Abscesso cerebral Diagnóstico e tratamento Apresentadora: Aissa Rodriguez Saroza R2 de Pediatria Hospital Materno Infantil de Brasília/SES/DF www.paulomargotto.com.br Brasília, 21 de junho de 2013 • Abscesso cerebral: É uma coleção focal no parênquima cerebral como complicação de diversas infecções, trauma ou cirurgia. • Patogenia: As bactérias invadem o cérebro por duas vias principais: • • Contiguidade: Responde por 20-60% dos casos. • Hematogênica: Usualmente resulta em lesões múltiplas. Contiguidade: -A disseminação direta do microrganismo desde o sitio primário de infecção causa usualmente um único abscesso cerebral. A infecção primaria pode ser para o parênquima ou incluso para o córtex cerebral. -Sítios primários de infecção por contiguidade incluem: 1 Otite media subaguda ou crônica e Mastoidite: Disseminam ao Lobo Temporal inferior e ao Cerebelo. 2 Sinusite frontal ou Etmoidal: Disseminam ao Lobo Frontal. 3 Infecções dentarias: Disseminam ao Lobo Frontal Abscesso cerebral como complicação de infecções de ouvido hão diminuído a sua incidência, especialmente em países desenvolvidos(Otolaryngol Head Neck Surg. 1995;113(1):15). Em contraste tem havido um aumento da sua incidência a partir de infecção dos seios paranasais tanto em crianças como em adultos(Am J Rhinol. 1998;12(3):173) 4 Traumas: Ferimento por armas de fogo podem resultar em material necrótico e fragmentos de metal que servem como nicho para infecção. Outros corpos estranhos que tem sido associados com abscessos cerebrais incluem: ponta do lápis e dardos, em estes casos o abscesso cerebral pode aparecer vários anos depois do trauma. Ocasionalmente pode ser causado também por trauma facial. 5 Cirurgias: Abscessos cerebrais podem também ser uma complicação de procedimentos neurocirúrgicos, e nestes casos o desenvolvimento da coleção pode ser lenta. Há 2 reportes de casos de abscesso cerebral após cirurgia para retirada de Neuroma do acústico, um dos pacientes desenvolveu achados neurológicos sutis três meses após a cirurgia, o segundo paciente apresentou convulsões 15 meses após a cirurgia, que já tinha sido complicada por uma meningite por Pseudomona aeruginosa Hematogênica: -O Abscesso cerebral associado à bacteremia usualmente resulta em múltiplas lesões e estão localizados frequentemente no território irrigado pela Artéria cerebral media. Estes abscessos geralmente formam-se na junção entre a substancia branca e a cinzenta, que é lugar que mais frequentemente acontecem micro infartos que danificam a barreira hematoencefálica. -Condições associadas a disseminação hematogênica: --Infecção crônica pulmonar: Abscesso pulmonar, empiema, bronquiectasia, fibrose cística. -Infecções de pele, pélvicas e intrabdominais. -Dilatações esofágicas e escleroses de varizes esofágicas feitas por endoscopia -Endocardite bacteriana (2-4%dos casos) -Cardiopatias congênitas cianóticas -Má formação arteriovenosa pulmonar com shunt direita-esquerda(10% dos casos) -Em 20-40% dos casos de Abscesso cerebral com disseminação hematogênica não é identificado o foco primário de infecção. (Brain abscesses: review of 30 cases treated with surgery. Aust N Z J Surg. 1995;65(9):664) • Localizações habituais em ordem de frequência: 1. Lobo frontal ou temporal 2. Fronto-parietal 3. Lobo parietal 4. Cerebelar 5. Lobo occipital Patologia O entendimento da patologia do Abscesso cerebral é importante para interpretar os achados de imagem na CT e MRI, já que as mudanças histopatológicas no tecido doente vão corresponder com o tempo de infecção. A lesão inicial( 1º a 2º semanas) está associada a um edema localizado, que é pobremente demarcada na TC. Há evidência de edema agudo mas não de necrose tecidual. Este estágio inicial é conhecido como Cerebrite. Depois de duas a três semanas acontece a necrose e liquefação do tecido envolto por uma cápsula fibrótica. Microbiologia Há uma grande variedade de microrganismos associados ao abscesso cerebral, dependendo do sitio primário de infecção, idade e o estado imunológico de paciente. Pacientes imunocomprometidos tem uma ampla lista de microrganismos incluindo fungos envolvidos na patogênese. Bactérias são mais frequentes em pacientes imunocompetentes. -Sitio primário & Microrganismos mais frequentes: Seios paranasais: Streptococcus ssp( S. Milleri), Haemophilus ssp, Bacteroides ssp, Fusobacterium ssp. Infecções dentarias: Streptococcus ssp, Bacteroides ssp, Prevotella ssp, Fusobacterium ssp, Haemophilus ssp. Ouvido: Enterobacteriaceae, Pseudomonas aeruginosa, Bacteroides spp Pulmões: Streptococcus spp, Fusobacterium spp, Actinomyces spp Trato urinário: Pseudomonas aeruginosa, Enterobacter spp Trauma penetrante: Staphylococcus aureus, Enterobacter spp, Clostridium spp Neurocirurgias: Staphylococcus spp, Streptococcus spp, Pseudomonas aeruginosa, Enterobacter spp Endocardite: Streptococcus Viridans, S. aureus Cardiopatias congênitas (especialmente com shunt direitaesquerda) – Streptococcus spp Patógenos anaeróbios • Frequentemente presentes em Abscessos cerebrais. • Estão presentes na flora normal da boca e geralmente estão presentes em lesões únicas, relacionadas a infecções otorrinolaríngeas. • Podem estar relacionados a sítios de infecção primaria de origem pélvica ou intra-abdominal (flora colônica e do trato genital feminino). • Os microrganismos mais frequentemente isolados de Abscessos cerebrais são: Anaerobic streptococci, Bacteroides spp. (incluindo B. fragilis), Prevotella melaninogenica, Propionibacterium, Fusobacterium, Eubacterium, Veillonella e Actinomyces Patógenos aeróbicos: • Cocos gram-positivos aeróbicos são também frequentemente encontrados : Streptococcus viridans, Streptococcus milleri, microaerophilic streptococci, Streptococcus pneumoniae (RARAMENTE), e Staphylococcus aureus. S. aureus em abscessos relacionados a trauma e procedimentos neurocirúrgicos. • EEUU: Casos de cMRASA em abscessos cerebrais relacionados a trauma tem sido descritos. • Streptococcus milleri (=S. anginosus) é isolado frequentemente, contem enzimas proteolíticas que predispoem a necrose e formação de absecssos. • Rhodococcus equi: Pacientes imunocomprometidos. • Klebsiella pneumoniae é o gram-negativo mais frequentemente isolado, seguido por Pseudomona ssp, E. coli, Proteus ssp. • Klebsiella pode associar-se a abscesso cerebral com ou sem meningite, e incluso ser uma infecção metastática de abscesso hepático primário adquirido na comunidade. Imunocomprometidos: • Principalmente patógenos oportunistas. • HIV: Toxoplasma gondii (Imunidade celular está comprometida) • Listeria: Pacientes que recebem corticoides(alta mortalidade) • Nocardia asteroide (solo) via respiratória-sangue • Aspergillus, Cryptococcus neoformans, and Coccidioides immitis (via respiratória-sangue-córtex) • Candida ssp, Cladosporidium, Curvalaria spp. dentre outros • Infecção fúngica geralmente se associa a abscessos múltiplos e tem um prognóstico ruim. • Outros microorganismos: • Cysticercose(Taenia solium) • Entamoeba Histolytica • Schistosoma japonicum • Paraginimus ssp. Manifestações clínicas - Não específicas= Atraso no diagnóstico. Estudos mostram que a maioria dos diagnósticos só se fazem aos 13-14 dias do inicio dos sintomas(Brain abscess. A study of 45 consecutive cases, Medicine (Baltimore). 1996;65(6):415.) - Cefaleia: Sintomas mais comum(adultos), geralmente na topografia do abscesso, podendo ser insidiosa. - Rigidez de nuca(15%) principalmente na localização occipital ou em abscessos que drenaram no ventrículo lateral. - Alteração de consciência(letargia-coma) geralmente associado a edema cerebral. - Vômitos( Aumento da PIC) Ao exame físico • Febre (40-50%) • Déficit neurológico focal (50%) • Convulsões (25%). Pode ser a primeira manifestação do Abscesso cerebral. Tipo tônico-clônico generalizada é mais frequente em abscessos de Lobo frontal. • Alterações no III e IV par cranial(aumento da PIC) • Papiledema(tardia-aumento da PIC) 25% • Hemiparesia facial . Diagnóstico: • Clínica+Estudo de imagens • Punção lombar: Contraindicada quando há manifestações de Hipertensão intracraniana(Papiledema, cefaleia unilateral, hemiparesia) 30%=Herniação cerebral. • Suspeitamos de meningite associada: PL(se não há sintomas de HIC) e Hemocultura(positiva apenas em 15% dos casos). • CT: Menos sensível para o diagnóstico que a MRI, deve ser realizada com contraste. • Achados da CT de acordo com tempo de evolução: Cerebrite(1º a 2º semanas): Área irregular hipodensa(escura), que não acentua depois de injetar contraste. Após a segunda semana: Área maior de hipodensidade antes do contraste, após o contraste vemos um anel hiperdenso(claro) perilesional que representa a capsula inflamatória Tardio: Área hiperdensa que representa uma lesão matura e encapsulada(antes do contraste), anel hipodenso que representa diminuição da vascularização na cápsula após a injeção de contraste. Cerebrite. TC sem contraste TC com contraste MRI & TC • MRI é mais sensível para o diagnóstico nos estágios iniciais. • É mais sensível para detectar lesões satélites. • Melhor estimativa da extensão da necrose, edema cerebral perilesional e o tamanho da capsula. • Visualiza melhor o tronco cerebral • Diagnóstico etiológico definitivo: Cultura do material obtido por aspiração guiada por CT estereotáxica. Tratamento • Penicilina G: Cobre a maioria dos germes da flora bucal, incluso Streptococcus aeróbios e anaeróbios, mas a emergência de bactérias produtoras de betalactamase limitam seu uso. • Metronidazol: Penetra rapidamente dentro do abscesso cerebral, é um excelente anaerobicida, muitos autores recomendam associa-lo. • Ceftriaxona: Cobre a maioria dos germes aeróbicos e as enterobactérias. • Oxacilina ou Vancomicina: Devem ser incluídas quando há historia de trauma penetrante de cabeça, craniotomia ou bacteremia por S. aureus possa ser documentada. • Antibióticos que não ultrapassam a Barreira Hematoencefálica: AminoglIcosídeos, Eritromicina, Clindamicina e cefalosporinas de 1º geração. Tratamento empírico: • Foco presumível: Boca, ouvido ou seios paranasais: Metronidazol + Cefriaxona ou Cefotaxima • Bacteremia com foco presumivelmente cardíaco(Endocardite) Vancomicina(Trocar para Oxacilina se S. aureus sensível) **Se bacteriologia incerta associar cefalosporinas de 3G+Metronidazol • Abscesso em paciente pós-operatório de Neurocirurgia Vancomicina + Ceftazidima ou Cefepime ou Meropenem **Sempre reajustar antibiótico empírico após resultados das culturas. • Abscesso cerebral após trauma penetrante Vancomicina + Ceftriaxona ou Cefotaxima ** • Lembrar: Uma importante desvantagem da Vancomicina é a pobre penetração no liquido cérebro-espinhal(1% com meninges não inflamadas e 5% com meninges inflamadas), pode ser associado Rifampicina, que alcança concentrações bactericidas sem importar o estado das membranas, mais os dados ainda são poucos na literatura que deem suporte a esta associação. • Outras opções para SNC: • -Linezolida • -Sulfametoxazol-trimetropima • -Daptomicina Duração do Tratamento: • Duração prolongada do tratamento, geralmente de 4 a 8 semanas. • Deve ser guiada pela melhora clínica do paciente e a normalização dos exames de imagem( TC e MRI). • O Neurocirurgião deve ser chamado na ocasião do diagnóstico inicial, para decidir se o tratamento será clínico ou cirúrgico. • Quando não está indicada cirurgia? I. Cerebrite sem evidencias de necrose tecidual. II. Localização em áreas vitais ou de difícil acesso. Nos casos que não será realizada cirurgia(drenagem ou aspiração) é necessário seguimento com exames de imagem. Não há consenso sobre o tempo para realizar estes exames(48h7 dias) Quando indicar cirurgia? • Não há melhora clínica após 1 semana de tratamento antibiótico. • Depressão do sensório • Sinais de hipertensão intracraniana. • Aumento progressivo do diâmetro do abscesso na TC/MRI • Lesões multiloculadas. • Devo usar corticoides? • Só quando apresentar efeito de massa importante demonstrado nos estudos de imagem. Sempre retirar o antes possível, lembrar que os corticoides podem diminuir a penetração do ATB no abscesso. Prognóstico • Mortalidade 0-30% nos trabalhos publicados • Fatores de pior prognóstico: - Tempo prolongado antes do diagnóstico e rápida progressão da infecção antes da hospitalização. - Queda importante do sensório na admissão - Estupor ou coma(60-100% de mortalidade) - Ruptura do abscesso dentro do ventrículo(80-100% de mortalidade) • Sequelas neurológicas acontecem em 30-60% dos casos mesmo com tratamento adequado. • Convulsões são as sequelas mais frequentes, principalmente aqueles pacientes com lesões no lobo frontal, que são mais susceptíveis a convulsões recorrentes. • http://www.uptodate.com/contents/treatment-andprognosis-of-brainabscess?detectedLanguage=en&source=search_result&transla tion=brain+abcsess&search=brain+abcsess&selectedTitle=1~1 50&provider=noProvider Nota do Editor do site, Dr. Paulo R. Margotto Consultem também Infecções bacterianas Autor(es): Paulo R. Margotto, Martha Gonçalves Vieira, Marta David Rocha Complicações da meningite neonatal • -abscesso cerebral: letargia, persistência da febre, convulsões e às vezes sinais de lateralização - LCR: 18 -100 cel (predomínio de linfócitos). Uma das mais devastadoras complicações da meningite bacteriana tem sido a formação de abscesso (ocorre entre 1% e 18% dos RN com meningite), com significante mortalidade (15% a 75%) e mais de 66% dos sobreviventes apresentam seqüelas neurológicas. As espécies mais envolvidas na formação de abscessos são as espécies Citrobacter e Enterobacter. Em mais de 77% dos pacientes com Citrobacter koseri (antigamente C. diversus). A maior característica patológica da meningite por Citrobacter é a vasculite seguida pelo infarto com necrose e liquefação de grande parte da substância branca dos hemisférios, podendo ocorrer também necrose hemorrágica e liquefação • -ventriculite: (73 a 100%) Uma inadequada resposta terapêutica, sugere esta possibilidade; na maioria dos casos, leva a hidrocefalia precoce com sinais de hipertensão intracraniana: apnéia, pulso lento e aumento do perímetro cefálico; o diagnóstico é feito com punção ventricular e o LCR mostra o número de células igual ou maior que 50 ou cultura positiva. • Preditores de prognóstico adverso são: convulsões, coma, uso de inotrópicos e leucopenia. • As anormalidades no US craniano estão presentes por volta de 65% das crianças com meningite bacteriana, chegando, no entanto a 100% com 48 horas de vida nos casos de deterioração tanto clinica como laboratorialmente. Há recomendações de um exame ultrassonográfico inicial ao diagnóstico da meningite e repetir semanalmente se forem detectadas alterações no exame inicial (anormalidades parenquimatosa ou ventricular) ou se o paciente apresentar deterioração clínica (aumento do perímetro cefálico, achados neurológicos, falta de resposta ao tratamento). Dr. Paulo R. Margotto, Dra. Bárbara L.B. Basílio, e Dra Aissa Rodriguez Saroza