Anais do I Simpósio de Linguística, Literatura e Ensino do Tocantins ISBN: 978-85-63526-36-6 484 11 a 13 de Novembro de 2013 – UFT/Araguaína –TO ANÁLISE LINGUÍSTICA: COMO O PROFESSOR DE LÍNGUA MATERNA (RE) ELABORA ISSO EM SEU DISCURSO E EM SUA PRÁTICA DE SALA DE AULA? Oziel Pereira da Silva (UFT) [email protected] Janete Silva dos Santos (UFT) [email protected] RESUMO: A Análise Linguística é uma nova proposta para o estudo/ensino dos conteúdos gramaticais que direciona o aluno a uma reflexão sobre a função dos recursos linguísticos empregados nos textos, tendo em vista o desenvolvimento de suas capacidades linguísticodiscursivas. Ela surgiu como resposta aos resultados pouco significativos apresentados pelo modelo tradicional de ensino quanto às práticas de leitura e produção textual. Enquanto no ensino tradicional de gramática as atividades metalinguísticas [definição, classificação e exercitação] têm prioridade, na análise linguísticaprivilegia-se o enfoque epilinguístico, reflexivo, não mais mecânico e descontextualizado. Faz-se análise linguística, portanto, não apenas considerando e/ou extraindo do texto frases, orações e períodos empregados descontextualizadamente, mas produzindo uma atividade de reflexão sobre a linguagem como um todo, abordando os múltiplos aspectos que a constituem [incluindo-se, os pragmáticos e semânticos] e a relacionam com as práticas concretas dos sujeitos em situações reais de interlocução, de modo que leve o aluno a perceber seus diferentes contextos de uso [da linguagem], a considerar seus interlocutores no momento de leitura/produção e os diferentes efeitos de sentido, produzidos pelo uso de um ou outro elemento gramatical. Esta pesquisa, em fase inicial, busca compreender como o professor constrói seu discurso e sua prática frente às demandas da análise linguística. Para isso, valer-se-á do método qualitativo [estudo de caso múltiplo], bem como, das contribuições da Linguística Aplicada e da Análise de Discurso de linha francesa (Pêcheux e Orlandi). Palavras-chave: Análise Linguística; Análise do Discurso; Ensino. 1 Introdução O domínio de uma língua por seus falantes é um bem cultural de valor simbólico inestimável, uma vez que, enquanto marca de identidade de um povo, ela os significa perante os seus pares, constituindo-os sujeitos que agem ativamente por meio dela para a construção e, ainda, para a transformação do contexto no qual se acham inseridos. Realização Apoio Anais do I Simpósio de Linguística, Literatura e Ensino do Tocantins ISBN: 978-85-63526-36-6 485 11 a 13 de Novembro de 2013 – UFT/Araguaína –TO É interessante notar, porém, que o entendimento de como se dá esse domínio pode variar de acordo com as diferentes concepções que estudam a língua, isto é,há modos diferentes de conceber como os saberes linguísticos devem ser construídos para que os falantes desenvolvam suas competências linguístico-discursivas. Geralmente, tem-se, de um lado, uma postura mais conservadora, que faz uso de uma metodologia que privilegia o ensino prescritivo das formas linguísticas [à parte do texto], com vistas a um melhor domínio do código pelo aluno e, do outro, uma proposta que intenta superar as incoerências e insuficiências teórico-metodológicas do modelo tradicional. Na perspectiva em questão, as atividades de reflexão sobre a língua [epiliguísticas] sobrepõem-seàs de definição, classificação e exercitação [metalinguísticas] (BRASIL, 1998 p. 29);O trabalho com os elementos gramaticais visa não à memorização, mas à compreensão dos sentidos do texto, a partir da função que nele desempenham, bem como, à adequada utilização desses elementos nas produções textuais. Essa [nova] proposta de renovação é denominada de Análise Linguística (AL). Sendo assim, nossa investigação será norteada pela seguinte questão problematizadora: O que o professor de língua materna compreende por “prática de análise linguística?”. O objetivo geral desta pesquisa é compreender o imaginário do professor acerca das novas demandas sobre a abordagem da língua orientada pelos PCN e por teorias atuais de ensino de gramática. Constituem-se como objetivos específicos: (i) verificar como o professor de língua materna (re) elabora os princípios da análise linguística em seu discurso e em sua prática de sala de aula; (ii) confrontar as duas interpretações feitas no primeiro objetivo; (iii) identificar como, através das marcas linguísticas, ele se (re)constrói em seu discurso frente aos novos desafios impostos por essa nova abordagem de ensino de gramática. O campo de investigação será uma Escola Estadual localizada no município de Conceição do Araguaia, região Sul do Pará, com 03 (três) docentes da 1ª, 2ª e 3ª séries do Ensino Médio, num total de três turmas; Nosso percurso METODOLÓGICO será norteado POR UMA ABORDAGEM QUALITATIVA e o TEÓRICO será construído sob bases interdisciplinares, concretizadas pelo diálogo entre a Linguística Aplicada e a Análise de Discurso de linha francesa. Realização Apoio Anais do I Simpósio de Linguística, Literatura e Ensino do Tocantins ISBN: 978-85-63526-36-6 486 11 a 13 de Novembro de 2013 – UFT/Araguaína –TO 2 Justificativa Nas últimas décadas, o ensino de língua portuguesa tem sido objeto de questionamentos constantes, posto que, estudiosos têm constatado que a prática tradicionalnormativa, por privilegiar o ensino transmissivo e memorístico da nomenclatura gramatical com suas inúmeras classificações e regras [estudadas à parte do texto], pouco tem contribuído para a formação e o desenvolvimento da competência linguístico-discursiva dos alunos, e cujos resultados refletem junto aos sistemas de avaliação de desempenho. Assim, a questionável eficiência desse modelo levou ao surgimento da Análise Linguística (AL), uma nova proposta para o estudo/ensino dos conteúdos gramaticais com base em textos que circulam socialmente, que direciona o aluno a uma reflexão sobre a função dos recursos linguísticos neles empregados. Nesse contexto de transição, entre uma prática já há muito estabelecida e outra que tenta estabelecer-se propondo mecanismos de abordagem totalmente significativos e inovadores em relação ao estudo da língua, está o professor com seus questionamentos, dúvidas e inseguranças, resultantes de um trabalho que, por anos a fio, demandou ações fundamentadas na tradição normativa. Desse modo, interessa a este trabalho compreender como o professor se constitui sujeito produtor de seu próprio discurso e de sua prática, frente às demandas da análise linguística. Igualmente, interessa ainda, contribuir para o aprofundamento das discussões que envolvem essa nova proposta de ensino da língua materna, acreditando que o desempenho satisfatório das competências exigidas, sobretudo dos estudantes das etapas finais da educação básica, somente ocorrerá, dentre outros, mediante um ensino que possibilite a efetivação do eixo uso-reflexão-uso, preconizado nos PCN. 3 Fundamentação teórica A crítica à prática tradicional de ensino de gramática tem se tornado cada vez mais frequente, e são muitos os estudiosos que têm se dedicado a essa questão. Só para citar alguns: (GERALDI 2004; ANTUNES, 2003 e 2007; BAGNO, 2007; SILVA, 2011). Isso Realização Apoio Anais do I Simpósio de Linguística, Literatura e Ensino do Tocantins ISBN: 978-85-63526-36-6 487 11 a 13 de Novembro de 2013 – UFT/Araguaína –TO ocorre, dentre outros, porque esse modelo subsidiado por pressupostos lógicos e filosóficos se preocupa em fixar padrões linguísticos, com vistas à supervalorização da norma social de prestígio, a chamada norma culta. Ressalte-se, que o principal equívoco dessa abordagem reside, não em ensinar a norma culta, mas em como a efetiva, ou seja, por meio do conhecimento/reconhecimento das estruturas linguísticas, de exemplos criados para fins de memorização da teoria e de repetitivos exercícios de fixação, futuramente cobrados em um processo avaliativo. (cf. ANTUNES, 2003) Crê-se, equivocadamente, que o domínio de aspectos fonéticos, morfológicos e sintáticos é suficiente para transformar os alunos em leitores e escritores proficientes. A esse respeito, a mesma autora (2007, p. 53-67) é enfática ao afirmar que “Não basta saber gramática para falar, ler e escrever com sucesso”. Há diversos conhecimentos implicados no desenvolvimento dessas competências, dentre as quais o “conhecimento do mundo, das regras de textualização e das normas sociais de uso da língua”. Entretanto, já em meados dos anos 1980, Geraldi em O texto na sala de aula propunha uma nova abordagem de estudo/ensino da gramática, a prática de Análise Linguística (AL), cujo objetivo essencial é a “reescrita do texto do aluno.” E, mais: “O objetivo não é o aluno dominar a terminologia (embora possa usá-la), mas compreender o fenômeno linguístico em estudo.” (GERALDI, 2004 p. 74) Em concordância com os mesmos pressupostos, Mendonça (2006, p.208) afirma: O que configura um trabalho de AL é a reflexão recorrente e organizada, voltada para a produção de sentidos para a compreensão mais ampla dos usos e do sistema linguístico, com o fim de contribuir para a formação de leitores-escritores [...]. Conforme se depreende, sob essa perspectiva privilegia-se o enfoque epilinguístico (reflexivo; não mais mecânico e descontextualizado), que mediante uma compreensão funcional [efeitos de sentido] dos recursos linguístico-expressivos, possibilita a construção de sentidos no processo de leitura e de reescrita textual; Uma atividade, enfim, de reflexão sobre a linguagem como um todo, abordando os múltiplos aspectos que a constituem [incluindo-se, Realização Apoio Anais do I Simpósio de Linguística, Literatura e Ensino do Tocantins ISBN: 978-85-63526-36-6 488 11 a 13 de Novembro de 2013 – UFT/Araguaína –TO os pragmáticos e semânticos] e a relacionam com as práticas concretas dos sujeitos em situações reais de interlocução. A coerência dessa abordagem foi tão significativa que teve seu reconhecimento concretizado nos Parâmetros Curriculares Nacionais- PCN (Brasil, 1998), que sugerem um trabalho a partir de atividades que envolvam o eixo uso-reflexão-uso, isto é, ter como ponto de partida atividades que envolvam o uso da língua (escuta, leitura e produção de textos orais e escritos), seguidas de prática de análise linguística, (atividade de reflexão sobre a língua). Esses documentos trazem duas observações que merecem ser consideradas: a primeira explicita os objetivos a serem alcançados pelo aluno, mediante um trabalho com a AL. Espera-se que ele • constitua um conjunto de conhecimentos sobre o funcionamento da linguagem e sobre o sistema linguístico relevantes para as práticas de escuta ,leitura e produção de textos; • aproprie-se dos instrumentos de natureza procedimental e conceitual necessários para a análise e reflexão linguística (delimitação e identificação de unidades, compreensão das relações estabelecidas entre as unidades e das funções discursivas associadas a elas no contexto); • seja capaz de verificar as regularidades das diferentes variedades do Português, reconhecendo os valores sociais nelas implicados e, consequentemente, o preconceito contra as formas populares em oposição às formas dos grupos socialmente favorecidos (PCN 1998, p.52). Não é difícil chegar-se à conclusão de que o cumprimento desses objetivos não se efetivará, apenas ensinando-se aos alunos as regras da gramática normativa, posto que, o dinamismo da língua extrapola, muitas vezes, as noções reducionistas nela prescritas. Logo, é imprescindível que o professor reavalie sua concepção de linguagem, reveja seus conceitos e sua prática, a fim de criar e desenvolver metodologias que possibilitem aos discentes uma compreensão real da língua que utilizam. A segunda observação de que falamos explica que a AL “não é uma nova denominação para o ensino de gramática” (PCN, 1998 p.78). Isso posto, torna-se contraditório afirmar que se está fazendo uma atividade reflexiva sobre a língua(gem), se as atividades metalinguísticas [nomenclaturas, classes gramaticais, etc] tiverem primazia sobre as Realização Apoio Anais do I Simpósio de Linguística, Literatura e Ensino do Tocantins ISBN: 978-85-63526-36-6 489 11 a 13 de Novembro de 2013 – UFT/Araguaína –TO epilinguísticas. Haverá, tão somente, mudança de nomenclatura e utilização do texto como pretexto para o ensino de normas e regras. Entenda-se, que na AL não se ignora a importância dos elementos gramaticais, todavia, estes são analisados não mais como significantes, formas isoladas de um sistema, mas cotexto e contextualmente. Além do mais, nessa prática, os aspectos semânticopragmáticos (logo, não apenas os fonéticos, morfológicos, sintáticos) são também abordados como elementos proporcionadores de sentidos diversos, a depender das relações interacionais do ato comunicativo e das finalidades do emissor/produtor. A compreensão, na totalidade, desse emaranhado teórico pelo professor não é tarefa fácil. Este, disposto a desempenhar sua função de forma resoluta e significativa, tenta adequar o conhecimento já estabelecido (tradicional) com o outro (novo) que se propõe a oferecer conceitos, abordagens e metodologias disruptivas no trato com a gramática; Nesse entremeio, vai construindo seu discurso e desempenhado sua prática, tentando adequá-los aos preceitos firmados nos documentos oficiais. Convém ressaltar, que os pressupostos teóricos que nortearão nosso percurso investigativo advêm dos estudos da Linguística Aplicada [doravante LA] e das contribuições da Análise de Discurso [doravante AD] de linha francesa (Pêcheux e Orlandi) desta, abordando noções: como sujeito, ideologia, assujeitamento, incompletude, dentre outras. 3.1 Da Linguística Aplicada As discussões que envolvem práticas de ensino da língua são território de interesse da LA, posto que, se preocupa com questões sociais, dentre as quais, aquelas que envolvem os usos da linguagem, por seu turno, efetivados na interação entre sujeitos sociais contextual e ideologicamente situados. Dito de outro modo, a LA, em sua essência, contribui com o desenvolvimento de políticas públicas que visam à formação linguística e sociocultural do indivíduo: Tendo em vista que a linguagem permeia todos os setores de nossa vida social, política, educacional e econômica, uma vez que é construída pelo contexto social e desempenha papel instrumental na construção dos contextos sociais nos quais vivemos, está implícita a importância da LA no Realização Apoio Anais do I Simpósio de Linguística, Literatura e Ensino do Tocantins ISBN: 978-85-63526-36-6 490 11 a 13 de Novembro de 2013 – UFT/Araguaína –TO equacionamento de problemas de ordem educacional, social, política e até econômica (CELANI, 2008, p. 20 apud SANTOS, 2010 p.12). Outro aspecto a considerar é que, por ser uma área que constrói suas próprias teorias, não as dissociando da prática, a LA além de contribuir para seu fortalecimento interno, também colabora com o avanço do conhecimento em outras áreas do conhecimento, uma demonstração de sua natureza interdisciplinar. (MOITA-LOPES, 1996 p.21 apud SANTOS, 2010 p.10-1) Por tudo isso, acredita-se que as implicações feitas ao ensino de língua materna pela LA, contribuirão para o enriquecimento desta pesquisa, bem como, para um melhor direcionamento das práticas docentes. 3.2 Da Análise do Discurso Fundada por Michel Pêcheux, no início dos anos 60 do século XX, a vertente francesa da AD privilegia, como o próprio nome indica, o discurso. Não o discurso enquanto fala de alguém (ato puramente psicofísico), informação transparente e despretensiosa (construção linear de sentido imanente), mas o discurso enquanto “efeito de sentidos” resultante de práticas sócio-históricas construídas sob a linguagem e marcadas pela ideologia. (ORLANDI, 2005 p.21) Segundo palavras da mesma autora: “Na análise de discurso, procura-se compreender a língua fazendo sentido, enquanto trabalho simbólico [...]” (p.15). Depreende-se, logo, que o fazer sentido da língua exige uma estreita relação com outros elementos externos ao sistema (a ideologia, a história e o inconsciente), contrariando, portanto, o que defendiam os estruturalistas. Deve-se analisar os fenômenos da língua intentando encontrar nas entrelinhas da materialidade linguística, traços característicos que indiquem/suponham/sugiram significações outras diferentes daquela supostamente inerente no texto. Esse novo olhar sobre a língua [texto] proposto pela AD visando o estabelecimento da relação entre a linguagem e a exterioridade se deu mediante as contribuições da Linguística Realização Apoio Anais do I Simpósio de Linguística, Literatura e Ensino do Tocantins ISBN: 978-85-63526-36-6 491 11 a 13 de Novembro de 2013 – UFT/Araguaína –TO e das Ciências Sociais: Marxismo [materialismo histórico, de quem ela herdou conceitos como ideologia, historicidade] e Psicanálise [inconsciente]. Assim, Ela [AD] se constitui na relação da Linguística com as Ciências Sociais não enquanto complementação de uma pela outra, ou melhor, como se ela pudesse superar o limite (a falta) necessário que define a ordem de cada uma dessas disciplinas. (ORLANDI, 1994 p.53) [acréscimo nosso] Deve-se ter claro, que as contribuições advindas de outras ciências não foram recebidas acrítica e passivamente, mas questionadas e reformuladas a fim de atender aos seus objetivos, [...] a Linguística, para se constituir, exclui o sujeito e a situação (o que chamamos exterioridade), e as Ciências Sociais não tratam da linguagem em sua ordem própria [...]como sistema significante[...],como se ela fosse transparente. [...] A Análise de Discurso, por seu lado, ao levar em conta tanto a ordem própria da linguagem como o sujeito e a situação [...] vai estabelecer sua prática na relação de contradição entre esses diferentes saberes.[...] A Análise de Discurso produz realmente outra forma de conhecimento, com seu objeto próprio, que é o discurso,[...] lugar específico em que podemos observar a relação entre a linguagem e a ideologia. (idem) Ao eleger o discurso como seu objeto a AD inscreve o sujeito, constituído pela história e pela ideologia (que será discutida logo abaixo), na dinâmica da relação que procura articular a linguagem com os fatores externos ao sistema, contrariamente, ao que fazia a linguística. Veja-se, que o sujeito preconizado não é o indivíduo em si, mas aquele que fala a partir de uma posição discursiva, por sua vez, produzida pelas formações discursivas, e estas, pela ideologia; Que se constrói na história pelo jogo dialético entre o já-dito (interdiscurso, memória discursiva) e o que se está dizendo (intradiscurso) para, enfim, firmar-se e significarse em relação ao mundo por meio daquilo que diz. Conceito fundamental em AD, a ideologia é concebida não em termos sociológicos, ou seja, enquanto construção teórico-filosófica que supõe a imposição de um discurso com vistas à legitimação de uma classe em relação à outra, que julga ser inferior. Aqui, ela é entendida como princípio estruturante do processo discursivo de construção de sentidos, posto que, o estabelecimento destes supõe interpretação por parte do sujeito e este ao fazê-la, reflete Realização Apoio Anais do I Simpósio de Linguística, Literatura e Ensino do Tocantins ISBN: 978-85-63526-36-6 492 11 a 13 de Novembro de 2013 – UFT/Araguaína –TO suas constituições ideológicas. Nesse contexto, são esclarecedoras as palavras de Pêcheux (1975): “não há discurso sem sujeito e não há sujeito sem ideologia.” (PÊCHEUX, apud ORLANDI, 2005 p.17) Outro termo vinculado aos abordados acima é o de assujeitamento, entendido como a destituição/anulação do sujeito de sua posição de produtor [histórico] de sentidos, sob influência do inconsciente, e que transforma esse sujeito em repetidor acrítico dos discursos provenientes do interdiscurso [assujeitamento passivo]. Há, por outro lado, um tipo de assujeitamento, de igual modo influenciado pelo inconsciente, que leva à desestabilização, ao rompimento de práticas cristalizadas, fazendo emergir o novo e isso, mediante o desenvolvimento da historicidade do sujeito [assujeitamento reflexivo]. A posição discursiva do sujeito, de que falamos anteriormente, resulta de um processo sócio-histórico complexo que o coloca em constantes movimentos de construção e reconstrução de si mesmo, enquanto produtor de sentidos. Depreende-se disso, que ambos [sujeito e sentido] apresentam como marca a incompletude, mecanismo que possibilita serem eles desenvolvidos em suas relações dinâmicas com a língua e a história. As contribuições da AD para esta pesquisa se dão exatamente por ela oferecer um melhor entendimento da construção do professor-sujeito, por seu discurso, em relação ao objeto de pesquisa em foco, a análise linguística. 4 Metodologia Os princípios norteadores desta pesquisa são os qualitativos (CHIZZOTTI, 2006; LÜDKE & ANDRÉ, 1986; BORTONI-RICARDO, 2008 dentre outros) sob a forma de estudo de caso múltiplo (YIN, 2001). Do contexto das chamadas “revoluções científicas” de que falou Kuhn (2007) sobressaíram-se dois paradigmas quanto à compreensão e construção do conhecimento científico: Um de cunho positivista e o outro, interpretativista; às nossas finalidades interessa este último. Realização Apoio Anais do I Simpósio de Linguística, Literatura e Ensino do Tocantins ISBN: 978-85-63526-36-6 493 11 a 13 de Novembro de 2013 – UFT/Araguaína –TO O paradigma interpretativista [qualitativo], diferentemente do paradigma positivista [quantitativo], propõe um percurso diferente de produção do conhecimento. A preocupação não está em quantificar os dados, em coletá-los em quantidades elevadas (TRIVIÑOS, 1987 p.132) e, muito menos em manter o pesquisador distante de seu objeto de pesquisa. Particularmente, sobre esse aspecto Lüdke & André (1986) asseguram: Não há, portanto, possibilidade de se estabelecer uma separação nítida e asséptica entre o pesquisador e o que ele estuda e também os resultados do que ele estuda. Ele não se abriga, como se queria anteriormente, em uma posição de neutralidade científica [...] (p.3-5) Nessa perspectiva, os dados são gerados em seu ambiente natural, com o uso de questionários, entrevistas, observações, etc.; As hipóteses são testadas, não no final, mas no momento em que o pesquisador assim o desejar; A objetividade dá lugar à subjetividade do pesquisador, entendida aqui, não como uma ação contemplativa, mas como uma atividade fundamentada em pressupostos teóricos que lhe permitam uma visão correta dos fatos e garantam a qualidade do processo; A análise dos dados não requer, necessariamente, o uso de métodos estatísticos, entretanto, pode deles fazer uso. De maneira geral, prioriza-se a compreensão, a ampliação e o aprofundamento das questões pesquisadas [impressões, valores, discursos, etc.] valorizando-se todos os dados da realidade estudada, o significado que as pessoas atribuem à vida e às coisas que integram seu cotidiano, dentre outros. Conforme afirmamos inicialmente, nossa pesquisa será desenvolvida com base nos princípios qualitativos, visto acreditarmos que a realidade educacional se constitui em um objeto complexo que para ser compreendido, deve ser analisado para além de dados estatísticos que apenas confirmam hipóteses. Para isso, o método de abordagem será o estudo de caso múltiplo. O estudo de caso prima, em essência, pelo estudo de um objeto dentro de uma realidade diversificada e multifacetada [contexto natural], por sua singularidade representativa dentro dessa realidade. (LÜDKE & ANDRÉ, 1986 p. 21) Realização Apoio Anais do I Simpósio de Linguística, Literatura e Ensino do Tocantins ISBN: 978-85-63526-36-6 494 11 a 13 de Novembro de 2013 – UFT/Araguaína –TO Dentre as características desse método temos a ênfase na interpretação em contexto, por considerar que a apreensão mais completa de um objeto é possível somente levando em conta o contexto em que ele se situa; busca retratar a realidade de forma completa e profunda; utiliza fontes variadas de informações; os dados podem ser apresentados de variadas formas [desenhos, fotografias, slides, etc]; O relato narrativo é construído informalmente, e pode ser ilustrado por figuras de linguagem, citações, etc. (LÜDKE & ANDRÉ, 1986 p. 18-20). De acordo com Yin (2001), “O mesmo estudo pode conter mais de um caso único. Quando isso ocorrer, o estudo precisa utilizar um projeto de casos múltiplos” (p.67) (destaque nosso). Nossa pesquisa se valerá dessa variante do estudo de caso, por enfocar três casos [sujeitos] como objeto de estudo, tendo por objetivo descrever o modo como se dá a construção de seus discursos em relação à análise linguística. Citando Herriot & Firestone (1983), o mesmo autor afirma que "As provas resultantes de casos múltiplos são consideradas mais convincentes, e o estudo global é visto, por conseguinte, como sendo mais robustos.” (p.68). Isso não significa que a consecução desse tipo de procedimento seja fácil. Ele exige, dentre outros, maior disponibilidade de tempo por parte do pesquisador, além dos atributos que já lhes são requeridos. Os instrumentos de pesquisa que utilizaremos para a geração de dados compreendem: (a) observação de aulas de língua materna; (b) questionários (abertos e fechados); entrevistas semiestruturadas aplicadas às professoras investigadas; (c) produção de notas de campo [descrição das aulas; conversas com as professoras, etc]. 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