1 UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO – CAMPUS I CURSO DE PEDAGOGIA HABILITAÇÃO EM ANOS INICIAIS ALINE SANTOS BARRETO TELEVISÃO E PROPAGANDA: REFLEXOS DO CONSUMO NOS ALUNOS DA 3ª E 4ª SÉRIE DA ESCOLA ESTADUAL ROBERTO SANTOS SALVADOR 2008 2 ALINE SANTOS BARRETO TELEVISÃO E PROPAGANDA: REFLEXOS DO CONSUMO NOS ALUNOS DA 3ª E 4ª SÉRIE DA ESCOLA ESTADUAL ROBERTO SANTOS Trabalho de conclusão de curso apresentado à Universidade do Estado da Bahia, como requisito para obtenção do titulo de Licenciatura em Pedagogia com Anos Iniciais do Ensino Fundamental. Orientadora: Lynn Rosalina Gama Alves CO-Orientadora: Heloísa Lopes Silva de Andrade SALVADOR 2008 3 FICHA CATALOGRÁFICA ELABORAÇÃO: Biblioteca Central da UNEB BIBLIOTECÁRIA: Maria das Mercês Valverde – CRB-5/1109 BARRETO, Aline Santos Televisão e propaganda: reflexos do consumo nos alunos da 3. e 4. séries da Escola Estadual Roberto Santos / Aline Santos Barreto. _ Salvador : [s.n.], 2008. 64 f.: il. Orientadora: Lynn Rosalinna Gama Alves CO-Orientadora: Heloísa Lopes Silva de Andrade Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação) Universidade do Estado da Bahia. Departamento de Educação – Campus I Inclui referências e anexos 1. Propaganda. 2. Anúncios em televisão – Aspectos sociais. 3. Comportamento do consumidor. 4. Consumo (Educação). 5. Crianças. 6. Escolas públicas. I. Alves, Lynn Rosalinna Gama. II. Universidade do Estado da Bahia. Departamento de Educação. CDD: 659.143 4 ALINE SANTOS BARRETO TELEVISÃO E PROPAGANDA: REFLEXOS DO CONSUMO NOS ALUNOS DA 3ª E 4ª SÉRIE DA ESCOLA ESTADUAL ROBERTO SANTOS Trabalho de conclusão de curso apresentado à Universidade do Estado da Bahia, como requisito para obtenção do titulo de Licenciatura em Pedagogia com Anos Iniciais do Ensino Fundamental. APROVADO EM: / / BANCA EXAMINADORA __________________________________________ Lynn Rosalina Gama Alves Universidade do Estado da Bahia __________________________________________ Heloísa Lopes Silva de Andrade Universidade do Estado da Bahia _________________________________________ Velda Gama Alves Torres Faculdade Social da Bahia CONCEITO FINAL: _____________ 5 Dedico este trabalho aos meus pais que me ensinaram a ser forte e persistente para vencer as batalhas que a vida apresenta. Ao meu namorado Danilo que sempre esteve ao meu lado me dando apoio e me compreendendo. A todos os colegas e professores do curso de Pedagogia que contribuíram para mudanças significativas na minha vida. 6 AGRADECIMENTOS A Deus, pela dádiva da vida e por me fornecer força e sabedoria necessárias para enfrentar os momentos difíceis e permitir mais uma conquista em minha vida. Sei que ele me guia e me orienta nos caminhos e escolhas que eu fizer. Agradeço muito a minha mãe que mesmo com grandes dificuldades de ordem sócioeconômica soube me conduzir sempre pelos melhores caminhos e o estudo foi um deles. As minhas orientadoras, Lynn Rosalinna e Heloísa que com carinho, paciência e dedicação me ajudou na elaboração deste trabalho e me fez acreditar que sou capaz. A todos os colegas e amigos que direta ou indiretamente contribuíram para que eu realizasse este trabalho. Um especial agradecimento para Danilo meu namorado que além da compreensão e carinho me ajudou muito na realização deste trabalho. As minhas colegas em especial Tatiana e Alexandra que por muitas vezes cederam os computadores para que eu pudesse fazer este trabalho. É muito sacrificante fazer um trabalho deste sem essa tecnologia em casa. Ao curso de Pedagogia da Universidade do estado da Bahia, pelo apoio do corpo docente, discente e funcionários principalmente os da Biblioteca que me auxiliaram na escolha de livros e materiais para este estudo o meu mais sincero agradecimento. 7 “Educar o consumidor é capacitá-lo para exercer seus atos de cidadania sem se submeter ao consumismo” Jaqueline Moll 8 RESUMO Este estudo foi norteado pela questão quais as propagandas e programas e programas despertam nos sujeitos da faixa etária de 10 a 12 anos o interesse pelo consumo, propondo mecanismos pedagógicos para leitura crítica dessas imagens? Sendo assim, a pesquisa busca explorar a linguagem educativa das propagandas e programas de Televisão com o intuito de identificar quais os serviços e produtos mobilizam mais o desejo de consumo dos sujeitos investigados; categorizar esses serviços e produtos mapeando as áreas produtivas que mais atingem as crianças; estabelecer relações entre o consumo e a escola; levantar junto às crianças quais as estratégias que utilizam para adquirir esses serviços e bens; e por fim propor mecanismos pedagógicos para leitura crítica dessas imagens. Para tanto foi realizado um estudo de caso na escola Estadual Roberto Santos (de 1 a 4 serie), no bairro do Cabula, com jovens na faixa etária de 10 a 14 anos. A investigação apontou um descompasso entre o estudo do consumo na escola e o cotidiano desses sujeitos. Palavras Chaves: televisão, propaganda e consumo. 9 SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO.............................................................................................................8 2. O CONSUMO E A MÍDIA ELEMENTOS DE UM MESMO CONJUNTO...................11 3. O PAPEL DA ESCOLA NA FORMAÇÃO CRÍTICA DO CONSUMIDOR.................23 4. BREVE RELATO SOBRE O CONSUMO DE UMA ESCOLA PÚBLICA.................39 4.1. Abordagem............................................................................................................39 4.2. Espaço empírico....................................................................................................40 4.3. Sujeitos..................................................................................................................44 4.4. Instrumentos..........................................................................................................45 4.5. Análise dos dados.................................................................................................46 CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................................56 REFERÊNCIAS...............................................................................................................59 APÊNDICE......................................................................................................................62 ANEXOS.........................................................................................................................63 ANEXO 1 – PROPAGANDA DO RED BULL.................................................................64 ANEXO 2 – PROPAGANDA DO MC LANCHE FELIZ...................................................65 ANEXO 3 – CAPÍTULO DO LIVRO SOBRE CONSUMO..............................................66 10 1. INTRODUÇÃO O Consumo está presente em nossa sociedade, e não há como deixar de existir, a necessidade de adquirir mercadorias e serviços é atualmente produzida com grande força, através da relação existente entre as mídias e a sociedade. O consumo está presente independente das condições financeiras do seu público, pois ele é transmitido principalmente pelo maior veículo de divulgação de massa, a televisão. Contudo é necessário estimular as crianças a refletirem sobre as relações com o consumo, pois estão imersas nesse mundo, não há como negar e nem tentar protegê-las das propagandas e programas que podem influenciá-las. De acordo com dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) de 2005 divulgados pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) a média, que as crianças assistem à televisão é de quatro horas por dia, sendo que atingem principalmente crianças com poucas condições financeiras. Estando expostas a um mundo de informações, conhecimentos e valores. Dentro desse contexto é necessário identificar quais propagandas e programas despertam nos sujeitos da faixa etária de 10 a 14 anos o interesse pelo consumo, propondo mecanismos pedagógicos para leitura crítica dessas imagens? Formar cidadãos que saibam consumir com responsabilidade e consciência é mais do que necessário em uma sociedade capitalista como a nossa, já que o consumo faz parte do cotidiano da criança e precisa ser interpretado de forma contextualizada e crítica, entendendo os problemas econômicos que assolam a sociedade. Por que o consumo se demonstra de uma forma tão desigual? Porque uns possuem muito e outros nada tem? Mesmo não cabendo aqui essa discussão, o consumo está ligado a questões da nossa economia e por sua vez precisa ser mais bem explorado nas salas de aula que também estão formando novos consumidores. Assim, a intenção desta pesquisa é explorar o potencial educativo das propagandas e programas de TV, analisando-os a fim de: a) identificar quais os serviços e produtos mobilizam mais o desejo de consumo dos sujeitos investigados; b) categorizar esses serviços e produtos mapeando as áreas produtivas que mais atingem as crianças; c) estabelecer relações entre o consumo e a escola; d) levantar junto às crianças quais as 11 estratégias que utilizam para adquirir esses serviços e bens; e finalmente propor mecanismos pedagógicos para leitura crítica dessas imagens. A realização deste estudo revela-se importante visto que este recorte traz um debate significativo para articulação entre escola e o cotidiano dos jovens, tornando a aprendizagem sintonizada com as demandas desses sujeitos. O aporte metodológico que norteou a pesquisa foi o qualitativo que busca entender um fenômeno específico em profundidade, descrevendo, interpretando a luz dos discursos dos sujeitos que nas suas singularidades pode apresentar escolhas semelhantes. Para tanto foi realizado um estudo de caso, em uma escola estadual no bairro do Cabula, com trinta alunos do ensino fundamental na faixa etária de 10 a 14 anos. Os sujeitos investigados estão segundo Piaget citado por Olmos (2006), no processo de transição entre o estágio operatório concreto e o formal. No estágio operatório concreto consolida-se a capacidade de apreender os objetos com base em suas relações internas, seus atributos e não captá-los somente através da aparência. Com o entendimento também da causa e efeito, a criança começa a formar processos reflexivos. Já no estágio operatório formal, que se dá a partir dos 12 anos, a criança desenvolve o pensamento abstrato. Durante esse período a criança aprende a lidar com problemas de vários ângulos, utilizando livremente o raciocínio hipotético, e sendo capaz de efetuar experimentações nas quais pode observar o efeito resultante de se alterar uma ou mais variáveis de cada vez, com diversas combinações. Assim, estes atores sociais já apresentam a capacidade de estabelecer relações e coordenar pontos de vista diferentes (próprios e de outrem), integrando-os de modo lógico e coerente. Um outro aspecto importante neste período é a capacidade da criança de interiorizar as ações, ou seja, ela começa a realizar operações mentalmente, apresentando um pensamento reversível. O delineamento do trabalho Este estudo inicia com esta introdução, sendo seguido pelo segundo capítulo que discute as questões relacionadas com o consumo, contextualizando a emergência 12 dessa categoria teórica, enfatizando o papel da propaganda televisiva e dos programas de TV nas necessidades das crianças e adolescentes. O terceiro capítulo apresenta a influência da propaganda e da mídia televisiva para despertar o consumo nas crianças e jovens, enfatizando a importância da escola na formação crítica do consumidor. O percurso metodológico e a análise dos dados serão detalhados no quarto capítulo, trazendo a interlocução com teóricos e os atores sociais sujeitos dessa investigação. E finalmente, na conclusão serão apontados mecanismos pedagógicos para leitura crítica dessas imagens. A intenção com este trabalho é iniciar o processo de investigação cientifica que será aprofundado no mestrado. Portanto, convido o leitor a estabelecer interlocução com as reflexões aqui apresentadas. 13 2. O CONSUMO E A MÍDIA ELEMENTOS DE UM MESMO CONJUNTO De acordo com Baudrillard·, o consumo não pode ser definido nem pela sua capacidade de absorção, nem como uma mera satisfação de necessidades, Se assim fosse, deveria chegar a um ponto de saturação. Portanto deve ser compreendido com uma prática idealista, que vai além da relação com os objetos e com os indivíduos, se prolongando para todos os registros históricos, comunicacionais e culturais. Nele, os signos devem se reproduzir infinitamente para que possam preencher uma realidade ausente. Por isto, de acordo com o autor, sua lógica não é pautada pela presença. Assim, o simples desejo de consumir, o sonho de possuir determinado objeto, produz intensas sensações que povoam o simbólico contemporâneo. Segundo o autor “é preciso que fique claramente estabelecido desde o início que o consumo é um modo ativo de relação (não apenas com os objetos, mas com a coletividade e com o mundo), um modo de atividade sistemática e de resposta global no qual se funda nosso sistema cultural” (BAUDRILLARD apud LYRA, 1993, p. 206). Para Sorj (2006) é possível construir um conceito de consumidor e de sociedade de consumo no qual, ao mesmo tempo em que se reconhece o efeito sistêmico na produção e dominação dos sujeitos sociais, o homem não é reduzido a simples instrumento da lógica do sistema ou dos grupos dominantes, sendo assim o indivíduo tem o papel de decisão no momento de adquirir os produtos de acordo com suas vontades, mesmo que lhe passem a necessidade de consumir em demasia, ou seja, o homem não é passivo. Segundo Pietrocola (1986) o surgimento da sociedade de consumo começou com a Revolução Industrial, e veio para consolidar o capitalismo, que é à base desta sociedade, ou seja, o produzir e adquirir mercadorias se tornam o eixo condutor de todas as ações humanas. Mas no Brasil este modelo se viabiliza as custas de muito sacrifício dos trabalhadores e de subdesenvolvimento que é resultado de uma prática política e caracteriza-se por marcar uma sociedade em que uma minoria dominante e modernizada reproduz os padrões de consumo do centro, adotando a sua ideologia e tecnologia enquanto a maioria de sua população é mantida marginalizada do processo 14 de desenvolvimento, vivendo em condições de extrema pobreza e recebendo salários que mal dão para sobreviver. (PIETROCOLA, 1986, p.30) Porém, mesmo as classes desfavorecidas, podem alimentar o consumo através do extorsivo sistema de créditos e adquirir produtos muitas vezes de baixa qualidade criados especialmente para atender esta demanda. Afinal a fantasia e o sonho de possuir alguns produtos não é privilégio dos ricos apenas, é dos pobres também. As condições gerais de vida desenvolvida na cidade favorecem a formação do hábito de consumo, que é estimulado pelo crescente jogo da propaganda. (PIETROCOLA, 1986). Para Sorj (2006) na sociedade de consumo competem versões diferentes sobre suas possibilidades, problemas e potencialidades, transformando-se num campo ideológico. A ideologia empresarial apresenta esta sociedade como capaz de gerar bens em quantidade e qualidade cada vez melhor e preços cada vez menores, aos quais cada indivíduo terá acesso de acordo com suas preferências pessoais. A crítica socialista tradicional tenta mostrar como na sociedade de consumo, se reproduzem às classes sociais. Já a ecológica busca evidenciar que a produção desenfreada de bens voltada unicamente para o lucro, destrói o meio ambiente. Sorj (2006) reflete ainda sobre a sociedade de consumo no Brasil e aponta alguns fatores que fortalecem o consumismo na sociedade brasileira: • A tendência hedonista da cultura brasileira, voltada para o presente, tem forte afinidade com a ideologia consumista. • A cultura produzida pela inflação, de incerteza sobre o valor futuro do dinheiro guardado. • Os processos de mobilidade social e a constituição de boa parte da classe média brasileira durante os anos 70, já no contexto de uma cultura capitalista de consumo. Essas camadas médias da sociedade careciam de outras formas de expressão cultural, social ou estética, ligadas a uma tradição pré-consumista. • O grande número de horas que se passa diante da televisão, um dos índices mais altos do mundo, o que implica uma exposição direta à publicidade – muitas vezes em forma subliminar – e a enorme capacidade da televisão de gerar, sobretudo com as novelas, uma verdadeira catarse e identificação coletiva em que os pobres podem entrar no mundo de consumo dos ricos. (2006, p.52) Por sua vez os reflexos desta sociedade chegam até a escola e necessita de um debate mais sério, para que os sujeitos que estejam sendo formados possam atuar de forma mais consciente e mais ativa no lugar em vivem. 15 Deste modo para Sorj (2006) a difusão da sociedade de consumo no Brasil ocorreu através de produtos que em sua maioria (rádio, televisão, eletrodomésticos de linha branca) não exigiam que o usuário fosse alfabetizado. Indica também o autor que a nova linha de produtos, relacionados com o uso do computador e à internet serão os principais instrumentos de compra no futuro, exigindo um nível educacional mínimo. Levanto questionamentos em relação a essa posição, pois justamente a maioria dos produtos de informática trazem muitos detalhes exigindo um entendimento maior. Sorj coloca também que possivelmente esses produtos trarão efeitos de exclusão social nos novos circuitos de consumo. Contudo, os produtos terão redução nos preços com a constante evolução tecnológica, possibilitando o acesso pela classe mais baixa. É importante, pontuar que a maior causa dessa exclusão não se deve ao fato da inserção desses produtos na sociedade, mas por uma má administração dos governantes e pela falta de preocupação em reparar as desigualdades existentes. Na sociedade capitalista as atividades e produtos fazem parte da lógica dos objetos de consumo, sendo que a linguagem que origina a transmissão do sentido destes ao público é a do mercador. Sendo assim o papel consumista dos meios de comunicação induz ao caminho da dependência ajudando as grandes empresas a venderem seus produtos, por intermédio da propaganda de massa, levando as pessoas de classe menos favorecida a se adaptar as vontades do mercado de forma a ser influenciado para a aquisição permanente de novos itens a sua disposição. (GUARESCHI, 1985). Todavia estas propagandas geram a aquisição de mercadorias de uma forma menos intensa, sem o consumismo demasiadamente excessivo, como cita Guareschi (1985), sendo mais voltada a determinadas épocas de consumo, como os períodos de festa e as datas comemorativas, que têm um maior enfoque no público em geral e influencia as crianças a serem o intermediário de um maior consumo do que o anteriormente planejado, para satisfazer as necessidades consumistas. Esse tipo de pensamento que a criança tem de que é só querer para se ter algum produto, é também devido à falta de esclarecimento dos pais aos filhos das necessidades a serem sanadas em detrimento de seus impulsos de consumismo. É, além disso, tem a ver com a questão do limite, que deve ser construído com a mediação dos pais. Aqui não é o fórum para essa discussão, mas a falta de imposição de um limite, tem relação com a falta de tempo ou 16 de controle dos pais levam a estas situações. Pais ausentes por questões de trabalho e/ou separações tendem a compensar a sua ausência através de objetos de consumo supérfluos. Segundo Santos (2000), as pessoas vivem rodeadas por um sistema ideológico desenhado ao redor do consumo e da informação ideologizados e isso se torna o motor de ações públicas e privadas. O consumo é o grande emoliente, produtor ou encorajador de imobilismos. Ele é, também, um veículo de narcisismos, por meio dos seus estímulos estéticos, morais, sociais, e aparece como o grande fundamentalismo do nosso tempo, porque alcança e envolve toda gente. Por isso, o entendimento do que é o mundo passa pelo consumo e pela competitividade, ambos fundados no mesmo sistema da ideologia. Heckeher citado por Karsaklian (2000) relaciona a sociedade de lazer com a de consumo e esta por sua vez influência de modo considerável as crianças, tornando-as conscientes do seu papel de consumidoras. Karsaklian (2000) cita que no início as possibilidades de consumo das crianças são bastante restritas, devido a suas aptidões cognitivas limitada. Contudo, é importante ressaltar que elas apenas pensam diferente dos adultos, com uma lógica diferenciada, mas, não limitada. À medida que as crianças crescem ocorre uma ampliação bastante rápida do consumo. Este processo é descrito por Le Bigot citado por Karsaklian (2000), da seguinte maneira: De 0 a 6 anos: produtos individuais que lhe dizem respeito diretamente ( 0 a 2 anos: mais rejeição do que solicitação sobre brinquedos e comida que lhe são mostrados; 2 a 4 anos: primeiras solicitações em relação a roupas, livros e discos; 4 a 6 anos: as preferências são mais acentuadas); De 7 a 11 anos: ampliação dos centros de interesse em direção a produtos familiares (7 a 8 anos: os pedidos são mais preciosos e cada vez mais orientados para produtos familiares utilizados; 9 a 11 anos: compras familiares, como automóvel, férias ou equipamentos, e surgimento de desejos por produtos para adultos); De 12 a 14 anos: a criança entra na idade do especialista e se focaliza sobre um número reduzido de centros de interesse e torna-se imbatível em certas áreas (motos, informáticas...). Seu universo se reorganiza em torno dessas especialidades. (LE BIGOT apud KARSAKLIAN, 2000, p. 219). Mas, para o jovem que está sendo estudado nesta pesquisa, são poucas as possibilidades de adquirir os produtos referenciados, mas o desejo de possuir esses bens se faz presente. 17 Para a autora Karsaklian (2000) vários estudos demonstram que as crianças são capazes de identificar as propagandas existentes entre os programas de TV. Antes mesmo de adquirir uma estrutura cognitiva operatória, são capazes de identificar as propagandas, sem confundi-las com os programas televisivos. Essa aptidão surgiria principalmente a partir dos 7 anos1, mas vários casos foram observados a partir de 4 anos. O fato das propagandas serem mais engraçadas e possuírem menor duração que os programas, leva a um maior entendimento pelas crianças. Tendo em vista a importância que “o engraçado” tem para as crianças, passou a serem utilizados nas propagandas alguns personagens de grande apelo e também foram criados outros para propagandas específicas, sendo este um fator determinante para a maior aceitação do público infantil. E com um maior entendimento e amadurecimento da criança é percebido que elas entendem melhor o objetivo das propagandas, sabendo analisar a intenção em convencer o público a comprar os produtos. É visto que o indivíduo não nasce consumidor, mas aprende a sê-lo, com a vontade de se obter os produtos já sendo adquirida durante a sua formação num contexto social e cultural. Tomando consciência gradativamente que possuir um produto é uma resposta ao surgimento de um desejo, que tem como base uma necessidade. A consciência adquirida pela criança virá da observação do comportamento de seus pais e da influência exercida pela propaganda e do marketing utilizados, que tem o fim de criar a sensação de ser necessária à obtenção dos itens comercializados. A sociedade de consumo é caracterizada pela lógica de criação de novas necessidades que se traduzem na criação de novos bens de consumo. A autora Pietrocola (1986) analisa dois tipos de necessidades. A supérflua que muitas vezes é alimentado pela propaganda e a Vital que é realmente necessária como roupa, comida, entre outros e que vem como resposta à suprema carência do homem de criar bens que lhe completem a condição de ser único. Além disso, a sociedade de consumo é assentada sobre valores como poder, prestígio, status, que são alimentados pela publicidade e propaganda. Mais do que produtos, vende imagens coloridas, brancas e pretas, belas, 1 A autora não detalha no seu trabalho qual o perfil dos sujeitos das pesquisas, nem o local que foi feita às investigações. 18 que são lançadas cotidianamente sobre os homens através dos meios de comunicação de massa. Cada produto na sociedade de consumo simboliza alguma coisa. Estes símbolos resultam da criação infinita e múltipla de novas necessidades ajustadas, evidentemente às categorias históricas das organizações sociais. Assim na nossa sociedade é comum comprar uma roupa ou um carro em função do status que a posse do mesmo confere ao comprador. Segundo Gade (1980) o consumo do jovem de classe baixa demonstra uma forte preocupação em aparentar pertencer à classe média, em adquirir símbolos de status. E isso pode trazer sérios problemas numa sociedade onde reina a desigualdade, pois é um contraste a vontade de consumir contra as restrições financeiras existente. Um dos meios que despertam o interesse pelo consumo, principalmente para crianças com poucas condições financeiras é a TV, pois de acordo com dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) de 2005 divulgados pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) a média, que elas assistem à televisão é de quatro horas por dia. Tempo, muitas vezes, similar ao que é dedicado à escola. Por meio da tevê, as crianças estão expostas a um mundo de informações, conhecimentos e valores. As crianças têm acesso a tudo: novelas, seriados, programas de humor, de auditório, reality shows, telejornais, entrevistas, comerciais... Mas, em geral, os programas prediletos não são aqueles produzidos e destinados para sua faixa etária. Mesmo porque a programação dirigida ao público infantil, no Brasil e em toda a América Latina, não ultrapassa 10% do total da grade de programação. As crianças assistem a programas produzidos para os adultos, principalmente, à noite, quando a família está em casa e o controle remoto é comandado pelos pais, responsáveis ou irmãos mais velhos. (ASSIS E TAVARES, 2007). Neste cenário, a televisão rompe com a separação entre o mundo adulto e o infantil. Dentre outras conseqüências, os conteúdos televisivos acabam de certa forma estimulando e instigando uma antecipação da vida adulta, seja no modo de vestir e no linguajar. Seja no consumo e nos valores. Seja no comportamento e nos desejos. As crianças falam de dieta, de cirurgia plástica, de dinheiro, de beleza, de conquistas amorosas, de intrigas e traições. Psicólogos afirmam que a sociedade está diante de 19 uma infância mais esperta e atenta, e muito pouco ingênua. (ASSIS E TAVARES, 2007). A grade de programação da televisão está quase que totalmente voltada para a satisfação das necessidades de mercado dos produtos de bens de consumo que financiam e patrocinam os programas exibidos de acordo com a influência dos mesmos para o público, ou seja, a sua aceitação pelo público e a quem estes programas atingem. Sendo que os programas com uma maior audiência serão alvo de maiores patrocinadores com o intuito de uma maior divulgação do seu produto, que gerará o maior volume de consumo, por parte daqueles que assistem aos programas. Ana Lúcia Villela em seu artigo do Projeto Criança & Consumo (2005), procura colocar à disposição de pais e profissionais que lidam com o público infanto-juvenil, instrumentos de apoio e informações valiosas sobre o impacto do consumismo na formação de novos valores da sociedade e uma reflexão sobre o tipo de pessoas que estão se formando se permitirmos que a mídia e o marketing tenham tamanha força na vida das crianças. Segundo a autora Gade “uma enorme quantidade de apelos é dirigida diretamente à criança não só para convertê-la ao consumo como para transformá-la em promotora deste consumo. Isto porque se descobriu a nova imagem e o papel ativo da criança no núcleo familiar”. (1980, p.112). Assim em termos de consumo de massa, o que mais profundamente atinge a criança é a TV, fazendo com que ela se lembre de 20 a 50 anúncios veiculados pela televisão; segundo pesquisas americanas, ela se recorda principalmente de anúncios de detergentes, de cigarro, cerveja e de leite. (GADE, 1980). Deste modo a TV faz parte do cotidiano das crianças e interfere muito intensamente na vida das crianças, segundo relata Gade (1980): A TV apresenta shows que têm apelos para a criança, quando permite que ela expresse suas fantasias e tensões interiores, como, por exemplo, quando a deixa um pouco assustada, temerosa ou com raiva diante das situações apresentadas, as quais em seguida mostram soluções. Elementos que representam a resistência infantil à autoridade adulta são bem vindos, pois permitem à criança liberar seus conflitos. Peter Pan, por exemplo, é uma criança que não cresce nunca, num país onde tudo lhe é permitido e onde o vilão é um adulto ridicularizado, o capitão Gancho. As historias infantis, o desenho animado e mesmo programas educativos na TV se utilizam frequentemente destas estratégias sem que os pais se apercebam disso, 20 mesmo por que a programação geralmente vem sob a capa do divertimento inocente ou da ciência. (GADE, 1980, p.112). Desta maneira a TV se faz presente na vida de muitas crianças e isso irá refletir em seu comportamento, principalmente aqueles infantes que passam horas em frente ao aparelho. Como pode se dá essa reflexão? Segundo Olmos (2006) a criança é educada para o consumo, e esse processo permite a construção de valores a partir de modelos que lhe são apresentados por uma sociedade que só reconhece quem tem poder e exclui quem não pode ter acesso aos bens de consumo. Com isso a criança é tratada desde cedo como consumidor e não como um cidadão com direitos a cumprir todas as fases de desenvolvimento. A publicidade dirigida à criança através da televisão joga um papel vital na formação de valores e atitudes necessários ao consumismo, especialmente para as crianças menores. A opinião de Olmos (2006) concorda com o discurso de Pietrocolla (1986) quando ele diz: Fomos educados para consumir. Aprendemos desde criança que quanto mais dinheiro um individuo tiver, mais será sua possibilidade de consumir, de comprar coisas, crescendo o seu prestigio, pois nesta sociedade o poder corresponde à riqueza pecuniária. (PIETROCOLLA, 1986, p 59). E uma das responsáveis por essa cultura é a propaganda que segundo Pietrocolla (1986) se lança na vida dos homens de forma sutil, sedutora, provocante, incidindo sobre necessidades não satisfeitas plenamente e dando respostas a elas. É na carência do homem que a propaganda atua, oferece alegria, emoção e ação que são vivenciadas por empréstimo pelo homem através dos meios de comunicação. É, pois, na área da fantasia que ela atua. “É um pensamento mágico, propenso ao miraculoso que envolve o consumo” (PIETROCOLLA, 1986, p. 56). Assim manipulando símbolos a propaganda vende imagens, estilo de vida, sensação, emoções, visões do mundo. Desse modo, a publicidade não se forma no vazio, ela expressa circunstâncias materiais e simbólicas vividas pelo sujeito. Carros, roupas, sapatos, cigarros, bebidas, têm a marca da distinção e não são consumidos de forma neutra. Os produtos expressam certos traços da nossa personalidade. “Ter um Fiat significa ser ágil, 21 moderno, independente”. Assim o consumo que está inserido na maioria dos homens, desde criança e precisamos ajudá-la a compreender esse fenômeno. Mas e aquelas crianças que excluída socialmente não tem o direito nem a uma moradia digna e que tem o televisor como o único entretenimento. Como lidar com estes contrastes existentes em países subdesenvolvidos como o Brasil? É uma pergunta difícil de responder. Segundo Karsaklian (2000) uma das maiores críticas feitas contra a propaganda seria no que diz respeito às crianças. Pelo fato delas deixar se influenciar livre e indefesamente pela propaganda, por não haverem adquirido um espírito crítico. Assim para essa autora a percepção das intenções da publicidade tende a crescer de forma diretamente proporcional com a idade da criança. E o determinante central para a compreensão dos comerciais de TV seria o estado de desenvolvimento cognitivo, junto com a idade e o nível atingido na escola. Deste modo é por volta dos 8 aos 11 anos que a maioria das crianças está realmente capacitada a tomar consciência tanto dos objetivos informativos quanto persuasivos, nos quais se baseia o discurso publicitário. A autora afirma o que as crianças mais apreciam nas propagandas é o espetáculo oferecido por ela. As cores os movimentos, as personagens, as músicas, tudo faz com que a atenção das crianças seja raramente desviada da tela da TV. Para elas, a propaganda está no mesmo nível que os demais programas de TV. Assim a maioria das crianças presta atenção à história que envolve o produto em vez de se concentrarem nele. Para a autora Pacheco (1998) os comerciais, sejam eles voltados para o publico infantil como para o adulto, acabam sendo fundamentais para o processo de marketing de um produto, o que por sua vez, ampliam os limites do imaginário infantil, reafirmando e intensificando as relações de desejo. E várias empresas estão investindo no potencial de consumo no mercado infantil, a exemplo de carrinhos nos supermercados e shopping apropriados para as crianças, e das inúmeras promoções de lanches e guloseimas que trazem juntos brinquedos, é o caso do Mc Lanche Feliz (ver Anexo 1). De acordo com Karsaklian (2000) a criança hoje influência nas decisões de compra de toda família e esse poder de decisão extrapolam o mundo dos brinquedos e 22 guloseimas. No Brasil, são 49 milhões de crianças entre 0 e 14 anos, responsáveis pelo consumo de 60% a 80% dos iogurtes e 40% dos refrigerantes vendidos no país. O consumo também está presente nos programas de TV, até para o público infantil, nos desenhos animados, seriados, novelas, entre outros e mais do que produtos esses programas vendem comportamentos e idéias, a exemplo de Aurélio2 em seu artigo que discute aspectos do programa Cocoricó da TV Cultura, em relação as suas proposições educativas e de consumo, em especial aquela que afeta a infância. Deste modo o merchandising está inserido implicitamente, com um conjunto de operações táticas e ações conjuntas de marketing. Notou-se que a proposta do Cocoricó além de despertar idéias, valores morais e posturas sociais igualmente condicionadas pelas características de cada episódio está implícito-explícita uma caracterização de marketing e propaganda. Em que pese às condições necessárias para a viabilização de enfoques e propostas para a educação infantil pela ação dos personagens, por outro se nota as circunstâncias da relação entre mídia e consumo encetados 3 pelas peças publicitárias intercaladas no programa. Aurélio não apresenta uma relação maniqueísta do programa, mas sua capacidade de influenciar sob esses dois aspectos, de um lado o senso educativo e de outro as relações implícitas de consumo.( AURÈLIO, 2007, p.01) Assim também para Araújo (2007) os programas de TV com suas imagens e sons admiráveis e suas histórias fascinantes, por vezes não permitem que o frequente telespectador tenha noção de sua real situação de oprimido e excluído do processo social vigente. Um exemplo disso é o período no qual acontece a Copa do Mundo onde a sociedade, quase que no seu todo vive um momento de letargia total, pois, enquanto os canais de TV mostram imagens de um Brasil unido de Norte a Sul pela chamada “paixão nacional”, os mesmos ocultam: as notícias de corrupção por parte dos políticos; as greves das classes trabalhadoras em busca de melhores condições de trabalho; a seca, a fome, a miséria e o descaso que caracterizam os nordestinos; os desempregos; as desigualdades e os preconceitos entre outros infortúnios como se os mesmos nunca 2 AURÉLIO, Juliane. A educação pela TV: Estratégias de consumo e aspectos educativos no programa Cocoricó. Disponível em: http://64.233.169.104/search?q=cache:-8IvbuEhC2cJ:200.155.18.61/informacao/79c2f01_115d80a527a, Acesso em 02 de abril de 2008. 3 AURÉLIO, Juliane. A educação pela TV: Estratégias de consumo e aspectos educativos no programa Cocoricó. Disponível em: http://64.233.169.104/search?q=cache:-8IvbuEhC2cJ:200.155.18.61/informacao/79c2f01_115d80a527a, Acesso em 02 de abril de 2008. 23 tivessem feito parte de nossa sociedade que vai às ruas de cara pintadas e veste a camisa verde e amarela como símbolo de patriotismo e amor à nação. A influência da TV passa por uma linguagem específica que envolve o sensorial e o emocional daquele que a assiste. É através de uma linguagem que traz para o telespectador aquilo que lhe interessa e aquilo que mexe com suas emoções que a TV interage com seu público tornando-se eficaz em atingir nossos sentimentos. Por isso muitas vezes é emocionante asistir certas cenas de novelas e filmes. Por falar em filmes, principalmente os estrangeiros, que de forma implícita passam à necessidade de adquirir os produtos de circulação que são exibidos, pois estes dão aos indivíduos, um maior status de aceitação na sociedade e tornam estas pessoas mais dependentes da opinião de outros com a sua forma de vida. Uma vez que a opinião de seu ciclo de amizades, muitas vezes acaba por diminuir a sua auto-estima, por não fazer parte do meio consumista, que só se faz restabelecida pela realização de seus desejos e de terceiros. Quanto ao consumo de anúncio não pode-se confudi-lo com o conumo de produto, pois é possivel pensar que o que menos se consome num anúncio é o produto. Assim em cada anúncio, vende-se estilo de vida, sensações, emoções, visões de mundo, relaçõe humanas em quantidades significativamente maiores que geladeiras, roupas e outros. Nesse intervalo consolida-se uma leitura de mundo e da sociedade. A relação sujeito e consumo, não é de passividade como às vezes se faz transparecer na concepção criada através do material analisado sobre o assunto, mas reside no desejo de consumir passando pela necessidade e pela subjetividade, ou seja, cada indivíduo consome pela sua consciência na interação com o meio de convívio e com o ambiente em que ele está inserido. De certa forma há proporções de influência, por querer estar incluso no seu círculo social, se deixando assim exceder pela vontade própria de almejar algo, mesmo que não possuindo os recursos necessários para satisfazer suas pretensões no momento. Outro fator importante que indica que o consumidor não é passivo são às novas informações disponibilizadas aos consumidores, as variedades de ofertas para sua escolha, e o apoio disponibilizado no caso de problemas com os produtos de consumo, como o caso das ouvidorias. O consumidor passa a ter uma maior iniciativa frente à 24 relação de consumo, possuindo um maior poder de decisão na aquisição dos produtos e tendo um papel mais ativo, ao exercer seu direito de escolha em concluir sua opção pela compra. Havendo ainda a possibilidade de desistir da aquisição e cancelar a operação no caso de insatisfação pelo produto a ser adquirido, sendo estes itens parte da nova política das empresas que oferecem os seus produtos, como vem ocorrendo nos sites de compra pela Internet. Por outro lado toda essa liberdade oferecida ao consumidor leva a possibilidade de crianças adquirirem produtos inadequados ao seu uso, por serem oferecidos com maior facilidade e sem muita burocracia, e isso pode acarretar em um endividamento doméstico para famílias que não possuem um bom poder aquisitivo, uma vez que as crianças que se sentem confortáveis em adquirir os produtos sem a responsabilidade de arcar com as despesas provenientes. Daí é necessário que a escola juntamente com a família passe educar as crianças para não serem influenciadas por ofertas irresistíveis, fazendo uma maior relação com o consumo e preparando os futuros consumidores, já que estes possuem um grande poder de decisão no consumo das famílias. Contudo o próximo capítulo explicita esta questão, da educação para o consumidor nas escolas com maior ênfase, apontando o importante papel que o professor deve ter na transmissão das informações necessárias para a relação com o consumo. Bem como trazendo a discussão dos autores sobre o tema estudado e as formas de se obter um maior apoio através dos órgãos que se preocupam em esclarecer os consumidores. 25 3. O PAPEL DA ESCOLA NA FORMAÇÃO CRÍTICA DO CONSUMIDOR A atual sociedade capitalista demanda cidadãos conscientes de seus direitos e deveres, para que possam atuar de forma crítica sobre a cultura de consumo, daí a relevância desse estudo em mostrar os reflexos do consumo nas crianças. Assim, segundo Coelho (1996), numa sociedade em que as mudanças são bruscas, quase sem regras, e em que a economia se altera rapidamente, o consumidor precisa estar preparado. Para O autor, o homem em sua relação com o mundo passa a consumir, ou seja, ser um sujeito de ação o que exige cada vez mais, a necessidade de uma educação para a relação de consumo, não descuidando de sua escolha de ser sujeito e, por outro lado, não negligenciando também das condições peculiares de nossa sociedade em transição. Do mesmo modo também para Oliveira (2007) em seu artigo discute a importância da educação para o consumidor, segundo ela a sociedade contemporânea exige consumidores conscientes e responsáveis. Neste sentido cabe a escola a missão relevante de formar o cidadão conscientizando-o, desde cedo, da relação de consumo e da importância desta para a vida em sociedade. O jovem ao tomar conhecimento dos direitos do consumidor, além de desenvolver seu senso crítico, capacita-se para combater os abusos praticados contras seus direitos. Além disso, na qualidade de consumidor desenvolve uma formação melhor de sua personalidade com atitude voltada para a responsabilidade social, com poder de decisão nas suas próprias opções de consumo tornando-se um consumidor de conhecimento, tendo como meta frear o consumo desnecessário e procurando podar as necessidades artificiais. Com a educação do consumidor na escola evita-se o endividamento familiar, o estudante desenvolve o senso critico e a capacidade de desenvolver projetos em sua comunidade, levando em consideração a sobrevivência das gerações futuras. O consumir passa a ser estritamente necessário dando ênfase ao consumo sustentável, contribuindo para formação de redes de solidariedades, todos com o mesmo ideal de conviver numa sociedade melhor voltada para a felicidade da humanidade a preservação da natureza. 26 Mas será que as escolas públicas trabalham o consumo com seus alunos? Este estudo verificou através de questionário, este aspecto em apenas uma escola, o que revela a necessidade de aprofundar e levar adiante as reflexões contidas aqui. È importante que se conheça o código de defesa do consumidor, que foi aprovado em 11 de setembro de 1990, pela lei 8.078, mas entrou em vigor a 11 de março de 1991. Como informa Coelho (1996) este código por si só não terá valor se o consumidor não tiver acesso a ele e se também não reconhecer o seu papel político-social. Alguns dos direitos e deveres apontados por Coelho (1996) do capitulo terceiro da constituição Brasileira são: Dos Direitos: Necessidades básicas: acesso a bens e serviços que garantem a sobrevivência mediante: alimentação adequada, vestuário, moradia, saúde, educação e saneamento básico. Ex: frentes de trabalho criadas pelo governo Segurança: garantia contra o marketing de mercadorias ou prestação de serviço que sejam perigosos para a saúde e para a vida. Ex: nas propagandas enganosas, procurar o Sistecon. Informação: conhecimento dos dados indispensáveis sobre produtos ou serviços para uma decisão consciente. Ex: fazer levantamento de dados sobre produtos e serviços terceirizados. Educação: para que possa adquirir os conhecimentos e a experiência necessária para ser um consumidor informado e executar conscientemente sua função no mercado. Ex: ler e analisar em grupo ou individualmente o código do consumidor, ler revistas e jornais em bibliotecas públicas. Meio ambiente saudável: para que possa viver e trabalhar sem que seja ameaçado ou corra perigo e possa ter uma vida digna. Ex: não poluir o ambiente com cigarros e afins. Dos Deveres: Consciência crítica: estar alerta e pôr em questão o preço e a qualidade do produto a consumir. Ex: os preços devem estar à mostra nos produtos, conforme a lei. Preocupação social: consciência de que seu consumo afeta os outros cidadãos, especialmente os mais desfavorecidos. Ex: não consumir desregradamente (evitar a síndrome do consumismo). Consciência do meio ambiente: compreensão das conseqüências ambientais do consumo. Preocupação em preservar, conservar e proteger os recursos naturais. Ex: não jogue lixo nos rios, preserve a natureza e as ruas da cidade. Reclamação: mais que um direito é um dever de consciência. Ex: exigir nota fiscal. (COELHO, 1996, p. 24-25). Ainda segundo coelho (1996) faz-se necessário analisar, criticar debater toda essa situação de direitos e deveres do cidadão, mas é preciso também uma mudança no pensamento crítico de cada pessoa, para que não seja apenas uma lei no papel sem utilidade. 27 Excepcionalmente as escolas públicas em sua maioria não tratam de aspectos políticos e econômicos, o que deixa seus discentes sem uma visão crítica, o que é perigoso em uma sociedade capitalista e desigual como a nossa, pois o consumo como a própria lei informa traz o direito a uma vida digna, e muitos alunos tem condições mínimas de subsistência e também não conhece seus direitos. Por que será que a escola pública trabalha pouco com essas informações? Por isso Coelho (1996) argumenta que toda a riqueza de uma nação gira em torno do homem bem-informado. A formação e a informação são eixos centrais de uma sociedade politicamente organizada na defesa do consumidor, e por isso merecem atenção especial dos governantes. É necessário que as escolas conheçam o PROCON, (Procuradoria de Proteção e Defesa do Consumidor) que conforme Sorj (2006) é um órgão que exerce o papel de informar, orientar, registrar reclamações individuais e coletivas. Essa defesa do consumidor vem junto com as mudanças na estrutura social, da consolidação de uma classe média com padrões globalizados de consumo, ao estabelecimento de uma indústria de consumo de massa, geralmente liderado por empresas multinacionais. Outro órgão que é preciso considerar é o IDEC (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor), foi criado em 1987, se transformou na mais importante instituição civil de defesa dos direitos do consumidor. O IDEC realiza testes de produtos, orienta a população, promove Ações Civis Públicas representando consumidores em processos coletivos. Sorj (2006). O IDEC também tem como preocupação central, à educação para o consumo. Formar cidadãos que saibam consumir com responsabilidade e consciência. Por isso é feita a preparação de cartilhas e livros acessíveis às crianças e adolescentes, sendo importante para a aproximação aos jovens envolvidos no projeto. Consistindo na criação de uma série de livros infantis, escrita por diversos autores, para tornar fácil o envolvimento das crianças com a área de consumismo, para sua melhor orientação no momento de adquirir algum produto. Este material é voltado para a utilização por professores para estabelecer com os alunos a orientação necessária para o seu desenvolvimento de forma que não sejam influenciados pela sociedade consumidora que os cerca. Mas é necessário que seja realmente explorado e aproveitado este material pelos educadores de forma que não se perca as informações que se tornam 28 importantes no cotidiano do consumidor, sendo que deve ser transmitido esse conhecimento para as crianças absorverem o consumo de uma forma mais objetiva e clara, relacionando o consumo ao ato de adquirir algum produto, e o contextualizando em outras áreas do saber. Com base em Coelho (1996) entende-se que a educação voltada para uma formação com maior grau de informação, forma uma sociedade com um maior nível de riqueza cultural, tornando-a politicamente organizada na defesa do consumidor, devendo possuir uma atenção especial do governo, sem a formação adequada o homem se torna um ser alienado que por sua vez se transforma num parasita, que é levado pela sociedade, por não possuir a consciência necessária sobre a sua importância para os padrões sociais. A informação ao consumidor é voltada para elucidar sobre os produtos e serviços prestados, a sua disposição, de forma que este se sinta mais esclarecido sobre suas dúvidas no momento de adquirir algum bem. Para se tornar mais informado em relação às formas de consumo, o indivíduo deverá principalmente ter conhecimento do código do consumidor, também obtendo mais conhecimento em revistas, folhetos, embalagens e bulas, no momento de optar por um produto ou outro que lhe seja mais agradável e adequado a sua situação. Por este motivo se faz necessário o maior foco em relação à necessidade de fazer o consumidor compreender a importância de obter o máximo de dados para não ser lesado ao adquirir algum produto, por não ter o conhecimento suficientemente necessário. A educação deverá se voltar para a criação de programas e a elaboração de conteúdos relacionados também à forma de consumo. Desta forma, os programas de ensino nas escolas deverão abrir espaços amplos para que sejam atualizados e formados os novos consumidores, as crianças, pois se faz necessária à manutenção de uma sociedade bem informada, para diminuir o consumismo dilacerado, que toma conta de nosso mercado atual. Em todo caso, é pela educação que se adquire o equilíbrio entre o consumo de modo excessivo e a obtenção da satisfação do prazer de uma forma natural, é nela que se encontra o suporte necessário, na formação do ato de pensar. Para assim se tornar mais equilibrados, livres de desejo demasiado e independentes, para poder usufruir de 29 uma forma coerente, sensata dos rendimentos salariais adquiridos e das reservas econômicas da família. Na sociedade consumista os indivíduos que não possuem cultura e educação, se encontram sem norteio e sem a orientação necessária, para compreender, analisar e escolher os produtos que são realmente necessários para suas demandas. Mas o fato de se obter uma educação adequada nos tempos atuais, se torna cada vez mais difícil, por ser a educação pública de certo modo precária e sem uma formação atualizada dos educadores para a construção, de novos conhecimentos às crianças, fazendo com que os indivíduos deixem de obter as informações necessárias que se fazem de vital importância na aquisição de consciência sobre o meio consumista e o modo de agir neste meio. Com uma reflexão sobre a realidade, os indivíduos poderão desenvolver um senso crítico se apoiando nas suas necessidades e interesses, fazendo uma análise juntamente com o educador, a fim de formar uma opinião. É preciso criar situações para que as crianças compreendam as relações provenientes do consumo. Esta prática já faz parte do currículo escolar de países como os Estados Unidos. O assunto consumo poderá ser abordado nas diversas disciplinas aplicadas, de acordo com a realidade da escola em que se leciona, procurando manter o foco em temas atuais mesclados aos conteúdos básicos. Todavia a educação pública está imersa no modo consumista da sociedade, sendo parte de uma mudança, de forma retórica e prática, do modo de se tratar os indivíduos como usuários para a forma de consumidores simplesmente. As relações voltadas para a oferta e o uso dos serviços disponíveis estão sendo redirecionadas para a forma usual de consumo, com a educação fazendo parte deste mercantilismo dos serviços, pois a educação passou a ser comprada em detrimento da obtenção da mesma, como em tempos remotos. (SILVA, 1999). Até que ponto se torna viável as soluções propostas, por Coelho (1996), na realidade das escolas publicas da atualidade, sendo os educadores mal remunerados e com necessidades de um maior apoio para aquisição e estudo do material disponível sobre este assunto abordado. E também as condições oferecidas pelo ambiente de trabalho, como a superlotação das salas, materiais escassos para ministrar as aulas, falta de 30 envolvimento dos responsáveis diretos pela coordenação das escolas no processo de educação e pela própria realidade dos alunos, que muitas vezes passam por um processo de frustração, e não possuindo condições dignas de sobrevivência e tendo dificuldades até para chegar ao local de aprendizado. Um outro fator a ser considerado é o fato de que na escola pública, muitos alunos chegam a concluir o ensino fundamental, sem possuir uma formação compatível, para se compreender e analisar informações a ele transmitidas, ou seja, são analfabetos funcionais. Não possuem a função social da escrita e da leitura, necessária para o desenvolvimento na sociedade, sendo isto uma falha muito grave do sistema educacional, por não manter um acompanhamento da qualidade das suas formas de ensino, para o gradativo aperfeiçoamento dos conteúdos e das estruturas organizacionais das escolas. Segundo Rossetti (2005, p.10-11) Os modelos mais tradicionais de ensino tendem a desapropriar os aprendizes de sua produção, focando o ensino na transmissão de informações e valores preestabelecidos pelos adultos. Fazem o que Paulo Freire denominava “educação bancária”, em que se transmite às novas gerações aquilo que a geração anterior considera importante, sem qualquer adequação. As novas mídias põem em xeque os modelos tradicionais de ensino e subvertem poderes estabelecidos. O problema da educação hoje não é tanto dar acesso à informação, papel tradicional das escolas, mas dar sentido ao “mar de informações” em que estamos todos mergulhados. Para lidar com tanta informação, é preciso repensar os modelos de Comunicação, Educação e Participação predominante no século XX. No caso citado por Rossetti a educação deveria ser voltada ao foco de passar as informações fazendo com que as crianças associem com a realidade, sendo que quando se citar um exemplo de formas de consumo como uma compra, as crianças saibam identificar o termo ao ato exercido, pois a maioria das crianças pesquisadas neste estudo não fez uma relação sobre este assunto quando questionadas. O fato é que os livros, os jornais, o rádio, a televisão, a internet, o celular, i-Pod, MSN, Orkut, entre muitas outras mediações tecnológicas, estão mudando as relações humanas. O jovem sujeito da educação vive hoje em um mundo cada vez mais fragmentado, que assiste ao fim das grandes narrativas e ao enfraquecimento das instituições, como a família, escola, Igreja. Nesse cenário complexo, ganha importância 31 o papel da educação no processo de construção da identidade dos indivíduos. A escola, predominantemente transmissora de conteúdos e comportamentos, passa a ser questionada. Os avanços tecnológicos dos veículos de comunicação, assim como as tecnologias de celular e os programas de bate-papo em tempo real para computadores, implicam uma direta mudança de comportamento social, que incide no relacionamento interpessoal e na construção da identidade. Isso tudo é intensificado pela força cada vez mais impetuosa da publicidade, e o seu discurso “Eu sou o que consumo”. Essas mudanças na comunicação produzem forte impacto na educação e na própria cultura. (ROSSETTI, 2005). Dessa forma percebe-se que ao mesmo tempo que aumenta as formas de se comunicar, aumenta o individualismo, pois o ser humano passa a ter menos contato pessoal. Como foi visto a educação passa por grandes transformações para se adequar às novas realidades, que mudam de acordo com os avanços da tecnologia. Essa mudança ocorre com uma maior dificuldade nas escolas públicas, pelo fato de não possuírem as condições essenciais, o que resulta no prejuízo dos seus usuários. Enquanto alunos de pré-escola de colégios particulares possuem acesso a essas novas tecnologias com uma maior freqüência. Isso só demonstra as discrepâncias encontradas no processo de formação dos indivíduos no ensino público e todos os fatores que impossibilitam o seu melhor desenvolvimento. Na visão de Buckingham (2000), reconhecer as crianças como consumidoras significa fundamentar as políticas sociais de uma forma bem diferente, com a intenção de se obter uma forma de prepará-las para saber como lidar com o mercado. Isto necessita do envolvimento da educação de forma planejada, para incentivá-las a refletir sobre o seu envolvimento com a cultura de consumo e entender os princípios econômicos com os quais opera. Sendo que este assunto é deixado de lado pelas escolas, mas é possível que as crianças desenvolvam um conhecimento econômico mais cedo que o previsto pelos educadores. Por isso não se pode achar que as crianças serão “protegidas” das influências das propagandas, se simplesmente elas forem retiradas das programações, o que significa a ida para um mundo irreal. Então para preparar as crianças é necessário observar as necessidades culturais delas e como as mídias 32 poderiam atender a elas, o que exige uma diferenciação entre desejos e necessidades, e o reconhecimento de que os indivíduos não conseguem distingui-las. Segundo Tavares, a sociedade consumista, descartável e imediatista ocidental do início do Século XXI bate à porta da escola e traz um desafio para o professor: assegurar a manutenção dos valores de convivência pacífica entre os seres humanos, baseada no respeito, no diálogo, na compreensão, na paciência e na solidariedade. Segundo Assis, citado por Tavares, “valores modernos que foram conquistados a duras penas, mas que se encontram ameaçados por conta da monetarização da relação humana, onde as pessoas estão mais preocupadas com o ter do que com o ser”. Este ponto trazido por Tavares diz respeito à importância do papel dos professores na preservação das personalidades naturais de cada indivíduo, sem a afetação pela forma consumista da sociedade, que os induzem a se preocuparem com o que possui e não com o que são como pessoas. Já para Seiter citado por Buckingham (2000), esta visão é nada mais que uma “ilusão da classe média”, que ignora as características consumistas inseridas no comportamento dos integrantes desta classe. Isto significa que o consumo não pode ser ignorado, como é feito por quem o analisa, se colocando fora desse meio capitalista, mas deve-se abrir os olhos para procurar as formas de se transmitir às crianças a melhor maneira de se adequar as mudanças da sociedade. Uma das formas que o professor pode fazer para aproximar a realidade do consumo com os conteúdos escolares é utilizando a televisão como exemplo, já que ela está presente na vida da maioria dos alunos, é isso que afirma Tavares4: Dessa forma, a TV educa e serve de exemplo. As informações emitidas por ela constituem e constroem o mundo que elas vivem. Em outras palavras: a TV produz significado, realidade para as crianças. Uma realidade fragmentada, editada, com objetivos mercadológicos e ideológicos, que é entendida, vista e apreendida como o todo, o legítimo, o real, por meninos e meninas. Segundo Assis citado por Tavares, a escola está vivendo uma contradição, pois recebe ao mesmo tempo, os papéis de acompanhar as transformações ocorridas ao longo dos anos na sociedade e deve conservar-se como o espaço da permanência dos conhecimentos e valores, nesta sociedade onde tudo é de forma provisória, com 4 TAVARES, Marcus e ASSIS, Regina. Ser professor no século XXI. Disponível em http://www.multirio.rj.gov.br/riomidia. Acesso 11 de mai. de 2008. 33 mudanças a todo instante. Os professores se vêem, sem uma forma de solucionar essas dificuldades encontradas na transmissão das novas informações disponíveis e manter o controle através dos princípios preestabelecidos há vários anos. Assim fica configurada a nova sociedade movida por valores capitalistas, o qual sobrepõe a dignidade das pessoas, e há a sensação do ser humano estar perdendo suas características mais humanísticas. Estamos na Idade Mídia, conduzida pelo mercado, pelo poder e pela fama, na qual a dignidade já não é mais um valor preponderante. Na qual, pais, mães e educadores da nova geração, em grande medida, vão se tornando indiferentes à necessidade de se (re)encantar e de se (re)humanizar para garantir a permanência de valores essenciais à vida. (ASSIS e TAVARES, 2007). O trabalho dos bons professores é pela constituição de valores de convivência e afeto, no entanto, essa tarefa, que é essencialmente humana, vem se tornando mais desafiadora, pelas mudanças que vem ocorrendo nos diversos setores sociais, as pessoas tem se tornado, mais individualistas e dão maior valor ao que adquirem, sem dar importância ao convívio com o outro, e as crianças dessa geração por sua vez estão imersas nesse mundo mercadológico. Os professores ainda são os principais exemplos de referências de adultos para as crianças, depois dos próprios pais ou responsáveis. Com isso, procuram se manter como mediadores das múltiplas formas de relacionamento e convívio. A autora Penteado (1991) traz um debate interessante podendo contribuir muito para esse estudo, segundo ela os sujeitos da escola são telespectadores de muitas horas diárias, perante a TV, desta forma os alunos gostam de ver TV e assistem com prazer as suas programações, e conseqüentemente aprendem modos de falar, padrões de comportamento, modos e parâmetros de julgamento e informações diversas. E esse aprendizado se dá através da linguagem icônica ou imagética e da linguagem sonora no qual as imagens falam e produzem sons adequadamente ambientados pela linguagem musical. Segundo Milanesi citado por Penteado: A mensagem da televisão comercial brasileira é criada a partir do interesse daqueles que controlam a economia e que sustentam as empresas de comunicação. Ela fornece ao público, didaticamente, as diretrizes do consumismo, que é o sustento do sistema capitalista(...) Se o mercado precisa 34 ser ampliado permanentemente, as mensagens dos meios de comunicação devem levar o público ao consumo, não só através da publicidade dos produtos, mas pela criação do desejo genérico do consumir, do acumular, de ostentar. (1991, p.108). Neste contexto, a Televisão visa cativar, envolver e atrair o seu público de diferentes camadas da população. Sendo assim, a escola poderia se voltar para a utilização desse material da TV, como um parâmetro a ser comparado aos temas estudados, e uma forma de se estabelecer à relação com o cotidiano do aluno. Na visão de Penteado o ensino é uma comunicação dialógica, não simplesmente reprodutora, mas é reelaboradora do conhecimento. Podemos então compreender que através dos diálogos e discussões provenientes do ensino, pode ser refeito ou modificado, o pensamento do indivíduo sobre um determinado assunto, ou seja, pode vir a ser influenciado de acordo com o que ouvem. E o ensino é o instrumento capaz de reformular as mentes das crianças de acordo com os interesses da sociedade. Ainda como afirma Penteado, a aprendizagem pode ocorrer de forma indireta através dos meios de comunicação de massa, como livros, televisão, Internet, rádio e jornais, passando pelo conhecimento já acumulado pelos indivíduos e o influenciando. Com isso a escola recupera seu papel de produtor do conhecimento, e não somente de transmissor, através da reelaboração, ou também pela criação dos conhecimentos. É possível para a escola utilizar as vantagens da televisão, se aproveitando da colaboração que os serviços da televisão levam ao seu público e também aproveitar as brechas deixadas pela televisão, com o intuito de passar as informações desejadas. Pois a televisão em síntese se volta para a cultura consumista utilizando suas programações, para levar ao público o interesse de se obter sempre mais, mesmo que não lhe seja necessário, e o próprio ato de assistir a televisão é uma prática de consumo. Os professores devem procurar uma forma de ligar os assuntos aplicados em sala com os tempos atuais e as informações distribuídas pela televisão e principalmente pela Internet, para atrair a atenção das crianças e conseguir transmitir e formular as informações. Ainda sobre o assunto televisão relacionado com a educação a autora Fischer (2006) acrescenta que a TV tem uma participação decisiva na formação das pessoas, por isso 35 é muito importante estudar a TV como um meio de produção cultural. A autora diz não ter dúvida das diversas formas de aprendizagens, desde formas de olhar e tratar o próprio corpo, até modos que devem atuar os diversos papéis na sociedade, então se torna imprescindível analisar essa linguagem, visto que a TV traz uma série de possibilidades de expressão audiovisual, de comunicação de sentimentos idéias, além de ser uma fonte para se pensar os problemas e os impasses da educação na contemporaneidade. Todavia a televisão para se tornar realmente um elemento significativo no contexto escolar é necessário compreender bem suas funções e sua atuação pedagógica. Porém se o professor não receber uma formação adequada ele não vai saber como usar essa ferramenta tão comum e aparentemente tão simples em suas aulas, a autora também chama atenção quanto a isso dizendo que a televisão precisa entrar como objeto de estudo na formação de professores. Assim em plena era das multimídias eletrônicas o preparo escolar e acadêmico ocorre quase exclusivamente na esfera do verbal e do conceitual. Concordo com a autora, pois poucas matérias durante a formação oferecem esse tipo de conteúdo e no estágio que vivenciei no ensino fundamental, no colégio Roberto Santos, não foi possível perceber em nenhum docente o uso deste recurso com os alunos, mesmo a escola dispondo o material, por que os professores não utilizam esses materiais, será que eles não receberam uma formação adequada? Ou a escola prefere a utilização de outros materiais a este? É claro que há muita carência, o que deixa os alunos de escola pública em geral com uma formação deficiente, mas se não for feito o uso do pouco material que se têm os resultados pioram. Assim as escolas deveriam introduzir leitura e analise de comerciais, programas de TV, filmes entre outros, isso possibilitaria um olhar mais apurado sobre essas imagens, aprendendo bastantes sobre mensagens veiculadas todos os dias para a população em massa. A autora Fischer (2006) fez um trabalho interessante através de cursos-oficinas realizados no SENAC de São Paulo, para professores defrontar-se com a TV com nova atenção, lendo e analisando mensagens que emociona e sensibiliza, os cursos têm vários eixos temáticos como: Comerciais e Propagandas: Eixo Econômico da TV Comercial, Em busca do que é “educativo” na TV e no vídeo. Isso demonstra que esse material é uma necessidade nas escolas atuais e já ocorre uma mobilização, para 36 colocar em praticas essas ações, mas não deve só analisar a TV como outros produtos mídia ticos como o computador e suas ferramentas. Assim, extrair o poder educativo da TV é importante para a criança, pois, conforme observa Pacheco (1998) as crianças usam este aparelho como uma das fontes de onde retiram material para interpretar suas experiências vividas e alimentar o imaginário. É percebido, este fenômeno principalmente nas crianças menores, elas encenam e fantasiam diversos personagens encontrados na TV. A autora chama atenção que embora a TV não tenha prioritariamente função educativa, ela associa a soma das experiências existenciais da criança e, sem dúvida, constitui padrões de comportamento. Fala também do poder de sedução que alguns personagens deixam como He-Man, Xuxa e mais recentemente os Power Rangers, Ben 10 nas pessoas, e por mais que haja críticas, o fascínio geralmente ocorre. Porém a visão de mundo que a criança constrói diante da TV precisa ser mediada pelo meio social em que ela situa. E a TV traz conotações diferentes para crianças favorecidas, cujas famílias podem oferecer lazer e estímulos diversos, seguramente essas crianças terão mais oportunidades de discutir as mensagens televisivas. Já para as crianças com menor poder aquisitivo, essas oportunidades se tornam mais restritas. Em síntese o deslumbramento da criança brasileira pela televisão é grande, tanto que as mães usam isso para chantagem na qual as crianças não irão poder assistir seus programas prediletos se não fizerem alguma tarefa ou não se alimentarem direito, assim uma pesquisa qualitativa5 publicada em 1992 registrou o depoimento de algumas crianças sobre a TV: Marcel, 7 anos: “ TV e videogame são as duas coisas que mais adoro.” Christiano, 6 anos: “Gosto de ter muitas namoradas como aquele Felipe da novela”. Marcelo, 6 anos: “Só durmo depois que o Jô Soares acaba. Eu gosto do Jô Soares por que ele é gordo e engraçado. Não entendo o que as pessoas falam. Um dia ele entrevistou um homem que falou de Aids. Eu fiquei com medo.” PACHECO (1998, p. 139). Como foi visto nos depoimentos, os gostos dos programas além de extrapolar os horários permitidos para crianças, as preferências muitas vezes não são infantis, como 5 Leila K. Moreno. “Televisão, a babá nossa de cada dia”, Jornal da USP, 9 a 15/03/1992, p.6. 37 é o caso do Marcelo descrito acima, estendendo esse comentário às crianças exageram atualmente em frente ao computador, e devido a isso a publicidade tem investido muito em cima dos internautas com comerciais de jogos, guloseimas entre outros. As empresas têm investido bastante para conquistar o público mirim sem possuir preocupação com as conseqüências de seu marketing agressivo, que resulta na frustração dos menos favorecidos. Em razão disso existe o Conar (Código de AutoRegulamentação Publicitária), que contém normas voltadas para a proteção das crianças, e que procura tomar novas providências para os abusos cometidos pelo setor publicitário e pela televisão. Sendo assim é importante se debater essas questões, desde que já existe até livros que tratam do assunto como é o caso do PCN, que está exposto a seguir e outros materiais descritos aqui. Há nos temas Transversais, propostos nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN/MEC), um sexto tema que trata sobre trabalho e consumo, é importante se abordar esse tema, pois os alunos desses ciclos começam a ser inserido como ator no mundo econômico. Daí a necessidade de apresentar essas questões, de forma transversa em disciplinas como Matemática, História, Geografia. Esse eixo Analisa a influência da publicidade na vida das pessoas. Busca-se segundo, a secretaria de educação fundamental, uma análise do trabalho e do consumo na atualidade, explicitar as relações sociais nas quais se produzem as necessidades, os desejos e os produtos e serviços que irão satisfazê-los. Participar dos debates sobre as formas de realização e organização do trabalho e do consumo, compreendendo suas relações, dependências, dilemas e direitos vinculados, de tal modo como os valores que lhe são associados, auxiliará uma atitude crítica, na perspectiva da valorização de formas de ação que favoreçam uma melhor distribuição da riqueza produzida socialmente. Ainda de acordo com o PCN6 as relações de trabalho e consumo produzem e reproduzem as tensões entre desigualdade e luta pela igualdade, injustiça e luta pela justiça. É assim que se constrói, a cada momento, a cidadania, como uma série de lutas em prol da afirmação dos direitos ligados à liberdade, à participação nas decisões públicas e à igualdade de condições dignas de vida, modificando, dessa forma, a 6 Parâmetros Curriculares Nacionais : Trabalho e Consumo. Disponível http://mecsrv04.mec.gov.br/sef/estrut2/pcn/pdf/trabalho.pdf . Acesso 19 de Mai. de 2008. em: 38 distribuição de riqueza e poder na sociedade. Ao se conceber a educação escolar como uma prática que tem a possibilidade de criar condições para que todos os alunos desenvolvam suas capacidades, a ecola fornece aos jovens uma perspectiva de participação em relações sociais, políticas e culturais cada vez mais amplas, condições estas fundamentais para o exercício da cidadania na construção de uma sociedade democrática e não excludente. Um direito básico do cidadão é ter acesso ao mercado de consumo, aos produtos ou serviços que são oferecidos. Embora, aparentemente, exista o livre acesso de todos aos bens de consumo e serviços, reconhece-se a existência de “bolsões” de consumo diferenciados: se em alguns o consumo de bens é praticamente ilimitado, em outros existe a impossibilidade de acesso aos bens de consumo e serviços considerados vitais. Trata-se, portanto, de reivindicar o acesso ao consumo como um direito fundamental de cidadania. Conforme o PCN7, por meio da publicidade criam-se necessidades e novos padrões de consumo, que passam a servir como indicadores da posição social dos indivíduos. Não sendo suficiente somente possuir um sapato, uma roupa, uma caneta, mas a roupa, o sapato de determinada marca. A identidade é marcada pelo consumo não apenas dos objetos como das marcas espalhadas pelo mundo e que se tornaram objeto de desejo, nas mais diversas culturas. Destaca também o PCN que os indivíduos ainda desconhecem sua força como consumidores, sua condição de sujeito nas relações de consumo, seus direitos e sua capacidade para interferir nessas relações. São essas reflexões que justificam e delineiam os propósitos de uma educação do consumidor: proporcionar aos alunos a ampliação de capacidades que lhe permitam compreender sua condição de consumidor, com os conhecimentos necessários para construir critérios de discernimento, atuar de forma crítica, perceber a importância da organização, solidariedade e cooperação para fazer valer seus direitos e assumir atitudes responsáveis em relação a si próprio e à sociedade. De fato a educação do consumidor torna-se importante para a construção da cidadania, agindo na aquisição ou manutenção de níveis adequados de bens e serviços, colaborando para a igualdade 7 Parâmetros Curriculares Nacionais : Trabalho e Consumo. Disponível http://mecsrv04.mec.gov.br/sef/estrut2/pcn/pdf/trabalho.pdf . Acesso 19 de Mai. de 2008. em: 39 social, à proporção que prepara e estimula a defesa do direito à saúde, à moradia, à previdência social, à qualidade ambiental e de todos aqueles serviços que se integram aos direitos sociais e para cujo cumprimento é essencial o esforço público e privado da sociedade. Tem a intenção, portanto, de analisar criticamente os problemas que afetam os consumidores e que são gerados por elementos estruturais ou conjunturais do sistema, assim como gerar a adoção, mediante a informação adequada e conhecimento dos procedimentos, de uma postura responsável e solidária. Concordo com o PCN no que diz respeito à educação para o consumidor, ele traz informações claras que podem ser usadas no dia-a-dia do professor para contribuir para sua prática em sala de aula. Outra informação transmitida pelo PCN, é que se pode utilizar projetos no estudo, estimulando o trabalho em grupo e as atividades individuais, aproveitando relatos de experiências pessoais ou familiares em relação a situações de compra de bens ou usufruto de serviços públicos ou privados e de situações de trabalho concretas, examinando atitudes e procedimentos que foram seguidos e possibilidades alternativas de resolução. Qualquer material pode ser usado como um recurso didático, como embalagens, propagandas, programas de rádio ou TV, músicas, textos literários e outras produções artísticas. É de fundamental importância que a escola procure apoios nas organizações governamentais e não-governamentais que trabalham com o tema existente na localidade, na região. Já foi feita a experiência durante o estágio na escola pública, da utilização de propagandas em um trabalho de matemática, isso prova que há possibilidade sim de aproveitar os materiais como citado pelo PCN. Destaca-se a necessidade de que os professores precisam selecionar com um melhor critério, e passem a criar e reorganizar os conteúdos de acordo com seus planos de trabalho e da discussão das experiências vividas e das expectativas em torno do tema do consumo. Diante das discussões expostas podemos compreender a importância do papel do professor voltado para a educação dos consumidores e a forma destes se colocarem no meio consumista. Além disso, a necessidade de se abordar este tema é essencial principalmente para os jovens que estão inseridos em um sistema capitalista onde o ter é mais importante do que o ser. E o fato de se possuir cada vez mais passa a ser uma 40 necessidade criada pelos impulsos do consumo. É claro que todos nós somos consumidores, desde que nascemos e somos colocados em fraldas descartáveis como aponta Gade (1980), por isso é preciso entender como a publicidade funciona e não só criticá-la, é preciso como cita os exemplos construídos ao longo desse texto a constante renovação dos conteúdos escolares, e a adequação dos professores as mudanças ocorridas. Deve-se também ouvir a opinião das crianças sobre seus gostos e preferências, para haver o entendimento das relações com o consumo, exercidas por elas. Por sua vez o próximo capítulo traz o aporte metodológico da pesquisa e as informações extraídas através do estudo de caso em uma escola pública com a exposição dos resultados obtidos durante o processo. Bem como relacionando com o debate teórico exposto até aqui. 41 4. PERCEPÇÃO SOBRE O CONSUMO DE PROPAGANDAS E DA PROGRAMAÇÃO TELEVISIVA: UMA ABORDAGEM DE CAMPO Abordagem Conforme Andrade (2003), os métodos de abordagem referem-se ao plano geral do trabalho, a seus fundamentos lógicos, ao processo de raciocínio adotado, uma vez que são essencialmente racionais. Desse ponto de vista os métodos de abordagem são exclusivos entre si, embora se admita a possibilidade de mais um método ser empregado em uma pesquisa. De acordo com Lakatos (2002), a seleção dos instrumentos metodológicos está, portanto, diretamente relacionada com o problema a ser estudado, e a escolha dependerá dos vários fatores relacionados com a pesquisa, ou seja, a natureza dos fenômenos, o objeto da pesquisa, os recursos financeiros e elementos que venham a ser necessários no campo de investigação. Não devendo ser utilizado apenas um método ou uma técnica, mas sim todos aqueles que forem necessários para o caso determinado. Para o desenvolvimento dessa pesquisa, mostrou-se como trajetória apropriada o Estudo de Caso, que segundo Lüdke (1986) visam à descoberta, ressaltam a interpretação em contexto, procura expor a realidade de forma completa e profunda, e procuram representar os diferentes pontos de vista presentes numa situação social. E é sobre uma base qualitativa que este estudo vem sendo construído, Na primeira etapa foi feita uma revisão bibliográfica sobre as concepções de consumo, compreensões sobre o consumo de propagandas, programas e a televisão direcionada principalmente para crianças e adolescentes, houve também a reflexão sobre o consumo na escola, promovendo um debate teórico e trazendo reflexões sobre a relevância que a escola tem na formação de um consumidor mais consciente. Assim esse estudo partiu de uma pesquisa exploratória, sendo esta a primeira etapa deste trabalho, constituída pela construção do tema e das referências, elas foram essenciais para penetrar no problema e construir um olhar mais consciente para ir a 42 campo, coletar os dados interpretá-los e logo em seguida sistematizá-los, fazendo uma conexão com os autores lidos. Durante a elaboração da parte teórica, foram utilizadas idéias de autores como Sorj (2006), Pietrocola (1986), Coelho (1996), entre outros estudiosos que participam das principais concepções aqui abordadas, para estabelecer as relações deste estudo. O tipo de investigação desenvolvida foi norteado por essa seleção teórica, sendo necessário para elucidar as questões levantadas pelo tema. O estudo de caso é uma categoria de pesquisa qualitativa, Goldenberg observa que: O estudo de caso reúne o maior número de informações detalhadas, por meio de diferentes técnicas de pesquisa, com o objetivo de apreender a totalidade de uma situação e descrever a complexidade de um caso concreto. Através de um mergulho profundo e exaustivo em um objeto delimitado, o estudo de caso possibilita a penetração na realidade social, não conseguida pela análise estatística. (2000, p. 34). Dessa maneira, a opção por este método nos permite a possibilidade de uma descrição mais minuciosa do objeto de investigação e de se formular um maior número de considerações a respeito do tema. A partir do material obtido através das pesquisas e avaliações foi possível elucidar sobre as questões levantadas acerca do tema, e com isso conseguiu-se transmitir as informações e idéias que surgiram durante o período de estudos e análises dos materiais. Em meio aos objetivos vislumbrados, a investigação de quais propagandas e programas despertam nos sujeitos da faixa etária de 10 a 12 anos o interesse pelo consumo, propondo mecanismos pedagógicos para leitura crítica dessas imagens, com base nas variáveis definidas nos capítulos anteriores, justifica o alvo a ser alcançado na pesquisa. Espaço empírico8 A Instituição de ensino onde foi realizada esta pesquisa é a Escola Estadual Governador Roberto Santos, uma escola de Ensino Fundamental, fundada em 8 O diagnóstico apresentado aqui foi construído através de entrevistas com a diretora, alunos e professores e a leitura do Projeto Pedagógico da Escola. 43 13/02/1979, de grande porte, P. O. Nº 1004, publicada no Diário Oficial do dia 13/02/1979, situada na Avenida Silveira Martins, s/n, no bairro do Cabula, CEP nº 41100-150. O nome da escola foi dado em homenagem ao professor e ex-governador Dr. Roberto Santos. Junto com esta referida Escola, quase que no mesmo período surgiram também o Colégio Roberto Santos do 2º Grau e o Hospital Roberto Santos. A Escola “Robertinho” como é carinhosamente denominada, nasceu na Avenida Silveira Martins no bairro de Narandiba, entre uma comunidade conhecida popularmente como Timbalada, atual Amazonas e o conjunto Jerônimo Baleeiro. O contexto da Escola é repleto de contrastes, tendo de um lado, o convívio com uma comunidade desfavorecida, desempregada e do outro, um grupo com privilégios acentuados com relação à infra-estrutura e segurança no local em que vivem e conseqüentemente às condições de vida. No início a Escola “Robertinho” era diferente de hoje, pois possuía uma arquitetura bastante original, sendo rodeada por várias árvores, com uma quadra de esportes e um pátio bastante amplo para as crianças brincarem, não possuía divisão e nem era separada por muros, sendo azul e branca. A Escola “Robertinho” foi muito desejada pela comunidade, todavia, pela sua estrutura mal conseguia atender a todos. Para suprir a grande demanda da comunidade local, o Colégio Roberto Santos do 2º Grau, cedeu algumas de suas salas para os alunos que necessitavam de uma escola de ensino fundamental. Em meados de 1987, a Escola “Robertinho” foi desativada, pois foi saqueada. Neste assalto foi depredada, destruíram carteiras, vasos sanitários e outros materiais que constituíam a mesma, não podendo receber crianças e adolescentes que a freqüentavam. Os professores por se sentirem ameaçados, ficaram temerosos e se afastaram da referida escola. No local começaram a acontecer assaltos e tiros. Na época destes acontecimentos, estas notícias viraram manchete do Jornal A Tarde: Depredada por desocupados, a Escola Governador Roberto Santos, de 1º Grau, ainda não começou o segundo semestre letivo deixando de atender aos quase dois mil alunos. Localizada no Cabula o estabelecimento está com carteiras e móveis quebrados sem as esquadrias, furtadas junto com portas e janelas, estando os sanitários interditados, por falta de condições de uso. Mas o mais grave são as ameaças ostensivas, que funcionários, professores e alunos vem sofrendo com o medo generalizado, porque nem vigias param no 44 serviço por não suportarem as agressões. Diversos assaltos à mão armada se registraram no local e alguns professores até deixaram de freqüentar as aulas, que acabaram suspensas, por este motivo, pela própria Secretaria de Educação (Jornal A Tarde, 25/07/1987)”. Durante 5 anos, o “Robertinho” permaneceu nessa situação deplorável. Em 1992 passou por uma reforma, recebendo um novo pavilhão de aulas e tendo sua cor de origem mudada para a cor creme. A Escola “Robertinho” não possui o mesmo espaço físico de antes, tendo a sua área ocupada por mais duas instituições: a creche Alípio da Franca Rocha, que foi fundada em 1994 e o Colégio Estadual Francisco da Conceição Menezes fundado em 1997. A Escola Estadual Governador Roberto Santos atende atualmente, o número aproximadamente de 1600 alunos distribuídos entre o Ensino Fundamental de 1ª a 8ª série, nos turnos matutino e vespertino; Projeto Regularização do Fluxo Escolar no vespertino e Educação de Jovens e Adultos no noturno. No que diz respeito ao aspecto pedagógico a Escola Estadual Governador Roberto Santos, enfrenta algumas dificuldades, uma vez que muitos alunos apresentam comportamento agressivo por falta de uma vida social e econômica melhor estruturada o que resulta no baixo desempenho, maior índice de repetência e um crescimento da evasão escolar, com maior incidência no noturno. Ainda no aspecto pedagógico continua a predominância no ensino, em alguns aspectos tradicionais, preocupados mais com o quantitativo sem levar em conta a qualidade. A Escola contém como grande parte de seu corpo docente, profissionais graduados, tendo alguns concluindo pósgraduações e mestrados, sendo responsáveis, assíduos e comprometidos com o processo educacional, mas há uma contradição por haver uma mão de obra qualificada e o ensino permanecer de uma forma tradicional, isso ocorre devido ao quadro de professores ser mantido com professores antigos na instituição, isto é, com muito anos de serviço no magistério. No campo pedagógico, conforme extraído do Projeto Político Pedagógico da Escola Estadual Governador Roberto Santos Ano 2008/2009, foram diagnosticados: baixa freqüência às aulas, empecilhos em estabelecer relação entre os conteúdos estudados com o dia-a-dia, sérias dificuldades para a resolução de problemas e atividades envolvendo raciocínio lógico, resistência à reflexão e prática de valores éticos, apatia e desinteresse pelos estudos resultantes da falta de estímulos dos familiares, falta de vínculo e identidade com a escola, baixa estima, baixo 45 desempenho nas avaliações da Prova Brasil, apresentado grandes dificuldades na absorção dos conteúdos em geral e resistência em perceber-se como agente do seu próprio conhecimento, dificuldade na oralidade e na escrita, boa participação nas atividades artísticas, esportivas. Quanto ao fator sócio-econômico e cultural da escola ele é constituído em grande parte por estudantes originários da comunidade da Timbalada, conhecida atualmente como Bairro Amazonas, clientela esta de baixa renda e baixa escolaridade, cujos pais estão desempregados, fazem “biscates” e os que trabalham muito tempo fora de casa, com jornada de trabalho intensa. Em conseqüência, os filhos administram sozinho, o rumo das suas vidas, sem acompanhamento dos pais. Pela falta de limites, desagregação familiar, descrença de uma justiça social, sérios problemas relacionados à bebida e outros entorpecentes, há um crescimento da indisciplina e o aumento da agressividade na escola. Toda essa situação gera muitos conflitos dentro da sala de aula, o que não acontecia tão intensamente, quando o ritmo de vida e a estrutura familiar era outra. Há uma maior valorização de bens de consumo, especialmente roupas e calçados de marca, que é forte entre os educandos, ocorre uma contradição diante destes fatos, conforme citado anteriormente através de Gade (1980), onde diz que o consumo dos jovens pertencentes à classe baixa possui uma forte preocupação em aparentar pertencer à classe média, adquirindo símbolos de status. Com relação à sua estrutura física e organizacional, a Escola “Robertinho” é considerada uma Escola de grande porte, possui quinze salas de aula, uma sala de vídeo, uma sala de leitura, uma sala de professores, uma quadra de esportes, uma sala de Direção, uma secretaria, uma cozinha com refeitório, quatorze sanitários, um arquivo, um depósito de merenda e um almoxarifado. A composição administrativa da Escola “Robertinho” é formada por uma diretora, três vice-diretores, três coordenadoras pedagógicas, uma secretária, quarenta e oito professores, vinte e oito funcionários e tem também um colegiado formado por representantes da direção, professores, pais, alunos e comunidade, não mantendo vinculo cooperativo com conselhos ou associações. Um ponto importante dentro da atual realidade da Escola Robertinho é a violência e indisciplina que tem afetado a mesma. É difícil visualizarmos relações afetivas entre os 46 alunos e muitas vezes isso tem se estendido aos professores e funcionários da mesma. O Robertinho parece que ficou desacreditado pelos estudantes que desconhecem a função e o papel social que a escola representa. Os estudantes se apresentam alheios a tudo isto, mostrando através dos seus atos que não tem perspectiva futura e parecem conformados em continuar sendo vitimas da exclusão social. (PENA e ATAÌDE, 2001). Sujeitos Os sujeitos da pesquisa são alunos do Colégio Estadual Governador Roberto Santos, que cursam a 3ª e 4ª séries do ensino fundamental, que se encontram na faixa etária de 10 a 14 anos, ou seja, alguns se enquadram fora do ciclo regular de aprendizado e em defasagem curricular de ensino. Como requisito para a participação seria necessário que os indivíduos soubessem ler e escrever, a fim de responder de forma autônoma o instrumento de pesquisa utilizado, isto é, questionário. Os sujeitos estão no período operatório concreto e no período operatório abstrato ou formal, que segundo Piaget: citado por Faria (1989) o período operatório concreto que se dá dos 7 aos 12 anos a criança é capaz de assimilar a acomodar objetos diversos, de construir sistemas de operações relativos à conservação das quantidades, às series, as classes, número, espaço etc. o pensamento torna-se verbalizado e os contatos sociais são facilitados. Nesta fase também, o individuo toma consciência das ações que sabe executar, isto é facilitado pelo choque de seu pensamento com o de outra pessoa e pelo esforço de reflexão que este choque provoca. O individuo domina a noção de conservação de quantidade e é capaz de ordenar elementos. Já o período operatório formal que vai dos 12 aos 16 anos o individuo começa a pensar sobre as proposições ou declarações feitas a respeito do conteúdo material, passa a raciocinar com base nas formas, isto é nos símbolos matemáticos ou esquemas verbais, incide também o raciocínio hipotéticodedutivo, que é a capacidade de pensar sobre o hipotético tanto quanto sobre o real, bem como a capacidade de deduzir conclusões e premissas hipotéticas. Neste período acontece a conquista da personalidade e de sua participação na sociedade adulta. A relevância de se definir os períodos de desenvolvimento da inteligência se encontra na necessidade de saber que, em cada período, o indivíduo passa a adquirir novos 47 conhecimentos ou estratégias para sua sobrevivência, compreensão e interpretação da realidade. Com base nessa informação é importante se conhecer bem o perfil dos sujeitos quanto à fase de desenvolvimento que se encontram e à capacidade de compreender as questões propostas para o bom desenvolvimento da pesquisa. Foram aplicados durante o processo trinta questionários, sendo que vinte e oito foram direcionados para os alunos da 4ª série e dois foram aplicados nos alunos da 3ª série, que se enquadram em sua maioria como integrantes do período operatório concreto em fase de transição para o abstrato. No que se refere esta pesquisa, ou seja, a intenção de explorar o potencial educativo das propagandas e programas de TV, analisando-os a fim de atingir os objetivos dessa investigação, as análises ocorreram por categorias elencadas, para o esclarecimento das questões que nortearam essa busca e pelos desenvolvimentos aqui apresentados. Ressaltamos que estas categorias surgem durante a análise dos dados. Instrumentos O instrumento utilizado nesta pesquisa foi o questionário, que é bastante útil para estudar o universo ou a amostra selecionada, pois de acordo com Richardson (1999), o questionário é uma forma de entrevista estruturada e exerce pelo menos duas funções: descrever as características e medir determinadas variáveis de um grupo social. O questionário utilizado em questão é o de perguntas abertas em que apresentam categorias livres e flexiveis de respostas. O entrevistado deve responder à alternativa que mais se ajusta às suas características, idéias ou sentimentos. Ao se aplicar o questionário, foi observado que houve dificuldade para quinze dos entrevistados ao responder às questões, pois na primeira questão, que se referia as propagandas e programas que mais gostavam na televisão, apareceram dúvidas no momento da análise, o que levou a supor que os sujeitos não entenderam a indagação. E depois observando melhor percebi que foram mal formuladas não atendendo as especificidades dos sujeitos que eram crianças e adolescentes de escola pública, tendo esses sujeitos grandes problemas de compreensão como já foi citado anteriormente. Assim, as questões que apresentaram esses problemas tiveram que ser retomadas 48 posteriormente em conversas informais com os sujeitos, a fim de esclarecer o que realmente queriam registrar. Os questionários (ver Apêndice) foram formulados com uma linguagem simples, de fácil compreensão, para que o leitor pudesse obter o entendimento dos questionamentos a serem resolvidos e poderem elaborar as respostas coerentes com suas realidades. As respostas dos sujeitos foram elaboradas nas seguintes categorias: alimentos, higiene pessoal, produtos de limpeza, veículos, bebidas, vestuário, tecnologia, acessórios, esportes, desenhos animados, programas, programas infantis, novela, jornalismo, brinquedos, lojas, filmes. No próximo tópico será apresentada a análise dos dados obtidos nos questionários de forma bastante detalhada e por categorias. Análise dos dados Segundo Ludke (1986) a tarefa de análise implica, num primeiro momento, à organização de todo material, dividindo-o em partes, relacionando essas partes e procurando identificar nele tendências e padrões relevantes. Como expõe Ludke é necessária à obtenção das informações e posteriormente a organização do material recolhido para que sejam definidos os elementos a serem analisados. Observando os dados será feita uma análise mais detalhada sobre as preferências dos sujeitos da pesquisa, sendo útil para a compreensão de como a vontade de consumir faz parte do cotidiano das crianças, a ponto de já elaborarem gostos diversos e muitas vezes fora da faixa de idade adequada para os mesmos. A seguir será apresentado os dados obtidos nos questionários de forma bem detalhada e por categorias. Para facilitar a compreensão dos dados os resultados foram ilustrados através de tabelas e gráficos. A primeira questão foi sobre programas e propagandas prediletos, sendo que nos programas prediletos foram obtidos os resultados demonstrados a seguir: 49 Figura 1.1 Resultado de programas prediletos. Programas prediletos 1 5 programas infantis programas de animação desenhos animados 10 3 novelas outros estilos todos os estilos 5 6 Os cinco sujeitos que estão na categoria outros estilos registraram os seguintes programas: esportes, filmes, jornalismo, novelas/desenhos e filmes/desenhos. Já na categoria de propagandas favoritas, foram obtidos os seguintes resultados: Figura 1.2 Resultado de propagandas prediletas. Propagandas prediletas 4 1 3 3 higiene pessoal produtos de lojas outros estilos todos os estilos não respondeu 10 8 não lembra não gosta 1 50 Os oito sujeitos que estão na categoria outros estilos registraram propagandas relacionadas com categorias: alimentos, filmes, produtos de limpeza, programas de animação, roupas, veículos, roupas/higiene, e veículos/bebidas. A primeira questão foi analisada sob a ótica de duas categorias: programas e propagandas prediletos. Acredito que isso dificultou a compreensão das crianças no que se refere às propagandas, tanto que 10 não responderam essa questão. Analisar estas preferências pode auxiliar o professor em suas aulas, além de aproximar-se de uma linguagem já conhecida pelos alunos, é necessário fazer com que os alunos tenham uma leitura mais apurada deste material, para poder entender essas mensagens veiculadas todos os dias para eles. Na segunda questão que foi sobre os produtos vistos em propagandas e que queriam comprar, foram obtidos os seguintes resultados: Figura 2. Resultado dos produtos vistos em propagandas. Produtos vistos em propagandas 4 tecnologia 11 5 higiene pessoal veículos brinquedos nenhum 2 outros produtos 4 4 Os quatro sujeitos que estão na categoria outros produtos registraram as seguintes propagandas com desenhos animados: acessórios, produtos de limpeza, vestuário e tecnologia/veículos. 51 Nesta questão houve um predomínio na categoria tecnologia, o que já era de se esperar, pois, é o que se destaca na atual sociedade de consumo do momento, e faz parte do desejo não só das crianças mais de adultos, e como já foi visto por Pietrocola (1986) a propaganda atua fortalecendo mais ainda à vontade de possuir os objetos, pois justamente incide sobre necessidades não satisfeitas. Mas para crianças carentes isso se torna um problema, pois o desejo de possuir esses bens é constantemente negados, devido às restrições da família e a criança tem que estar preparada para entender, o que muitas vezes isso não acontece, causando revoltas e frustrações, mas o ideal é que as crianças possam pensar soluções junto com os professores e a própria família e percebam esses problemas em uma esfera bem maior, isto é a sociedade passa por grandes desigualdades, problemas econômicos que dependem de vários setores da sociedade para ser reolvido. Na terceira questão investigamos se as crianças já viram propagandas com desenhos animados. Figura 3. Resultado das propagandas com desenhos animados. Propagandas com desenhos animados desenhos 8 11 programas infantis bebidas outros estilos 1 1 não lembra não soube explicar 4 2 3 não viu Os quatro sujeitos que estão na categoria outros estilos registraram as seguintes propagandas com desenhos animados: com jogadores de futebol, produtos de limpeza, 52 veículos/tecnologia, animais. Nesta alternativa 11 crianças confundiram a pergunta e colocaram os desenhos animados que mais gostavam, mais a intenção era investigar se realmente as propagandas com animação atingem mais esse público como a do Red Bull (ver Anexo 2) citado por um dos entrevistados. Com isso pode ser percebido que as crianças não conseguem distinguir as propagandas com animação dos próprios desenhos, isso se deve ao fato que a mensagem que a propaganda passa é mais importante que o produto em si, valendo mais o entretenimento e a distração, pois as crianças gostam mais de propagandas irreverentes, geralmente com humor e alegria. As oito crianças que disseram não ter visto, demonstram não compreender a questão proposta ou não conseguir associar com propagandas já vistas, isso implica que elas assistem as programações mesmo que não tenham capacidade de entender e assimilar seus conteúdos. Na quarta questão que interroga se já foi visto o assunto consumo na escola, foram obtidos os resultados expostos a baixo: Figura 4. Resultado do assunto consumo na escola. Consumo e escola 5 1 Sim. Na 3ª série Sim. Na 2ª série Não viu 24 Com isso pode ser analisado que 24 dos alunos não consegue compreender o que se refere ao tema consumo, o que acaba por gerar a falta de entendimento do mesmo. 53 Desse modo pode ser percebido que a escola onde foi realizado o questionário não se enquadra nos preceitos do PCN, que traz várias alternativas de se trabalhar o consumo na escola, como já foi exposto anteriormente no referencial teórico e também no próprio livro didático de Português dos alunos da terceira série, consta um capítulo que trata sobre o consumidor (Ver Anexo 3), então estes alunos já deveriam possuir o conhecimento sobre este assunto, por se encontrarem em uma série posterior a que foi trabalhado este tema. Então se faz necessário e urgente que os alunos compreendam o consumo na escola, para fornecer uma melhor visão econômica e social para que possam lidar com as demandas da sociedade que exige cidadãos cada vez mais preparados e conscientes de sua participação nos meios de consumo. Na quinta questão que diz respeito à execução de trabalhos envolvendo a utilização de propagandas, foi alcançado o resultado a seguir: Figura 5. Resultado de utilização de propagandas na escola. Propaganda e escola 1 Sim. Já fez Não fez 29 Somente um dos trinta entrevistados diz ter feito um trabalho com jornal sobre o assunto abordado e todos os outros disseram não ter feito trabalhos com a utilização de 54 propagandas. Podemos compreender que o tema está sendo pouco trabalhado nas escolas, ou pelo fato de não assimilarem o termo propaganda não o associando com o consumo. Sendo que já deveria ter sido trabalhado isto com os alunos, havendo o tema nos livros de terceira série, como já exposto na quarta questão. É perceptível essa falta de associação entre consumo e escola, deixando de passar a idéia que o fato de comprar alguma coisa é uma atividade de consumo, levando os alunos a dizerem que nunca viram algo relacionado ao termo, por não ficar transparente essa relação. E existem várias formas de se trabalhar com esse tema em sala de aula, a televisão é uma delas, além de poder ser explorado também em disciplinas como matemática, em problemas envolvendo compras de algum item. Na sexta questão sobre o horário em que assistem mais à televisão, houve o resultado exposto abaixo: Figura 6. Resultado do horário em que mais assiste TV. Horário que mais assiste TV 2 1 1 1 noite tarde 15 10 madrugada manhã manhã/noite tarde/noite Pelos resultados obtidos percebemos que as crianças não assistem somente os programas infantis, o que já era de se esperar, pois a grade de programação das emissoras atingem qualquer pessoa, de qualquer idade, que possa estar em casa a 55 qualquer hora do dia e da noite, daí cabe a família controlar e administrar esses horários, tais cuidados são importantes, pois alguns comportamentos são despertados muito cedo como, por exemplo, questões sexuais, e sem o devido amadurecimento podem trazer conseqüências graves. E devido ao fato das crianças estarem muito tempo sozinhas, por seus pais trabalharem, não existe um controle necessário para a absorção das informações produzidas pela televisão, sendo que assistem tudo aquilo que querem independente da classificação etária da programação. Na sétima questão que se refere a algum produto que queriam comprar, mas não tinham dinheiro, foi visto que: Figura 7. Resultado dos produtos que queriam comprar. Produtos e dinheiro 3 2 8 higiene pessoal brinquedos tecnologia 5 veículos outros produtos 6 nenhum 6 Os dois sujeitos que estão na categoria outros produtos registraram que queriam comprar: móveis e veículos/tecnologia. Nesta categoria pode ser analisado o desejo das crianças sobre o que almejam adquirir, mesmo que não possuam recursos no momento, pois elas estão inseridas na cultura de consumo e como tal, não pode ser ignorado o fato de que participam ativamente do mercado consumidor. Sendo assim, vai implicar no aprendizado que deve existir em relação à economia, até para que 56 essas crianças ajudem seus pais e entendam mais expressivamente as questões de exclusão existentes no país e as conseqüências que isso tem na vida das pessoas. Na oitava questão sobre como faziam para comprar produtos que gostam, os entrevistados responderam que: Figura 8. Resultado do que fazem para comprar produtos que gostam. Produtos e compra 1 1 1 pede dinheiro 4 10 junta dinheiro compra iria trabalhar fica alegre 6 não faz nada 7 não respondeu De acordo com os resultados obtidos verificamos que dez dos entrevistados pedem dinheiro aos pais o que demonstra a participação das crianças nas decisões de compra. E como já foi visto antes na reflexão teórica, isso é muito comum, as crianças escolhem desde cedo o que querem comprar e muitas vezes influenciam os pais, para que estes satisfaçam as suas vontades por meio de chantagens emocionais e psicológicas. Sete dos entrevistados disseram que juntariam dinheiro para comprar, o que demonstra a capacidade de compreender que é necessário um esforço próprio para se obter o que se deseja, sem necessariamente depender da realização da compra por parte dos pais, que muitas vezes negam a fazer os anseios dos filhos, por restrições econômicas. Quanto as quatro, que disseram que trabalhariam para conseguir comprar o que 57 queriam, o que demonstra mais ainda a necessidade de debater sobre trabalho e consumo na escola. Na nona questão que se referiu ao que sentiam quando não conseguiam comprar algum produto que gostassem, foram obtidas as seguintes informações: Figura 9. Resultado do que sentem quando não compram o que querem. Estado emocional/Compra não realizada 1 1 1 1 fica triste se acomoda/aceita se chateita 7 se esforça juntando dinheiro 19 insiste fica alegre Com os resultados obtidos podemos perceber que dezenove dos entrevistados demonstram sentir tristeza por não conseguirem o que querem, o que os leva a procurar meios de se obter os produtos, e evidencia as desigualdades existentes pela classe econômica em que foi aplicada a pesquisa e que ocorre muitas vezes a frustração por não ver o desejo realizado, e esse contexto precisa ser analisado por eles mesmos para que possam entender e possam construir uma cidadania mais justa. 58 CONSIDERAÇÕES FINAIS Este estudo estabelece a tentativa de compreender e extrair o que pode ser produtivo em relação à educação nas propagandas e programas de televisão de uma escola pública. Para isso procurou-se atingir os objetivos propostos anteriormente, primeiramente através de uma reflexão teórica trazida sobre o histórico do consumo, as formas que ele se apresenta e suas implicações na sociedade, e como pode ser percebido pelos indivíduos integrantes desse meio consumista, principalmente com relação às propagandas que procuram se voltar ao que elas necessitam e desejam, assim absorveu-se que o meio em que residem está plenamente envolvido pelo capitalismo. Analisou-se também os programas e as propagandas voltadas principalmente para as crianças, e foi verificado que possuem um foco maior direcionado ao consumo, desde uma programação infantil até a voltada ao público no horário normal de adultos que em síntese é vista por todos que se prendem a grade de programas da TV, e em seguida o papel que a escola e o professor devem ter diante da formação do jovem consumidor, nesse debate verificamos o quanto é importante o jovem ter acesso a esse assunto em decorrência da sociedade que é desigual e excludente, tornando essencial que a escola busque se renovar com relação às questões de consumo, procurando atualizar seus professores, realizando palestras sobre o tema e reunindo informações pertinentes para a maior conscientização com relação ao consumo. Procurou-se estabelecer relação com as questões propostas, para a análise do tema, nas quais viu-se necessário identificar quais os serviços e produtos mobilizam mais o desejo de consumo dos sujeitos investigados e sua categorização, foi obtido o resultado no questionário aplicado anteriormente para se avaliar os pontos levantados, em que foi visto que os entrevistados preferem produtos voltados à área tecnológica e para a higiene pessoal, que demonstra uma maior preocupação em se manter atualizados em relação aos avanços da tecnologia e também pelo fato de ser um dos pontos mais ressaltados nas propagandas para o público em geral, e se preocupam com relação aos cuidados pessoais e a aparência que é ressaltada pelo mercado televisivo, como um meio de inclusão social, pois é transmitido que é necessário ter um bom biótipo para 59 ser aceito na sociedade, ou seja, é necessário que se possua produtos que lhe façam melhor do que já é. Procurou-se estabelecer relações entre o consumo e a escola, em que foi percebido que os entrevistados não compreendem o assunto consumo com o que é estudado e por vezes dizem que nunca viram este tema na escola, gerando assim um conflito de idéias, pois absorvem situações em que o consumo reside, mas não conseguem relacioná-lo com o dia-a-dia, o que torna necessário uma maior preocupação em conscientizá-los e fazê-los conhecedores do consumo como um dos meios de produção social e saber lidar com as formas de apelo comercial nas propagandas que se voltam a este tema. A escola deve se concentrar na criação de condições de desenvolvimento das habilidades das crianças, para que adquiram condições para serem independentes nas suas escolhas e contribuam para firmar os alicerces de uma sociedade mais consciente e melhor preparada para as necessidades que surgem com relação ao seu público. Os indivíduos podem assim conhecer e debater sobre as formas de realização do consumo, procurando compreender as suas relações, contradições e os associados ao mesmo, conseguindo obter a sua auto-imagem positiva e sendo crítico no que diz respeito à forma de ação de uma melhor distribuição da renda social. O tema traz em caráter de urgência a necessidade de abranger as demandas sociais de aprendizagem desde o ensino fundamental para uma maior participação dos educandos nas mutações sociais. Assim o consumo tem um potencial educativo muito grande e precisa ter uma inclusão maior na sala de aula, já que é possivel explorar bastante deste material. Levantou-se junto às crianças quais as estratégias que utilizam para adquirir esses serviços e bens, que se levou a perceber que os entrevistados procuram adquirir os recursos para a aquisição dos produtos, pedindo aos pais o dinheiro para comprar, ou juntando o dinheiro que vão ganhando aos poucos, até conseguirem a quantidade que necessitam. Demonstrando assim um conhecimento com relação às práticas de consumo, mesmo que não saibam defini-lo como tal, e possuem uma capacidade de saber quando é necessário procurar formas de realizar a sua vontade de consumir determinado produto, quando este não se encontra na sua realidade aquisitiva. Isso então evidencia a necessidade de ser exposto e discutido este assunto na escola, para 60 que percebam a importância de terem um conhecimento mínimo em relação ao assunto. E foram propostos mecanismos pedagógicos para leitura crítica dessas imagens, como o trabalho com a televisão que se encontra amplamente envolvida com o tema, o computador que se relaciona com as novas mídias e as novas formas de se atingir o público, e de se obter um maior conhecimento sobre o referido assunto, a análise da linguagem exposta nos comerciais de forma que persuade o indivíduo, os códigos que possuem as formas de proteção ao consumidor. Sendo possível utilizar projetos que procurem estimular trabalhos em equipe e individuais, com relação a situações de compra ou uso de serviços, e a utilização de materiais que assessorem como um recurso didático como no caso de embalagens, textos literários, etc. Por fim a pesquisa se mostra importante para a relação do consumo com a escola, que se faz claro a partir do tema proposto e dos objetivos alcançados durante a elaboração. Sendo possível um maior aprofundamento sobre o tema desenvolvido, num posterior trabalho sobre o mesmo, tendo este como base teórica. . 61 REFERÊNCIAS ANDRADE, Mário Margarida de. Introdução à Metodologia do Trabalho Científico. São Paulo. 6. ed. Atlas, 2003. ARAÙJO, Alany. Artigo TV Escola. Disponível em: http://juquinha10.blogspot.com/2007/12/artigo-tv-e-escola.html. Acesso 02 de abr. de 2008. ASSIS, Regina e TAVARES, Marcus. A criança e a tevê no Brasil. 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Acesso 10 de dez. de 2007. 64 APÊNDICE Dados de identificação Nome____________________________________________________ Idade:_____________ Série:_____________ Endereço:___________________________________________________ Escola:______________________________________________________ Questionário 1- Quais propagandas e programas você mais gosta na televisão? ______________________________________________________________________________ ______________________________________________________________________________ 2- Que produtos você viu nas propagandas e gostaria de comprar? ______________________________________________________________________________ 3- Você já viu alguma propaganda com desenho animado? Qual? 4- Na sua escola você já viu o assunto consumo? Se já em que série? ______________________________________________________________________________ 5- Já fez algum trabalho na escola utilizando propagandas? Se já quais foram? ______________________________________________________________________________ 6- Que horas você mais assiste televisão? ______________________________________________________________________________ 7- Diga alguns produtos que você gostaria de comprar, mas não tem dinheiro? 8- Como você faz para comprar algum produto que gostaria? 9- Como você fica quando não consegue comprar um produto que tanto gostaria? _____________________________________________________________________________ 65 ANEXOS 66 ANEXO 1 – PROPAGANDA DO RED BULL 67 ANEXO 2 – PROPAGANDA DO MC LANCHE FELIZ MC LANCHE FELIZ MARÇO 2008: I-DOG (BRINDES) 68 ANEXO 3 – CAPÍTULO DO LIVRO SOBRE CONSUMO 69 70