Castas do Douro Caracterização Enológica de Castas Tintas Joaquim Guerra Eduardo Abade DRAPN Novembro 2008 Castas do Douro ÍNDICE 1. INTRODUÇÃO ............................................................................................................ 3 2. MATERIAL E MÉTODOS .......................................................................................... 4 3. INTERPRETAÇÃO DE RESULTADOS .................................................................... 4 3.1 ANÁLISE FÍSICO-QUÍMICA DOS MOSTOS .................................................... 5 3.1.1. Precocidade ........................................................................................................ 5 3.1.2. Valores de Álcool vs Acidez Total ...................................................................... 5 3.2 ANÁLISE FÍSICO-QUÍMICA – VINHOS ........................................................... 6 3.2.1. Análise em Componentes Principais (ACP) ....................................................... 6 3.2.2. Análise Parâmetros individuais.......................................................................... 8 3.3 ANÁLISE SENSORIAL – VINHOS ..................................................................... 9 4. CONCLUSÕES .......................................................................................................... 11 ABREVIATURAS Castas ABOU CRNF FRCIS MPRT RUFT TBARC TFEM TFRAN TNAC Alicante Bouschet Cornifesto Tinta Francisca Malvasia Preta Rufete Tinta da Barca Touriga Fêmea Touriga Franca Touriga Nacional Outros ACP CEVD IPT RDD Análise em Componentes Principais Centro de Estudos Vitivinícolas do Douro Índice de Polifenóis Totais Região Demarcada do Douro Colaboração Queremos destacar, de entre outras, a contribuição do colega Engº Luís Sampaio Arnaldo na Análise Sensorial dos vinhos provenientes das castas em estudo. Centro de Estudos Vitivinícolas do Douro Página 2 Castas do Douro 1. INTRODUÇÃO Desde há alguns anos que nas novas plantações de vinha na Região Demarcada do Douro (RDD) se assiste, inevitavelmente, à utilização de 5 a 6 castas tintas (Touriga Nacional, Touriga Franca, Tinta Roriz, Tinto Cão, Tinta Barroca e Tinta Amarela). Sendo riquíssimo o património genético da RDD (mais de 100 castas) e apesar da qualidade associada às castas acima referidas, entendemos ser importante vir a diversificar os encepamentos, continuando, como não podia deixar de ser, a ter a Qualidade sempre como factor decisivo. O Centro de Estudos Vitivinícolas do Douro (CEVD) tem levado a efeito em diversos Campos Experimentais da Região de Trás-os-Montes, nomeadamente na sua unidade experimental da Quinta de Santa Bárbara (Pinhão), a realização de alguns estudos conducentes à determinação do valor enológico de diversas castas autóctones brancas e tintas. Considerando necessário incrementar e diversificar a utilização de outras castas, sempre com o objectivo último da Qualidade, apresentamos neste trabalho, mais um contributo para o conhecimento efectivo das potencialidades de algumas das castas já conhecidas e de outras, que embora menos conhecidas, nos parecem interessantes do ponto de vista enológico. Centro de Estudos Vitivinícolas do Douro Página 3 Castas do Douro 2. MATERIAL E MÉTODOS Os dados que seguidamente se apresentam, respeitam à Análise Físico-Química de mostos e vinhos e à Análise Sensorial de vinhos obtidos pelo processo de microvinificação nos últimos 9 anos (1998/2006). As microvinificações foram realizadas na Adega Experimental do CEVD. As castas Touriga Nacional e Touriga Franca são reconhecidas como de grande potencial qualitativo e surgem neste trabalho, como indicadoras desse potencial, servindo de termo de comparação com as restantes castas em estudo. As castas tintas objecto deste presente trabalho são: CASTAS TINTAS Alicante Bouschet Cornifesto Malvasia Preta Rufete Tinta da Barca Touriga Fêmea Touriga Franca Tinta Francisca Touriga Nacional A realização das análises no Laboratório do CEVD, obedeceu aos métodos oficiais de análise estabelecidos. A Análise Sensorial foi efectuada com recurso ao preenchimento de uma ficha de prova elaborada pelo CEVD e normalmente utilizada na caracterização de vinhos resultantes de ensaios. Para a análise estatística foram utilizadas as médias dos resultados obtidos durante os anos em estudo. Recorremos ao programa SPSS versão 10.0.1, a partir do qual foi possível realizar a Análise Estatística clássica e a Análise em Componentes Principais (ACP). 3. INTERPRETAÇÃO DE RESULTADOS Os resultados serão apresentados em três pontos diferentes, de forma a permitir uma mais fácil interpretação dos dados referentes às castas em estudo. Serão então apresentados e interpretados separadamente os seguintes pontos: - análise físico-química dos mostos; - análise físico-química dos vinhos e; - análise sensorial dos vinhos. Centro de Estudos Vitivinícolas do Douro Página 4 Castas do Douro 3.1 ANÁLISE FÍSICO-QUÍMICA DOS MOSTOS 3.1.1. Precocidade A análise do Gráfico 1, permite-nos ter a percepção relativamente à precocidade das diferentes castas vs álcool provável e mostra a formação de dois grandes grupos: - um grupo com as castas TFEM, TNAC, RUFT e FRCIS, com valores relativamente elevados de álcool e maior precocidade comparativamente a; - um segundo grupo onde aparecem as castas TBARC, CRNF e MPRT, com valores relativamente mais baixos em álcool e maturação mais tardia; Precocidade tbarca malvpre cornife 23.07.07 datacolh 20.07.07 - surge ainda a TFRAN com valores relativamente altos em álcool, mas de precocidade média e a casta ABOU com valores de álcool e precocidade médios; franca 16.07.07 abousch francis rufete 13.07.07 tnacion 09.07.07 11,50 12,00 12,50 tfemea 13,00 alcprov Gráfico 1 3.1.2. Valores de Álcool vs Acidez Total Com base na análise do Gráfico 2 poderão observar-se os valores médios da acidez total e do álcool provável para as castas em estudo. Centro de Estudos Vitivinícolas do Douro Página 5 Castas do Douro Gráfico 2 Vinhos Tintos - Mostos 5,7 malvpre 5,6 5,5 5,4 tnacion cornife 5,3 abousch 5,2 francis rufete 5,1 5,0 ATOTM 4,9 4,8 tfemea tbarca 4,7 franca 4,6 11,0 11,5 12,0 12,5 13,0 ALCPROV Da sua observação destacamos: - a TBARC com os menores valores de álcool e acidez; - a FRCIS, RUFT e TNAC com os maiores valores de álcool e acidez, o que se traduz pela melhor equilíbrio entre estes dois parâmetros; - o grupo das castas TFRAN e TFEM que apresentam bons valores de álcool, mas a relativamente baixa acidez, o que poderá indiciar, nalguns casos, uma necessidade de correcção ácida dos mostos; - as castas ABOU, CRNF e MPRT aparecem no quadrante dos mostos com menor álcool provável e maior acidez; 3.2 ANÁLISE FÍSICO-QUÍMICA – VINHOS 3.2.1. Análise em Componentes Principais (ACP) Com base na ACP onde se utilizaram 8 parâmetros enológicos e de acordo com a “matrix de correlações”, foi possível chegar ao Quadro II que mostra a variância total para os “diferentes eixos”. Podemos observar nesta ACP, que em dois eixos estão “explicados” 79.3% do total e em 3 eixos 92.3%, mostrando assim haver uma boa informação desta análise. Centro de Estudos Vitivinícolas do Douro Página 6 Castas do Douro Total Vari ance Explained Component 1 2 3 4 5 6 7 8 Total 4,640 1,705 1,037 ,348 ,208 4,955E-02 1,110E-02 3,129E-03 Initial Eigenv alues % of Variance Cumulativ e % 57,995 57,995 21,311 79,306 12,958 92,263 4,345 96,608 2,594 99,203 ,619 99,822 ,139 99,961 3,912E-02 100,000 Extract ion Sums of Squared Loadings Total % of Variance Cumulativ e % 4,640 57,995 57,995 1,705 21,311 79,306 1,037 12,958 92,263 Extract ion Method: Principal Component Analy sis. Com base na ACP e analisando a matrix de correlações, foi possível construir os Gráficos 3 e 4, que descrevem o seguinte: Gráfico 3 Gráfico 4 Component Plot Vinhos Tintos 1,0 2,0 mvol abousch ,5 atot Component 2 0,0 -,5 ton -1,0 -1,0 -,5 REGR factor score 2 for analysis 1 1,5 1,0 icor do280 antoc malvpre cornife ,5 tnacion 0,0 ph franca rufete tbarca -,5 alc -1,0 francis -1,5 tfemea -2,0 0,0 Component 1 ,5 1,0 -2,0 -1,5 -1,0 -,5 0,0 REGR factor score 1 for analysis ,5 1,0 1,5 2,0 1 O Gráfico 3, mostra a distribuição dos vários parâmetros enológicos em diferentes quadrantes, onde destacamos: - quadrante I refere-se aos valores de Cor, Polifenóis Totais e Antocianas; - quadrante II refere-se à Massa Volúmica e Acidez Total Assim e por observação do Gráfico 4 (da direita), podemos constatar o seguinte: - no quadrante I, as castas TNAC, TFRAN e ABOU formam um grupo, que apresenta simultaneamente teores elevados de intensidade de cor, antocianas e índice polifenóis totais (IPT); - no quadrante II as castas RUFT, MPRT e CRNF são as que apresentam simultaneamente maiores valores de Acidez Total e Massa Volúmica; Centro de Estudos Vitivinícolas do Douro Página 7 Castas do Douro 3.2.2. Análise Parâmetros individuais De forma a consolidar a análise acima referida e melhor visualizar as diferenças entre as diversas castas em estudo, vamos de seguida apresentar alguns gráficos com análise comparativa de diferentes parâmetros enológicos. O Gráfico 5 mostra o valor de IPT, onde é possível constatar os maiores valores para as castas TFRAN, TNAC e ABOU, contrariamente à MPRT que apresenta os menores valores. Vinho - Polifenóis (DO280) 80 70 60 Value DO280 50 40 30 abousch malvpre cornife tfemea tbarca francis franca tnacion Gráfico 5 CASTAS O Gráfico 6 por sua vez, mostra a distribuição das castas de acordo com os seus valores de Intensidade de Cor e Antocianas. Poderá facilmente verificar-se que existe uma boa correlação entre estes dois parâmetros, podendo facilmente distinguir-se dois grupos, sobressaindo num deles a TFRAN e a TNAC que apresentam simultaneamente os maiores valores de Intensidade de cor e Antocianas. Vinhos - Cor vs Antocianas 20 18 franca tnacion abousch 16 14 12 tfemea cornife ICOR 10 francis tbarca 8 malvpre 6 300 400 500 600 700 800 ANTOC Centro de Estudos Vitivinícolas do Douro Página 8 Castas do Douro Por fim, sendo o Extracto Seco um parâmetro igualmente com reflexos na qualidade final dos vinhos, nomeadamente na análise sensorial, apresentamos no Gráfico 7 uma panorâmica relativamente às castas presentemente em estudo. vinhos- Ext. Seco 34 Gráfico 7 32 Value ESECO 30 28 26 abousch malvpre cornife tfemea tbarca francis franca tnacion CASTAS Voltam a destacar-se a TFRAN, TNAC e MPRT com os maiores valores (acima de 30 g/l) e, no lado oposto, a TBARC com o menor valor (26.9 g/l), valor este, no entanto, mesmo assim acima dos valores normais para os vinhos correntes tintos do Douro. 3.3 ANÁLISE SENSORIAL – VINHOS Para além das características físico-químicas dos vinhos, é por todos reconhecida a importância da Análise Sensorial, imprescindível na apreciação da qualidade final dos vinhos. Os parâmetros de Prova utilizados no tratamento estatístico, foram os seguintes: intensidade de cor, qualidade de aroma, acidez, corpo, adstringência e nota final. - A análise do Gráfico 8 evidencia tudo o acima exposto relativamente à cor dos vinhos. É notória a maior intensidade de cor evidenciada à Prova nas castas TFRAN, TNAC e ABOU e no lado oposto a MPRT com menor intensidade de cor. Centro de Estudos Vitivinícolas do Douro Página 9 Castas do Douro Prova - Cor Prova - Qualidade Aroma 4,6 4,0 4,4 3,8 4,2 3,6 4,0 3,8 Value PQAROM 3,4 Value PCOR 3,6 3,4 3,2 3,0 abousch malvpre cornife tfemea 3,2 3,0 2,8 francis tbarca franca abousch tnacion malvpre tfemea cornife CASTAS tbarca francis franca tnacion CASTAS Gráfico 8 Gráfico 9 - No que se refere à Qualidade de Aroma (Gráfico 9) sobressaem de novo as três castas acima referidas (TFRAN, TNAC e ABOU); - das castas em estudo, as que apresentam menores valores no parâmetro “Qualidade de Aroma” são MPRT e o CRNF; Prova - Adstringência Prova - Corpo 3,4 4,0 3,2 3,8 3,0 3,6 2,8 3,4 2,6 Value PADST Value PCORPO 3,2 3,0 2,8 2,6 abousch malvpre cornife tfemea tbarca 2,2 2,0 abousch francis franca 2,4 malvpre cornife tnacion tfemea tbarca francis franca tnacion CASTAS CASTAS Gráfico 10 Gráfico 11 Nos Gráficos 10 e 11, respectivamente para o “Corpo” e a “Adstringência” que os vinhos revelaram à Prova, voltamos a observar que: - no que se refere ao “Corpo” continuam a destacar-se a TFRAN e a TNAC, apresentando-se o ABOU, TFEM, TBARC e FRCIS com valores intermédios; - quanto à “Adstringência” diferenciam-se o CNRF e a MPRT por apresentarem os menores valores; Centro de Estudos Vitivinícolas do Douro Página 10 Castas do Douro Por fim, apresentamos no Gráfico 12 a Nota Final atribuída aos diferentes vinhos. Prova - Nota Final 15 Gráfico 12 14 Value NFINAL 13 12 11 abousch malvpre cornife tfemea tbarca francis franca tnacion CASTAS Poderão aqui considerar-se três distintos grupos: - um para a TFRAN e TNAC com os valores mais altos na “Nota Final” (acima de 13,5); - o grupo das castas TFEM, TBARC, FRCIS e ABOU com valores intermédios; - e o grupo do CRNF e MPRT com os menores valores na Nota Final 4. CONCLUSÕES Tendo em conta as condições experimentais do presente estudo, onde se incluem entre outras, as características edafo-climáticas específicas do Campo Ampelográfico da Quinta de Santa Bárbara – Pinhão, importa realçar alguns aspectos que consideramos mais relevantes, de entre as castas agora em estudo: Maturação - as castas Touriga Fêmea, Touriga Nacional, Rufete e Tinta Francisca apresentam os valores mais altos de álcool provável a par da sua relativa precocidade; - as castas Tinta da Barca, Malvasia Preta e Cornifesto são as castas que se mostram no presente estudo como as mais tardias; - a Malvasia Preta e a Tinta da Barca apresentam, comparativamente, os valores mais baixos de álcool provável; - a casta Alicante Bouschet com valores médios de álcool e maturação intermédia; Centro de Estudos Vitivinícolas do Douro Página 11 Castas do Douro Acidez Total e Álcool - Vinhos - as castas Tinta da Barca, Touriga Franca e Touriga Fêmea apresentam os valores mais baixos na acidez total, contrariamente à Malvasia Preta que apresenta o valor mais alto de acidez; - os valores mais baixos de álcool são das castas Malvasia Preta e Tinta da Barca; - as castas Touriga Nacional, Tinta Francisca e Rufete surgem com valores mais equilibrados em ácidos vs álcool; Cor e polifenóis totais - as castas Touriga Franca, Touriga Nacional e Alicante Bouschet apresentam os maiores valores de polifenóis, a par do maior índice de cor; - contrariamente, a Malvasia Preta e o Cornifesto apresentam teores de polifenóis relativamente inferiores; Extracto Seco - os vinhos que apresentam maior extracto seco são os das castas Touriga Franca, Touriga Nacional e Malvasia Preta; Análise Sensorial - no que respeita à Cor e Qualidade de Aroma, as castas Touriga Franca, Touriga Nacional e Alicante Bouschet apresentam-se como as mais ricas nestes parâmetros; a Malvasia Preta e o Cornifesto têm normalmente os menores valores; - são ainda as castas Touriga Franca, Touriga Nacional e Alicante Bouschet que revelam à prova maiores valores no Corpo e na Adstringência; - em termos globais (Nota Final), podemos distinguir 3 níveis: - Touriga Franca e Touriga Nacional com os valores mais altos (acima de 13,5); - as castas Touriga Fêmea, Tinta da Barca, Tinta Francisca e Alicante Bouschet com valores intermédios; - e o Cornifesto e Malvasia Preta com os menores valores de Nota Final Uma boa classificação na Análise Sensorial, associada a teores elevados em cor, polifenóis totais e ainda a valores de álcool e extracto igualmente elevados, são factores essenciais a um bom potencial de envelhecimento dos vinhos, sendo disso bons exemplos, os vinhos provenientes das castas Touriga Nacional e Touriga Franca. Todavia, os valores apresentados para as restantes castas do presente estudo, indicam estarmos perante vinhos com bons parâmetros de qualidade, embora a Malvasia Preta e o Cornifesto se encontrem a alguma distância das restantes. Como é evidente estes resultados devem continuar a incentivar-nos e a merecer a nossa atenção. Naturalmente o Produtor, que poderá vir a utilizar estas e outras castas nas novas plantações, deverá também ter em consideração as condições edafo-climáticas presentes em cada local, condições essas que condicionam fortemente a escolha final do encepamento. Centro de Estudos Vitivinícolas do Douro Página 12