A
EXMO SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA 1 VARA CÍVEL DA COMARCA DE LIMEIRA – SP.
PROCESSO Nº 1023/02
ASSOCIAÇÃO DOS MORADORES DO PARQUE RESIDENCIAL BELINHA OMETTO, já qualificada nos autos da ação civil
pública que move contra ÁGUAS DE LIMEIRA S/A, também qualificada, vem, por seus advogados que ao final
assinam, respeitosamente perante este Digno Juízo apresentar sua RÉPLICA a contestação proposta nos seguintes
termos:
DA NÃO NECESSIDADE DE COMPLEMENTAÇÃO DO PÓLO PASSIVO
Tal denunciação da lide pretendida pela requerida não se coaduna aos fatos acontecidos bem
como fere frontalmente a Lei 8.9887/95 em seu art. 25 e o Edital N. 68/94, item 9 conforme será a
seguir demonstrado:
Por ocasião da assinatura do contrato entre a Águas de Limeira S/A e a Prefeitura Municipal firmado em meados de
1995, a multa de mora decorrente do inadimplemento ERA DE 10% , portanto, perfeitamente legal e válido o artigo
68 do Capítulo XXII do Contrato de concessão – “Das infrações e penalidades” até a data de 31/07/1996 ( transcrito
pela requerida a fls. 105). Deixou de ser legal e válido a partir da publicação da Lei Federal n. 9.298, de 01/08/1996
que alterou o artigo 52, parágrafo primeiro reduzindo a multa de 10% para 2%.
Vale dizer então, que o contrato quando de sua assinatura estava sem vicio, ao menos, quanto a esse aspecto
pontual, ou seja, previsão de multa moratória de 10%.
A requerida deveria, isto sim, ter se adequado e reduzido a multa para os legais 2% a partir da lei 9.298/96, diga-se
ainda que nem precisava de aditamento ao contrato, bastaria tão somente cumprir a lei.
Ante esse fato a Prefeitura Municipal em nada tem que indenizar a requerida, até porque, quem recebeu e “gastou”
o dinheiro indevidamente arrecadado foi a própria requerida e não a Prefeitura Municipal. Se assim fosse, o
consumidor de água que pagou as multas indevidas teria que paga-las novamente. Sim! Pois o poder público não
GERA recursos e tão somente TRANSFERE recursos, através da arrecadação de tributos pagos pelos cidadãos
consumidores de água.
Se pelo prisma fático a denunciação da lide deve ser improcedente, pela análise das normas jurídicas o resultado
não será diferente como veremos:
A LEI 8.987, DE 13 DE FEVEREIRO DE 1995 que dispõe sobre o regime de concessão e permissão da prestação
de serviços públicos previsto no art. 175 da Constituição Federal, e dá outras providências diz em seu artigo 25
que cabe ao concessionário executar em seu nome e por sua conta e risco as obras e os serviços que lhe foram
concedido, ASSUMINDO A INTEIRA RESPONSABILIDADE PELAS CONSEQUÊNCIAS QUE SEUS ATOS
CAUSAREM NÃO SÓ AO PODER CONCEDENTE, MAS AOS USUÁRIOS OU A TERCEIROS EM GERAL,
INDEPENDENTEMENTE DA FISCALIZAÇÃO EXERCIDA PELO PODER PÚBLICO.
Art. 25. Incumbe à concessionária a execução do serviço concedido, cabendo-lhe responder
por todos os prejuízos causados ao poder concedente, AOS USUÁRIOS OU A TERCEIROS, sem
que a fiscalização exercida pelo órgão competente exclua ou atenue essa responsabilidade. (
grifado)
Não é de outra maneira os dizeres do EDITAL N. 68/94 CONCORRÊNCIA PÚBLICA N. 07/94 ANEXO I MINUTA DE
CONTRATO DE CONCESSÃO CLÁUSULA QUINTA – OBRIGAÇÕES DA CONCESSIONÁRIA – ITEM 9
(....)
9. responsabilizar-se por todos os danos e prejuízos de
QUALQUER NATUREZA causados à PREFEITURA
MUNICIPAL e/ou A TERCEIROS, face à sua AÇÃO
OU
OMISSÃO,
ou
de
seus
empregados,
subcontratados e prepostos, decorrentes dos serviços
ora concedidos; ( grifado) fls. 175
Também no contrato de concessão a requerida se comprometeu em seu item “h” “RESPONDER ISOLADAMENTE
PELO INTEGRAL CUMPRIMENTO DAS REGULAMENTAÇÕES VIGENTES NO PAÍS, em especial (.....) fls. 194
No mesmo contrato em seu item “i” se extraí que a requerida “responsabilizar-se ISOLADAMENTE POR TODOS OS
DANOS E PREJUÍZOS DE QUALQUER NATUREZA, inclusive relativos ao meio ambiente, causados ao poder
concedente e/ou a TERCEIROS, em razão de ação ou omissão” (......) fls. 194.
Não se diga que não houve a redução de 10% para os 2% por desconhecimento de tal subordinação ao código do
consumidor. Não! Sabia e muito bem, pois assinou o contrato de concessão se comprometendo em cumprir o que
estabelece a Lei 8.078/90 CDC. Pode-se verificar à cláusula Nona do contrato – DOS DIREITOS E DEVERES DOS
USUÁRIOS, juntado pela própria requerida a fls. 199 que se transcreve:
CLAUSULA ESSA QUE VEIO RATIFICAR O ARTIGO 7 DA LEI 8.987/95 “concessão de serviços públicos”
“SEM PREJUÍZO DO DISPOSTO NA LEI 8.078/90,
esta concessão respeitará os direitos e deveres dos
usuários, quais sejam:” fls. 199
Ora Ora! Tanto alarde por parte da requerida em afirmar que não está submetido ao Código do Consumidor e
assina um contrato se comprometendo a cumprir o disposto na referida Lei? Esta aí, não foi o requerente que
juntou tal documento e sim a própria requerida. Foi omissa em não se adaptar à nova regra do CDC e por isso deve
devolver o arrecadado indevidamente conforme o artigo 42 do mesmo CDC.
Conclui-se que o Poder Público ( prefeitura municipal) não deve fazer parte do polo passivo desta ação civil pública
pelos motivos acima aduzidos. Entretanto se a requerida, ainda assim, se sentir lesada terá a possibilidade de
adentrar com ação regressiva contra o Poder Público conforme prevê o CDC.
DAS PRÁTICAS ABUSIVAS
Neste ponto é necessário abrir um parêntese, pois tal assunto que ora passaremos a tratar transborda os limites
desta ação civil indo as raias do crime. Oportuno entretanto uma vez que esta ação passa pelo crivo do Ministério
Público que funciona como fiscal da lei podendo caso vislumbre ilícito penal tomar as devidas providências.
Na contestação apresentada pela requerida ela diz nas fls 105 último parágrafo que:
“De um lado isto gerou para Águas de Limeira uma expectativa de faturamento e, de outro
lado, tendo em vista que a multa compõe parte da receita financeira auferida pela
Concessionária, implicou a obrigação do Poder Concedente manter o equilíbrio econômicofinanceiro do contrato de concessão.
Disso decorre a seguinte dedução: se a responsabilidade do Poder Concedente não é total
neste caso, donde decorreria eventual ilegitimidade passiva da ora Peticionária, ao menos
ela se apresenta de modo parcial, pois a devolução dos valores já quitados deve ser efetuada
pelo Poder Concedente sob pena de se quebrar a equação do contrato de concessão firmado
entre ambos.”
Para a requerida denunciar a Prefeitura ( poder concedente) na lide é porque entende que a multa cobrada pelo
atraso de pagamento nas contas de água é uma forma de aumentar seu faturamento ( tarifa), demonstrando um
verdadeiro desvio de finalidade, pois aumenta por via obliqua a tarifa sem autorização expressa do poder
concedente e pelas vias legais a tarifa do serviço de fornecimento d’água em uma verdadeira caracterização do
CONFISCO. Se analisarmos esta declaração de modo isolado poderá ficar no campo da retórica, entretanto existe
outra componente que vem confirmar que a multa realmente é para aumentar receita. É de conhecimento de todos
que as datas oferecidas pela requerida para pagamento da tarifa, principalmente para as pessoas que moram em
bairros periféricos não atendiam as necessidades dos consumidores. Tais datas eram fornecidas nos seguintes dias;
31, 01, 02, 03, 04, 05 de cada mês. Ocorre que a maioria destas pessoas recebem seus pagamentos no quinto dia
útil de cada mês, que na esmagadora maioria das vezes quinto dia útil não é dia cinco e sim dia seis em diante. Por
óbvio então, que estas pessoas eram obrigadas a pagar com alguns dias de atraso, acabando desta forma a gerar
um aumento de faturamento e por conseqüência um aumento de sua receita financeira. Esta atitude, senão é ilegal,
ao menos é imoral.
Por certo a requerida vem exigindo do usuário (consumidor) vantagem excessiva quando impõe que os dias de
o
pagamentos fiquem adstritos somente durante a semana e não do mês como prevê o art. 7 A:
Art.7 A – As concessionárias de serviços públicos, de direito público e privado, nos Estados e no Distrito Federal, são
obrigadas a oferecer ao consumidor e ao usuário,
dentro do mês de vencimento, o mínimo de seis
datas opcionais para escolherem os dias de
vencimento de seus débitos. ( Artigo incluído
pela Lei n. 9.791, de 24.03.99)
O referido artigo é muito claro, onde as datas devem ser distribuídas “dentro do mês de vencimento” e não da
semana. Com este comportamento a Requerida vem praticando prática Abusiva que o CDC proíbe através de seu
o
art. 39 “É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas:” – Inciso V – “exigir do
consumidor vantagem manifestamente excessiva”.
o
o
Ao adotar uma multa moratória muito superior ao legal (art. 52 , páragrafo 1 ) também fere o mesmo artigo 39 em
seu inciso XI – “aplicar fórmula ou índice de reajuste diverso do legal ou contratualmente estabelecido;” (acrescido
pela lei 9.870/99)
Além do mais, como se percebe pela redação do parágrafo primeiro e do art. 42 – “Na cobrança de débitos o
consumidor inadimplente não será exposto a ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou
ameaça.”, a objeção da lei 8.078/90 resume-se nos excessos cometidos pelo requerido (fornecedor), no afã de
receber aquilo de que se diz credor, em atitude abusiva.
o
Por isso, é que o art. 42, 52 do CDC e art. 7 A da Lei 8.987/95 deve ser lido em conjunto com o disposto no artigo
71 do próprio Código, que diz expressamente:
“Art. 71. Utilizar, na cobrança de dívidas, de ameaça, coação, constrangimento físico ou
moral, afirmações falsas, incorretas ou enganosas ou de qualquer outro procedimento que
exponha o consumidor, injustificadamente, a ridículo ou interfira com seu trabalho,
descanso ou lazer:
Pena – Detenção de 3 (três) meses a 1 (um) ano e multa
DO MÉRITO
Alega a requerida em sua contestação que “Da inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor ao caso
concreto” (fls. 108 item 1), bem como alega ainda sendo impossível “aplicação do CDC às CONCESSIONÁRIAS DE
SERVIÇOS PÚBLICOS”( fls. 110, item 2), pelo fato que o “regime de direito público, que não se confunde com os
regimes jurídicos que regulam as relações entre particulares ( leia-se entes de natureza privada) e que deve
sempre privilegiar o interesse público e a prestação de um serviço adequado à toda a coletividade.”( fls. 111).
Após transcrever vários trechos doutrinários conclui que “é de solar evidência que a concessionária de serviço
público não se submete à legislação de defesa do consumidor e o que implica a improcedência da presente ação
civil pública, sob pena de se atentar contra todo um sistema jurídico administrativo” ( fls. 113).
Também rechaça a aplicação do artigo 52 parágrafo 1 do CDC por “não se aplica às concessionárias de serviço
público como é a Águas de Limeira S/A, mas tão somente às empresas que se prestam ao fornecimento de produtos
ou serviços que dependam de outorga de crédito ou concessão de financiamento ao consumidor. Efetivamente não
é este o caso em comento” (fls. 108).
A requerida lamentavelmente tem uma visão completamente distorcida da realidade jurídica de nosso País. Por ser
uma Empresa de origem européia, para ser mais exato, Francesa, deveria nos dar um banho de “civilização de
primeiro mundo”, entretanto continua sendo igual a outros países que aqui estiveram 500 anos atrás.
DA LEGISLAÇÃO
A lei 8.987/95 a que também se submete a requerida dispõe sobre o regime de concessão e permissão da prestação
de serviços públicos previsto no artigo 175 da Constituição Federal, conforme esclarece sua ementa. O citado artigo
prescreve que “incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão,
o
sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos”. Já, o art. 6 , deixa claro que a requerida não esta
somente submetida por esta lei em específico mas também a outras normas pertinentes, ou seja:
º
Art. 6 Toda concessão ou permissão pressupõe a prestação de serviço adequado ao pleno
atendimento dos usuários, conforme estabelecido nesta Lei, NAS NORMAS PERTINENTES e
no respectivo contrato (grifado).
o
A referência e submissão ao CDC vem expresso no artigo 7 7A, da mesma Lei no Capítulo III – DOS DIREITOS E
OBRIGAÇÕES DOS USUÁRIOS que diz:
o
Art. 7 Sem prejuízo do disposto na Lei n. 8.078, de 11 de setembro de 1990, são direitos e
obrigações dos usuários:
Art.7 A – As concessionárias de serviços públicos, de direito público e privado, nos Estados e no Distrito Federal, são
obrigadas a oferecer ao consumidor e ao
usuário, dentro do mês de vencimento, o
mínimo de seis datas opcionais para escolherem
os dias de vencimento de seus débitos. ( Artigo
incluído pela Lei n. 9.791, de 24.03.99) (grifado)
Pode-se notar até agora que a própria Lei 8.987/95 que é posterior a lei do CDC respeitou e adotou o Código do
Consumidor como norma a ser seguida pela Concessionária ou Permissionária. Não poderia ser diferente pois o
artigo 22 do CDC é expresso em dizer que:
Art. 22. Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma
de empreendimento, são obrigados a fornecer
serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto
aos essenciais, contínuos.
Parágrafo único. Nos casos de descumprimento, total ou parcial, das obrigações referidas
neste artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas a cumpri-las e a reparar os danos
causados, na forma prevista neste Código.
O código do Consumidor em nenhum momento descuidou da importância dos Serviços Públicos em relação aos
o
consumidores que é a parte fraca da relação. Tanto foi assim que em seu artigo 6 , item X que tal serviço devesse
ser adequado e eficaz.
o
Art. 6 São direitos básicos do consumidor:
..........
X – a adequada e eficaz prestação dos serviços públicos em geral.
Deixando claro inclusive em seu art. 3o que “fornecedor”, também é pessoa “física ou jurídica, PÚBLICA ou
privada” (grifado)
Art. 3o Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou
estrangeira,”(....) (grifado)
Também o art. 4o do CDC no Capítulo II – DA POLÍTICA NACIONAL DE RELAÇÕES DE CONSUMO em seu
item VII determina como princípio a “racionalização e melhoria dos serviços Públicos”
Art. 4o A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das
necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de
seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e
harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios:
(....)
VII – racionalização e melhoria dos serviços públicos.
Com todas essas normas jurídicas exposta não resta dúvida que a Requerida como prestadora de serviço público
ESSENCIAL está submetida de forma insofismável ao Código de Defesa do Consumidor.
Não tem sido diferente o entendimento do Superior Tribunal de Justiça que serviço público é subordinado ao
Código de Defesa do Consumidor. A título de demonstração anexaremos apenas três ementas do Superior Tribunal
de Justiça onde a primeira demonstra muito bem que a Concessionária de Fornecimento de Água está submetida ao
CDC, inclusive tendo que devolver o indébito com base no artigo 42 do CDC. O segundo trata-se também de uma
fornecedora de água e a terceira uma prestadora de serviço público de energia Elétrica:
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Acórdão RESP 263229 / SP ; RECURSO ESPECIAL 2000/0058972-1 Fonte DJ DATA:09/04/2001
PG:00332 JBCC VOL.:00190 PG:00245 Relator Min. JOSÉ DELGADO (1105)
Ementa
ADMINISTRATIVO. EMPRESA CONCESSIONÁRIA DE FORNECIMENTO DE
ÁGUA.
RELAÇÃO DE CONSUMO. APLICAÇÃO DOS ARTS. 2º E42, PARÁGRAFO
ÚNICO, DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR.
1. Há relação de consumo no fornecimento de água por entidade concessionária desse
serviço público a empresa que comercializa com pescados.
2. A empresa utiliza o produto como consumidora final.
3. Conceituação de relação de consumo assentada pelo art. 2º, do Código de Defesa do
Consumidor.
4. Tarifas cobradas a mais. Devolução em dobro. Aplicação do art.42, parágrafo único, do
Código de Defesa do Consumidor.
5. Recurso provido.
Data da Decisão 14/11/2000
Órgão Julgador T1 - PRIMEIRA TURMA
Decisão
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da Primeira Turma do
Superior Tribunal de Justiça, prosseguindo no julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro
Francisco Falcão acompanhando o Relator, por unanimidade, dar provimento ao recurso, nos
termos do voto do Sr. Ministro Relator.
Votaram de acordo com o Relator os Srs. Ministros Francisco Falcão e Humberto Gomes de
Barros. Ausentes, justificadamente, os Srs. Ministros Garcia Vieira e Milton Luiz Pereira.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Acórdão RESP 122812 / ES ; RECURSO ESPECIAL 1997/0016898-0 Fonte DJ DATA:26/03/2001
PG:00369 JBCC VOL.:00189 PG:00442 LEXSTJ VOL.:00143 PG:00104 RJADCOAS VOL.:00024
PG:00042 Relator Min. MILTON LUIZ PEREIRA (1097)
Ementa
Corte no fornecimento de água. Inadimplência do consumidor.
Ilegalidade.
1. É ilegal a interrupção no fornecimento de energia elétrica, mesmo que inadimplente o
consumidor, à vista das disposições do Código de Defesa do Consumidor que impedem
seja o usuário exposto ao ridículo.
2. Deve a concessionária de serviço público utilizar-se dos meios próprios para receber os
pagamentos em atrasos.
3. Recurso não conhecido.
Data da Decisão 05/12/2000 Órgão Julgador T1 - PRIMEIRA TURMA Decisão
Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas:
Decide a egrégia Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, não
conhecer ao recurso, nos termos do voto do Senhor Ministro Relator, na forma do relatório e
notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado. Votaram de acordo com o Senhor Ministro Relator os Senhores Ministros José
Delgado e Francisco Falcão. Ausentes, justificadamente, os Senhores Ministros Garcia Vieira
e Humberto Gomes de Barros. Presidiu o julgamento o Senhor Ministro José Delgado.
Custas, como de lei.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Acórdão RESP 353796 / MA ; RECURSO ESPECIAL 2001/0128309-3 Fonte DJ
DATA:04/03/2002 PG:00209 Relator Min. JOSÉ DELGADO (1105)
Ementa
DIREITO DO CONSUMIDOR. ENERGIA ELÉTRICA. INTERRUPÇÃO DO
FORNECIMENTO. ARTS. 22 E 42, DA LEI Nº 8.078/90 (CÓDIGO DE PROTEÇÃO E
DEFESA DO CONSUMIDOR).
1. Recurso Especial interposto contra Acórdão que entendeu ser ilegal o corte de
fornecimento de energia elétrica, em face do não pagamento de fatura vencida.
2. O art. 22, do Código de Proteção e Defesa do Consumidor, assevera que "os órgãos
públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra
forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e,
quanto aos essenciais, contínuos". O seu parágrafo único expõe que "nos casos de
descumprimento, total ou parcial, das obrigações referidas neste artigo, serão as pessoas
jurídicas compelidas a cumpri-las e a reparar os danos causados na forma prevista neste
código".
3. Já o art. 42, do mesmo diploma legal, não permite, na cobrança de débitos, que o devedor
seja exposto ao ridículo, nem que seja submetido a qualquer tipo de constrangimento ou
ameaça.
4. Caracterização do Periculun in mora e do fumus boni iuris para sustentar deferimento de
ação com o fim de impedir suspensão de fornecimento de energia a uma empresa.
5. Juízo emitido no âmbito das circunstâncias supra-reveladas que se prestigia.
6. Recurso Especial improvido.
Data da Decisão 11/12/2001 Órgão Julgador T1 - PRIMEIRA TURMA
Decisão Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas,
acordam os Ministros da PRIMEIRA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, por
unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os
Srs. Ministros Francisco Falcão, Luiz Fux, Garcia Vieira e Humberto Gomes de Barros votaram
com o Sr. Ministro Relator.
o
DO ARTIGO 52 PARÁGRAFO 1 DO CDC
Demonstrado a pertinência do CDC nos serviços públicos em especial o serviço prestado pela requerida,
passaremos a demonstrar a incidência do artigo 52 parágrafo primeiro no caso em tela.
o
Alega a requerida que o artigo 52 parágrafo 1 , não se aplica às concessionárias de serviço público mas tão
somente às empresas fornecedoras que dependam de outorga de crédito ou concessão de financiamento ao
consumidor.
Para tanto citou “autores do Anteprojeto do Código de Defesa do Consumidor” (fls. 109), sendo que no caso
específico o autor é Nelson Nery Júnior conforme nota 2 de fls 109. Ocorre entretanto que somente transcreveu a
primeira parte do texto, ou seja, a parte que por óbvio lhe interessava.
a
Mas, continuando com o mesmo autor e na mesma obra, sendo que em sua 7 edição a página 558 cujo título é
MULTA MORATÓRIA tem-se o seguinte:
“[8] MULTA MORATÓRIA – Ao primeiro exame pode parecer que o Código tenha admitido
somente a cláusula penal moratória, para a ocorrência da mora nos contratos de crédito ou
financiamento ao consumidor. Todavia, não existe proibição para que se estipule pena para
o inadimplemento da obrigação ( cláusula penal compensatória). Essa “multa” de que fala
o dispositivo é, em verdade, pena convencional.
Em sua redação originária, o dispositivo comentado fixava o valor de 10% do total da
prestação como teto para as penas decorrentes da mora. A lei 9.298/96, publicada do DOU
de 2.8.96, p. 14.457, modificou a redação do parágrafo, reduzindo a multa de 10 para 2%. O
NOVO PERCENTUAL APLICA-SE A TODOS OS CONTRATOS DE CONSUMO. O Banco Central
do Brasil editou a Circular n. 2.754, de 7.5.97 (DOU de 8.5.97), que manda aplicar a norma
sob exame aos consórcios.
A disposição legal ora comentada não impede a fixação de cláusula penal compensatória,
nem limita o direito do fornecedor de haver perdas e danos do consumidor.
Além da multa moratória (cláusula penal moratória), podem ser cobrados, cumulativamente
com ela, os juros de mora, porque legalmente devidos e exigíveis ( art. 1062, Código Civil),
ainda que não pactuados expressamente.
A cláusula penal, quando estipulada para o inadimplemento da obrigação (cláusula penal
compensatória), não enseja possibilidade de exigência cumulativa de perdas e danos,
porque considerada como substituta da indenização. Quando fixada para o caso de mora no
cumprimento da prestação ( cláusula penal moratória), poderá o fornecedor exigir o
cumprimento da obrigação juntamente com a pena, como indenização pelos prejuízos
resultantes da mesma mora ( art. 919, Código Civil).
RESUMINDO, PODE SER PACTUADA CLÁUSULA DA QUAL CONSTE PENA MORATÓRIA
(CLÁUSULA PENAL MORATÓRIA), QUE NÃO EXCEDERÁ 2% DO VALOR DA PRESTAÇÃO;
exigível cumulativamente com os juros da mora, que decorrem de lei (art. 1.062, do Código
Civil); sem prejuízo de eventuais perdas e danos que serão suportados pelo consumidor em
mora.
O OBJETIVO DA NORMA FOI LIMITAR A CLÁUSULA PENAL MORATÓRIA A 2% DO VALOR DA
PRESTAÇÃO, NÃO SENDO APLICÁVEL AOS CONTRATOS DE CONSUMO O ART. 920 DO
CÓDIGO CIVIL, QUE ESTABELECE O MÁXIMO DA CLÁUSULA PENAL COMO SENDO O VALOR
DA PRESTAÇÃO. (GRIFADO)
Mesmo utilizando a doutrina trazida pela Requerida não autoriza interpretar o art. 52 somente para fins de
contratos que envolvam crédito do tipo mútuo, cartão de crédito e assim por diante e muito menos se utilizar do
artigo 920 do Código Civil como quer a requerida a fls 104:
“E se não há regra especial prescrevendo uma determinada conduta dos sujeitos de direito nestas circunstâncias,
aplica-se a regra geral veiculada pelo artigo 920
do Código Civil ainda em vigor” (......) fls. 104.
Se ainda existe interpretação semelhante a da Requerida quanto a abrangência do art. 52 do CDC é porque se
enxerga o direito de forma superficial cujo horizonte colide com o próprio nariz.
o
o
A aplicação do artigo 52 , parágrafo 1 , é pertinente por várias razões. A requerida fornece o produto água. Se a
água na “fonte” não é produto, o é por ocasião de seu tratamento que inclusive é inserido cloro e outros
componentes químicos bem como é encanada até o consumidor. Água encanada é produto! Como dito na inicial A
requerida ao entregar a água encanada ANTECIPADAMENTE a uma contraprestação futura que é o pagamento do
fornecimento no dia aprazado pratica uma “outorga de crédito”. Tanto é assim que se o consumidor não pagar sua
conta, seu CRÉDITO é cortado e após é determinado a suspensão do serviço de fornecimento do precioso liquido.
Para o retorno do fornecimento de água é preciso que o consumidor restabeleça SEU CRÉDITO, PAGANDO PELO (S)
VALOR ATRASADO.
Tal suspensão é previsto no contrato em sua Cláusula Nona – Dos direitos e deveres dos usuários em seu item “g”:
(fls. 199)
g) pagar em dia as contas relativas à prestação dos serviços concedidos, sob pena de pagar multa E TER OS
SERVIÇOS SUSPENSOS, conforme previsto no
Regulamento de Comercialização, que constitui
o Anexo V e integra este instrumento.
Anexo V, art. 48 – O abastecimento de água do CLIENTE, será interrompido pelo
CONCESSIONÁRIO nos seguintes casos, com possibilidade de APLICAÇÃO DE MULTAS,
SANÇÕES OU PENALIDADES;
a) FALTA DE PAGAMENTO DA CONTA ( grifado)
Desta feita com a “FALTA DE PAGAMENTO DA CONTA” O CRÉDITO SE FINDA e a suspensão dos serviços é
inexorável. Após o restabelecimento do CRÉDITO que é feito com o pagamento correrá ainda por conta do Cliente
as despesas com a suspensão e com o restabelecimento do abastecimento conforme preceitua o art. 50 do ANEXO
V de fls. 232.
Toda a relação jurídica e econômica entre o consumidor e a requerida está diretamente relacionada com a REAL
EXISTÊNCIA DO CRÉDITO FORNECIDO AO CONSUMIDOR. Em síntese, podemos dizer que, o prazo de pagamento
dado para a quitação do fornecimento de água é tido como crédito e com a impontualidade do pagamento, gera
uma quebra do crédito, cujo efeito prático desta quebra é a suspensão do fornecimento do produto.
a
O professor Fran Martins em seu livro Títulos de Crédito Volume I 4 , edição define o CRÉDITO como:
“O crédito, ou seja, a confiança que uma pessoa inspira a outra de cumprir, no futuro, obrigação atualmente assumida,
veio facilitar grandemente as operações
comerciais, marcando um passo avantajado para
o desenvolvimento das mesmas.”
Também aqui podemos vislumbrar a presença do “CRÉDITO” sob qualquer prisma que se analise dentro da relação
entre consumidor e a Águas de Limeira.
O fornecimento de água é uma operação de venda à prazo. Sim! Imaginemos um consumidor que inicie seu
contrato com a Requerida, este terá o fornecimento do produto por um mês sem pagar nada por isso, devendo
pagar por este fornecimento somente no mês seguinte e assim indefinidamente, ou seja, todo pagamento que o
consumidor efetuar para a requerida será sempre relativo ao mês anterior. Ora, isso é venda à prazo e não à vista,
muito menos com pagamento adiantado. Um exemplo de venda à vista seria àquela onde se compra água em galão,
cujo pagamento é feito na entrega do produto. O que não é o caso!
o
a
Portanto se temos uma venda à prazo temos um “crédito”, neste sentido Rubens Requião 2 Volume 14 edição
página 297 cida Gide “Gide, em seu Compêndio de Economia Política, apresentado no livro de, conceituou o crédito
como o alargamento da troca. “A troca no tempo, em lugar de ser no espaço”, escrevia o economista francês,
acrescentando que A VENDA A PRAZO e o empréstimo constituem precisamente as suas duas formas essenciais. E
são caracteres essenciais do crédito, primeiro, O CONSUMO DA COISA VENDIDA ou emprestada e, segundo, a
espera da coisa nova destinada a substituí-la. O crédito importa um ato de fé, de confiança do credor. Daí a origem
etimológica da palavra – creditum, credere.”
Então, a figura do CRÉDITO sempre estará presente, seja porque a Requerida entrega a água na confiança que o
consumidor irá honrar seu compromisso pagando em dinheiro pelo consumo, seja porque a própria venda de água
é uma venda à prazo e portanto mediante um CRÉDITO como conceituado por Gide.
Pelo conceito jurídico CRÉDITO significa o direito que tem a pessoa de exigir de outra o
cumprimento da obrigação contraída. Neste sentido, entanto, tem-se o vocábulo em
acepção mais ampliada, pois que abrange as obrigações de da, fazer ou não fazer –
a
Vocabulário Jurídico DE PLÁCIDO E SILVA, 10 edição.
Interpretando o artigo 52 caput. Verifica-se que o mesmo é dividido em duas “partes”, num primeiro momento o
referido artigo diz: “No fornecimento de produtos ou serviços que envolva outorga de crédito” que é onde se
encaixa no caso em tela, pois como sabido “água encanada” é “produto” e a distribuição é “serviço”, portanto,
Águas de Limeira é “fornecedor” e “crédito” tanto pelo conceito jurídico como econômico se coaduna com a prática
exercida pela requerida. Entre a primeira e a Segunda parte do artigo existe um conector “ou” que designa
alternativa. Ou isso ou aquilo. Já a Segunda parte do artigo “concessão de financiamento” está afeto as atividades
como os de mútuo, abertura de crédito rotativo, cartão de crédito etc.
o
Outro enfoque, sem no entanto perder o objetivo do artigo 52 parágrafo 1 foi dado pelo Juiz Rizzatto Nunes do
Primeiro Tribunal de Alçada Civil que ao decidir sobre a suspensão da liminar em agravo de instrumento de N.
1119892-0 interposto pela requerida entendeu que, se o referido artigo não possui previsão legal para o caso em
tela é porque está-se diante de um “caso típico de lacuna na lei”. Embora o requerente não concorde que exista
uma lacuna, o fato é que a abrangência de tal dispositivo alcança, de um modo ou de outro, seu objetivo que é
limitar as multas no percentual de 2%. Com esta e outras fundamentações que ora se transcreve ele manteve a
liminar deferida por este Juízo.
D O E - Edição de 05/08/2002
Arquivo: 27 Publicação: 277
PRIMEIRO TRIBUNAL DE ALÇADA CIVIL SEÇÃO VIII INTIMAÇÕES DE DESPACHOS
0277. 1119892-0 Agravo de Instrumento
Comarca: Limeira; Ação Originária: 200200001023 Ação Civil Pública; Órgão Julgador: 10ª
Câmara; Relator: Juiz Simões de Vergueiro; Agvte: Águas de Limeira S/a; Advogado: Pedro
Estevam Alves Pinto Serrano, Mariela Bolina; Agvdo: Associação dos Moradores do Parque
Residencial Belinha Ometto; Advogado: Carlos Renato Monteiro Patrício, Fabiano D`andrea,
Mario Cesar Bucci.
`Trata-se de agravo de instrumento interposto contra a r. decisão de fls. 26 que, em ação pública, concedeu a liminar,
determinando que a ré-agravante sustasse a
cobrança da multa no percentual de 10%,
cifrando-a a apenas 2% até o desfecho final da
ação. Pleiteia a agravante (fls. 2/24) a concessão
de efeito suspensivo ao presente agravo. A par
de toda a doutrina apresentada pela agravante
nas razões de fls. 4/24, a verdade é que a
interpretação jurídica adequada é mesmo aquela
dada pelo MM. Juiz a quo. Com efeito, argui a
agravante que a previsão expressa do § 1º do
artigo 52, do Código de Defesa do Consumidor,
só se aplica às hipótese em que o fornecedor
vende a crédito ou quando o produto ou serviço
oferecido é pago por parcelas, como no
financiamento bancário. E realmente é o que está
estabelecido no art. 52 e § 1º, da lei 8.078/90.
Leia-se: `Art. 52. No fornecimento de produtos
ou serviços que envolva outorga de crédito ou
concessão de financiamento ao consumidor, o
fornecedor deverá, entre outros requisitos,
informá-lo previamente sobre: I - preço do
produto ou serviço em moeda corrente nacional;
II - montante dos juros de mora e da taxa efetiva
anual de juros; III - acréscimos legalmente
previstos; IV - número e periodicidade das
prestações; V - soma total a pagar, com e sem
financiamento. § 1º. As multas de mora
decorrentes do inadimplemento de obrigação no
seu termo não poderão ser superiores a dois por
cento do valor da prestação.` Acontece que não
há previsão legal para outras hipóteses de
incidência da multa, sendo caso típico de lacuna
na lei. Ora, sabe-se que cabe ao aplicador ou
qualquer intérprete integrar lacunas, sempre que
constatada. Não se discute que a prestadora do
serviço essencial de fornecimento de água e
esgoto está submetida às regras do Código de
Defesa do Consumidor (conf. arts. 3º e 22 da lei
consumerista). Logo, aplica-se à relação sub
judice totalmente as regras lá estabelecidas. Se
nesse microssistema da lei 8.078/90 não há
previsão para a estipulação de multa contratual
por inadimplência naquelas transações que não
envolvem crédito ou financiamento, somente se
pode concluir que a lacuna constatada deve ser
colmatada pela hipótese prevista no § 1º, do art.
52, ou seja, nenhum contrato envolvendo relação
jurídica de consumo pode ter multa por
inadimplência fixada em percentual superior a
2%. O outro argumento de que a regra da multa
só incide para os contratos firmados após
02/08/96 para a hipótese dos autos é pífio,
beirando a má fé. Nos contratos de fornecimento
de água e esgoto, tipicamente contínuos, a
prestação de serviço se dá diariamente e a
cobrança se faz mensalmente, de tal modo que
funcionada como se a todo mês um novo
contrato fosse firmado. Assim, a partir de
02/08/96 teve incidência a regra do $ 1º, do
artigo 52, do Código de Defesa do Consumidor,
em todos os contratos então vigentes. Somente
para o serviço fornecido e as dívidas fixadas
antes daquela data é que a multa poderia ter sido
de 10%. Aliás, diga-se que o consumidor que
pagou multa superior a 2% após 02/08/96
poderá, caso queira, pleitear a repetição do
indébito. Portanto, não estando presentes o
fumus boni iuris e o periculum in mora, não
concedo o efeito pleiteado. I.` São Paulo, 30 de
julho de 2002, (a) RIZZATTO NUNES, Juiz no
plantão do Agravo de Instrumento. Sala 105
(grifado)
Somando-se a todas as decisões já transcritas na inicial no sentido de aplicar o CDC para adequar a multa por atraso
de pagamento no fornecimento de água e esgoto pedimos vênia para transcrever mais uma decisão desta vez do
Tribunal de Justiça do Estado do Paraná que manteve a suspensão da cobrança de multas por atraso de pagamento.
AGRAVO DE INSTRUMENTO – DECISÃO QUE CONCEDE LIMINAR EM AÇÃO CIVIL PÚBLICA – LEI Nº
7.347, DE 24.07.1985 – FORNECIMENTO DE
ÁGUA E ESGOTO POR CONCESSIONÁRIA
DE SERVIÇO PÚBLICO – DISCUSSÃO
QUANTO A LEGALIDADE DO VALOR DAS
MULTAS
COBRADAS
POR
INADIMPLÊNCIA
OU
TAXA
DE
RELIGAÇÃO
–
PRESENÇA
DOS
REQUISITOS QUE AUTORIZAVAM A
CONCESSÃO DA LIMINAR – RECURSO
IMPROVIDO – DECISÃO MANTIDA – 1.
Quando presentes o fumus boni juris et
periculum in mora, não deve o juiz negar a
liminar. 2. Deve ser mantida a decisão que
suspendeu a cobrança, pela concessionária de
serviço público, das multas cobradas junto aos
seus clientes pelo atraso no pagamento da fatura
de água e esgoto, bem como da taxa de
religação, nos valores até então praticados,
quando incontroverso que isto ocorria, a
princípio, com violação das disposições do
Código de Defesa do Consumidor, e que a
demora na entrega da prestação jurisdicional
definitiva poderia causar danos ao interesse de
inúmeros consumidores, sujeitando-os à
interrupção do fornecimento de água, elemento
básico à vida. (TJPR – AI 0067707-0 – (2843) –
5ª C.Cív. – Rel. Des. Cyro Crema – DJPR
19.10.1998)
Destaca-se ainda quando a requerida diz a fls 109 – “Seria absurdo se cogitar que o legislador atue de forma
absolutamente atécnica na elaboração das leis” . Absurdo é comparar atividade bancária com serviço público, ou
seja que a multa de 2% somente vale para àqueles. É sabido por todos os brasileiros que o “negócio” mais lucrativo
no Brasil chama-se “banco”, há até quem diga que existe tão somente três tipos de “Empresas” cujos negócios são
lucrativos, ou seja, Banco grande, Banco médio e Banco pequeno. Entretanto estes mesmos “bancos” que tem
o
º
como atividade “vender dinheiro com lucro” estão adstritos aos efeitos do artigo 52 , parágrafo 1 , ou seja, multas
não superiores a 2% e a requerida uma prestadora de serviço público que não deveria Ter finalidades lucrativas
cobra 10% de multa por atraso no pagamento das tarifas. Como devemos chamar isso?! EXTORSÃO?
INGENUIDADE? DESVIO DE FINALIDADE? IGNORÂNCIA OU PURA MÁ-FÉ?
Cita a Requerida por diversas vezes o Professor Cintra do Amaral (fls 110 a 112), que embora sem indicar a fonte
mas tudo indica Ter retirado da Revista Diálogo Jurídico Número 13 – abril/maio de 2002 – Salvador – Bahia – Brasil
cujo título DISTINÇÃO ENTRE USUÁRIO DE SERVIÇO PÚBLICO E CONSUMIDOR.
Tal autor sustenta que os usuários de prestadora de serviço público deva estar submetido a “lei de defesa do
usuário de serviços públicos” que como dito pelo próprio autor “Até hoje não o foi.”, desconsiderado no entanto
pelo Requerido a fls. 111 último parágrafo. Salienta o Professor que tal lei recrudesceria ainda mais a situação do
Concessionário perante o usuário do que o próprio CDC com os seguintes dizeres: “Para o Poder Público, a defesa
do usuário de serviço público é ainda mais relevante do que a defesa do consumidor”, também transcrito pelo
requerido a (fls 112 segundo parágrafo). Defende ainda o mesmo autor a existência de uma “agência reguladora ;
“Nada impede, porém, que a agência reguladora mantenha convênio com esses órgãos de defesa do consumidor,
para que também participem da defesa do usuário de serviço público”
Em sendo assim, as exigências para o concessionário seriam bem maiores do que os previstos no CDC, levando a
crer que a multa moratória prevista nunca seria superior ao estabelecido no CDC e sim inferior a este!
Em realidade existe as duas figuras de forma independente, o “consumidor” e o “usuário” que não se confundem.
o
Consumidor como é definido no CDC em seu artigo 2 é : “Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire
ou utiliza produto ou serviço como DESTINATÁRIO FINAL.” A figura do “usuário” não utiliza a água como sendo um
consumidor final e sim para agregar em seu produto como “INSUMO” ou “MATÉRIA PRIMA” é o caso por exemplo
das Cervejarias, industria farmacêutica e química entre outras. Estas empresas na prática acabam revendendo a
água com a essência de seu produto, longe portanto de ser considerado um “consumidor final”.
Por óbvio estas Empresas estão desprotegidas de lei própria que regulamenta tal fornecimento pelo poder público,
tendo que “emprestar” legislações como o CDC, Código Comercial e assim por diante para dirimir possíveis litígios.
Daí a necessidade urgente de criar uma lei para estes usuários de serviço público que estão a margem da legislação
vigente.
Não se diga que estas afirmações são meras ilações. Não! A própria lei de Concessão de serviços públicos identifica
o
as duas figuras “consumidor” e “usuário” como distintas conforme se vê em seu art.7 A.
Art.7 A – As concessionárias de serviços públicos, de direito público e privado, nos Estados e no Distrito Federal, são
obrigadas a oferecer ao CONSUMIDOR E AO
USUÁRIO, dentro do mês de vencimento, o
mínimo de seis datas opcionais para escolherem
os dias de vencimento de seus débitos. ( Artigo
incluído pela Lei n. 9.791, de 24.03.99) (grifado)
o
Já o artigo 7 é expresso em dizer da submissão do serviço público ao código do consumidor.
º
Art. 7 Sem prejuízo do disposto na Lei n. 8.078, de 11 de setembro de 1990, são direitos e
obrigações dos usuários:
Desta feita é importante que o legislativo consiga o mais rápido possível aprovar uma proteção específica aos
“usuários do serviço público” que como visto em nada será alterado a submissão destes mesmos serviços em
relação ao CDC quando se tratar de “consumidor final”.
DO EQUÍLIBRIO ECONÔMICO-FINANCEIRO DO CONTRATO ADMINISTRATIVO
Alega a requerida a fls 116 que: “Assim, com a redução no percentual da multa, a receita da concessionária restará
irrefutavelmente afetada, de modo que este benefício estendido aos inadimplentes reverterá, necessariamente, em
prejuízo para toda a população de Limeira,” (....)
Não se entende o porquê causaria prejuízo a população, pois como exaustivamente dito MULTA por atraso de
pagamento não é FATURAMENTO ( receita) e sim uma compensação para a requerida que recebeu com atraso e
uma penalidade para o consumidor que pagou atrasado. NADA MAIS! Não se diga que com a diminuição do
percentual da multa a população começaria a pagar atrasado. Essa afirmação seria o mesmo que dizer que os
Limeirenses são todos caloteiros, não tem nenhum nexo esta afirmação, quem paga atrasado a conta de água são
as pessoas mais necessitadas.
Para que a requerida possa diminuir seu temor por conta da redução da multa será relacionado o nome de algumas
cidades do Estado de São Paulo que já operam em conformidade com o CDC, aplicando uma multa nunca superior a
2%, sem necessidade da população destes municípios precisarem se socorrer ao poder judiciário. Eis as cidades:
Americana, Araraquara, Ribeirão Preto, Araras, Santa Rita do Passa Quatro, Itapira, Indaiatuba, Capivari, Itu,
Cerquilho Mogi Mirim, Pirassununga, Jundiai, Bauru e uma centena de outras cidades. Campinas por exemplo após
a
tomar conhecimento da ação Civil pública proposta contra a SANASA que recebeu o N. 2726/2 5 Vara,
imediatamente, antes que a liminar fosse deferida, baixou a multa para os legais 2%.. Da mesma forma ocorreu com
a
a cidade de Sumaré onde a ação civil pública recebeu o n. 1641/02, 3 Vara. Não se tem conhecimento que a
população destas cidades tenha sofrido a represália do aumento de tarifa por conta disso.
Portanto não houve nenhum desequilíbrio econômico-financeiro do contrato administrativo.
DA NECESSIDADE DE REVOGAÇÃO DA LIMINAR OUTRORA CONCEDIDA
Esta matéria já foi bem decidida por este juízo bem como foi proposta por três vezes ao Tribunal de Alçada Cível
que acabou ratificando o acerto da decisão proferida por este juízo. Tal matéria somente será reanalisada pelo
Tribunal por ocasião do julgamento de mérito do Agravo interposto pela requeria. Destaca a seguir a decisão do Juiz
Rizzatto que no tópico final da decisão proferido no agravo transcrito acima que: Aliás, diga-se que o consumidor
que pagou multa superior a 2% após 02/08/96 poderá, caso queira, pleitear a repetição do indébito.
Disse ainda a Requerida a fls. 120 que:
“Este periculum (...), cominada com o fato dos habitantes de Limeira começarem a ingressar com ações de repetição
de indébito, tendo em vista a superexposição da
decisão em todos os jornais locais.”
Tudo indica que a Requerida não assimilou os efeitos desta Ação Civil Pública pois o art. 16 da lei 7347/85 é claro
em dizer que a sentença civil fará coisa julgada “erga omnes”, nos limites da competência territorial do órgão
prolator concomitantemente com o art. 103 do CDC inciso III ,ou seja, “erga omnes, apenas no caso de procedência
do pedido, para beneficiar TODAS AS VÍTIMAS E SEUS SUCESSORES”
Portanto os “habitantes de Limeira”, não precisarão “ingressar com ações de repetição de indébito”, pois já o
fizeram através desta ação civil pública proposta pela Requerente.
DOS PEDIDOS
Requer o indeferimento da denunciação a lide no polo passivo em relação a prefeitura municipal de Limeira;
Requer também o julgamento antecipado da lide com base no art. 330, I do CPC;
Ante a todo o exposto requer a total procedência da presente ação condenando-se a ré a devolução em dobro das
quantias pagas a maior a todos os consumidores de água da comarca de Limeira e também para abster-se da
o
cobrança de multa em patamar superior ao permitido no artigo 52 §1 do CDC.
Nestes termos
Pede deferimento.
Limeira, 23 de setembro de 2002
Mario Cesar Bucci
OAB/SP 97.431
Carlos Renato Monteiro Patrício
OAB/SP 143.871
Download

exmo sr. dr. juiz de direito da 1a vara cível da comarca de limeira