Pílulas Metroviárias I É uma máquina incansável, verdadeira minhoca automática que percorre os subterrâneos daquela cidade fria. Quando chega, emitindo um som que os ouvidos mal conseguem suportar, regurgita de sua barriga um sem número de praticamente todo mundo. Eles saem em bando, desnecessariamente apressados, como se estivessem culpa de ainda não terem chegado a lugar algum. II Lá vêm eles mais uma vez, consigo saber pelo som estridente da máquina que os carrega. Eles ainda saem em bando, apressados, como se juntos soubessem que estão mais seguros. Tática de guerra espartana. Eu os vejo andar, estupefata. Todos passam resolutos, seguindo o mesmo caminho. Vez ou outra, alguns desviam o olhar e o depositam em mim. Naturalmente, nada vêem. Apenas uma sombra difusa e incerta que tentar falar sem ser ouvida. Lá vêm eles mais uma vez... III E quando estas estruturas do metrô se tornarem ruínas e virarem objeto de estudo de ávidos historiadores, cientistas, sociólogos, astrólogos e adivinhos? “Era um local amplamente utilizados para corridas. Veja só a extensão desta pista!”, diria um. “Na verdade”, outro replicaria, “as instalações encerravam uma piscina subterrânea, única alternativa para os banhistas diante da avançada poluição das águas na época.” “Ah, bobagem! É claro que isso era um templo construído em adoração ao deus “A Grande Minhoca Prateada”, Divergencias. Revista de estudios lingüísticos y literarios. Volumen 11, número 1, verano 2013 55 Divergencias. Revista de estudios lingüísticos y literarios. Volumen 11, número 1, verano 2013 e por esses túneis os fieis percorriam para propagar as boas novas”. Esse foi o que chegou mais perto! Estação Largo 13 do Metrô de São Paulo, 7:00 da manhã, Outubro de 2010. Beatriz Brito Carneiro fora”, que conseguimos ver as coisas com uma perspectiva mais objetiva. Pílulas Metroviárias consegue fazer o que todo bom poema faz: mexer com a imaginação dos leitores fazendo com que vejamos o mundo à nossa volta com novos olhos. Michael Child The University of Arizona Beatriz Brito Carneiro Fullbright Scholar Foreign Language Teaching Assistant The University of Arizona Comentário Ao descrever a cidade de São Paulo como “aquela cidade fria”, a autora de “Pílulas Metroviárias”, já na primeira frase do poema, dá aos leitores uma ideia do seu ponto de vista, tanto daquela cidade imensa como do corre-corre infame que acontece todos os dias nas estações do Metrô de São Paulo. O poema, escrito em verso livre, é dividido em três partes distintas. A primeira parte introduz o cenário traçando uma imagem inesquecível do metrô, representandoo como uma minhoca regurgitando seus passageiros. Com esta metáfora, a autora ajuda os leitores a verem claramente que estranhos são, para quem que realmente observa, esses meios de transporte com os quais a gente está tão acostumada. Mas apesar do título, não é o metrô em si, mas sim as pessoas e suas rotinas diárias “naquela cidade fria” que são o foco do poema. A segunda parte do poema ilumina como a autora pensa sobre as multidões intermináveis naquele vasto labirinto subterrâneo. Para ela, essas pessoas apressadas, quase robóticas, sempre seguem o mesmo caminho, literalmente e talvez figurativamente. Seria a primeira vez para a autora estar aí na estação de metrô? Ou talvez fosse a primeira vez que realmente conseguiu ver a verdadeira absurdez do corre-corre diário que muitos aceitam como normal? De qualquer maneira, é óbvio que ela se sentiu como uma sombra, uma estranha, no meio daquele lugar tão conhecido e lotado. Na última parte do poema, a autora se pergunta o que pensarão os historiadores futuros daquele lugar. Ao mencionar as muitas hipóteses erradas que poderão propor, ela implica que muitas vezes nós, na atualidade, não vemos as coisas como realmente são. Por sentir como alguém de fora naquele dia em outubro, ela conseguiu ver a estação com olhos diferentes das outras pessoas. Essa sensação que às vezes a gente sente geralmente em lugares alheios e estranhos onde nos sentimos estranhos à comunidade, nos leva a encarar o mundo à nossa volta de uma forma diferente. É precisamente nesses tempos, quando nos encontramos “do lado de 56 57