxo de Na+ . Fisiopatologia • Conseqüências: Desidratação das secreções mucosas → aumento da viscosidade →obstrução dos ductos →reação inflamatória → fibrose Fisiopatologia Fisiopatologia • Comprometimento mecanismo de defesa pulmonar → infecções repetidas, especialmente por Pseudomonas → ↑IgG específica, deficiente →formação de imunocomplexo → processo inflamatório que leva à fibrose Fisiopatologia – Ductos das glândulas sudoríparas: menor reabsorção de Cl de Na do lúmen, levando a suor com elevadas concentrações de NaCl. – Ductos pancreáticos: acúmulo de muco, com obstrução dos ductos pancreáticos menores, dilatação e atrofia das glândulas exócrinas→ fibrose pancreática progressiva. Fisiopatologia – Ductos biliares e fígado: obstrução dos pequenos ductos biliares (cirrose hepática) – Trato genital masculino: obstrução dos pequenos ductos → atrofia, fibrose ou ausência dos vasos deferentes, cauda e corpo do epidídimo. – Trato Gastrintestinal: secreção de água diminuída em íleo terminal → bolo fecal espesso e endurecido (impactação e obstrução intestinal:íleo meconial no RN). Fisiopatologia – Trato respiratório: • batimento mucociliar reduzido, muco respiratório abundante, desidratado e viscoso, favorecendo a colonização bacteriana. • Pulmões: atividade antimicrobiana do sistema imune inato reduzida (altas concentrações de NaCl) Manifestações Clínicas • Doença multissistêmica • Multiplicidade de manifestações • Início precoce ou na vida adulta • Trato respiratório: causa de morte em 90% dos casos Manifestações Clínicas Manifestações Clínicas • Aparelho respiratório: – Muco viscoso, redução clearance mucociliar – Pulmões normais intra-útero – Dilatações e hipertrofia glândulas submucosas da traquéia: início em pequenas vias aéreas – Colonizações bacterianas: retenção de secreção e metaplasia do epitélio brônquico Aparelho Respiratório • Infecções recorrentes → inflamação persistente: BASE DO PROCESSO FISIOPATOLÓGICO • Bronquiectasias (após 2º ano de vida) • Colapso de vias aéreas: aprisionamento de ar e pneumonia hemorrágica • Hipóxia: shunt pulmonar Aparelho respiratório • “A doença pulmonar evolui em 100% dos fibrocísticos para cor pulmonale” • Características: – Tosse crônica persistente – Bronquiolite, lactente chiador, infecções recorrentes, penumonias recidivantes – Diminuição tolerância ao exercício – Excesso de escarro mucoso e espesso Aparelho Respiratório • Radiografia de tórax: – Hiperinsuflação pulmonar – Colapsos e atelectasias – Tardiamente: abscessos, destruição parenquimatosa – Pneumotórax – Fibrose: lobos superiores e médios Aparelho Digestivo • Insuficiência exócrina do pâncreas: – Diarréia crônica – Fezes volumosas, de cor amarelo-palha – Restos alimentares – Desnutrição Aparelho Digestivo • Íleo Meconial – Apresentação mais precoce – 15 a 20% dos pacientes com FC – Diagnóstico pré-natal : US gestacional – Complicações: atresia jejunal ou ileal, volvo, perfuração com peritonite meconial – Rx: distensão abdominal, sem níveis hidroaéreos e de aparência mosqueada Aparelho Digestivo • Íleo Meconial (IM): – 90% dos pacientes com IM têm Fibrose Cística →tratar todo paciente com íleo meconial como se portador de fibrose cística Icterícia Neonatal Prolongada • Colestase Neonatal é a forma mais rara de apresentação • A FC deve ser considerada em todo RN com icterícia colestática, afastando-se atresia de vias biliares Doença Hepatobiliar • Presente em mais de 50% dos casos • Secreção anormal de íons pelo epitélio das VB → diminuição fluxo biliar → obstrução biliar e reação inflamatória → fibrose biliar Crescimento Deficiente • Desnutrição protéico-energética • Má-absorção intestinal • Lactente com ingesta adequada e ganho ponderal insuficiente Outras Manifestações • • • • • • • Dedos hipocráticos Esterilidade Tosse / sibilância Pneumonias de repetição Suor salgado Cirrose, pancreatite crônica Obstrução Intestinal Diagnóstico • Pelo menos uma característica da doença: – – – – doença sinusal ou pulmonar crônica e/ou insuficiência exócrina pancreática crônica e/ou história familiar de FC (p. ex. em irmão) e/ou teste duplamente positivo de triagem neonatal repetidos. + Diagnóstico • Evidência de elevação anormal da [ ] de cloro no suor, em duas ocasiões diferentes ou • Identificação Genética de duas mutações de FC Teste do Suor • Dosagem quantitativa de cloretos no suor pelo método da iontoforese por pilocarpina • • • • • [ Cl ] > 60 mmol/L. em duas ocasiões diferentes Sensib e espec > 95%, baixo custo Casos duvidosos: dosagem de Na também O teste normal não exclui o diagnóstico Falso positivo: – Insuf. Supra-renal – Displasia ectodérmica – Hipoparatireoidismo Análise das mutações da FC • Teste de DNA • Mais de 700 mutações • Extremamente sensível, mas não específico • Duas mutações conhecidas • Isoladamente, não sela o diagnóstico Outros Testes diagnósticos complementares • Insuficiência pancreática – Teste da secretina pancreosina – Dosagem da gordura fecal – Coeficiente de absorção de gordura – Esteatócrito – Micorscopia Outros testes diagnósticos complementares • Detecção de enzimas nas fezes • • • • Quimiotripsina Elastase Lipase imunorreativa Nitrogênio fecal • Detecção enzimas no sangue • Proteína associada a pancreatite • Triglicérides • Tripsina imunorreativa (TIR) – teste do pezinho Outros testes diagnósticos complementares • Bacteriologia respiratória – Colonização persistente por Pseudomonas aeruginosa do tipo mucóide – Colonização persistente por S. aureus ou Burkholderia cepacea • Avaliação Urogenital – Azoospermia obstrutiva Diagnóstico pré-natal • Biópsia de vilosidade coriônica na 12ª sem gestação: análise genética • Indução de ovulação múltipla, biópsia celular em mórula: seleção de óvulo Diagnósticos Diferenciais Tratamento Tratamento – medidas gerais 1. Suprir gasto calórico elevado, apesar da anorexia (até gastrostomia) 2. Terapia pulmonar vigorosa 3. Reposição de enzimas pancreáticas 4. Reposição de vitaminas lipossolúveis 5. Tratar Diabetes 6. Tratamento doença hepática: ác. ursodeoxicólico Tratamento Pulmonar • Antibioticoterapia: intermitente ou contínua • P. aeruginosa • S. aureus • H. influenzae Amicacina + Cefatzidime + oxacilina IV por 15 dias a cada 4 ou 6 meses • Caracterizar se há colonização aguda ou crônica, se infecção aguda ou crônica Exarcerbação Pulmonar Medicações de Manutenção • • • • • • Corticosteróides orais e inalatórios AINE´s Macrolídeos como aintiinflamatórios Broncodilatadores Mucolíticos Solução salina hipertônica Outras medidas • Fisioterapia • Oxigenioterapia Prognóstico da FC • Herança genética, sexo, idade de início, gravidade das manifestações respiratórias • Sobrevida EUA / Canadá: 27 a 30 anos • Sobrevida na América Latina: 6 anos Consultem também: • Caso Clínico: Fibrose Cística Francisco C J Pereira, Elisa de Carvalho Pediatria • Obrigada!!! Dda Laura