LEPTOSPIROSE Marcos Vinicius da Silva Leptospirose Humana Antropozoonose causada por bactérias do gênero Leptospira, com grande complexidade clínica, epidemiológica, social e econômica. Ampla distribuição mundial e sem perspectiva de erradicação Fonte: Faine S. et al. Leptospira and leptospirosis. 2ª ed. Austrália, MediSci, 1999 Leptospira espiroquetídeo, aeróbico, de forma helicoidal, flexível e móvel, medindo de 5 a 20 μm de comprimento e 0,1 μm de diâmetro, com ambas as extremidades encurvadas Fonte: Faine S. et al. Leptospira and leptospirosis. 2ª ed. Austrália, MediSci, 1999 Zona norte São Paulo Fisiopatogenia Ação direta: -mecanismos bacterianos proteínas e polissacárides (Ag superfíce) lipopolissacárides (Ag somático) enzimas: hemolisina, catalase, lipase, transamidase, hialuronidase e oxidase glicoproteína (GLP) endotoxina → inibidora das isoformas de Na+ e K+ ATPase -fator citotóxico: hemorragia Fisiopatogenia Mecanismos imunológicos: - citocinas (TNF-α) → inflamação - ativação do complemento e de radicais livres Fisiopatogenia Ação direta: - diarréia, náuseas e vômitos - mialgia (rabdomiólise) - alterações hidroeletrolíticas - neurológicas - arritmias cardíacas - capilarite, hipotensão arterial hipovolemia e Fisiopatogenia Mecanismos imunológicos: - lesão tecidual - ↑ permeabilidade vascular RIM - Pré-renal - Nefrite tubular intersticial - Necrose tubular aguda - Maior acometimento dos túbulos proximais - As alterações da função tubular precedem a queda da filtração glomerular - As alterações são predominantes no túbulo proximal, com integridade relativa dos segmentos distais - A incapacidade de concentração urinária na insuficiência renal na leptospirose, deve-se em parte a resistência do túbulo coletor ao hormônio antidiurético Fonte: Abdulkader RCRM, Silva MV. Injúria renal aguda na leptospirose. In: Injúria renal aguda no paciente crítico. Atheneu 2010 PULMÃO - Dano vascular na microcirculação ↓ CD 34 Edema e hemorragia intraalveolar Aumento e hipertrofia do pneumócito I Alterações no transporte do Na+ (↑ ENac e aquaporina 5) - ↓ discreta de pneumócito II - Dano do epitélio alveolar - Edema, hemorragia e IRA (SARA) De Brito et al. PLoS ONE 2013, 8:e71743 PULMÃO - Edema pulmonar intersticial - Hemorragia acompanhada hipotensão e sinais meníngeos - Hemorragia com hepático e renal de comprometimento SNC Comprometimento: - Meníngeo - Encefálico Meningite por leptospirose diagnosticada pelo teste ELISA-IgM por sexo, idade e padrão liquórico no Instituto de Infectologia Emílio Ribas, de janeiro a julho de 1988 Idade Anos/sexo Linfócito Linfócito Polimor Polimor Total M F M F N % ˂5 5 - 10 8 6 3 3 (12) 4 18 (72) 16 -30 ˃ 30 1 3 4 (16) Total N 8 1 9 7 25 Total % 32 4 36 28 100 Fonte: Silva et al. Rev Inst Med trop S Paulo, 1996; 38: 153-6. CORAÇÃO - Lesão do miócito - Coronárias - Alterações ECG → ↑ 5x o risco de óbito Fonte: Dupont et al. Clin Infect Dis 1997; 25: 720-4. Características clínicas Doença sistêmica bacteriana, aguda, febril, com manifestações clínicas polimórficas, diversificadas, desde infecção inaparente, forma leve com quadro frustro e vago, confundível com o estado gripal até a grave com falência renal , hepática e pulmonar Manifestações clínicas Assintomática Sintomática leve moderada grave → anictérica → ictérica CURSO BIFÁSICO DA LEPTOSPIROSE FORMAS ANICTÉRICAS Fase imuno (0 a 30 dias) Fase séptica (4 a 7 dias) Anorexia Artralgias Astenia Calafrios Congestão ocular Dor abdominal Escarro hemoptoico Exantema Febre Mialgias Náuseas Rigidez da nuca Tosse Vômitos Repercussões: Alopécia Dor ocular Epistaxe Esplenomegalia Hepatomegalia Oligúria Petéquias Prurido Tremores Uveite (associam-se às da fase séptica) Hematológicas Hepáticas Renais Respiratórias Cardiocirculatórias Meningoencefalíticas Gastrointestinais Musculoesqueléticas Oculares Linforreticulares SÍNDROME DE WEIL Fase séptica (4 a 7 dias) Fase imuno (14 a 30 dias) Anemia Gengivorragia Hematêmese Hematúria Hemorragia ocular Icterícia Insuficiência renal aguda IDEM (fase anictérica) Melena Miocardite Pancreatite Torpor Coma Choque IDEM (fase anictérica) Autores da foto: André Vilela Lomar e Décio Diament. In: Tratado de Infectologia/ editores Ricardo Veronese e Roberto Focaccia. SP, Atheneu ed. 2002. Definição de caso suspeito Doença caracterizada por febre de início súbito, mialgias, cefaléia, mal estar e/ou sintomas: sufusão conjuntival ou conjuntivite, náuseas e/ou vômitos, calafrios, alteração do volume urinário, icterícia, fenômenos hemorrágicos e/ou alterações hepáticas, renais e vasculares compatíveis com leptospirose ictérica (S. Weil) ou anictérica grave Indivíduo que apresente sinais e sintomas de processo infeccioso inespecífico com antecedentes epidemiológicos (30 dias anteriores a data do início dos sintomas) Fonte: FUNASA. Guia de Vigilância Epidemiológica, 2002. Escore para se chegar a um diagnóstico presuntivo de leptospirose no homem diagnóstico presuntivo se o total da parte A ou a soma da parte A +B totalizam 26 ou mais, 20 e 25 o diagnóstico de leptospirose é possível Parte A - O paciente apresenta: Total 1.Cefaléia de início recente? Sim=2 Não=0 2.Febre? Sim=2 Não=0 Sim=2 Não=0 3.Sufusão conjuntival bilateral? Sim=4 Não=0 4. Meningismo? Sim=4 Não=0 5. Mialgias (principalmente em panturrilhas)? Sim=4 Não=0 6. Os itens 3, 4 e 5 estão presentes conjuntamente? Sim=10 Não=0 7. Icterícia? Sim=1 Não=0 8. Proteinúria no exame de urina ou aumento de uréia? Sim=2 Não=0 Se “sim” é ≥39º C? Total da Parte A Parte B - Fatores epidemiológicos: O paciente teve contato com água contaminada ou com animais Sim=10 em casa, no trabalho, em atividades de lazer ou em viagens? Total da Parte A+B Não=0 Fluxograma para atendimento e condução clínica de pacientes com suspeita de leptospirose Antecedentes epidemiológicos para leptospirose nos últimos 30 dias febre alta de início súbito, mialgia, cefaléia, calafrios, hiperemia conjuntival, náuseas, vômitos e diarréia (os três últimos são facultativos) = ambulatório tosse, icterícia, meningismo, sangramento, comorbidades, roncos e sibilos na ausculta pulmonar, plaquetas = internação 140.000/mm3, uréia ≥ 50 mg/dL, creatinina ≥ 1,5 mg/dL, enfermaria potássio > 4 mEq/L, enzimas hepáticas elevadas = internação UTI Caso confirmado - Clínico laboratorial: sinais e sintomas clínicos compatíveis isolamento (sangue, LCR, urina e tecidos) macroaglutinação ELISA-IgM microaglutinação imunohistoquímica Fonte: FUNASA. Guia de Vigilância Epidemiológica, 2002. Caso confirmado - Clínico epidemiológico: com sinais e sintomas inespecíficos associado à alterações hepáticas, renais, vasculares e antecedentes epidemiológicos, sem exames ou com resultado não reagente coletado antes de 7 dias mesmo vínculo epidemiológico de caso confirmado clínico e laboratorial Fonte: FUNASA. Guia de Vigilância Epidemiológica, 2002. E x a m e s hemocultura cultura liquor l a b o r a t o r i a i s urocultura PCR sangue/urina ELISA IgM e Dot ELISA IgM soroaglutinação microscópica 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 dias de doenças Exames complementares - Hemograma - Bioquímica : U, C, Na+, K+, BTDI, TGO, TGP, ƔGT, FA, colesterol, CPK - TP/AP - Urina I - RX de tórax - ECG - Gasometria arterial - LCR (?) Confirmação do caso -Critério laboratorial -Critério clínico-epidemiológico Algoritmo de atendimento em UTI de Síndrome Febril Aguda Suspeita de Leptospirose • Sintomas: febre início súbito, mialgia e conjuntival. • alta de cefaleia, hiperemia Antecedentes (últimos 30 dias); Relação com áreas alagadas, lama, esgoto, ratos e outros animais ou profissões como veterinário, lavradores, trabalhadores de matadouros ou da rede de esgoto ou praticantes de esportes de aventura. • • • • • • • • • Sinais de Alerta: (um ou mais ) + •Dispnéia, tosse e taquipnéia •Poliúria, oligúria ou anúria •Hemorragias, inclusive escarro hemoptoico •Alteração de consciência •Vômitos frequentes •Arritmias cardíacas •Icterícia •Hipotensão (PAS<90 mmHg ou PAD<60 mmHg) •Estertores crepitantes •Plaquetas <100.000/mm3 •Creatinina>3mg/dL Preencher ficha de notificação epidemiológica Coletar sorologia para leptospirose (amostras pareadas com intervalo de 14 a 21 dias) Internação em UTI Solicitar: hemoculturas para bactérias e específicas para leptospira, hemograma, uréia, creatinina, sódio, potássio, magnésio, creatinoquinase , amilase, enzimas hepáticas, bilirrubinas, coagulograma, gasometria arterial, uroanálise, radiografia de tórax e eletrocardiograma Monitoramento cardíaco contínuo, de pressão arterial, frequência cardíaca e respiratória, saturação arterial de oxigênio, diurese e balanço hídrico. Correção cuidadosa de hipovolemia para evitar edema pulmonar Ventilação assistida precoce e com PEEP alto (12 a 16 cm H 2O) Diálise precoce, de preferência hemodiálise, considerando-se valores de creatinina, oligúria e comprometimento pulmonar. Antibióticoterapia: início de amplo espectro para tratamento de sepse. Confirmado o diagnóstico de leptospirose: penicilina G cristalina, alternativas: amoxacilina, ampicilina ou ceftriaxona. Tratamento 1- Avaliação respiratória: gasometria PaO2 < 80 mm Hg → O2 5-10L/min PaO2 < 60 mm Hg → PEEP alto e VC baixo (6ml/Kg) 2- Reposição volêmica: SF 0,9% Restrição hídrica nos pacientes com SARA e/ou sangramento pulmonar Evitar albumina e colóides sintéticos 3Drogas vasoativas: noradrenalina (0,08μg/Kg/min), dopamina (5 μg/Kg/min), dobutamina (disfunção miocárdica) (5 μg/Kg/min), com ajustes Tratamento 4- Reposição do K+: < 2,5 mEq/L → 0,5 mEq/Kg/h, máximo 10 a 20 mEq/h, máximo de 80 mEq/L, durante 2 horas 5- Sangramento: plaqueta < 30.000/μL , concentrado de plaquetas, vitamina K e plasma fresco 6- Prevenção de hemorragia digestiva: pantoprazol 40mg IV de 12/12h ou omeprazol 40mg IV de 12/12h ou ranitidina 50mg IV de 8/8h Na presença de IRA ministrar ¼ da dose no mesmo intervalo Tratamento 7- Arritmias cardíacas (fibrilação atrial e extrassístoles supra e ventriculares): corrigir distúrbio hidroeletrolítico Quinidina, amiodarona, xilocaína, etc 8- Insuficiência Renal aguda: furosemida – 5 a 10 ampolas diálise Tratamento 9- Antibióticoterapia: - Penicilia cristalina adulto 1 milhão U IV de 4/4h, na IRA 1,5 milhões U IV de 6/6h criança 100 mil U/Kg/dia - Ampicilina adulto 1 g Iv de 6/6h criança 100 mg/Kg/dia - Tetraciclina * 2 g/dia - Doxaciclina * 100 mg 12/12h - * contra indicada em criança menor de 10 anos, gestante, insuficiência renal e hepática Tratamento Alternativas cefalosporinas (ceftriaxona, cefalotina, cefepime) penemas monobactâmicos claritromicina eritromicina telitromicina ciprofloxacina e gatifloxacina Tempo de tratamento: 7 dias Griffith et al. Curr Opin Infect Dis 19: 533-537, 2006. Diagnóstico diferencial Estado gripal Febre tifóide Febre amarela Febre maculosa Hepatites infecciosas Meningoencefalites Endocardite Pneumonia Colangite/colecistite Sepse Malária Meningites Hantaviroses Dengue Arboviroses D. Chagas Pielonefrite S. hemolíticourêmico Prevenção controle de roedores (abrigo e alimentos) destino adequado do lixo uso de EPI em situação de risco armazenamento correto de alimentos higiene nas instalações das criações desassoreamento e limpeza dos córregos limpeza dos terrenos baldios educação em saúde conhecimento da fisiopatogenia→↓ mortal. quimioprofilaxia Primária: doxaciclina 200 mg 1x/semana Secundária: [email protected] [email protected]