Cálculo 2 - Capı́tulo 2.7 - Diferenciabilidade e continuidade das derivadas parciais 1 Capı́tulo 2.7 - Diferenciabilidade e continuidade das derivadas parciais 2.7.1 - Teorema do Valor Médio 2.7.2 - Diferenciabilidade e continuidade das derivadas parciais Veremos, neste capı́tulo, um teorema que facilita em muito a verificação de diferenciabilidade de uma função de diversas variáveis. Antes de provarmos o teorema principal deste capı́tulo, é necessário primeiro voltar a um teorema importante das derivadas de funções de uma variável real. 2.7.1 - Teorema do Valor Médio Neste capı́tulo, veremos um teorema que simplifica bastante a determinação de diferenciabilidade de uma função baseando-se na continuidade de suas derivadas parciais. isto encerra a nossa discussão de diferencibilidade de uma função. A demonstração desse teorema depende de um outro teorema muito importante do Cálculo, o Teorema do Valor Médio, que é enunciado a seguir. A Leitura Complementar 2.7.1 faz um estudo mais aprofundado desse teorema. Teorema 1 - Teorema do Valor Médio: se f for contı́nua em um intervalo fechado [a, b] e derivável no intervalo aberto (a, b), então existirá pelo menos um c ∈ [a, b] tal que f (b) − f (a) = f ′ (c) . b−a A explicação desse teorema se dá da seguinte forma: consideremos uma função contı́nua limitada por um intervalo [a, b], como a da figura ao lado, onde f (a) não é necessariamente igual a f (b). Podemos traçar uma reta secante entre os pontos (a, f (a)) e (b, f (b)). Esta reta secante, a exemplo da equação da reta tangente a um ponto, tem a equação dada por f (b) − f (a) y(x) = f (a) + m(x − a) , m = . b−a y f (b) a [ c ] b x f (a) Para verificar que esta equação é a correta, podemos calcular f (b) − f (a) · 0 = f (a) , b−a f (b) − f (a) y(b) = f (a) + · (b − a) = f (a) + f (b) − f (a) = f (b) . b−a y(a) = f (a) + O que o Teorema do Valor Médio afirma é que, traçando uma secante entre quaisquer dois pontos do intervalo, haverá sempre um ponto c entre esses dois pontos cuja derivada será igual ao coeficiente angular da reta secante. Cálculo 2 - Capı́tulo 2.7 - Diferenciabilidade e continuidade das derivadas parciais 2 Exemplo 1: considere a função f (x) = x2 − 2x + 1, cuja derivada é f ′ (x) = 2x − 2. O coeficiente angular da reta secante entre os pontos a = 1 e b = 2 é dado por f (2) − f (1) (4 − 4 + 1) − (1 − 2 + 1) 1 f (b) − f (a) = = = =1. b−a 2−1 1 1 Para calcularmos o valor c para o qual f (b) − f (a) = f ′ (c), podemos escrever b−a f ′ (c) = 1 ⇔ 2c − 2 = 1 ⇔ 2c = 3 ⇔ c = 3 . 2 Isto corrobora o teorema. 2.7.2 - Diferenciabilidade e continuidade das derivadas parciais Vamos agora enunciar e provar um teorema que mostra que uma função é diferenciável em um determinado ponto de seu domı́nio se ela tiver derivadas parciais contı́nuas nesse mesmo ponto. Teorema 2 - Dada uma função f : A ⊂ R2 → R, onde A é um conjunto aberto, se existem as derivadas ∂f ∂f (x0 , y0 ) e (x0 , y0 ), onde (x0 , y0 ) ∈ A, então f é diferenciável nesse ponto. parciais ∂x ∂y Demonstração: como o domı́nio A da função é aberto, é possı́vel definir uma bola aberta em torno do ponto (x0 , y0 ) ∈ A que esteja inteiramente contida em A. Consideremos agora um ponto deslocado do original dado por (x0 + ∆x, y0 + ∆y), também pertendente à mesma bola aberta (figura abaixo e ao lado). Podemos escrever a diferença da função f entre esses dois pontos da seguinte forma: ∆f = f (x0 + ∆x, y0 + ∆y) − f (x0 , y0 ) = f (x0 + ∆x, y0 + ∆y) − f (x0 , y0 + ∆y) + f (x0 , y0 + ∆y) − f (x0 , y0 ) . Pelo Teorema do Valor Médio, existe um x̄ ∈ [x0 , x0 + ∆x] tal que ∂f f (x0 + ∆x, y0 + ∆y) − f (x0 , y0 + ∆y) = (x̄, y0 + ∆y) ⇔ ∆x ∂x ∂f (x̄, y0 + ∆y)∆x . ⇔ f (x0 + ∆x, y0 + ∆y) − f (x0 , y0 + ∆y) = ∂x y y0 + ∆y y0 b b De modo semelhante, existe um ȳ ∈ [y0 , y0 + ∆y] tal que f (x0 , y0 + ∆y) − f (x0 , y0 ) ∂f = (x0 , ȳ) ⇔ ∆y ∂y ∂f ⇔ f (x0 , y0 + ∆y) − f (x0 , y0 ) = (x0 , ȳ)∆y . ∂y x x0 x0 + ∆x Podemos, então, escrever f (x0 + ∆x, y0 + ∆y) − f (x0 , y0 ) = ∂f ∂f (x̄, y0 + ∆y)∆x + (x0 , ȳ)∆y . ∂x ∂y Como a nossa intenção é conseguir a função G(∆x, ∆y) vista na definição de diferenciabilidade de uma função no capı́tulo passado, escrevemos ∂f ∂f (x0 , y0 )∆x − (x0 , y0 ) = ∂x ∂y ∂f ∂f ∂f ∂f (x̄, y0 + ∆y)∆x + (x0 , ȳ)∆y − (x0 , y0 )∆x − (x0 , y0 ) = = ∂x ∂y ∂x ∂y ∂f ∂f ∂f ∂f = (x̄, y0 + ∆y) − (x0 , y0 ) ∆x + (x0 , ȳ) − (x0 , y0 ) ∆y . ∂x ∂x ∂y ∂y G(∆x, ∆y) = f (x0 + ∆x, y0 + ∆y) − f (x0 , y0 ) − Cálculo 2 - Capı́tulo 2.7 - Diferenciabilidade e continuidade das derivadas parciais 3 A condição de diferenciabilidade da função f em (x0 , y0 ) fica, agora, G(∆x, ∆y) = (∆x,∆y)→(0,0) ||(∆x, ∆y)|| ∂f ∂f ∂f ∂f (x0 , ȳ) − (x0 , y0 ) ∆y ∂x (x̄, y0 + ∆y) − ∂x (x0 , y0 ) ∆x ∂y ∂y = lim + = ||(∆x, ∆y)|| ||(∆x, ∆y)|| (∆x,∆y)→(0,0) ∂f ∂f ∆x ∂f ∆y ∂f . (x̄, y0 + ∆y) − (x0 , y0 ) + (x0 , ȳ) − (x0 , y0 ) = lim ∂x ∂x ||(∆x, ∆y)|| ∂y ∂y ||(∆x, ∆y)|| (∆x,∆y)→(0,0) lim Caso as derivadas parciais com relação a x e com relação a y sejam contı́nuas, então ∂f ∂f ∂f ∂f lim (x̄, y0 + ∆y) − (x0 , y0 ) = 0 e lim (x0 , ȳ) − (x0 , y0 ) = 0 . ∂x ∂y (∆x,∆y)→(0,0) ∂x (∆x,∆y)→(0,0) ∂y Além disso, de modo que ∆x ∆x ||(∆x, ∆y)|| = p(∆x)2 + (∆y)2 ≤ 1 e lim (∆x,∆y)→(0,0) ∆y ∆y ||(∆x, ∆y)|| = p(∆x)2 + (∆y)2 ≤ 1 , G(∆x, ∆y) =0, ||(∆x, ∆y)|| o que prova que a função é diferenciável em (x0 , y0 ). Esse teorema será usado a seguir para provar a diferenciabilidade de algumas funções. Exemplo 1: verifique se a função f (x, y) = xy 2 − 4x é diferenciável em todo o seu domı́nio. Solução: as derivadas parciais dessa função ficam ∂f (x, y) = y 2 − 4 ∂x e ∂f (x, y) = 2xy , ∂y de modo que elas são contı́nuas em todo o R2 . Portanto, f é diferenciável em todo o seu domı́nio, que é o próprio R2 . 2 px y , (x, y) 6= (0, 0) 2 + y2 Exemplo 2: verifique se f (x, y) = é diferenciável em (0, 0). x 0 , (x, y) = (0, 0) Solução: para (x, y) 6= (0, 0), as derivadas parciais dessa função ficam p 1 2xy x2 + y 2 − x2 y · (x2 + y 2 )−1/2 · 2x x3 y 2xy ∂f 2 p − = (x, y) = ∂x x2 + y 2 (x2 + y 2 )3/2 x2 + y 2 p 1 x2 x2 + y 2 − x2 y · (x2 + y 2 )−1/2 · 2y x2 y 2 x2 ∂f 2 − 2 = p (x, y) = . 2 2 ∂y x +y (x + y 2 )3/2 x2 + y 2 e Para (x, y) = (0, 0), precisamos calcular as derivadas parciais pela definição: (∆x)2 · 0 p −0 ∆x)2 f (0 + ∆x, 0) − f (0, 0) ∂f (0, 0) = lim = lim =0, ∆x→0 ∆x→0 ∂x ∆x ∆x 0 · ∆y p −0 (∆y)2 f (0, 0 + ∆y) − f (0, 0) ∂f (0, 0) = lim = lim =0. ∆y→0 ∆y→0 ∂y ∆y ∆y Falta agora provar que as derivadas parciais são contı́nuas em (0, 0). Para a derivada parcial com relação a x, temos Cálculo 2 - Capı́tulo 2.7 - Diferenciabilidade e continuidade das derivadas parciais 4 ∂f y y x2 lim 2x · p ·p (x, y) = lim −x· 2 (x,y)→(0,0) ∂x (x,y)→(0,0) x + y2 x2 + y 2 x2 + y 2 ! . x2 x2 y y ≤ 1, de modo que ·p Como lim x = 0, p ≤ 1 e 2 ≤ 1, então 2 2 2 2 2 x + y x2 + y 2 x +y (x,y)→(0,0) x +y ∂f ∂f lim (x, y) = 0, de modo que (x, y) é contı́nua em (0, 0). ∂x (x,y)→(0,0) ∂x Para a derivada parcial com relação a y, temos x2 x y ∂f −y· 2 x· p ·p (x, y) = lim lim 2 2 2 2 x + y (x,y)→(0,0) (x,y)→(0,0) ∂x x +y x + y2 Como lim (x,y)→(0,0) y = 0 e usando os resultados anteriores, ! . ∂f (x, y) = 0, de modo que (x,y)→(0,0) ∂y lim ∂f (x, y) é contı́nua em (0, 0). ∂y Como as duas derivadas parciais são contı́nuas em (0, 0), então f é diferenciável nesse mesmo ponto. O próximo exemplo mostra que mesmo quando as derivadas parciais de uma função não são contı́nuas em um determinado (x0 , y0 ), essa mesma função pode ser diferenciável nesse ponto. 1 (x2 + y 2 ) sen , (x, y) 6= (0, 0) 2 é diferenciável em (0, 0). Exemplo 3: verifique se f (x, y) = x + y2 0 , (x, y) = (0, 0) Solução: para (x, y) 6= (0, 0), as derivadas parciais dessa função ficam ∂f 1 1 + (x2 + y 2 ) cos 2 (x, y) = 2x sen 2 ∂x x + y2 x + y2 1 1 ∂f + (x2 + y 2 ) cos 2 (x, y) = 2y sen 2 ∂y x + y2 x + y2 −1 1 2x 1 · 2x = 2x sen 2 − 2 cos 2 , (x2 + y 2 )2 x + y2 x + y2 x + y2 −1 1 2y 1 · 2 · 2y = 2y sen 2 − 2 cos 2 . (x + y 2 )2 x + y2 x + y2 x + y2 · Para (x, y) = (0, 0), precisamos calcular as derivadas parciais pela definição. Para a derivada parcial com relação a x, temos 1 (∆x)2 sen f (0 + ∆x, 0) − f (0, 0) 1 ∂f (∆x)2 . (0, 0) = lim = lim = lim ∆x sen ∆x→0 ∆x→0 ∆x→0 ∂x ∆x ∆x (∆x)2 ∂f 1 ≤ 1, então (0, 0) = 0. Como lim ∆x = 0 e sen (∆x)2 ∂x (∆x,∆y)→(0,0) Para a derivada parcial com relação a y, temos (∆y)2 sen ∂f f (0, 0 + ∆y) − f (0, 0) (0, 0) = lim = lim ∆y→0 ∆y→0 ∂y ∆y ∆y ∂f 1 ≤ 1, então (0, 0) = 0. Como lim ∆y = 0 e sen 2 (∆x) ∂y (∆x,∆y)→(0,0) 1 (∆y)2 = lim ∆y sen ∆y→0 1 . (∆y)2 Podemos, então, escrever as derivadas parciais com relação a x e a y da seguinte forma: 1 2x 1 ∂f 2x sen 2 − 2 cos 2 , (x, y) 6= (0, 0) (x, y) = e x + y2 x + y2 x + y2 0 , (x, y) = (0, 0) ∂x 1 2y 1 ∂f 2y sen 2 − 2 cos 2 , (x, y) 6= (0, 0) (x, y) = . x + y2 x + y2 x + y2 0 , (x, y) = (0, 0) ∂y Cálculo 2 - Capı́tulo 2.7 - Diferenciabilidade e continuidade das derivadas parciais 5 Vamos agora verificar se as derivadas parciais são contı́nuas em (0, 0). A primeira parte de cada expressão para as derivadas parciais é formada por um limite tendendo a zero quando (x, y) → (0, 0) multiplicado por uma função limitada, porém isto não é verdade para a segunda expressão de cada derivada parcial. Vamos, então, testar os limites quando (x, y) → (0, 0) de dois caminhos distintos para ambas as derivadas parciais. Começando pelo caminho dado pela imagem da função vetorial F (t) = (x(t), y(t)) = (t, 0), teremos os seguintes limites: ∂f 2t 1 2 1 1 1 lim (x, y) = lim 2t sen 2 − cos − cos = lim , 2t sen t→0 t→0 t + 02 t2 + 0 2 t2 + 0 2 t2 t t2 (x,y)→(0,0) ∂x 1 2·0 1 ∂f = lim 0 = 0 . − cos (x, y) = lim 2 · 0 sen 2 lim t→0 t→0 t + 02 t2 + 0 2 t2 + 0 2 (x,y)→(0,0) ∂y 1 1 e cos 2 são limitadas, o limite para a derivada parcial de f com relação a x fica, para t → 0− (t t2 t tendendo a zero pela esquerda, ou seja, t tendendo a zero a partir de valores negativos de t), 1 2 1 ∂f (x, y) = lim− 2t sen 2 − cos 2 = 0 − (−∞) = ∞ . lim t t t (x,y)→(0,0) ∂x t→0 Como sen Já para t → 0+ (t tendendo a zero pela direita, ou seja, t tendendo a zero a partir de valores positivos de t), ∂f 1 2 1 lim (x, y) = lim+ 2t sen 2 − cos 2 = 0 − ∞ = −∞ . (x,y)→(0,0) ∂x t t t t→0 Dessa forma, o limite da derivada parcial de f com relação a x quando (x, y) → (0, 0) não existe e essa derivada parcial não é contı́nua em (0, 0). Considerando agora o caminho dado pela imagem da função vetorial F (t) = (x(t), y(t)) = (0, t), teremos os seguintes limites: 1 ∂f 2·0 1 lim = lim 0 = 0 , − cos (x, y) = lim 2 · 0 sen 2 t→0 t→0 0 + t2 0 2 + t2 0 2 + t2 (x,y)→(0,0) ∂x 1 1 2t 1 2 1 ∂f 2t sen = lim . − cos − (x, y) = lim 2t sen 2 cos lim t→0 t→0 0 + t2 0 2 + t2 0 2 + t2 t2 t t2 (x,y)→(0,0) ∂y Como já vimos antes, o segundo limite não existe, de modo que a derivada parcial de f com relação a y também não é contı́nua em (0, 0). Era de se esperar agora que a função f não fosse diferenciável em (0, 0). Porém, podemos calcular ∂f ∂f (x0 , y0 )∆x − (x0 , y0 )∆y = ∂x ∂y − 0 − 0 · ∆x − 0 · ∆y = (∆x)2 + (∆y)2 sen G(∆x, ∆y) = f (x0 + ∆x, y0 + ∆y) − f (x0 , y0 ) − = (∆x)2 + (∆y)2 sen de modo que 1 (∆x)2 + (∆y)2 1 , (∆x)2 + (∆y)2 1 (∆x)2 + (∆y)2 sen 2 G(∆x, ∆y) (∆x) + (∆y)2 p = lim = lim (∆x,∆y)→(0,0) (∆x,∆y)→(0,0) ||(∆x, ∆y)|| (∆x)2 + (∆y)2 p 1 (∆x)2 + (∆y)2 sen = lim . (∆x)2 + (∆y)2 (∆x,∆y)→(0,0) p 1 G(∆x, ∆y) 2 2 ≤ 1, então Como lim (∆x) + (∆y) = 0 e sen lim = 0, de 2 2 (∆x) + (∆y) (∆x,∆y)→(0,0) (∆x,∆y)→(0,0) ||(∆x, ∆y)|| modo que f é diferenciável em (0, 0). Um último exemplo serve para lembrar que uma função pode ser diferenciável em um ponto quando suas derivadas parciais não forem contı́nuas nesse ponto, mas que ela não será diferenciável em um ponto onde suas derivadas parciais não existam. Cálculo 2 - Capı́tulo 2.7 - Diferenciabilidade e continuidade das derivadas parciais sen (x2 + y 2 ) , (x, y) 6= (0, 0) Exemplo 4: verifique se f (x, y) = é diferenciável em (0, 0). x2 + y 2 1 , (x, y) = (0, 0) 6 Solução: para (x, y) 6= (0, 0), as derivadas parciais dessa função ficam cos(x2 + y 2 ) · 2x · (x2 + y 2 ) − sen (x2 + y 2 ) · 2x ∂f e (x, y) = ∂x (x2 + y 2 )2 cos(x2 + y 2 ) · 2y · (x2 + y 2 ) − sen (x2 + y 2 ) · 2y ∂f . (x, y) = ∂y (x2 + y 2 )2 Para (x, y) = (0, 0), precisamos calcular as derivadas parciais pela definição: sen (∆x)2 −1 ∂f 1 f (0 + ∆x, 0) − f (0, 0) sen (∆x)2 (∆x)2 + lim (0, 0) = lim = lim = lim , 3 ∆x→0 ∆x ∆x→0 ∆x→0 ∆x→0 ∂x ∆x ∆x (∆x) sen (∆y)2 −1 1 f (0, 0 + ∆y) − f (0, 0) sen (∆y)2 ∂f (∆y)2 + lim (0, 0) = lim = lim = lim . ∆y→0 ∆y ∆y→0 ∆y→0 ∆y→0 ∂y ∆y ∆y (∆y)3 1 1 e lim não existem. Portanto, a função não é diferenciável em (0, 0), pois não podemos ∆x ∆y→0 ∆y montar a função G(∆x, ∆y) adequada. Os limites lim ∆x→0 Terminamos por aqui a nossa análise da diferenciabilidade de uma função. Todos os resultados aqui vistos podem ser generalizados para funções de mais de duas variáveis. Resumo • Teorema do Valor Médio. Se f for contı́nua em um intervalo fechado [a, b] e derivável no intervalo aberto (a, b), então existirá pelo menos um c ∈ [a, b] tal que f (b) − f (a) = f ′ (c) . b−a • Diferenciabilidade e continuidade das derivadas parciais. Dada uma função f : A ⊂ R2 → R, ∂f ∂f (x0 , y0 ) e (x0 , y0 ), onde (x0 , y0 ) ∈ onde A é um conjunto aberto, se existem as derivadas parciais ∂x ∂y A, então f é diferenciável nesse ponto. Cálculo 2 - Capı́tulo 2.7 - Diferenciabilidade e continuidade das derivadas parciais 7 Leitura Complementar 2.7.1 - Teorema do Valor Médio Em Cálculo 1, várias definições foram dadas de maneira informal e fizemos várias afirmações que, na verdade, são teoremas que precisam ser provados. Esta leitura complementar se encarrega de enunciar e provar um dos teoremas mais importantes do cálculo com funções de uma variável real: o Teorema do Valor Médio. Noi entanto, para prová-lo, é necessário fazer algumas definções e provar outros teoremas, o que é feito a seguir. Para que possamos dar definições coerentes do que é um máximo ou um mı́nimo de uma função, conceitos importantes para o Teorema do Valor Médio, precisamos do conceito de vizinhança, definido a seguir. Definição 1 - Dado um número real a qualquer pertencente a um subintervalo I ⊂ R, definimos uma vizinhança desse ponto como sendo um conjunto de pontos pertencentes a I que estejam a uma distância menor que um número ǫ > 0 de a, isto é, uma vizinhança de a é o intervalo {x ∈ I | a − ǫ < x < a + ǫ} = {x ∈ I | |x − a| < ǫ} . Vamos, agora, às definições de máximos e mı́nimos locais e globais. Definição 2 - Dados uma função f (x) e um ponto a ∈ D(f ), f (c) é um máximo local de f se f (c) ≥ f (x) para todo x pertencente a alguma vizinhança de a. Definição 3 - Dados uma função f (x) e um ponto a ∈ D(f ), f (c) é um mı́nimo local de f se f (c) ≤ f (x) para todo x pertencente a uma vizinhança de a. Definição 4 - Dados uma função f (x) e um ponto a ∈ D(f ), f (c) é um máximo global de f se f (c) ≥ f (x) para todo x ∈ D(f ). Definição 5 - Dados uma função f (x) e um ponto a ∈ D(f ), f (c) é um mı́nimo global de f se f (c) ≤ f (x) para todo x ∈ D(f ). Uma definição completa de um ponto de inflexão ainda não pode ser dada, mas a seguir fazemos uma definição temporária. Definição 6 - Dada uma f (x), se f (c), c ∈ D(f ), não é nem um máximo (local ou global) nem um mı́nimo (local ou global) de f e f ′ (c) = 0, então c é um ponto de inflexão de f . Note que a definição acima não limita um ponto de inflexão a ocorrer somente quando f ′ (c) = 0 e f (c) não for nem um máximo nem um mı́nimo da função. Como será visto na próxima aula, há outros casos em que surgem pontos de inflexão e f ′ (c) 6= 0. Vamos agora enunciar e provar um teorema do matemático francês Pierre de Fermat (1601-1665). Teorema 1 - Teorema de Fermat: se f (a) é um ponto de máximo ou de mı́nimo de f , então a é um ponto crı́tico de f . Cálculo 2 - Capı́tulo 2.7 - Diferenciabilidade e continuidade das derivadas parciais Demonstração: provaremos o teorema por absurdo. Suponhamos que a seja um ponto de máximo ou de mı́nimo local de f tal que f ′ (a) 6= 0. Por conseqüência, f (a) < 0 ou f ′ (a) > 0. Se f ′ (a) > 0, então ′ f ′ (a) = lim h→0 f (a + h) − f (a) >0. h Para que f ′ (a) exista, devemos ter lim h→0− f (a + h) − f (a) f (a + h) − f (a) = lim + h h h→0 e, de acordo com a nossa hipótese, devemos ter lim h→0− f (a + h) − f (a) >0 e h lim h→0+ f (a + h) − f (a) >0. h Podemos assumir que, para valores suficientemente pequenos de h (para os dois casos), tenhamos f (a + h) − f (a) >0. h Para o limite pela esquerda, h < 0, de modo que f (a + h) − f (a) < 0 ⇔ f (a + h) < f (a) , o que significa que a não pode ser um mı́nimo da função. Para o limite pela direita, h > 0, de modo que f (a + h) − f (a) > 0 ⇔ f (a + h) > f (a) , o que significa que a não pode ser um máximo da função. Como os dois limites têm que ser válidos, então a não pode ser nem um máximo nem um mı́nimo da função, o que contradiz nossa hipótese inicial. Portanto, se a é um ponto de máximo ou de mı́nimo da função, então f ′ (a) não pode ser positiva. Suponhamos agora que f ′ (a) < 0. Então, f ′ (a) = lim h→0 f (a + h) − f (a) <0. h Para que f ′ (a) exista, devemos ter lim h→0− f (a + h) − f (a) f (a + h) − f (a) = lim + h h h→0 e, de acordo com a nossa hipótese, devemos ter lim− h→0 f (a + h) − f (a) <0 e h lim+ h→0 f (a + h) − f (a) <0. h Novamente, podemos assumir que, para valores suficientemente pequenos de h (para os dois casos), tenhamos f (a + h) − f (a) <0. h Para o limite pela esquerda, h < 0, de modo que f (a + h) − f (a) > 0 ⇔ f (a + h) > f (a) , o que significa que a não pode ser um máximo da função. Para o limite pela direita, h > 0, de modo que f (a + h) − f (a) < 0 ⇔ f (a + h) < f (a) , o que significa que a não pode ser um mı́nimo da função. Como os dois limites têm que ser válidos, então a não pode ser nem um máximo nem um mı́nimo da função, o que contradiz nossa hipótese inicial. Portanto, se a é um ponto de máximo ou de mı́nimo da função, então f ′ (a) não pode ser negativa. Como f ′ (a) não pode ser nem negativa nem positiva se a for um máximo ou um mı́nimo da função, e como f ′ (a), por hipótese, existe, então, necessariamente, f ′ (a) = 0. Isto prova o teorema. 8 Cálculo 2 - Capı́tulo 2.7 - Diferenciabilidade e continuidade das derivadas parciais 9 Pierre de Fermat (1601-1665): foi um dos grandes matemáticos de todos os tempos, embora sua principal ocupação fosse o direito. Estudou matemática nas Universidades de Toulouse e Bordeaux e depois formou-se em leis na Universidade de Orléans. Fez diversas contribuições à matemática, tendo inventado métodos para calcular máximos e mı́nimos de funções e retas tangentes a diversas figuras, técnicas que são precursoras do Cálculo Diferencial. Também fez importantes descobertas no campo matemático chamado teoria dos números. Uma famosa conjectura sua, conhecida como “o último teorema de Fermat”, resistiu cerca de 300 anos, até ser finalmente provada pelo matemático inglês Andrew John Wiles em 1994. Veremos agora dois teoremas de muita importância no Cálculo: os teoremas de Rolle e do Valor Médio, sendo o segundo uma generalização do primeiro. Consideremos uma função contı́nua limitada por y um intervalo [a, b], como a da figura ao lado, onde f (a) = f (b). O teorema de Rolle afirma que, se essa função for diferenciável no intervalo (a, b), enf (a) = f (b) tão haverá nesse intervalo ao menos um ponto cuja c2 derivada é nula. Na figura ao lado, por exemplo, x [ ] há dois pontos de derivada nula dentro do intervalo a c1 b [a, b]. A demonstração desse teorema é baseada no Teorema de Weierstrass (Aprofundamento 4) e no Teorema de Fermat (teorema 1 desta leitura complementar). Teorema 2 - Teorema de Rolle: se f for contı́nua em um intervalo fechado [a, b], derivável no intervalo aberto (a, b) e se f (a) = f (b), então existirá pelo menos um c ∈ [a, b] tal que f ′ (c) = 0. Demonstração: primeiro, vamos considerar o caso de uma função constante, f (x) = k, k ∈ R. Neste caso, qualquer ponto c ∈ (a, b) será tal que f ′ (c) = 0. Se f (x) não for constante, então, pelo Teorema de Weierstrass (Aprofundamento 4), existem x1 ∈ [a, b] e x2 ∈ [a, b] tais que f (x1 ) ≤ f (x) ≤ f (x2 ), x ∈ [a, b]. Como a função não é constante, então f (x1 ) 6= f (x2 ). Como f (a) = f (b), por hipótese, isto significa que não podemos ter f (x1 ) = f (a) e f (x2 ) = f (b) ou f (x1 ) = f (b) e f (x2 ) = f (a). Portanto, x1 e x2 não podem ser ambos extremos do intervalo [a, b]. Sendo assim, pelo menos um deles tem que estar no intervalo (a, b), onde f (x) é sempre derivável. Vamos chamar esse ponto (x1 ou x2 ) de c. Sendo assim, de acordo com o Teorema de Fermat, c é um ponto crı́tico de f (x) em x ∈ (a, b). Como, por hipótese, f ′ (c) existe, então f ′ (c) = 0. Michel Rolle (1652-1719): Rolle nasceu na França e teve pouca educação formal, tendo sido basicamente um auto-didata. Trabalhou como assistente de advogado, escriba e especialista em contas, tendo depois recebido pensões especiais do governo para que trabalhasse em matemática. Publicou o teorema pelo qual é mais conhecido em um livro obscuro. Descrevia o Cálculo como “uma coleção de falácias engenhosas”. Tomemos agora uma função contı́nua limitada por um intervalo [a, b], como a da figura ao lado, onde f (a) não é necessariamente igual a f (b). Podemos traçar uma reta secante entre os pontos (a, f (a)) e (b, f (b)). Esta reta secante, a exemplo da equação da reta tangente a um ponto, tem a equação dada por y(x) = f (a) + m(x − a) , m = f (b) − f (a) . b−a y f (b) a [ c ] b x f (a) Para verificar que esta equação é a correta, podemos calcular y(a) = f (a) + f (b) − f (a) f (b) − f (a) · 0 = f (a) , y(b) = f (a) + · (b − a) = f (a) + f (b) − f (a) = f (b) . b−a b−a Cálculo 2 - Capı́tulo 2.7 - Diferenciabilidade e continuidade das derivadas parciais 10 O que o Teorema do Valor Médio afirma é que, traçando uma secante entre quaisquer dois pontos do intervalo, haverá sempre um ponto c entre esses dois pontos cuja derivada será igual ao coeficiente angular da reta secante. A demonstração do teorema baseia-se na função g(x) = f (x) − y(x), que é tal que g(a) = f (a) − y(a) = f (a) − f (a) = 0 e g(b) = f (b) − g(b) = f (b) − f (b) = 0 . Escrevendo g(x) = f (x) − f (a) − m(x − a) = f (x) − mx + ma , temos que g′ (x) = f ′ (x) − m · 1 + 0 = f ′ (x) − m = f ′ (x) − f (b) − f (a) . b−a Teorema 3 - Teorema do Valor Médio: se f for contı́nua em um intervalo fechado [a, b] e derivável no intervalo aberto (a, b), então existirá pelo menos um c ∈ [a, b] tal que f (b) − f (a) = f ′ (c) . b−a Demonstração: consideremos a função g(x) = f (x) − y(x) = f (x) − f (b) − f (a) (x − a) . b−a Como f ′ (x) é contı́nua em [a, b] e diferenciável em (a, b), então g(x) também o é. Além disso, g(a) = g(b) = 0. Como g(a) = g(b), então, pelo Teorema de Rolle, existe ao menos um ponto c ∈ (a, b) tal que g ′ (c) = 0. Considerando a derivada de g(x), temos, então, g ′ (c) = 0 ⇔ f ′ (x) − provando o teorema. f (b) − f (a) f (b) − f (a) = 0 ⇔ f ′ (x) = , b−a b−a