FALÁCIA
CONCEITO
Um argumento inválido que parece válido. Por exemplo: "Todas as coisas têm uma causa;
logo, há uma só causa para todas as coisas". Do ponto de vista estritamente lógico não
há qualquer distinção entre argumentos inválidos que são enganadores porque parecem
válidos, e argumentos inválidos que não são enganadores porque não parecem válidos.
Mas esta distinção é importante, uma vez que são as falácias que são particularmente
perigosas. Os argumentos cuja invalidade é evidente não são enganadores e, se todos os
argumentos inválidos fossem assim, não seria necessário estudar lógica para saber evitar
erros de argumentação. Prova-se que um argumento é falacioso mostrando que é
possível, ou muito provável, que as suas premissas sejam verdadeiras mas a sua
conclusão falsa. Quando se diz que uma definição, por exemplo, é falaciosa, quer-se dizer
que é enganadora ou que pode ser usada num argumento que, por causa disso, será
falacioso.
ALGUMAS FALÁCIAS
falácia ad hominem
(ataque à pessoa) FALÁCIA pela qual se pretende refutar (ver REFUTAÇÃO) uma
afirmação, atacando, ou desvalorizando de alguma maneira, a pessoa que a defendeu.
Pode assumir a forma de ataques ao carácter, à raça, à religião ou à nacionalidade da
pessoa. Exemplo: "O meu pai diz que não se deve fumar, mas fuma. Logo, não há razões
para deixar de fumar". Neste caso, pretende-se refutar a ideia de que não se deve fumar
atacando a pessoa que a defendeu por ela ser incoerente.
falácia da afirmação da consequente
FALÁCIA que consiste em supor que da CONDICIONAL "Se P, então Q" e da afirmação
da CONSEQUENTE dessa condicional, "Q", se pode concluir "P". Exemplo: "Se jogamos
bem, então ganhamos o jogo. Ganhámos o jogo. Logo, jogámos bem." É fácil apresentar
uma REFUTAÇÃO desta forma de argumento com um CONTRA-EXEMPLO com a
mesma FORMA LÓGICA: o argumento "Se isso é sardinha então isso é peixe. É peixe.
Logo, é sardinha.", implicando a falsidade "Basta ser peixe para ser sardinha", mostra que
este padrão argumentativo é falacioso.
falácia da circularidade
1. Um ARGUMENTO cuja conclusão esteja explícita ou implicitamente contida nas
premissas; chama-se petição de princípio ou petitio principii a este tipo de falácia. Os
casos mais evidentes são aqueles em que a conclusão se limita a repetir a premissa:
"Deus existe porque diz na Bíblia e a Bíblia é a palavra de Deus". Os casos mais subtis
incluem variações gramaticais: "Os animais não têm direitos porque não são
contemplados na legislação". É falso que nos argumentos dedutivos válidos a conclusão
esteja "contida" nas premissas, como por vezes se pensa. Pois há argumentos
dedutivos válidos cujas conclusões não estão "contidas" nas premissas: "Sócrates é
grego; logo, Sócrates é grego ou os livros estão errados". E há argumentos
dedutivos inválidos cujas conclusões estão "contidas" nas premissas: "Se Sócrates
tivesse nascido em Estagira, seria grego; Sócrates era grego; logo, Sócrates nasceu em
Estagira".
2. Uma DEFINIÇÃO é falaciosamente circular se definir A em termos de B e depois B em
termos de A, sem com isso esclarecer A. Por exemplo: "Uma pessoa solteira é uma
pessoa não casada". E o que é uma pessoa casada? "É uma pessoa não solteira". Um
certo grau de circularidade nas definições é aceitável, desde que se trate de uma
circularidade informativa. Por exemplo, as definições científicas de massa, peso, energia,
força, etc., acabam por ser circulares, mas são informativas.
falácia da composição
FALÁCIA que consiste em concluir que, por as partes de um todo ou os elementos de
uma classe terem uma propriedade, o todo ou a classe também devem ter tal
propriedade. Exemplo: "As células não têm consciência. Portanto, o cérebro, que é feito
de células, não tem consciência." Provamos que esta forma de argumento é falaciosa
com exemplos simples como, por exemplo, "O oxigénio e o hidrogénio não são bebíveis.
Logo, a água não é bebível".
falácia da divisão
FALÁCIA que consiste em atribuir às partes de um todo ou aos elementos de uma classe
uma propriedade do todo ou da classe. "F é uma excelente equipa. i joga na equipa F.
Logo, i é um excelente jogador." CONTRA-EXEMPLO: "A classe dos números é infinita.
Ora 2 é um número. Logo, 2 é infinito".
falácia da exclusão
São frequentes os argumentos que omitem conhecimentos relevantes para avaliar uma
conclusão. Por exemplo: uma pessoa empenhada em provar que as guerras são
inevitáveis e que se limite a coleccionar os exemplos favoráveis oferecidos pela história,
incorre nestaFALÁCIA por excluir conhecimentos relevantes — deveria, por exemplo,
explicar por que razão a Suíça, estando trezentos anos sem guerrear, não é
um CONTRA-EXEMPLO que arruína a sua tese.
falácia da falsa analogia
Um argumento analógico é fraco quando sobrevaloriza as semelhanças entre duas ou
mais coisas ou quando despreza diferenças relevantes. Os casos mais extremos são
falsas analogias. O argumento "Uma casa teve um arquitecto e tem um senhor; assim o
Universo, a casa de todos, teve um arquitecto e tem um senhor — Deus" é um caso óbvio
de falsa analogia porque a pretensa semelhança entre "casa" e "Universo" é apenas um
efeito literário e retórico. Ver também FALÁCIA, ANALOGIA e ARGUMENTO POR
ANALOGIA.
falácia da negação da antecedente
FALÁCIA que consiste em supor que, se uma CONDICIONAL, "Se P, então Q", e a
negação da sua antecedente, isto é, "não P", forem verdadeiras, a negação da sua
consequente, isto é, "não Q", também é verdadeira. Exemplo: "Se copiaste, acertaste.
Não copiaste. Logo, não acertaste". Apesar de ser fácil apresentar contra-exemplos —
"Se Camões é espanhol, então é ibérico. Camões não é espanhol. Logo, Camões não é
ibérico" — é uma falácia muito frequente.
falácia da pergunta complexa
Pergunta formulada de tal modo que uma resposta directa compromete a pessoa com
mais do que uma afirmação. Cria-se esta FALÁCIA incluindo na pergunta afirmações ou
suposições às quais o interrogado ainda não assentiu. A pergunta "Já deixaste de
copiar?" só deve ser aceite por quem já reconheceu ter copiado porque tanto o "sim"
como o "não" são comprometedores: o "sim" será interpretado como confissão de que a
pessoa copiou; o "não" será interpretado como confissão de que a pessoa ainda copia.
falácia do apelo à força
ARGUMENTO que, para defender a sua CONCLUSÃO, apresenta ameaças em vez de
razões. As ameaças podem ser directas ou consequências possíveis e apenas sugeridas.
Exemplo: "Isso talvez seja verdadeiro mas se o afirmar a empresa terá de prescindir dos
seus serviços". O apelo à força é legítimo em algumas circunstâncias, por exemplo para
fazer cumprir a lei ou como conselho técnico destinado a evitar acidentes.
falácia do apelo à ignorância
ARGUMENTO em que, confessada a ignorância sobre a verdade de uma afirmação, se
conclui que a afirmação é falsa (ou que da ignorância sobre se uma afirmação é falsa se
conclui que ela é verdadeira). Exemplos clássicos de apelos à ignorância falaciosos
(verFALÁCIA): "Ninguém provou que Deus existe. Logo, Deus não existe", "Não há provas
de que Deus não exista. Logo, Deus existe", "Ninguém sabe qual é a causa natural de X.
Logo, X tem uma causa sobrenatural". Há apelos à ignorância não falaciosos. Por
exemplo: se uma pessoa acusa o nosso pacato vizinho de ser um ladrão mas não
apresenta indícios, devemos rejeitar a acusação. Em geral, o apelo à ignorância é
legítimo se a negação da sua conclusão colide com o conhecimento comum.
falácia do apelo à piedade
Um apelo à piedade do auditório é falacioso (ver FALÁCIA) se puser em segundo plano
os factos ou critérios que devem justificar uma afirmação. Exemplo: "O professor deve
dar-me o 18 porque de outra maneira não entro em medicina e a minha vida atrasa-se." é
um apelo ao sentimento de piedade do professor para que este altere os seus critérios.
falácia do apelo ao povo
Esta FALÁCIA caracteriza-se pelo apelo às emoções de um grupo ou à suposta sabedoria
partilhada por todos (povo). Em regra, este apelo a emoções ou saberes comuns apela
amotivos e não a razões. Exemplo: "Todas as pessoas sensatas rejeitam X. Logo, deves
rejeitar X". Neste caso, espera-se que o desejo de ser incluído na classe das pessoas
sensatas leve o auditório a aprovar a conclusão.
falácia do apelo às consequências
FALÁCIA, ou classe de falácias, em que possíveis consequências práticas de uma
proposição são usadas como prova. Exemplo: "Se toda a ordem fosse apenas aparente, o
mundo seria inquietante. Logo, a ordem não é apenas aparente." Neste caso espera-se
que o desejo de segurança do auditório o leve a rejeitar uma PROPOSIÇÃO e a tomar a
sua negação como verdadeira.
falácia do falso dilema
FALÁCIA que consiste na suposição de que, sobre um determinado assunto, só há duas
alternativas quando de facto há mais. Exemplos: "Estás com a América ou contra a
América.", "És rico ou pobre.", "És bom ou mau". Estas suposições falsas são muitas
vezes usadas como premissas de argumentos dedutivos válidos (ver VALIDADE), do
género: "Estás com a América ou contra a América: Não estás com a América; logo, estás
contra a América".
falácia do homem de palha
Esta FALÁCIA consiste em atacar as ideias de uma pessoa apresentando-as numa
versão deficiente ou distorcida. Constitui uma violação do princípio de caridade — a
exigência de que, no debate racional, se ataque a versão mais sólida das ideias que
queremos contestar. Exemplos desta falácia: "A única razão para defender a pena de
morte é o desejo primitivo de vingança.", "Reprovaram-me porque só olharam para o meu
comportamento".
falácia genética
Esta FALÁCIA ocorre quando, para avaliar uma TEORIA ou AFIRMAÇÃO, se invocam
factores do contexto de descoberta que são irrelevantes como prova. Em regra, é
falacioso apelar a contextos históricos ou sociais ou às circunstâncias psicológicas em
que surgiu uma teoria para legitimar um juízo sobre essa teoria. Exemplos: os nazis
cometeram a falácia genética ao desvalorizar as teorias de Einstein por este ser judeu;
muitas pessoas acreditam falaciosamente que o casamento monogâmico é a única forma
de família legítima apenas com base na sua longa história.
falácia post hoc
FALÁCIA também designada "depois disso, por causa disso" porque consiste em
presumir que se dois acontecimentos são sucessivos, então o primeiro é causa do
segundo. "Ingeriu o mel e a constipação passou. Logo, o mel é bom para tratar
constipações.", "Rezou e a sorte mudou. Logo, rezar é eficaz para mudar o curso dos
acontecimentos". Na base desta falácia pode estar a sobrevalorização de sequências
acidentais, o descarte de possíveis causas subjacentes ou o simples desejo de acreditar.
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FALÁCIA CONCEITO Um argumento inválido que parece válido