INTRODUÇÃO
O conhecimento sobre plantas medicinais simboliza muitas vezes o único
recurso terapêutico de muitas comunidades e grupos étnicos. O uso de plantas no
tratamento e na cura de enfermidades é tão antigo quanto a espécie humana. Ainda hoje
nas regiões mais pobres do país e até mesmo em grandes cidades brasileiras plantas
medicinais são comercializadas em feiras livres, mercados populares e encontradas em
quintais residenciais. As observações populares sobre o uso e a eficácia de plantas
medicinais contribuem de forma relevante para a divulgação das virtudes terapêuticas
dos vegetais, prescritos com freqüência, pelos efeitos medicinais que produzem, apesar
de não terem seus constituintes químicos conhecidos. Dessa forma, usuários de plantas
medicinais de todo o mundo, mantém em voga a prática do consumo de fitoterápicos,
tornando válidas informações terapêuticas que foram sendo acumuladas durante séculos.
O interesse pelas ervas e plantas da Amazônia com aplicação nas áreas medicinais e de
cosméticos tem aumentado cada vez mais. A exploração comercial dessas plantas
apresenta perspectivas cada vez mais promissoras de se tornar uma atividade econômica
rentável para o Amazonas3.
De maneira indireta, este tipo de cultura medicinal desperta o interesse de
pesquisadores em estudos envolvendo áreas multidisciplinares, como por exemplo, a
botânica, a farmacologia, a fitoquímica e a biotecnologia, que juntas enriquecem os
conhecimentos sobre a inesgotável fonte medicinal natural: a flora mundial. Entre as
plantas que já provaram seu potencial terapêutico podemos citar: Croton cajucara
Benth, Xylopia frutescens Aubl, Tabebuia cassinoides, Podophyllum hexadrum,
Podophyllum peltatum, etc3.
Amazônia
Croton cajucara Benth (Euphorbiaceae)
Estudos Etnofarmacológicos
O Croton cajucara, vulgarmente conhecido por sacaca (feitiço na língua Tupi),
representa um recurso medicinal de grande importância no tratamento e cura de várias
doenças. No estado do Pará, as folhas e cascas do caule desta planta são utilizadas em
forma de chá ou pílulas, no combate a diabetes, diarréia, malária, febre, problemas
estomacais, inflamações do fígado, rins, vesícula e no controle de índices elevados de
colesterol.Para distúrbios do fígado e auxilia na digestão, principalmente após ingestão
de alimentação rica em gorduras. O pó das folhas é vendido em farmácias de
manipulação, com indicação hepatoprotetora, para tratamento de diabetes e para dietas
de emagrecimento. O chá das folhas é indicado em academias de ginástica da cidade de
Belém para diminuição de peso corporal, em dietas de emagrecimento. Porém, inúmeros
casos de hepatite tóxica já foram notificados em hospitais públicos dessa cidade, devido
ao uso prolongado deste chá, em dosagens concentradas. As partes utilizadas para
estudo são grandes quantidades de folhas e cascas do caule (partes da planta que são
utilizadas na medicina popular) de árvores com idades variando entre 1½ - 6 anos,
buscando o isolamento de substâncias majoritárias que pudessem vir a ter
representatividade em testes biológicos3.
Croton cajucara
Composição Química
O estudo fitoquímico clássico realizado com 6 kg das cascas do caule de árvores
com idades variando entre 4-6 anos, mostrou que esta parte da planta é rica em
diterpenos do tipo clerodano. Neste estudo foi possível reisolar os clerodanos transdesidrocrotonina (DCTN); trans-crotonina (CTN); cis-cajucarina B; cajucarina A e
cajucarinolida, previamente reportados em adição aos clerodanos inéditos transcajucarina B e sacacarina. A lactona envolvendo os átomos de carbono C-19 e C-20, foi
confirmada para a estrutura 19,20-epoxi-20-oxo, denominada de isosacacarina, sendo
portanto, um isômero da sacacarina (19,20-epoxi-19-oxo)3.
Através de estudos fitoquímicos quando realizado com as folhas do Croton
cajucara é possível isolar e caracterizar três esteróides (β-sitosterol, estigmasterol e
3,O-glicopiranosil-β-sitosterol), dois flavonóides (3,7,4'-tri-O-metilcanferol e 3,7,-di-Ometilcanferol) e um diterpeno do tipo 19-nor-clerodano (cajucarinolida). Dentro da
programação de princípios ativos que está conectada à química orgânica sintética,
obteve-se o derivado trans-crotonina (CTN) através de hidrogenação catalítica da
DCTN (objetivando investigações farmacológicas específicas). Os dados
espectroscópicos do produto hidrogenado mostraram-se iguais aos observados para a
CTN quando comparados, isolada como um dos componentes minoritários das cascas
Croton cajucara3.
Estudos Clínicos
O triterpeno ácido acetilaleuritólico (AAA) também estápresente nas cascas do
caule desta planta. O estudo fitoquímico realizado em todas as partes da planta (raiz até
folhas), mostrou que a DCTN também está presente nas raízes e caule. Este clerodano é
a substância majoritária nas cascas do caule do Croton cajucara, com um teor incomum
de 1,4 %. O isolamento de 85 g de DCTN possibilitou variados tipos de colaboração
com grupos de farmacologia, que rastrearam através de experimentos específicos, todas
as indicações terapêuticas empíricas da sacaca. O 19-nor-clerodano DCTN tem
correlação com grande parte das propriedades terapêuticas da planta, tendo sido possível
evidenciar as seguintes propriedades farmacológicas: ação antiinflamatória e
antinociceptiva (correlacionados com as indicações da planta para cura de inflamações
em geral); efeito hipoglicemiante (tratamento de diabetes); atividade antiespasmódica
(cura de diarréia); atividade antiulcerogênica (tratamento de problemas estomacais
como azia, gastrite, úlcera gástrica). Evidenciou-se ainda, para este diterpeno,
propriedades biológicas não mencionadas pelos usuários da planta, tais como: atividade
antitumoral e atividade antiestrogênica. O efeito hipolipidêmico, correlacionado com a
redução de índices elevados de colesterol, está relacionado no extrato hidroalcoólico das
folhas da sacaca. O efeito antimutagênico da DCTN foi comprovado em camundongos,
utilizando-se testes citogenéticos do micronúcleo e de aberrações cromossômicas em
células de medula óssea. Outros estudos farmacológicos envolvendo avaliações
citotóxica e antiulcerogênica da DCTN e do óleo essencial da sacaca, vêm sendo
desenvolvidos no país, por outros pesquisadores. O DCTN foi isolada como
componente majoritário nas cascas do caule da árvore com idade variando entre 3 e 6
anos. Nas árvores com idade de 3 anos, este clerodano foi isolado com um teor (0,26%)
inferior ao observado nas árvores com 4-6 anos (1,4%). No entanto, sua presença não
foi evidenciada nas cascas de árvores com 1½ de idade. Nestas árvores, o ácido
acetilaleuritólico (AAA) foi isolado como componente majoritário em árvores com
idade de 1½ ano, provenientes de área com pouco grau de insolação (0,18%). O
rendimento de isolamento do AAA em árvores com 1½ de idade, provenientes de área
exposta ao sol (grau máximo de insolação) foi 0,08%. O triterpeno AAA foi também
isolado em 0,08% de rendimento, nas árvores com idade variando entre 3-6 anos3.
Estudos Farmacológicos
Experimentos biológicos realizados com o AAA mostraram que este triterpeno
possui atividade antiespasmódica, ação antiinflamatória e antinociceptiva. Esta
substância mostrou-se inativa em testes que avaliam atividades antitumoral e
antiulcerogênica3.
Experimentos realizados com a CTN-derivado mostraram que este diterpeno
possui atividade antiulcerogênica, ação antiinflamatória e antinociceptiva. A CTN difere
da DCTN apenas pela ausência da ligação Δ3,4 do anel A do sistema decalínico; no
entanto, esta substância mostrou-se inativa em testes que avaliam atividades antitumoral
e antiespasmódica, atividades estas, que foram observadas para a lécula-mãe DCTN3.
Xylopia frutescens Aubl (Annonaceae)
Aspectos Botânicos
É uma espécie arbórea nativa das Américas Central e Sul, África e Ásia. Esta
planta é conhecida popularmente como: anona, araticum, fruto-do-conde, pinha, ata,
condessa, ateira, pinheira. Tendo como características gerais de identificação botânica
como árvore de copa irregular e aberta, de 4-8 m de altura. Folhas simples, catárceas, de
8-12 cm de comprimento. Flores solitárias, de cor esverdeada. Fruto do tipo baga
composta, esverdeada e de superfície papilada, com polpa branca, mucilagenosa e
doce1.
Xylopia frutescens
Estudos Etnofarmacológicos
O grande interesse pelo gênero deve-se devido a sua atividade biológica vistas
aos extratos de algumas espécies. Sendo que no Brasil as sementes são utilizadas
popularmente para tratamento de bronquite, como vermífugos, carminativos,
estimulantes da bexiga e antileucorréia, em reumatismos, picadas de cobra, mau hálito,
cárie dental e psicoativo. Também incluindo-se como atividade citotóxicas,
anticontraceptiva masculina, anti-hepatotóxica, abortiva, indutora do parto e
antimicrobiana, etc5.
Composição Química
Na composição química do gênero tem-se relatado a ocorrência de alcalóides,
acetogeninas tetraidrofurânicas e diterpenos caurânicos. Os diterpenos caurânicos
constituem um grupo de grande relevância neste gênero (Xylopia spp) por serem
encontrados em grandes quantidades. Entre as atividades estão a antimicrobiana,
antiparasitária, inibidora do apetite de insetos, antifertilizante, citotóxica, anti-HIV, antiinflamatória e hipotensora, também estar relacionada à gênese de esteróides e a
regulação do crescimento de plantas. Então ao considerar-se o alto teor de diterpenos
caurânicos e as suas atividades biológicas descritas tem-se em vista que essas
substâncias podem constituir protótipos moleculares para o desenvolvimento de novos
fármacos.O diterpeno ácido ent-Kaur-16-em-19-óico, denominado comumente de ácido
caurenóico (8) é abundante nas sementes de X. frutescens, com teor médio de 3,16 -+
0,97%. A atividade tripanossomida dos ácidos caurenóico (8), 16β-hidroxi-cauran-19óico (10) está avaliada frente a formas tripomastigotas do Trypanossoma cruzi,
protozoário causador da doença de chagas. Ante a atividade antimicrobiana de
diterpenos caurânicos avaliaram-se a atividade antibiótica de diterpenos isolados de
espécies brasileiras, frente a culturas de bactérias, leveduras, fungos produtores de
aflotoxinas e dermatófilos; na obtenção de novos antibióticos levando-se em conta a
variação de grupos e a relação estrutura e atividade na obtenção de fármacos mais
potentes5.
Tabebuia cassinoides (Bignoniaceae)
Aspectos Botânicos
Tabebuia cassinoides (Bignoniaceae) ou caixeta é uma espécie arbórea pioneira,
geralmente de pequeno porte (máximo 20 m de altura e 100 cm de diâmetro à altura do
peito -–DAP). O tronco é irregular, geralmente tortuoso e apresenta raízes aéreas na
base (Carvalho, 1994). Segundo Carvalho (1994), a espécie distribui-se entre as
latitudes 8ºS (PE) e 26ºS (SC), na faixa litorânea brasileira. T. cassinoides ocorre em
terrenos permanentemente alagados ou encharcados, formando em alguns locais,
agrupamentos densos, às vezes quase puros. A freqüência é irregular e descontínua, uma
vez que tem ocorrência localizada restrita aos locais brejosos próximos ao litoral. A
espécie é exclusiva da Floresta Ombrófila Densa (Floresta Atlântica), nas formações
Terras Baixas e Baixo-Montana e nas Formações Pioneiras de influência pluvial.
Ocorre, também, na restinga. Nessas formações, ocupa os estratos superior e
intermediário. A brotação é intensa após o corte, permitindo que a espécie possa ser
manejada pelo sistema de talhadia4.
Tabebuia cassinoides
Estudos Farmacológicos
Experimentos mostram que o lapachol encontrado na família Bignoniaceae tem
atividade biológicas antitumoral, antimalária, tripanossomicida e antimicrobiana e
outros prenilnaftoquinonas, despertando o grande interesse por essa família na pesquisa
científica mundial. O estudo está particularmente relacionado ao gênero Tabebuia do
qual obtiveram um novo tipo estrutural, as furanonftoquinonas, representado por 24 e
25. As furanonftoquinonas foram isoladas pela primeira vez da Tabebuia cassinoides,
apresentado atividade in vitro contra leucemia linfocítica P-338 e citotoxicidade para
células KB. A partir disso, esses compostos começaram a ser obtidos de outras espécies
do gênero Tabebuia, como T.ochracea e T. incana5.
Composição Química
Em vista a usar as naftoquinonas como protótipos várias substâncias sintéticas
foram obtidas, como as séries 2-hidroxi-3-alquil-1,4-naftoquinonas (26), 1,4naftoquinonas alquiladas no anel benzênico (27), orto-ε para-naftoquinonas
heterocíclicos,entre os quais diversas furanonaftoquinonas, como28 e 29. Empregandose a modificação de radicais do lapachol levou-se ao desenvolvimento da
atovacona(30), que está relacionado ao efeito antimicrobiano na terapêutica da
pneumonia por Pneumocystis carinii, em indivíduos aidéticos, e também se mostrou
ativa contra Plasmodium spp., Leishmania donovani, Toxoplasma gondii e
Trypanossoma cruzi5.
Com isso, através de compostos sintéticos análogos aos naturais pode-se projetar
novos fármacos no mercado em vista contra parasitoses endêmicas5.
Podophyllum hexandrum e Podophyllum peltatum
Histórico e Aspectos Botânicos
São plantas pertencentes à família botânica Berberidaceae. O Podophyllum
peltatum L. é uma árvore pequena, nativa das regiões orientais dos Estados Unidos e
Canadá, empregada antigamente pelos índios e pelos primeiro colonizadores como
cáustico para certos papilomas, como vermífugo e emético. Dessa planta prepara-se a
“resina de podofilo”, de que se extraem diversas lignanas do tipo ariltetralinas, com
propriedades antineoplásicas, sendo a mais conhecida a podofilotoxina. O Podophyllum
hexandrum é uma espécie nativa da Índia que produz 12% de resina e contém quase o
dobro de podofilotoxina da espécie norte-americana2.
Podophyllum hexandrum
Podophyllum peltatum,
Estudos Farmacológicos
A podofilotoxina (31) é uma lignana isolada da resina do rizoma dessas duas
espécies. O uso da podofilina (extrato alcoólico dos rizomas de Podophyllum) no
tratamento de condilomas em humanos foi publicado em 1942 por Kaplan, verificandose, posteriormente, que esta possuía ação semelhante à da conchicina. A ação
farmacológica da podofilotoxina é devida à inibição da polimerização da tubulina em
microtúbulos, e portanto, bloqueio da divisão celular no início da metáfase. No entanto
a utilização terapêutica sistêmica da podofilotoxina é inviabilizada pela sua forte
toxicidade, que inclui problemas gastrintestinais do sistema nervoso central e hepático.
Apesar disso, a podofilina é utilizada como agente antimitótico principalmente no
tratamento tópico de condilomas externos pequenos, ou como queratolítico. A aplicação
tópica da podofilotoxina não deve atingir tecidos sãos devido à sua ação muito irritante
na pele, olhos e mucosas2.
Modificações Estruturais
Uma série de modificações químicas foi realizada na tentativa de produzir
análogos da podofilotoxina com menor toxicidade e boa disponibilidade. O
desenvolvimento de produtos ocorreu na indústria farmacêutica Sandoz a partir de 1950,
onde foram preparados centenas de derivados, os quais foram testados em modelos in
vitro e in vivo. Esses estudos levaram à introdução no mercado, em 1963, dos
glicosídeos de derivados da podofilotoxina condensados com benzaldeído que não são
mais utilizados na terapêutica. Posteriormente foram introduzidos outros derivados, os
acetais cíclicos como o teniposídeo (32) e o etoposídeo (33). Apesar dos esforços
realizados na obtenção de análogos, estes são os únicos derivados com interesse cíclico
atualmente. Estes dois derivados semi-sintéticos da podofilotoxina são utilizados na
terapêutica como antitumorais. Ao contrário da colchicina e da podofilotoxina, eles são
inativos no processo de polimerização da tubulina agindo ao nível do ADN por inibição
das topoisomerases II, estabilizando o complexo enzima-ADN e impedindo a
replicação. As indicações clínicas do etoposídeo são, principalmente, os cânceres dos
brônquios de pequenas células e os tumores embrionários de testículo. Para o
teniposídeo, são certos linfomas e tumores cerebrais2.
Outras Plantas Brasileiras de Potencial Terapêutico Promissor
Vale a pena destacar a atividade leishmanicida de neolignanas de Virola
surinamensis e V. pavonis, como surinamensina (34), virilona (35) e análogos sintéticos
desta última. Também o efeito anti-Trypanosoma cruzi da cubelina (36), isolada de
Piper cubeba, que motivou a sua seleção, como protótipo e matéria-prima, para uma
série de derivados semi-sintéticos com vistas ao desenvolvimento de um novo
medicamento para a doença de chagas. A avaliação de possíveis atividades biológicas
das neolignanas isoladas de plantas brasileiras é, sem dúvida, um caminho promissor
que poderá contribuir para o progresso da química medicinal no Brasil e para a inovação
farmacêutica5.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1. LORENZI, Harri. Plantas Medicinais no Brasil: nativas e exóticas. Nava Odessa:
Plantarum, 2002.
2. FARMACOGNOSIA da planta ao medicamento. Sed. rev. amp. Florianópolis:
UFSC, 2003.
3.
http://www.cpatu.embrapa.br/pub_res_exp/assepsia_em_explante_de_sacaca.doc.
Acessado em 01 de junho de 2006.
4. http://www.jardimdeflores.com.br/ECOLOGIA/A15ecologia1.htm. Acessado em 28
de maio de 2006.
5. OLIVEIRA, A.B; BRAGA, F.C. Produtos Naturais Bioativos de plantas brasileiras e
sua contribuição para o desenvolvimento da química medicinal. Arquivos Brasileiro
de Fitomedicina Científica, v.1 (maio 2003) p: 49-50.
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Plantas Medicinais da Amazônia