CASO SOBRE A LEGALIDADE DO USO DA FORÇA (Iugoslávia vs. Estados Unidos da
América) (medidas provisórias)
Despacho de 2 de junho de 1999
Em um despacho emitido no Caso relativo a Legalidade do Uso da Força (Iugoslávia
v. Estados Unidos da América), a Corte rejeitou por doze votos a três, o pedido de indicação de
medidas cautelares apresentadas pela República Federal da Iugoslávia (RFI).
Em sua decisão, a Corte, após ter constatado que manifestamente não tinha
jurisdição para conhecer o caso, decidiu rejeitá-lo. Ela ordenou por doze votos a três que o
caso fosse removido da lista.
A Corte foi composta da seguinte forma: Vice-Presidente Weeramantry, Presidente
Interino; Presidente Schwebel; Juízes Oda, Bedjaoui, Guillaume, Ranjeva, Herczegh, Shi,
Fleischhauer, Koroma, Vereshchetin, Higgins, Parra-Aranguren, Kooijmans; Juiz ad hoc Kreca;
Escrivão Valencia-Ospina.
O texto completo do parágrafo dispositivo do Despacho lê-se:
"34. Por estas razões,
A CORTE,
(1) Por doze votos a três,
Rejeita o pedido de indicação de medidas cautelares apresentado pela República
Federal da Iugoslávia em 29 de abril de 1999;
A FAVOR: Vice-Presidente Weeramantry, Presidente Interino; Presidente Schwebel;
Juízes Oda, Bedjaoui, Guillaume, Ranjeva, Herczegh, Fleischhauer, Koroma, Higgins, ParraAranguren, Kooijmans;
CONTRA: Juízes Shi, Vereshchetin; Juiz ad hoc Kreca;
(2) Por doze votos a três,
Ordena que o caso seja removido da lista.
A FAVOR: Vice-Presidente Weeramantry, Agindo
Presidente; Presidente Schwebel; Juízes Oda, Bedjaoui, Guillaume, Ranjeva,
Herczegh, Shi, Fleischhauer, Koroma, Higgins, Kooijmans;
CONTRA: Juízes Vereshchetin, Parra-Aranguren e Juiz ad hoc Kreca".
Juízes Shi, Koroma e Vereshchetin anexaram declarações ao despacho da Corte. Os
Juízes Oda e Parra-Aranguren anexaram pareceres em separado. O Juiz Kreca ad hoc anexou
uma parecer divergente.
Informações Preliminares
Em 29 de abril de 1999 a Iugoslávia entrou com uma petição inicial contra os Estados
Unidos da América "por violação da obrigação de não usar a força", acusando o Estado de
bombardeio no território iugoslavo “juntamente com outros Estados Membros da NATO". No
mesmo dia, apresentou um pedido de indicação de medidas cautelares, pedindo a Corte que
condene os Estados Unidos da América a "cessar de imediato seus atos de uso da força" e
"abster-se de qualquer ato de ameaça ou uso da força” contra a República Federativa da
Iugoslávia.
Como base para a jurisdição da Corte, a Iugoslávia invocou o artigo IX da Convenção
sobre a Prevenção e Punição do Crime de Genocídio, adotada pela Assembleia Geral das
Nações Unidas em 9 de dezembro de 1948, bem como o artigo 38, parágrafo 5º, das Regras
da Corte. O artigo IX da Convenção sobre Genocídio prevê que as disputas entre as partes
contratantes, relativas à interpretação, aplicação ou cumprimento da Convenção serão
submetidas à Corte Internacional de Justiça. Quanto ao artigo 38, parágrafo 5º, das Regras da
Corte, o qual prevê que quando um Estado propõe uma petição contra outro Estado que não
aceitou a jurisdição da Corte, o pedido é transmitido para outro Estado, mas nenhuma ação é
tomada nos procedimentos, a não ser que o Estado aceite a jurisdição da Corte e somente
quando isto ocorrer.
Fundamentos da Corte
Em seu despacho, a Corte primeira sublinha que está "profundamente preocupada
com a tragédia humana, a perda de vidas e o enorme sofrimento no Kosovo, o que forma o
pano de fundo" da disputa, além da "contínua perda de vidas e o sofrimento humano em todas
as partes da Iugoslávia". Ela declara-se "profundamente preocupada com o uso da força na
Iugoslávia", o que "nas atuais circunstâncias... levanta questões muito graves de direito
internacional". Apesar de ser "consciente dos propósitos e princípios da Carta das Nações
Unidas e das suas próprias responsabilidades na manutenção da paz e segurança sob a Carta
e (seu) estatuto", a Corte "considera necessário enfatizar que todas as partes devem agir em
conformidade com as suas obrigações com base na Carta das Nações Unidas e outras normas
de direito internacional, incluindo o direito humanitário".
A Corte, em seguida, aponta que ela "não tem automaticamente a jurisdição sobre
disputas legais entre os Estados" e que "um dos princípios fundamentais do seu Estatuto é que
ela não pode decidir uma disputa entre os Estados, sem o consentimento deles à sua
jurisdição". Ela não pode indicar medidas cautelares se a sua jurisdição não for estabelecida
prima facie.
Relativamente ao artigo IX da Convenção sobre Genocídio, a Corte afirma que não é
contestado, tanto pela Iugoslávia, quanto pelos Estados Unidos da América, que eles são
partes nessa Convenção, mas que, quando os Estados Unidos a ratificaram, em 25 de
novembro de 1988, fizeram uma reserva. Esta reserva prevê, com referência ao artigo IX, que
antes de qualquer disputa ser submetido à jurisdição da Corte, "o consentimento específico dos
Estados Unidos é necessário para cada caso". No entanto, nesse caso, os Estados Unidos
indicou que não deu nenhum consentimento específico e que não iria fazê-lo. Como a
Convenção sobre Genocídio não proíbe reservas e desde que a Iugoslávia não se opôs à
reserva feita pelos Estados Unidos, a Corte considera que o artigo IX não constitui,
manifestamente, uma base para a jurisdição no caso, mesmo que prima facie.
Quanto ao artigo 38, parágrafo 5º, das Regas da Corte, salienta-se que, na ausência
de consentimento por parte dos Estados Unidos, ela não pode exercer a jurisdição no caso,
ainda que prima facie.
A Corte conclui que "é manifestamente incompetente para conhecer a petição da
Iugoslávia" e que "não pode, portanto, indicar qualquer medida provisória que seja". Acrescenta
que "dentro de um sistema de jurisdição consensual, manter na Lista Geral, um caso sobre o
qual parece certo que a Corte não poderá decidir acerca dos méritos, não contribuiria,
certamente, para a boa administração da justiça".
A Corte, finalmente, observa que “há uma distinção fundamental entre a questão da
aceitação por um Estado da jurisdição da Corte e a compatibilidade dos atos particulares com o
direito internacional". "A primeira exige o consentimento; já a última questão só pode ser
alcançada quando a Corte lida com os méritos, depois de ter estabelecido a sua jurisdição e
tendo ouvido argumentos jurídicos por inteiro e por ambas as partes”. Ela enfatiza que “mesmo
se os Estados aceitem ou não a jurisdição da Corte, eles permanecem, em qualquer caso,
responsáveis pelos atos atribuíveis a eles que violem o direito internacional, incluindo o direito
humanitário” e que “qualquer disputa acerca da legalidade de tais atos deverão ser resolvidas
por meios pacíficos”, sendo que a escolha, conforme o artigo 33 da Carta, compete às partes”.
Nesse contexto, "as partes devem tomar cuidado para não agravar ou estender a disputa". A
Corte reafirma que "quando tal disputa dá origem a uma ameaça à paz, ruptura da paz ou ato
de agressão, o Conselho de Segurança tem responsabilidades especiais com base no Capítulo
VII da Carta".
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Casos Contenciosos 1999 – Legalidade do Uso da Força