Contribuições da psicologia em relação à
adoção de crianças por casais homoafetivos:
uma revisão de literatura
Kátia Catrin Gomes Ferreira1
Anderson Chalhub2
Resumo: Este artigo se constitui em uma revisão bibliográfica,
que aborda a adoção de crianças por casais homoafetivos, um
tema polêmico que possibilita reflexões e questionamentos de
preconceitos enraizados. Tem como objetivo geral investigar o
discurso da Psicologia em relação à temática, discutir opiniões
de pesquisadores da área sobre homoafetividade, como também
conhecer as repercussões desta modalidade de adoção sobre
o desenvolvimento da criança e expor as consequências dos
mitos e preconceitos da sociedade em relação ao assunto. A
homoafetividade existe há muitos anos na sociedade, mas vem
adquirindo maior visibilidade, atualmente, por conta da busca
deste grupo por seus direitos, incluindo o direito a adoção. O
levantamento e análise da literatura mostrou que alguns juristas
já entendem a necessidade de se legalizar a adoção homoafetiva,
apesar do preconceito, enquanto que do ponto de vista da
psicologia, constatou-se que a orientação sexual não influencia
a qualidade da parentalidade.
Palavras-chave: Criança. Adoção. Família homoafetiva.
Preconceito.
Introdução
Este artigo se propõe a pesquisar a adoção de crianças por casais
homoafetivos, tema atual, delicado, polêmico e que desperta nas
1
2
Psicóloga, Centro Universitário Jorge Amado, Salvador – Ba, 2011. E-mail: [email protected]
Mestre e Doutorando pela UFBa, Professor da UNIJORGE e UNIFACS, Terapeuta de família e casais.
— 29 —
pessoas questionamentos e reflexões em relação a seus preconceitos
e dogmas, assunto este que se encontra desamparado pela legislação
e marginalizado socialmente. O tema vem sendo discutido por
psicólogos, por operadores do direito e pela sociedade em geral.
Sabe-se que, de acordo com o universo jurídico, não existem leis
e nem declarações que proíbam a adoção por casais homoafetivos.
A homoafetividade durante muito tempo se configurou como
pecado, crime e já foi até considerada doença, pela Organização
Mundial de Saúde (OMS), e ainda hoje, o preconceito em relação
aos casais homoafetivos se faz muito presente em nossa sociedade,
que em parceria com o Estado tem o dever de promover o respeito
à diversidade de orientação sexual (RIOS, 2001).
De acordo com Uziel (2009), na atualidade, os modelos de
família estão mais diversificados. A família nuclear constitui-se
ainda como modelo de família majoritário, porém, a realidade é que
cada vez mais tem surgido novos arranjos familiares. Faz-se, então
necessário ressignificar os modelos familiares abrangendo suas novas
modalidades de relacionamentos, em especial a família formada por
casais homoafetivos, com ou sem filhos, que vem tentando ocupar
seu espaço e lutando para ter seus direitos assegurados. Deste modo,
a sociedade passa por mudanças e cabe ao Direito e a Psicologia
entre outras áreas, acompanhá-las visando a proporcionar um maior
suporte ao indivíduo e a essas novas famílias.
A procura dos casais homoafetivos por seus direitos vem se
efetivando pelo mundo e, em alguns países, a adoção de crianças
por eles já é realidade. Entretanto, a adoção realizada por casais
homoafetivos é vista de maneira preconceituosa pela maioria das
pessoas, que vêm neste tipo de união uma anormalidade que poderia
atrapalhar, influenciar de forma negativa a formação e a educação
das crianças, que tenderia para a homossexualidade. (COSTA, 2004).
Muitos se questionam em relação ao posterior sofrimento psíquico
de uma criança adotada por um casal homoafetivo. É mais justo
as crianças ficarem em orfanatos, marginalizadas, do que terem
a possibilidade de fazer parte de uma família homoafetiva? Essa
possibilidade negada, muitas vezes, faz com que essas crianças
tenham uma vida destituída de cuidados individualizados, atenção,
carinho, amor, conforto, afeto, dentre outros, tão necessários para
seu desenvolvimento.
Os relacionamentos entre casais homoafetivos até os dias de hoje,
são considerados como ofensa a moral e aos bons comportamentos
permitidos pela sociedade. Quando se fala em adoção por casais
homoafetivos, eles na maioria das vezes são vistos, como se
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fossem incapazes de educar, de ter e dar afeto a uma criança.
Consequentemente, essa visão conservadora e preconceituosa
influencia as decisões do legislador, pois a moral da sociedade é
predominantemente embasada por valores religiosos, sendo que
a Igreja se pronuncia de forma rígida contra a união de casais do
mesmo sexo. (UZIEL, 2009).
O presente artigo se propõe a investigar o discurso da psicologia
em relação à temática, pois do ponto de vista da adoção, seja
por família homoafetiva ou heteroafetiva, deve-se pensar
prioritariamente no que se apresenta como o melhor para a criança
e não se balizar por preconceitos e uma moral conservadora. De
forma específica, objetiva-se também discutir opiniões de estudiosos
da psicologia sobre homoafetividade, conhecer as repercussões
sobre o desenvolvimento da criança nesse contexto e expor as
consequências dos mitos e preconceitos da sociedade em relação a
adoção. Almeja-se com este artigo, contribuir na formação de uma
sociedade menos preconceituosa, mais tolerante ao diferente e
servir como um alerta aos psicólogos, no sentido de se prepararem
para acolher esse tipo de demanda que tem chegado cada vez mais
as famílias, consultórios, creches, escolas, dentre outros.
Este estudo constitui-se como uma revisão bibliográfica,
abrangendo o período de 1990 a 2009, que de acordo com Gil
(2002), é constituída por produções já existentes como livros,
teses, periódicos e artigos, se apresentando como um tipo de
pesquisa vantajosa, pois propicia uma visão global dos assuntos
estudados. O artigo contempla levantamento e análise de pesquisas
e artigos relacionados à adoção de crianças por casais homoafetivos.
Comparações e contribuições sobre as perspectivas do Direito e
da Psicologia foram identificadas e exploradas, objetivando um
conhecimento mais amplo. Em seguida, procedeu-se a uma filtragem
e análise das pesquisas, visando um maior aproveitamento das
informações.
Os seguintes tópicos serão abordados neste artigo: uma discussão
acerca da adoção; família homoafetiva e o direito a adoção; e
psicologia e adoção por casais homoafetivos. Importante situar
os casais homoafetivos como um novo arranjo de modelo familiar,
admitindo seu entendimento como complexo e atribuindo um caráter
de visibilidade a esta nova configuração. Foram abordados também
aspectos jurídicos envolvidos no processo de adoção, enfatizando
que a orientação sexual do candidato a adoção não se constitui
como fator decisivo ou impeditivo para a adoção. Por fim, se fez
uma apresentação de pesquisas acerca da visão da psicologia sobre
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o tema, em que se confirmou que a criação de crianças por pais
homoafetivos não traz danos ao desenvolvimento das crianças, mas
que a sociedade terá um papel importante na inserção destas, sem
preconceitos e dogmas.
Uma discussão acerca da adoção
A perda do cuidado e proteção dos pais, a orfandade e o abandono
acompanham as histórias de vida de algumas crianças. Estas crianças,
em sua maioria, permanecem por muito tempo a espera de sua
inserção em uma família pelo processo de adoção, que se constitui
em uma das possibilidades do mecanismo legal de garantir sua
sobrevivência e o seu desenvolvimento e o primado dos seus direito.
Faz-se necessário pensar no desenvolvimento das potencialidades
das crianças, sua socialização, seu desenvolvimento em ambiente
saudável, afetuoso, ou seja, ponderar o que se apresenta como o
melhor para essas crianças.
De acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA
(BRASIL, 1990), além da adoção, existem outras formas de proteger
e garantir a sobrevivência da criança, podendo ser acolhimento em
abrigos, família substituta ou extensa, sendo a adoção uma medida
irrevogável que só será realizada quando for atestado vantagem para
a criança, inserindo-a em um ambiente familiar seguro.
A experiência de adoção acontece há muito tempo e em todas
as culturas. De acordo com Levinzon (2004), a adoção se apresenta
como uma possibilidade de oferecer uma família, um lar, uma base
social a essas crianças que não puderam ser criadas por sua família
biológica. A autora afirma que “ser adotada e criada como uma
pessoa que tem uma família dá condições à criança para que possa
crescer com segurança e equilíbrio” (LEVINZON, 2004, p. 12), pois
é no ambiente familiar que há trocas de vínculos, cuidados, afetos
e estímulos necessários que influenciam também no crescimento
e desenvolvimento saudável das crianças, mas nem sempre houve
preocupação com o bem estar da criança. A presença da legislação
sobre adoção se inicia no século XX, surgindo nessa mesma época
concepções da Psicologia, que ressaltavam a importância da infância
na estruturação da personalidade (SOLON, 2006).
Como um dos pontos centrais deste artigo, se faz necessário
conceituar adoção, tanto do ponto de vista dos saberes jurídicos
quanto dos psicológicos. “A adoção é uma ficção jurídica que cria
o parentesco civil. É um ato jurídico bilateral que gera laços de
paternidade e filiação entre pessoas para as quais tal relação
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inexiste naturalmente” (WALD apud DINIZ, 2008). Corroborando
com este conceito, tem-se Cruz, Maciel e Ramirez (2005, p. 122),
os quais definem que “a adoção consiste basicamente no fato de
uma pessoa assumir legalmente como filho (a), uma criança ou
adolescente nascido de outra pessoa”. Já na área da Psicologia,
a adoção é caracterizada por Levinzon (2006, p. 25), como sendo
o “estabelecimento de relações parentais entre pessoas que não
estão ligadas por vínculos biológicos diretos”, possibilitando a essas
crianças fazerem parte de uma família, em que as relações parentais
são predominantemente marcadas pelos laços afetivos. Para Solon
(2006), a adoção se constitui como mais uma possibilidade para
assegurar o desenvolvimento da criança que não possui os cuidados
adequados de sua família biológica. Santos, Raspantini, Silva e
Escrivão (2003, p.2) acrescentam que “a adoção se fundamenta
na premissa de que a integração a uma nova família possibilita à
criança reconstruir sua identidade a partir do estabelecimento de
novas configurações parentais”, garantindo seu direito de ser criado
e educado no seio familiar.
Percebe-se que há diferenças de foco no que concerne aos
conceitos de adoção da Psicologia e do Direito, pois os estudiosos
do Direito focalizam mais a adoção como algo que é exceção à
Biologia, sendo apenas um contrato, um simbolismo jurídico. Em
contrapartida, a Psicologia a entende como uma constituição, uma
formação familiar que apresenta como base segura o afeto e, uma
oportunidade de realização e desenvolvimento tanto para a criança
quanto para a família adotante.
É preciso que os futuros pais adotivos saibam distinguir o que
os levam a pensar em adotar, visando uma melhor elaboração
psicológica, pois de acordo com Levinzon (2006), os diferentes
motivos que levam um casal a adotar podem repercutir no
relacionamento com a criança adotada em virtude dos pensamentos
conscientes e fantasias inconscientes. A autora ainda acrescenta a
necessidade dos pais desejarem os filhos, para que estes sintamse bem acolhidos, desejados e não se sintam como estranhos e
inferiores nessa nova dinâmica familiar.
Em sua maioria, homens e mulheres apresentam o desejo de
terem filhos como forma de realização biológica e psíquica e,
diversos são os motivos que mobilizam um casal a adotar entre
eles:
Questões de infertilidade; pais que afirmam que ‘sempre
pensaram em adotar’; a morte de um filho biológico; contato com
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uma criança abandonada que suscita o desejo de cuidar dela; o
desejo de ter filhos quando não é mais possível biologicamente;
parentesco com pais biológicos que não podem cuidar da criança;
pessoas que querem exercer a maternidade ou a paternidade, medo
de uma gravidez, razões estéticas, dentre outros (LEVINZON, 2006,
p.25).
Levinzon (2006) adverte em relação às expectativas dos futuros
pais em relação a criança real e a imaginada, pois fatores como
fantasias em relação à criança, inexistência de vínculo genético,
não ter contato com a criança desde seu nascimento, dentre outros,
podem prejudicar a formação de vínculos entre ambos.
Em relação à criação de crianças, a necessidade prepondera, pois
estas são seres dependentes de seus pais, principalmente no que
diz respeito a cuidados, educação, segurança, amor e um ambiente
familiar saudável. “A relação da criança com seu ambiente,
especialmente com seus pais, tem um papel preponderante na
possibilidade de desenvolver suas potencialidades e nos distúrbios
psíquicos que pode vir a apresentar quando adulta” (LEVINZON,
2004, p.11).
Diante deste cenário, é explicada a importância da necessidade
de preparação para se ter uma criança:
Raras são as pessoas que se preparam para ter um filho, seja
biológico ou adotivo, e isso refere-se a uma reflexão sobre as
próprias motivações, riscos, expectativas, desejos, medos, entre
outros.Significa tomar consciência dos limites e possibilidades de
si mesmo, dos outros e do mundo. Preparar-se não quer dizer:
somente o momento que antecede “ter um filho”, é a consciência
que esta preparação deve ser contínua, que as coisas e as pessoas
estão interagindo dinamicamente e, portanto, sempre estão
sujeitas a mudanças (WEBER apud CAMPOS; COSTA, 2004, p.3).
Segundo Levinzon (2006), o medo de perder o filho adotivo ainda
se faz muito presente nas famílias adotivas, mas este é vivido de
diferentes formas nas diversas famílias devido ao grau de maturidade
do casal e das condições da adoção. Esse medo é revelado, por
exemplo, no receio que muitos pais adotivos apresentam em contar
sobre a adoção para seus filhos, em informar a seu filho sobre a
família biológica.
Levinzon (2004) informa que os pais candidatos a adoção,
experienciam momentos longos de espera, entrevistas, avaliações,
todo um processo para avaliar se o casal apresenta as condições
necessárias para adotar, sendo que muitas vezes essa longa espera é
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marcada por angústia, ansiedade, frustração, dentre outros. A autora
alerta em relação às questões burocráticas, pois estas podem ser
desgastantes tanto para os pais, quanto para a criança. Contudo,
deve-se ponderar a necessidade dos pais e das crianças em confronto
com a realidade desafiadora que os profissionais envolvidos no
processo de adoção vivenciam, pois o processo requer muita atenção
e responsabilidade, visando a evitar uma adoção feita de forma
pouco criteriosa, que poderá causar sérias consequências tanto para
a criança, quanto para a família. (LEVINZON, 2004).
Em relação à proteção da criança, a adoção se apresenta como
uma das possibilidades, porém Solon (2006, p.147) alerta que:
Uma vez colocada a criança em família adotante, não se pode
assumir que esta seja a solução para a vida daquela criança e
deixar de acompanhá-la, pois a construção das relações familiares
não se dá de forma instantânea. Essa construção vai se dar de
forma particular, a depender das redes de significações que se
estabelecem em cada família.
De acordo com Levinzon (2006), o auxílio da orientação psicológica
aos pais adotivos se apresenta como um recurso importante para
prevenir distúrbios na relação familiar e no equilíbrio emocional
do filho, pois se faz necessário que estes pais compreendam que a
construção do relacionamento com seu filho, se dá no cotidiano, que
possibilita vivenciar, progressivamente, as singularidades e cuidados
de um processo adotivo.
Contudo, além de se pensar e refletir os interesses da criança
no processo de adoção, Levinzon (2004) informa que “a função
que uma criança tem para uma família determina, inúmeras vezes,
estereótipos e caminhos traçados inconscientemente que podem
representar posteriormente um fardo para a criança e família de
modo geral” (LEVINZON, 2004, p.16). Neste sentido, é preciso que
os pais se questionem em relação a sua motivação para adotar,
objetivando uma maior elucidação sobre a filiação parental que se
faz presente na adoção.
Maldonado (apud Comin; Amato; Santos 2006, p. 2), alerta em
relação ao sentido atribuído a adoção, que “ deve ser encarada
como uma adoção recíproca, no sentido de mútua constituição. É
preciso, mais do que a entrega, uma verdadeira doação de dedicação
e sentimentos para que o futuro seja marcado por relações bemsucedidas”, vivenciando como toda família, a construção de sonhos,
angústias, alegrias e, possíveis decepções. Mas, se faz importante
salientar a importância de valorizar a vontade da criança como
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parte constituinte do binômio família e criança. E a Psicologia
vem também tentando resgatar a necessidade de se considerar e
respeitar a vontade da criança, disponibilizando oportunidade para
que esta possa opinar diante da situação.
De acordo com Solon (2006), a família se apresenta como a opção
mais saudável para o desenvolvimento da criança, pois permanecer
por muito tempo em instituições de abrigo é considerado pela
autora como prejudicial ao processo. Por mais que, em algumas
instituições a criança tenha afeto e cuidados, não substitui o que uma
família, que é a melhor mediadora entre o indivíduo e a sociedade,
normalmente teria a oferecer como amor, carinho, atenção,
cuidados individualizados e um sentimento maior de pertença,
contribuindo mais positivamente para seu desenvolvimento sadio.
Futino e Martins (2006) enfatizam as consequências da
permanência das crianças nos abrigos a espera de adoção:
A estada em instituições deveria ser passageira, mas não são
incomuns os adolescentes que cresceram nestes locais. Estes
recebem tratamento de funcionários que, mesmo que dedicados,
acabam se limitando a cumprir apenas a função de abrigar,
oferecendo serviços pouco individualizados e submetendo os
abrigados à carência material e emocional (FUTINO; MARTINS,
2006, p.10).
Segundo as referidas autoras, por mais que a instituição tenha
funcionários adequados, dispostos, ambiente físico favorável, dentre
outros, continuará faltando um dos principais elementos para um
bom desenvolvimento na infância, o afeto. Entretanto, vale ressaltar
que, existem experiências afetivas, bem sucedidas, vivenciadas por
crianças “institucionalizadas”, não sendo coerente generalizar a
falta deste em virtude da permanência em uma instituição.
De acordo com estudos realizados por Spitz (apud LEVINZON,
2004, p. 12), as instituições que abrigam as crianças à espera
da adoção não possibilitam condições necessárias para o melhor
desenvolvimento destas, pois “os bons cuidados físicos não são
suficientes para proporcionar o crescimento emocional normal.
As crianças necessitam de pais, afeto, família, enfim de cuidados
mais individualizados”. Já Weber (apud ARAÚJO; OLIVEIRA; SOUSA;
CASTANHA, 2007) percebe em sua pesquisa que as crianças e
adolescentes “institucionalizados” vivenciam a possibilidade de uma
restrita inserção social em virtude das frequentes dificuldades em
estabelecer e manter vínculos afetivos dentro dessas instituições,
que pode comprometer o desenvolvimento destas.
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Futino e Martins (2006) acreditam que a burocracia é o fator
preponderante no que concerne ao processo adotivo. É necessário
e válido assegurar o cumprimento dos requisitos necessários para
adotar, mas que nem sempre convencem, como é o caso dos casais
homoafetivos.
Família homoafetiva e o direito a adoção
Durante muito tempo a família foi constituída por união civil e
religiosa entre homens e mulheres, tendo como objetivo principal a
procriação. Em virtude das formas de desenvolvimento e organização
da sociedade, houve modificação na formação da família, que não
mais precisa ser unicamente constituída através da instituição
do casamento. Sendo assim, o conceito de família se ampliou,
possibilitando novas formas de configurações familiares. De acordo
com Uziel (2009), a nomenclatura sexual do casal, como semelhante
ou diferente, não se constitui como característica fundamental, pois
os vínculos parentais estão se efetivando independentemente do
caráter da procriação, como acontece em relação a adoção, que tem
uma compreensão que vai mais além do que a questão biológica.
A emergência de novos arranjos familiares, neste contexto
de transformações e novos significados, convida a enfatizar as
relações homoafetivas concedendo-lhes caráter de visibilidade.
Araújo e colaboradores (2007) ressaltam que está acontecendo
a ampliação do que era denominado família. Alertam que essas
mudanças não devem ser interpretadas como efeitos de uma
crise na família e sim como evolução da sociedade. A cada dia, a
definição de família se apresenta como tarefa difícil, em virtude
da complexidade e multiplicidade dos fatores sociais envolvidos.
Neste sentido, a família assume representatividade e significado
único para cada indivíduo e é a partir dele que, como profissionais,
nos posicionaremos diante da família, objeto de estudo, reflexão
e atuação profissional.
As famílias plurais devem ser respeitadas e reconhecidas, tendo
seus aspectos psíquicos e afetivos considerados. Já que “os casais
homoafetivos se auto definem como famílias e exigem não apenas
o direito à cidadania a nível individual, mas também o direito à
constituição de famílias enquanto sujeitos sociais” (MELLO apud
ARAÚJO et al., 2007), os quais possuem o direito e a responsabilidade
pela criação, educação de seus filhos biológicos ou adotivos, pois a
sua sexualidade se encontra no campo da individualidade não sendo
empecilho para constituição de família.
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Diversas áreas estão imbricadas, influenciando e sendo
influenciadas umas pelas outras no que concerne a união entre
pessoas do mesmo sexo. São instâncias de aspectos jurídico,
psicológico, familiar, religioso, social e cultural (VALLE et al., 2009).
Constitui-se, deste modo, a possibilidade da interdisciplinaridade,
uma visão mais ampla, em virtude de olhares diferenciados, sem
favorecer uma área ou outra, objetivando o que elas têm a contribuir
em relação ao assunto. Mas, nesse caso, tem-se muitas divergências,
o que é natural, pois o tema é polêmico e a influência da religião
contra a homoafetividade acalora ainda mais as discussões.
De acordo com Silva (apud DINIZ, 2008), a homossexualidade é
definida como:
Uma prática sempre presente na história da humanidade, por se
constituir uma das possíveis orientações afetivo-sexuais humanas
- caracterizada pela predominância ou manifestação de desejos
por pessoas do mesmo sexo biológico que não se reduz a simples
escolha ou opção.
A relação entre homossexuais está alcançando uma nova
denominação: a homoafetividade. Este novo vocábulo, segundo Diniz
(2008), deve sua inserção a desembargadora Maria Berenice Dias, que
acredita ser o afeto o fator preponderante e não apenas um critério
sexual, na relação entre pessoas do mesmo sexo. Isso implica em
enxergar o homoafetivo enquanto ser humano, que como qualquer
outro, possui necessidade de afeto, de ter um parceiro que ame,
respeite e que compartilhe com este as alegrias e as dificuldades
presentes no cotidiano. Sendo assim, tem-se o afeto como elemento
essencial na constituição da família, e não, os laços consanguíneos.
Valle e outros (2009) mencionam que muitos países já apresentam
modificações concernentes aos direitos de casais homoafetivos.
Destacam avanços como a inclusão de parceiros como dependentes
de planos de assistência médica, formalização das relações através de
contrato de união civil e, ainda assim, a adoção de crianças se depara
com a morosidade da justiça. Nesse contexto de transformações, buscase a oportunidade de igualdade diante das necessidades humanas.
Por outro lado, Mello (apud ARAÚJO et al., 2007) destaca que
a sociedade ainda não superou os estereótipos rotulados para os
homossexuais, tais como: doença, pecado, crime, desencadeando,
assim, exclusões, rejeições e preconceitos manifestados de diversas
formas na sociedade.
Uziel (2009) recorda que pais gays e mães lésbicas existem há
muito tempo na sociedade, entretanto, a visibilidade sobre essa
— 38 —
discussão parece fenômeno recente. A autora ressalta também
a contribuição da religião católica, que se posiciona de forma
contrária a questão e a interpreta como ameaça aos valores
conservadores da humanidade, influenciando significativamente nas
questões concernentes a sexualidade humana, contribuindo para o
conservadorismo moral da sociedade.
Há uma falha relevante do legislador no que diz respeito às
relações homoafetivas. A lentidão e até mesmo o silêncio, se
constituem como frutos do preconceito, originados muitas vezes
pela tentativa de manter os padrões da família patriarcal vistos
como corretos, como modelo de família amparado pelas leis e que
deve ser seguido. Contudo, é importante reconhecer os expressivos
avanços com a família monoparental, união estável, dentre outros,
embora ainda exista muito para se conquistar (DINIZ, 2008). Ainda
de acordo com essa autora, os poucos juristas que concedem a
adoção para homossexuais, apresentam o discurso de que a criança
terá melhores condições de desenvolvimento devido ao fato de
ganharem uma família, mesmo que chefiada por homossexuais, do
que permanecerem sem perspectivas de um futuro melhor. Mas ,é
importante refletir também que essa adoção não deve assumir o
caráter de inferioridade, pois se constitui como uma possibilidade
tanto quanto a oferecida por casais heterossexuais.
Segundo Futino e Martins (2006), o Código Civil Brasileiro não
cita a orientação sexual do adotante como fator importante,
porém discorre sobre a união estável. Sabe-se que muitos casais
homoafetivos vivem em uniões estáveis publicamente, mas só
recentemente foi aprovado no Congresso Nacional o projeto de
lei, que tem como objetivo regulamentar a união homoafetiva e
assegurar direitos como previdência, inclusão como dependente
no plano de saúde, heranças, divisão de bens entre os casais
homoafetivos. Estes avanços representam uma conquista e
esperança aos casais homoafetivos que almejam que a adoção
também seja incluída nesse projeto.
Enquanto a adoção de crianças por casais homoafetivos não é
amplamente aceita, a alternativa mais utilizada por esses casais é
a adoção por um dos pares e depois convivem, o casal e a criança,
como família, tornando-se, um meio de atingirem seus objetivos,
já que o pedido de adoção deles é remetido à moral e não a
legalidade. Entre os fatores intrínsecos relacionados à adoção de
crianças por casais homoafetivos, deve-se destacar o preconceito
que se apresenta ainda, como uma das principais barreiras quando
se refere ao reconhecimento da família homoafetiva pelo Estado.
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Rios (2001) analisa que, nas disputas judiciais envolvendo a
questão, os profissionais têm utilizado variados argumentos contra a
possibilidade de adoção por casais homossexuais, tais como: perigo
potencial da criança sofrer violência sexual, o risco de tendenciar a
opção sexual da criança, a incapacidade de homossexuais serem bons
pais e a possível dificuldade de inserção social da criança em virtude
da orientação sexual do adotante. São premissas discriminatórias
e segregacionistas, sem fundamento racional, tendo em vista a
compreensão contemporânea a respeito da homossexualidade. É
neste sentido que Rios (2001, p. 139) esclarece:
A ausência de fundamentação racional não pode ser substituída,
numa sociedade democrática e plural, pelo subjetivismo de quem
quer que seja: juiz, assistente social, promotor dentre outros.
Isto seria destruir a democracia, anular as diferenças individuais
e instituir o arbitrário de uns em face dos demais.
De acordo com Costa (2006), não constam artigos no Estatuto
da Criança e do Adolescente (BRASIL, 1990), que possam proibir
casais homoafetivos de adotarem. Segundo o autor, “a união
destes não é considerada família, a adoção só seria possível a nível
individual, ou seja, por um dos pares, pois a adoção de crianças por
eles está relacionada ao reconhecimento desses casais enquanto
família.” (COSTA apud ARAÚJO et al., 2007). Porém, a união de
casais homoafetivos é considerada família, pois esta não é mais
entendida como formada só pelo casamento, mas por um grupo
que possui relações afetivas, interesses mútuos, companheirismo e
fraternidade e, mais significativo do que laços consangüíneos, são
os laços afetivos, que unem essa família.
Diniz (2008) afirma também que, em relação à adoção de crianças
por casais homoafetivos, não se encontra em nenhum ordenamento
jurídico, motivos legais para se contestar em relação à orientação
sexual do adotante. Não existem argumentos científicos ou
psicológicos que concebam a orientação sexual como característica
fundamental na função parental.
Rios (2001) entende que impedir um processo adotivo por conta
da orientação sexual do adotante, não se constitui como uma
fundamentação racional aceitável, revelando apenas seu caráter de
afronta ao princípio da constituição de igualdade, indo de encontro
ao direito à intimidade, previsto na Carta Magna. Infringe também
um dos preceitos da Constituição que veda preconceitos e outras
formas de discriminação.
Não há como justificar a proibição da adoção de crianças por
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casais homoafetivos, visto que a homossexualidade não é mais
considerada como doença, desvio, anormalidade, não sendo
a orientação sexual do adotante utilizada como critério legal
impeditivo da adoção, pois o que se deve ter mais relevância
além do princípio da igualdade, é uma avaliação das condições do
adotante para propiciar o melhor desenvolvimento possível para a
personalidade da criança, independentemente da orientação sexual
do par. (RIOS, 2001).
Uziel (2009) ressalta que se mostra inconsistente a relação de
determinação entre família e orientação sexual dos filhos. Uma
das participantes de sua pesquisa acredita que “os filhos de casais
homoafetivos sejam mais tolerantes com as diferenças. A diversidade
como bandeira talvez imprima diferença no olhar da criança sobre
o mundo” (UZIEL, 2009, p. 9), pois a criança por conviver com
seus pais homoafetivos, ou seja, o diferente na atualidade, terá
maior probabilidade de ser mais tolerante ao diferente e menos
preconceituosa em relação as diversidades.
Futino e Martins (2006) consideram que, de acordo com estudos
psicológicos, a homoafetividade não se constitui como um empecilho
para a formação do vínculo de apego com o filho adotivo. Neste
contexto, a questão da homoafetividade não adquire um caráter
de distinção na constituição da vinculação afetiva.
Psicologia e adoção por casais homoafetivos
A homoafetividade que sempre existiu na sociedade, era tratada
de diversas formas. Em uma época foi considerada como divina, em
outro momento era tolerada, e posteriormente, foi criminalizada
e repudiada. Segundo Costa (2004), a Psicologia também teve
sua parcela de contribuição em relação ao preconceito contra os
homoafetivos, pois já na época de Freud, foi considerada como
uma inversão, posteriormente caracterizada como desvio de
conduta, como uma patologia. Mas, conforme foram avançando os
estudos, entendimentos e pesquisas na área, a Psicologia ganha
mais amadurecimento e atualmente não compactua com a ideia de
patologia, pois a homoafetividade não se configura como doença
ou anomalia e é considerada como uma das possibilidades do
desenvolvimento sexual, entendendo-se que é a partir da infância
que a tendência sexual começa a se delinear. Vale ressaltar que a
homoafetividade, ainda, se configura como desafio para as ciências,
pois não há conclusões definitivas amplamente aceitas sobre sua
gênese.
— 41 —
O termo homoparentalidade teve origem na França e sua função
tornou-se necessária para realizar a adaptação às novas formas
de configuração da família (SILVA apud CONSELHO FEDERAL DE
PSICOLOGIA, 2008). As uniões homoafetivas não assumem caráter
de novidade na sociedade e, mesmo assim, as pessoas pertencentes
a esse grupo são vítimas de discriminação em todos os aspectos,
pela maioria da sociedade, incluindo também a justiça, que muitas
vezes se omite não garantindo seus direitos, como acontece no caso
da adoção. Antes era visto como um assunto tabu, mas está sendo
discutido na atualidade, de modo que possui visibilidade em todos
os âmbitos, tais como consultórios, escolas, trabalho, dentre outros,
fazendo parte da vida social e familiar de muitos.
De acordo com Futino e Martins (2006), a orientação sexual dos
candidatos a adoção não se enquadra como requisito investigado
nas avaliações psicológicas e não deve se constituir em vantagem
ou desvantagem para se alcançar a mesma. A avaliação psicológica
para os casos de adoção envolve várias técnicas, dentre elas:
entrevistas, testes psicométricos, projetivos, hora do jogo
diagnóstica e instrumentos lúdicos. As autoras esclarecem que ao
longo do processo o que mais importa é o desejo e a necessidade
do estabelecimento de novos laços pela criança.
Segundo Fernández e Vilar (apud FUTINO; MARTINS, 2006, p.
9), a Associação Americana de Psiquiatras, a Associação aAmericana
de Psicólogos, a Associação Americana de Pediatras, a Associação
Psicanalítica Americana e a Academia Americana de Pediatras, já
se posicionaram e afirmam que “pais homossexuais são capazes de
proporcionar ambientes saudáveis e protetores aos seus filhos – cujo
desenvolvimento é similar ao de crianças criadas por heterossexuais
nos âmbitos emocional, cognitivo, social e sexual” e alertam para
o diálogo com as crianças, o que favorecerá um desenvolvimento
saudável. Não se encontram, portanto, desvantagens em relação
aos filhos de homoafetivos quando comparados aos filhos de
heteroafetivos, constatando-se que o ambiente familiar homoafetivo
não prejudicaria o seu desenvolvimento psicossocial.
Apesar de existirem poucas pesquisas referentes ao processo de
socialização e desenvolvimento emocional e cognitivo das crianças
adotadas por casais homoafetivos, a maioria da sociedade insiste em
estigmatizar essas crianças, afirmando que apresentarão problemas
em sua socialização. Poderão sim apresentar esse problema, não
por conviverem com pais homoafetivos, mas por estarem em
uma sociedade excludente e com visão estereotipada em relação
ao assunto. Vale ressaltar a importância que é atribuída a uma
— 42 —
pesquisa realizada nos Estados Unidos, que se apresenta como um
desacordo aos preconceitos vigentes, pois de acordo com Kevin
(apud RIOS, 2001, p. 142) obteve resultados os quais apontam que
“o desenvolvimento individual e a integração das crianças na sua
comunidade não apresentou diferenças significativas de dificuldades
relevantes advindas da criação por pais homoafetivos”.
Futino e Martins (2006) aportam informações sobre as pesquisas
realizadas por González (2005) e Tarnovski (2002) com crianças
criadas por casais homoafetivos, em que os resultados obtidos
mostram semelhanças em nível de desenvolvimento social e
cognitivo esperado por crianças criadas por casais heteroafetivos. Os
autores também apontam a rede social e de apoio como facilitadores
na criação e adequação dessas crianças à sociedade (GONZÁLEZ,
2005; TARNOVSKI apud FUTINO; MARTINS, 2006).
Ricketts e Achtenberg (1989) constatam nos seus estudos sobre
casos de adoção homoafetiva,que não importa como essa família é
formada e sim sua dinâmica, sua forma de funcionar e de viver. Já
Patterson (1997), investiga a influência de pais e mães homoafetivos
em relação ao desenvolvimento social, pessoal e identidade sexual
de seus filhos adotivos ou biológicos. Seus resultados apontam para
uma compatibilidade em relação a autoestima e desenvolvimento
social e pessoal das crianças criadas por casais heteroafetivos
(RICKETTS; ACHTENBERG, 1989; PATTERSON apud COSTA, 2004).
Deve-se ponderar que, casais homoafetivos não são nem mais
qualificados nem menos para cuidar de uma criança, o que importa
é o respeito, a responsabilidade, harmonia e o amor existente nessa
família. Essas pesquisas realizadas nos Estados Unidos corroboram
com a ideia de que as crianças criadas por casais homoafetivos
não têm seu desenvolvimento prejudicado e que estão sujeitas a
problemas como qualquer outra criança criada por outras pessoas,
sendo que a orientação sexual dos pais independe do papel exercido
por eles. O fato de possuir duas mães ou dois pais não representa
uma tendência a homoafetividade para a criança, pois se fosse
assim, os filhos de pais e mães solteiras teriam sua orientação sexual
direcionada a homoafetividade, em virtude da ausência de uma das
figuras. Não existe, dessa forma, um determinismo psíquico, pois
cada ser humano é único.
Costa (2004) pontua que a formação da sexualidade se constitui
de forma preponderante por características psíquicas individuais,
muitas vezes involuntárias, do que por características advindas do
ambiente externo. Sendo assim, não se tem dados contundentes
de que a ausência de modelo familiar heterossexual determine a
— 43 —
orientação sexual do filho.
Apesar de serem encontrados estudos apontando o sucesso na
criação de crianças por famílias homoafetivas e constatarem que isso
em nada prejudica o desenvolvimento destas, muitas pessoas ainda
questionam a capacidade dos homoafetivos em disponibilizar para
a criança um ambiente sadio, favorável ao seu desenvolvimento; a
orientação sexual dos pais não determinará o tipo da qualidade de
parentalidade exercida por estes. Quanto mais se discrimina esse
grupo e se procrastina a conquista de seus direitos, mais as crianças
que continuam “institucionalizadas” serão prejudicadas.
Araújo e Oliveira (2008) realizaram uma pesquisa no município
de João Pessoa, que teve como intenção avaliar através de
questionários, o nível da representação social da adoção
homoafetiva por estudantes concluintes dos cursos de Psicologia e
Direito. A pesquisa contou com a participação de 104 estudantes,
sendo 51 do curso de Direito e 53 do curso de Psicologia, de ambos
os sexos. Nessa pesquisa, os autores utilizaram como base a Teoria
das Representações Sociais, e de acordo com eles:
A apreensão das representações sociais sobre adoção de crianças
no contexto da homoparentalidade pode permitir a identificação
das atitudes e das informações que os indivíduos possuem, as
quais nortearão as suas relações com seus grupos de pertença,
orientando e organizando as suas formas de comunicação e de
conduta. (ARAÚJO; OLIVEIRA, 2008, p. 3).
Na análise dos dados, a homoafetividade foi associada por esses
estudantes à transmissão de doenças, promiscuidade, violência e
vergonha. Constata-se, assim que, as representações sociais desses
estudantes embasam-se em uma visão preconceituosa, pois muitos
a elencaram como doença, pecado, crime. Foi verificado também
que alguns estudantes mencionaram o fato da adoção por casais
homoafetivos ser algo novo e que deve ser analisado com muita
cautela.
Araújo e Oliveira (2008) surpreenderam-se com o resultado
das representações sociais que a adoção homoafetiva obteve,
principalmente entre os alunos de Psicologia, pois é de conhecimento
dos autores que estes alunos poderão lidar diretamente com essa
demanda e que a Psicologia atualmente não compactua com essa
ideia preconceituosa em relação a homoafetividade. Uma pesquisa
abordando a temática familiar homoafetiva realizada nos Estados
Unidos por Bailey, Bobrow, Wolfe e Ikach (apud ARAÚJO e OLIVEIRA
2008, p. 8) constata que “a inserção de crianças em famílias
— 44 —
chefiadas por pares homoafetivos não provoca distúrbio algum nos
seus aspectos psicossociais, afetivos e cognitivos quando comparados
aqueles das crianças que possuem pais heteroafetivos”.
No entanto, as representações sociais desses universitários
concluintes, refletem o pensamento de muitas pessoas, que possuem
uma visão preconceituosa, que se passa de geração a geração, sem
a necessária reflexão sobre o assunto. Esta reprodução acontece
sem ao menos utilizarem as respectivas áreas de conhecimento para
o amadurecimento das ideias, ou se embasarem em argumentos
científicos. Corroborando com esta concepção, uma pesquisa
realizada em Minas Gerais por Costa (apud ARAÚJO e OLIVEIRA,
2008), apresenta como resultados que 93% dos homoafetivos
entrevistados disseram não acreditar na influência da orientação
dos pais no delineamento da orientação dos filhos e 94% afirmaram
que o contato e a criação deles não prejudica o desenvolvimento,
pois muitos relataram participar da educação ou até mesmo serem
os responsáveis pela criação de algumas crianças.
Os resultados dessa pesquisa com os estudantes concluintes
das áreas de Psicologia e Direito, servem como um alerta, pois o
esperado era justamente o contrário, por terem acesso a informações
e maiores possibilidades de lidar com esse tipo de demanda. No
entanto, os seus valores conservadores poderão interferir em suas
práticas. Pode-se supor também que a falta de discussão, informação
e divulgação acerca dessa temática pode ter contribuído para estes
resultados. Deste modo, se faz importante uma reavaliação das
posturas desses futuros profissionais.
Poucos são os estudos que consideram a opinião dos homoafetivos
e das crianças sobre a adoção. De acordo com a pesquisa de opinião
realizada em Juiz de Fora por Costa (2004), foram preenchidos 65
questionários, sendo 29 do sexo feminino e 36 do sexo masculino, 52
com parceiros fixos e 13 sem, desses, 25 moram com os parceiros.
Nessa pesquisa, 87,69% dos participantes discordaram em relação
a adoção ser indeferida em virtude da orientação sexual dos
candidatos, enquanto que 93,85% foram a favor da concessão a
adoção. A autora destacou que “o mais interessante foi que quase a
totalidade, 94,12% dos que conhecem algum homossexual que tenha
adotado ou tenha tido uma criança sob sua responsabilidade acredita
que isso não tenha sido prejudicial a esta” (p. 61) e 93,8% afirmaram
que a orientação sexual dos pais não interfere na escolha do filho.
O destaque dessa pesquisa foi, também, a questão da vontade
de adotar dos homoafetivos (66,15%), contra apenas 17, 24% que
não aceitariam adotar. Percebe-se assim, o desejo dos homoafetivos
— 45 —
em constituírem família e uma oportunidade para muitas crianças
que estão a espera de uma família, pois a maioria dos homoafetivos
que participaram da pesquisa, se candidatariam a adotar, mas em
virtude da barreira do preconceito tão enraizado socialmente, esse
futuro pode tardar a chegar.
Considerações finais
Ao discutir-se o tema da adoção homoafetiva, não se teve o
intuito de esgotar o assunto, pois este é amplo e possibilita diferentes
narrativas que devem ser ponderadas e respeitadas. O objetivo
central na elaboração deste estudo foi incitar questionamentos e
contribuir para ampliar as reflexões, tendo como base de dados
pesquisas nas áreas da Psicologia e do Direito.
É importante ressaltar que a adoção homoafetiva é legalmente
possível, haja visto que a família substituta deve estar inserida
nos requisitos estabelecidos pelo Estatuto da Criança e do
Adolescente, o qual não exige uma orientação sexual específica
aos casais candidatos a adoção. Quando for regularizada e aceita
a adoção por casais homoafetivos, o problema de muitas crianças
“institucionalizadas” a espera da oportunidade de fazer parte de
uma família será amenizado.
Pode-se constatar a partir dos achados, que não existe modelo
de perfeição de família para adotar; o que deve ser ponderado é
seu grau de motivação em criar, oferecer amor, atenção, ambiente
saudável, um lar e tudo que for necessário a uma criança que muitas
vezes foi negligenciada, abandonada.
É direito do cidadão a constituição de família, assim sendo, para
que esse direito seja assegurado aos casais homoafetivos, é preciso
que se considere o que se apresenta como o melhor para a criança
e não se balizar por preconceitos e mitos sem fundamento.
Sabe-se que a homoafetividade ou heteroafetividade dos pais não
se constitui como fator principal para o bem estar da criança, pois
nem todos homoafetivos ou heteroafetivos estão aptos a adotar, já
que cada indivíduo tem suas particularidades e características que
precisam ser avaliadas visando o que se apresenta como o melhor
interesse para a criança. Foi percebido que, para a criança, conviver
com o homoafetivo se constitui em uma maior possibilidade de
desenvolvimento do respeito e tolerância às diferenças individuais,
características estas muito valiosas para vida em sociedade.
Pôde-se verificar a escassez em relação a pesquisas na área de
Psicologia sobre adoção homoafetiva. Muitas vezes estes estudos
— 46 —
eram enraizados numa perspectiva prescritiva e as informações
repetitivas, e foi percebido também a carência de pesquisas sob o
ponto de vista da criança em relação ao processo adotivo, pois esta
se apresenta como parte principal do processo.
Foi constatado também que a maioria dos estudos referentes à
adoção não abordam, não aprofundam a questão dos pais e mães
que por algum motivo entregaram seu filho à adoção, motivo este
que muitas vezes está ligado a condição social.
Para ocorrer uma melhoria no sistema jurídico no que concerne a
adoção de crianças por casais homoafetivos, se faz necessário uma
mudança na sociedade em geral e nos governantes, pois é preciso se
eximir dos julgamentos de valor, do conservadorismo, do preconceito
para que se possa entender que um casal homoafetivo tem potencial
de criar e educar uma criança como qualquer casal heteroafetivo.
Foi percebido a partir dos achados também que, alguns juristas
já entendem a necessidade de se legalizar a questão da adoção
homoafetiva. No entanto, o principal obstáculo é o preconceito
social. Já os estudos psicológicos concluíram que a orientação sexual
em nada influencia a qualidade da parentalidade. Sendo assim,
os psicólogos apresentaram uma posição menos influenciada pelo
preconceito em relação a temática, exceto a pesquisa realizada com
os universitários concluintes dos cursos de Direito e Psicologia, na
qual parecem ter evidenciado acentuado preconceito.
Diante do exposto, a adoção de crianças por casais homoafetivos
não se apresenta como fator prejudicial ao desenvolvimento
saudável da criança, pois assim como os casais heteroafetivos, os
homoafetivos possuem condições de cuidar, educar e fornecer o
que preciso for ao filho.
Contudo, vale ressaltar a carência e a importância de estudos na
área da Psicologia em relação ao assunto, e que este estudo possa
incentivar alguns profissionais na realização de novas pesquisas e a
refletir sobre a atuação enquanto agente de mudanças.
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