São Paulo, 15 de julho de 2015.
Dr. Jorge Venâncio
Coordenador da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa
Conselho Nacional de Saúde
Ministério da Saúde
Ref.: Considerações da SBPPC referente à Minuta de Resolução sobre Acreditação de
Comitês de Ética em Pesquisa
Após a publicação feita pela CONEP em maio de 2015, da Minuta de Resolução para
Acreditação de Comitês de Ética em Pesquisa, a SBPPC teve a oportunidade de participar de
algumas discussões com membros de sua diretoria, associados e em alguns fóruns específicos
onde estiveram presentes profissionais do setor, ONGs e população em geral.
Subsidiados por tais discussões, a SBPPC entendeu que a Minuta deveria passar por um
processo de revisão em sua íntegra, pois traz em sua essência conceitos equivocados.
Como entidade que existe formalmente desde 1999 congregando profissionais que atuam com
a condução de pesquisa desde antes da criação da CONEP, a SBPPC está certa de que as
ponderações feitas a seguir, devem ser consideradas pela CONEP/CNS que parece se distanciar
cada vez mais dos anseios da população brasileira.
Algumas considerações sobre a Minuta:
1. O texto apresentado possui um erro conceitual sobre o termo “acreditação” que
utilizado em conjunto com o termo “certificação” gera um cenário pouco claro sobre o
real objetivo da Resolução proposta;
2. A minuta parece ter como foco central, não a acreditação no sentido literal, mas sim, a
redefinição de fluxos que permitam que os CEPs avaliem de forma independente os
projetos das áreas temáticas especiais. Vale lembrar que em 1997 quando foi
publicada a Resolução 251 tivemos a liberação de uma das então oito áreas temáticas
especiais para análise exclusiva dos Comitês. O que se viu a partir daquele momento
foi um conjunto de tentativas frustradas de se regular da mesma forma as demais
áreas temáticas. A regulamentação da Resolução 292/99 no ano de 2002, revogada em
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2005 pela Resolução 346, é um exemplo importante do quanto a CONEP parece ter se
perdido nas suas próprias regras. Isso tudo é dito, para mostrar as razões que levam a
SBPPC a entender que a Minuta sobre acreditação pode ser mais um equivoco que não
levará o Sistema CEP/CONEP a atingir seu objetivo, quer seja a real descentralização na
análise dos projetos;
3. A Minuta parece rever o processo de registro dos CEPs já que boa parte dos requisitos
para o que se chamou de “Certificação” já estão previstos pelas normas vigentes;
4. Depois de 19 anos desde a criação do Sistema CEP/CONEP, não é razoável que os CEPs
tenham que passar por um período de pré-acreditação de um ano e na sequencia por
mais um ano (acreditação) tutelados pela CONEP, para somente depois disso e de
acordo com uma nova Resolução que ainda será elaborada, terem condições de avaliar
os projetos de risco elevado;
5. Preparar uma Minuta que se baseia em gradação de risco sem que essa gradação
tenha ainda sido estabelecida é outro ponto que merece reavaliação;
6. Entender que todos os projetos enquadrados nas atuais áreas temáticas especiais
possuem risco elevado, não possui qualquer respaldo científico;
7. Estabelecer que para solicitar a acreditação uma chamada pública terá que ser
realizada e nela regras específicas e definidas pela CONEP serão publicadas, nos
remete aos seguintes questionamentos:
a. A CONEP está preparada para atender as demandas dos CEPs que se sentirem
aptos ao processo de certificação?
b. A CONEP fará chamadas dirigidas? Baseadas em quais critérios?
c. Será definido nas chamadas públicas um número máximo de CEPs por
chamada? Em havendo mais CEPs que se candidatem para uma mesma
chamada como e quem fará o processo de seleção? Esses critérios de
desempate serão definidos no momento em que a chamada pública for
liberada?
d. Considerando-se que a CONEP possui entre seus membros relatores,
profissionais de instituições que competem por publicações científicas, quais
serão as ações preventivas para que conflitos de interesses sejam evitados
durante o processo de seleção dos CEPs?
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8. A Minuta propõe que os protocolos de risco elevado sejam avaliados de forma
simultânea pelo CEP em processo de acreditação e pela CONEP. O parecer emitido
pela CONEP será encaminhado ao pesquisador e o parecer do CEP servirá como base
para que a CONEP faça uma comparação entre os pareceres. Essa comparação serviria
para a CONEP avaliar se o CEP é capaz de emitir um parecer semelhante ao seu.
Baseado no exposto, pergunta-se:
a. O que fez a CONEP com todos os pareceres enviados pelos CEPs nos últimos 19
anos?
b. Dezenove anos não teria sido suficiente para analisar esses pareceres e fazer
uma comparação entre eles como sugere a Minuta? Quais foram os resultados
dessas análises nos últimos anos? Eles não serviram de base para o processo
de renovação de registro?
c. Padronizar pareceres de um CEP com aqueles emitidos pela CONEP seria algo
factível? Aspectos relacionados com a ética devem ser sempre analisados sob
um único ponto de vista?
9. A CONEP, em suas apresentações públicas, mostra dados sobre o pequeno número de
projetos por ela analisados, uma vez que, segundo a própria CONEP, a maioria das
pesquisas envolvendo seres humanos é avaliada exclusivamente pelos CEPs. Baseados
nessa situação, pergunta-se:
a. Por que a CONEP possui uma equipe com mais de quinze assessores técnicos
contratos com recursos federais para fazer as notas técnicas dos projetos?
b. Os membros relatores da CONEP, seguindo o preconizado para os CEPs não
possuem condições de elaborar um parecer consubstanciado?
c. Qual a opção dada pela CONEP para que as instituições públicas consigam
orçamento para contratar assessores técnicos?
d. Cabe ressaltar que a SBPPC sempre foi favorável ao processo de
profissionalização do Sistema CEP/CONEP, razão pela qual durante muitos
anos, defendeu a necessidade de que todos os CEPs e a própria CONEP
contratassem assessores capacitados para a elaboração de notas técnicas que
subsidiasse os pareceres dos relatores. A CONEP finalmente entendeu que
essa seria uma medida necessária e contratou tais assessores. Os CEPs em sua
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grande maioria, não possuem recursos para contratar esses assessores, dessa
forma, qual será a fonte de recurso para o financiamento dos Comitês? Os
Comitês poderão contratar esses assessores e solicitar que o governo federal
assuma esses custos da mesma forma como ocorre com a CONEP?
10. Mais um ponto que merece destaque, é o conjunto de declarações que devem ser
elaboradas pelo Coordenador do CEP e pelo responsável da instituição, no momento
em que se solicita a acreditação. Importante lembrar que todas essas declarações são
enviadas quando do processo de registro ou de renovação do registro de um CEP. Por
que então pedir todos esses documentos novamente? Onde estão os documentos já
enviados? Supondo que esses documentos não tenham sido enviados, porque o CEP
teria sua renovação efetivada?
11. Reiteramos que o texto da Minuta tem falhas importantes na sua concepção, razão
pela qual, embora favoráveis a autonomia dos CEPs para analisar qualquer tipo de
projeto envolvendo seres humanos, somos contrários a Minuta proposta, por
entender que a mesma não contempla as necessidades do sistema CEP/CONEP após
19 anos desde a sua concepção.
12. A SBPPC entende que um sistema que pretende garantir a segurança e os direitos dos
que participam de uma pesquisa, deve zelar por processos que contemplem a
transparência e a participação ativa da sociedade.
13. Considerando-se
que
a
CONEP/CNS/MS
tenha
como
objetivo
central
a
descentralização do Sistema, alicerçada em Comitês capacitados e conscientes de suas
responsabilidades, várias poderiam ser as ações para se atingir tal objetivo. Após 19
anos de experiência da CONEP, um Comitê de Ética deveria pedir seu registro de
acordo com as atuais normas e durante seus três anos iniciais, ser monitorado pela
CONEP que teria como principal função orientar e capacitar de forma continuada seus
relatores e secretaria. Durante esse período, projetos com risco elevado seriam
avaliados em um primeiro momento pela CONEP e na sequencia pelo CEP que teria um
“modelo” de parecer para orientação e ampliar seus conhecimentos. Na medida em
que relatórios fossem enviados para a CONEP, essa reforçaria ou não seus
treinamentos e mecanismos para controle desse CEP. Passados três anos, em uma
nova renovação, esse Comitê passaria a avaliar qualquer tipo de projeto envolvendo
seres humanos de forma independente, salvo quando considerasse uma situação
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extraordinária, momento em que a CONEP seria acionada. A CONEP poderia solicitar a
qualquer tempo que qualquer CEP após três anos desde sua criação enviasse um
projeto de risco elevado para análise simultânea da CONEP, além de desenvolver um
programa de monitoramento continuado o que permitiria o descredenciamento de um
Comitê que não fosse aderente aos requisitos previamente estabelecidos pelo
Sistema. Após a criação desse modelo de trabalho, desenvolver mecanismos para a
acreditação seria inevitável.
14. Lembramos que um processo de acreditação prevê independência dos profissionais
responsáveis por esse processo, foco em educação e liberdade para que todos os
interessados solicitem a acreditação.
Esperamos que a CONEP reavalie a forma como vem conduzindo seus trabalhos nos últimos
anos e através de uma análise crítica sobre suas ações, admita suas falhas e pactue com a
sociedade opções para melhoria.
A SBPPC entende que a CONEP trabalha hoje de forma isolado ou pior, somente com os que
pactuam de forma incondicional com seus princípios. Isso certamente não representa um
processo ético e democrático. Ações equivocadas da CONEP/CNS/MS tomadas ao longo dos
últimos 19 anos, fez com que iniciativas, muitas delas radicais, fossem sendo articuladas e
agora nos vemos em uma encruzilhada. Mais uma vez, a SBPPC insiste que ainda podemos
reverter esse quadro, se pelo menos uma vez o Conselho Nacional de Saúde discutir o Sistema
CEP/CONEP de forma transparente e apolítica, adotando medidas baseadas em fatos e não
convicções.
A SBPPC é favorável a proteção dos que participam de pesquisa; ao gerenciamento de risco
permanente nos estudos; a geração de dados corretos, completos e rastreáveis; a
possibilidade de que todos os brasileiros tenham acesso as pesquisas que estão sendo
conduzidas no país. A SBPPC é favorável a existência de um sistema que se mostre de fato
ético.
Diretoria SBPPC
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São Paulo, 15 de julho de 2015. Dr. Jorge Venâncio Coordenador