A SEGURANÇA DO SER PROFESSOR
Cecília Aidikaitis Previdelli Marques
Aluna do curso de Licenciatura em Ciências Sociais na Universidade Federal do
Rio Grande do Sul, realizei estágio de docência curricular em uma Escola Estadual
de Nível Médio na cidade de Porto Alegre. Este com duração de 20 horas/aula,
tendo como professora titular uma licenciada em Ciências Sociais pela mesma
Universidade. A escola localiza-se em um bairro de classe baixa, a turma utilizada é
de terceiro ano, turno noturno, com idades variando em torno dos 18 anos. O
período de realização da prática foi entre abril e julho de 2006.
Toda prática pedagógica traz experiências significativas. Fui professora do
Ensino Fundamental por cinco anos e regularmente acumulava novas experiências.
Grande parte delas, construtivas.
Durante a prática pedagógica em Ciências Sociais, pela primeira vez, fui
possibilitada de lecionar sociologia, e para alunos de nível médio. Foi uma
experiência nova, não pela faixa etária dos alunos, pois já lecionei no EJA, mas por
ser em uma Escola localizada em um bairro populoso, e os alunos possuírem uma
visão mais ampla da realidade que os cerca.
O que me chamou atenção, e que gostaria de mencionar como aprendizagem
significativa, foi a forma com que abordam a questão do trabalho. Esse tema foi
desenvolvido em algumas aulas, onde pude perceber a preocupação e interesse
deles no papel de trabalhador que assumiriam em breve (embora vários já
estivessem no mercado de trabalho, muitos deles eram estagiários, e não
consideravam isso como trabalho).
Outro fato que me marcou bastante foi a questão da violência. Por motivos de
segurança, relacionados a um tiroteio ocorrido na praça ao lado da Escola no horário
de saída dos alunos do noturno, onde guardas municipais foram feridos, as aulas
terminaram no intervalo durante uma semana. Tive a oportunidade de assistir a uma
palestra realizada na Escola sobre Segurança Pública, onde moradores clamavam
por mais segurança no bairro. Aproveitei tais oportunidades para utilizar o tema em
minha aula, como um tema transversal, já que não estava incluído no meu
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planejamento, mas que no momento era de grande interesse deles. Esses
aprendizados são únicos, vivenciados de diferentes formas de acordo com as
diferentes características de cada Escola. De maneira geral, foi extremamente
produtivo o aprendizado com esses adolescentes com os quais tive a honra de
dividir uma sala de aula.
SER PROFESSOR DE CIÊNCIAS SOCIAIS
Para Durkheim,
“É uma ilusão acreditar que podemos educar nossos filhos
como queremos. Há costumes com relação aos quais somos
obrigados a nos conformar; se os desrespeitarmos, muito gravemente,
eles se vingarão em nossos filhos. Estes, uma vez adultos, não
estarão em estado de viver no meio de seus contemporâneos, com os
quais não encontraram harmonia. Que eles tenham sido educados,
segundo idéias passadistas ou futuristas, não importa; num caso,
como noutro, não são de seu tempo e, por conseqüência, não estarão
em condições de vida normal. Há, pois, a cada momento, um tipo
regular de educação, do qual não nos podemos separar sem vivas
resistências, e que restringem as veleidades dos dissidentes.” (p.28).
É duvidoso nosso momento da educação. Professores cada vez mais
descontentes, alunos completamente desrespeitosos, pais em sua maioria ausentes.
Esta parece ser a realidade da educação brasileira, e não só das tão temidas
escolas públicas. Lembro de um fato ocorrido há cerca de quatro anos em uma
escola particular de confissão católica: um aluno do ensino fundamental,
descontente com a avaliação recebida pela professora, jogou pela janela um dos
ventiladores da sala.
Alunos agridem pais, professores e colegas. Como tratar um aluno assim? Nós,
como professores, temos que saber dialogar, já que faz parte do nosso preparo. E o
que falar dos alunos? Foi publicado no jornal Zero Hora do dia 25 de junho de 2006
um dado alarmante, mas antigo: professores apanham de alunos. A que ponto
chegamos! Interessante a fala de uma professora com relação ao seu aluno de onze
anos, estudante da segunda série, que a agrediu com uma pedrada no mês de Maio.
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“Se eu fazia uma atividade de bingo em sala de aula e não o premiava, ele
enfurecia. Ele me chamava de vagabunda, ameaçava depredar o meu carro, dizia
que ia acabar comigo...” (Zero Hora,25/06/06,p.32).
Chegamos a um ponto máximo: ou impomos limites a nossos filhos e alunos, ou
a educação caminhará para um abismo sem fim. Como podem esses professores
agredidos voltarem à sala de aula? Como desenvolverão suas aulas de forma
criativa, com prazer ( é esse prazer no que faz que nos mantém educadores), se não
se desprenderão da angústia da lembrança da agressão? Nenhuma formação será
capaz de devolver para esse professor a tranqüilidade ao lecionar. Suas aulas?
Possivelmente nunca mais serão as mesmas. Enfim, o medo tomará o lugar do
prazer, o encantamento do ser professor findará e a realidade sórdida fará com que
esse educador ou abandone a profissão ou se torne um apático professor.
Como agiremos nós, professores de ciências sociais? Nossa apatia tornará o
caminho muito mais difícil. Caberia a nós lidarmos com esses temas em salas de
aula. A violência, a segregação, a exclusão estão presentes desde os primeiras
estudos sociológicos. Se não podemos combatê-los de forma eficaz, ao menos
atenuá-los. Devemos dar esse enfoque às nossas aulas. Passamos por períodos de
conflitos intensos, e parece que poupamos nossos alunos dos esclarecimentos
sobre esses conflitos. Poderíamos trazer essa realidade para nossas salas de aula,
não agirmos como psicólogos, tentando “tratá-los” (ou seriam psiquiatras?), mas
como educadores buscando o entendimento do que ocorre na volta deles, e como
eles poderiam e deveriam agir para transformar esse entorno. Talvez se
tornássemos temas de nossas realidades em salas de aula, traríamos nosso aluno
para essa realidade, faríamos dele um agente esclarecido sobre o que pode causar
o conflito, faríamos exercer seus direitos e exercitar seus deveres, talvez um ponto
de partida para um futuro melhor dentro de sala de aula.
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CONCLUSÃO
Ao término de minha prática, chego a conclusão do que já sabia: educar não é
tarefa fácil, mas possível. Precisamos superar nossos medos, inseguranças, vencer
o desafio. Agressões, indisciplina, desvalorizações sempre terão, porém, cabe a nós,
professores, e mais especificamente os de áreas humanas como ciências sociais,
trabalhar o aluno de forma com que ele compreenda seu verdadeiro papel de
educando, aprenda a ter respeito e a valorizar cada ser humano como um ser único,
com seus defeitos e virtudes, como eles mesmo os são.
Acredito que lecionar é um aprendizado eterno. São muitas crianças e jovens que
precisam da nossa atenção, paciência, carinho e compreensão. Precisam de nossa
vontade, garra, confiam em nós. Nossa missão é uma das mais belas que possa
existir: a de formar cidadãos, conscientes de sua realidade e seu papel no mundo, e
ao mesmo tempo, carentes de nosso afeto.
Sei da dura realidade das agressões em salas de aula, dos baixos salários
recebidos pela classe, da eterna dificuldade em deslocar-se para mais de uma
Escola durante o dia. Mas também sei que, para mim, não h´tarefa mais bela e
sublime do que educar.
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REFERÊNCIAS
DURKHEIM, Émile Educação e Sociologia. Por Paul Fauconnet. 5.ed. São
Paulo:Melhoramentos, sd.
MACEDO, Lino de. Piaget e a nossa inteligência. Pátio Revista Pedagógica. Porto
Alegre: Artes Médicas Sul. v.1, n.1, mai/jul 1997.
http://www.bibvirt.futuro.usp.br/acervo/paradidat/patio/patio1.html.Acesso em 02/07/06.
MELO, Itamar. Professores vão à Justiça. Zero Hora, 25/06/06, p.32-33.
SANTOS, Boaventura de Souza. Para uma pedagogia do conflito. In: Silva, Eron et
al. Novos mapas culturais, novas perspectivas educacionais. Porto
Alegre:Sulina, 1996.
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