Acidente Vascular Cerebral
agudo em Pediatria
Versão Original:
Versão Portuguesa:
Kshama Daphtary, MD
Marta Moura, MD
Paulo Oom, MD
Pediatric Critical Care Medicine
University Medical Center
Las Vegas, Nevada
Unidade de Cuidados
Intensivos Pediátricos
(Hospital S. Maria – Lisboa
– Portugal)
INTRODUÇÃO
Em adultos
 Elevada morbilidade e mortalidade
 “Enfarto cerebral/AVC”
Em crianças,
 A sua raridade contribui para uma certa
relutância em considerar o diagnóstico
 Cada vez mais se pensa que os enfartos
ocorrem em maior número do que se
suspeitava
 Várias causas
 População heterogénea dificulta
investigação clínica
INCIDÊNCIA
A incidência é de 1.2 a 2.52/100,000 crianças / ano
ADULTOS
CRIANÇAS
20%
45%
55%
80%
ISQUÉMICO
ISQUÉMICO
HEMORRÁGICO
HEMORRÁGICO
DEFINIÇÃO
 AVC: défice neurológico focal de causa
vascular com duração > 24 horas
 Acidente isquémico transitório (AIT): episódio
semelhante mas por um período de tempo
mais curto
ETIOLOGIA DO ENFARTO
ISQUÉMICO
 Doença cardíaca
Cardiopatia congénita
Endocardite infecciosa
Doença vascular
Arritmias
 Hematológico
Drepanocitose
Coagulopatia
hereditária
Doenças
mieloproliferativas
 Vasculopatia primária
Displasia fibromuscular
Infecções
Arterite de Takayasu
Lupus (LES) e outras
doenças autoimunes
Vasculite infecciosa
 Trauma
Traumatismo fechado da
faringe posterior
Rotação ou luxação da
coluna cervical
ETIOLOGIA DO ENFARTO
ISQUÉMICO
 Metabólico
Homocisteinúria
MELAS
 Fármacos
Tóxicos (cocaína)
Simpaticomiméticos
Contraceptivos orais
L-asparaginase
 Cirurgias
ECMO
Cirurgia cardíaca
Cateterismo cardíaco
Angiografia cerebral
 Síndromes neurocutâneos
Neurofibromatose
Esclerose tuberosa
Sturge Weber
ETIOLOGIA DO ENFARTO
HEMORRÁGICO
 Malformações
vasculares
MAV
Telangiectasia
capilar
 Aneurismas
Sacular
Infeccioso
 Hipertensão
 Diátese
hemorrágica
Défices de factores
coagulação
Trombocitopénia
CID
Leucemia
Policitémia
Anticoagulantes,
trombolíticos
 Vasculite
FISIOPATOLOGIA






Embolia cerebral
Trombose arterial
Trombose venosa
Hemorragia intraparenquimatosa
Enfarto lacunar
Hemorragia subaracnoideia
MECANISMOS
FISIOPATOLÓGICOS
Penumbra
(Débito 20 – 50 mL/100 g/min)
Centro
(Débito 0 – 12 mL/100 g/min)
Centro: área central onde a isquémia é grave e o enfarto
se desenvolve ràpidamente
Penumbra: área perfundida à periferia e que envolve o
centro; tem capacidade para recuperar se a perfusão for
restabelecida ràpidamente
FISIOPATOLOGIA
Interrupção completa da perfusão cerebral
 Supressão da actividade eléctrica ao fim
de 12-15 segundos
 Inibição da excitação transsináptica em
2- 4 minutos
 Inibição da excitabilidade eléctrica em 46 minutos
 Redução do metabolismo inicia-se pouco
tempo depois
FISIOPATOLOGIA
 Neurónios e glia sobrevivem mas sem
função durante pelo menos 30 minutos
antes de haver morte celular
 A possibilidade de que o
restabelecimento de perfusão no
intervalo entre a perda de actividade
neuronal e a morte tecidular pode
restaurar a função é a base para a
terapêutica do enfarto cerebral em
evolução
O que se passa a nível molecular no SNC, durante a isquémia
Ref: Drug Therapy:
Treatment of acute
ischemic stroke. Brott
T., Bogousslavsky J.
N Engl J Med
2000; 343:710- 22
Copyright © 200x2000
Massachusetts
Medical Society. All
rights reserved.
FACTORES QUE INFLUENCIAM O
TAMANHO DO ENFARTO
ISQUÉMICO






Tempo de envolvimento?
Vascularização colateral
Pressão de perfusão
Oxigenação tecidular
Fornecimento de glicose
Acumulação de ácido láctico,
neurotransmissores, radicais livres,
superóxidos
FACTORES QUE INFLUENCIAM O
TAMANHO DO ENFARTO
ISQUÉMICO
 Temperatura tecidular local
 Desenvolvimento de edema cerebral
 Oclusão venosa
QUADRO CLÍNICO




Hemiparésia (91%)
Sinais hemisensoriais
Defeitos dos campos visuais
Paralisia ocular ou rotação da cabeça 
extenso enfarto supratentorial
 Cefaleias  dissecção arterial, trombose
venosa cerebral
 Convulsões  trombose venosa cerebral
 Perda de consciência  hemorragia cerebral,
enfarto extenso território da ACM, enfarto
fossa posterior
QUADRO CLÍNICO
Embolia
 Perda súbita de função
 Sintomas dependem da localização e tamanho
do vaso ocluído
 Muitas vezes associado a doença cardíaca
Trombose arterial
 Sintomas prodrómicos, AITs, curso intermitente
QUADRO CLÍNICO
Trombose venosa
 Cefaleias
  PIC
 Alteração do estado de consciência
 Sinais neurológicos focais
Hemorragia intraparenquimatosa
 Início súbito de cefaleias, vómitos,
deterioração de função
 Por vezes achados mais subtis
DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL




Tumores
Traumatismo
Infecção SNC
Doenças
desmielinizantes
 Parésia de Todd
 Enxaqueca
AVALIAÇÃO NA SUSPEITA DE
ENFARTO CEREBRAL
 Neuroimagiologia
RMN e AngioRM
TAC
Angiografia convencional
 Punção lombar
AVALIAÇÃO NA SUSPEITA DE
ENFARTO CEREBRAL
Em caso de hemorragia
 Estudo da coagulação e plaquetas
 Angiografia convencional se não houver diátese
hemorrágica
Em caso de enfarto com distribuição vascular
 Hemograma, VS
 Ferro, folato, electroforese de Hb
 Proteína S, proteína C
AVALIAÇÃO NA SUSPEITA DE
ENFARTO CEREBRAL
 Anti-trombina III,cofactor de heparina II,
plasminogénio, Factor von Willebrand, factor VIII,
factor XII, anticoagulante lúpico
 Anticorpos anticardiolipina
 Factor V Leiden e resistência à proteína C activada
 Gene protrombina 20210
 Homocisteína total ( e gene MTHFR termolábil,
folato sérico, B6, B12)
 Colesterol em jejum, triglicéridos, Lipoproteína Lp(a)
AVALIAÇÃO NA SUSPEITA DE
ENFARTO CEREBRAL
 Excluir infecção- Serologias Mycoplasma,
Chlamydia, Helicobacter, Borrelia
 Serologias e pesquisa do vírus herpes/ varicella
zoster no LCR
 Estudo do sono
 ECG, ecocardiograma, radiografia tórax
Em caso de enfarto no território vertebrobasilar
 Radiografia da coluna cervical em flexão e extensão
AVALIAÇÃO NA SUSPEITA DE
ENFARTO CEREBRAL
Em caso de enfarto sem uma distribuição vascular típica
 Lactato no LCR
 Amónia plasma e aminoácidos
 Ácidos orgânicos urina
 Ecocardiograma
 Anticorpos antifosfolípidicos
Em caso de não haver enfarto
 EEG
NEUROIMAGIOLOGIA
Imagem do cérebro
 Será enfarto?
 Enfarte isquémico
ou hemorrágico?
 Onde está?
 Que tamanho tem?
 Que tempo tem?
Imagem dos vasos
 Há oclusão?
 Onde?
 Que gravidade?
 Patológico?
 Outras lesões
vasculares?
NEUROIMAGIOLOGIA-TAC
 Enfarto cerebral pode ser identificado ao
fim de 5h desde o início dos sintomas mas
os sinais podem ser subtis
 Avaliação 24h depois mostra
hipodensidade em 60% dos casos
 Sinais precoces:
 “obscuração” do núcleo lentiforme
 Perda da “fita insular” (reflecte
alterações isquémicas precoces na
distribuição da ACM e da ACI)
NEUROIMAGIOLOGIA-TAC
 Efeito de massa precoce pode ser
detectado nas primeiras horas
Enfartos extensos do território da ACM:
apagamento dos sulcos corticais,
apagamento do corpo do ventrículo lateral
Enfartos cerebelosos: apagamento dos
sulcos cerebelosos e cisterna quadrigémia,
efeito de massa no IV ventrículo
Embolia vascular intracraniana pode ser
detectada na TAC sem contraste como
estrutura hiperdensa duma artéria major
por ex. “sinal da ACM hiperdensa”
NEUROIMAGIOLOGIA-TAC
 Diagnóstico de hemorragia intracraniana (HIC)
aguda em 100% dos casos
Hemorragia dos gânglios basais profundos:
hipertensão
HIC basal frontal: traumatismo craniano, rotura de
aneurisma
HIC aguda com efeito de massa e extensa área
envolvente de edema hipodenso: tumor com
hemorragia
Hemorragias lobares: rotura de malformações
vasculares, simpaticomiméticos, trombolíticos ou
anticoagulantes
Hemorragias cerebelosas com efeito de massa na
fossa posterior e hidrocefalia supratentorial :
drenagem cirúrgica emergente
Hemorragia talâmica e hidrocefalia ventrículo
lateral: ventriculostomia urgente
NEUROIMAGIOLOGIA-TAC
 Permite visualizar a presença de efeito de
massa, hemorragia ventricular e hidrocefalia
 96% sensibilidade no diagnóstico de
hemorragia sub aracnoideia
NEUROIMAGIOLOGIA-RMN
 Maior sensibilidade do que a TAC na detecção
precoce de enfartos e transformação hemorrágica,
sinais precoces de edema cerebral e efeito de massa
 Útil na identificação de enfartos da circulação
posterior, de pequenas hemorragias e tempo de
evolução da hemorragia
 Menos acessível, mais cara, menos fiável na
identificação da hemorragia intracraniana aguda,
contra-indicada em mais doentes (implantes de
metal, pacemakers, etc)
NEUROIMAGIOLOGIA





Duplex e Doppler Transcraniano
RMN Funcional
AngioRM
Angiografia convencional
Estudos de fluxo e metabolismo cerebral
ALGORITMO DIAGNÓSTICO
SUSPEITA DE ENFARTO
Défices neurológicos agudos
focais
TAC
Hemorragia
Baixa densidade ou normal
Estudo de enfarto isquémico
Não
Não é AVC
Angiografia
Estudos
para enfarto
hemorrágico
AVALIAÇÃO
 ABC e sinais vitais
 Avaliação médica global
 Avaliação neurológica sumária
TRATAMENTO DO ENFARTO
AGUDO
OBJECTIVOS
 Recuperação rápida e manutenção do fluxo
sanguíneo nas áreas de isquémia
 Minimizar a lesão cerebral
 Prevenção/tratamento de complicações agudas
 Medidas de suporte
 Não há estudos aleatórios e controlados em crianças
 Dados de eficácia, dose e segurança inadequados
TERAPÊUTICA TROMBOLÍTICA EV
 Alteplase ev em doentes seleccionados que
podem ser tratados nas primeiras 3 horas após
o início do enfarto isquémico
 Probabilidade de morte ou sequelas no final do
seguimento diminuiu em 44% comparando com
placebo (IC 95%: 18-48)
 “Odds ratio” de hemorragia intracraniana
sintomática 3.1 (IC 95% 2.3-4.2), hemorragia
intracraniana fatal 3.6 (IC 95% 2.3-5.7)
TERAPÊUTICA TROMBOLÍTICA EV
EM CRIANÇAS
 Análise de 203 crianças tratadas com
trombolíticos para complicações trombóticas
não cerebrais: desaparecimento do trombo
em 80%, hemorragia minor em 54%, HIC em
1 criança;
 29 crianças tratadas com t-PA no Hospital
Sick Children de Toronto: dissolução do
coágulo em 79%, quase 25% com
hemorragia que necessitou de transfusão
TERAPÊUTICA TROMBOLÍTICA
INTRA-ARTERIAL
 Opção para doentes
seleccionados com enfarto
isquémico major por oclusão da
ACM nas primeiras 6 horas
 Não aprovado pela FDA
TERAPÊUTICA ANTITROMBÓTICA
 Começar nas primeiras 48 horas após o enfarto
isquémico excepto se está programada terapêutica
trombolítica
 Aspirina 2- 3 mg/kg/dia
 Diminui probabilidade de recorrência de enfarto
durante o tratamento em 13% (IC 95% 3-21%)
 Diminui probabilidade de morte ou sequelas no final
do seguimento em 5% (IC 95% 1-9%)
ANTICOAGULANTES
 O uso de heparina, heparina de
baixo peso molecular ou
heparinoides não está
recomendado após enfarto
isquémico
 Maior risco de transformação
hemorrágica do enfarto
ESTRATÉGIAS
NEUROPROTECTORAS
 Incluem antagonistas dos
canais de cálcio,
antagonistas de glutamato,
barbitúricos, inibidores da
Sintetase do óxido nítrico,
inibidores de radicais livres,
gangliosido GM-1 , etc.
 Actualmente, nenhum é
recomendado
AUMENTO DO FLUXO
SANGUÍNEO
 Inclui hemodiluição iso ou
hipervolémica
 Ainda não foi provado que
é eficaz
COMPLICAÇÕES NEUROLÓGICAS
AGUDAS
 25% dos casos agravam nas
primeiras 24 horas
 Monitorizar sinais vitais e estado
neurológico
 Vigiar:
 Edema cerebral e aumento de PIC
 Convulsões
 Conversão em enfarto hemorrágico
EDEMA CEREBRAL
 10- 20% desenvolvem edema cerebral que leva
a deterioração
 Pico aos 3-5 dias
 Valor da monitorização da PIC não está
estabelecido
 Recomenda-se osmoterapia e hiperventilação
 Corticosteroides não são eficazes
 Ventriculostomia, descompressão cirúrgica e
evacuação de um enfarto extenso podem ser
“life-saving”
CONVULSÕES
 Na ausência de convulsões, o
uso profiláctico de
anticonvulsivantes não é
recomendado
MEDIDAS DE SUPORTE





Manter temperatura normal
Manter saturações de oxigénio > 95%
Manter glicémia < 300 mg/dl
Corrigir hipoglicémia
Tratamento de hipertensão - controverso
Nos adultos, não tratar excepto se PA sistólica >
200-220 ou diastólica > 120 no enfarto isquémico ou
> 180/105 no enfarto hemorrágico
Fármacos usados: labetalol, nicardipina
MEDIDAS DE SUPORTE
 Planear reabilitação
 Nutrição e avaliação da deglutição
 Mobilização precoce para reduzir risco
de pneumonia de aspiração,
tromboembolismo venoso, escaras de
pressão e contracturas
FACTORES PREDICTIVOS DE MAU
PROGNÓSTICO
ASPECTOS CLÍNICOS
 Perda de
consciência
 Temperatura >
38,5°C
 Elevação grave de
PA?
 Doença de grandes
vasos




DADOS LABORATORIAIS
Glutamato no plasma > 200
mol / L
PCR > 10.1 mg / L
glicémia < 7 mmol / L (sem tPA), > 6,6 mmol / L prevê
HIC (t-PA)
Plaquetas < 150.000 / L
predispõe a HIC
FACTORES PREDICTIVOS DE MAU
PROGNÓSTICO
INVESTIGAÇÕES IMAGIOLÓGICAS
 TAC: Sinal da ACM hiperdenso
 > 33% densidade do território da ACM
 ACM+ACA, ACP ou AChA hipodensidade
 Doppler Transcraniano : oclusão, sem fluxo
 Ecografia carótidas: estenose ou oclusão
 SPECT: ausência de fluxo cerebral (rCBF)
 Angiografia: ACI “T”, ACM proximal ou oclusão da
AB, sem colaterais
 RMN: DWI (difusão) e PWI (perfusão) com grandes
alterações
 AngioRM: ACM baixo débito
PROGNÓSTICO
 Sobrevivência no primeiro mês:
 Após enfarto isquémico: 85- 95%
 Após enfarto hemorrágico: 60- 80%
 Prognóstico melhor em crianças do que
em adultos
 Défice residual em > 75% casos
 Défices: hemiparésia, dificuldades de
aprendizagem, atraso mental,
convulsões, perturbações do movimento
PREVENÇÃO DE
RECORRÊNCIA
 Enfarto isquémico recorre em 6-20% dos casos e
em mais de 60% das crianças com
drepanocitose
 Na drepanocitose
Transfusões regulares para manter HbS < 30%
Considerar transplante medular
Considerar hidroxiureia se não é possível manter
transfusões regulares
PREVENÇÃO DA RECORRÊNCIA
 No Moya Moya
Considerar revascularização
 Nos homozigóticos do gene MTHFR
termolábil
Suplemento com vitamina complexo B
PREVENÇÃO DA RECORRÊNCIA
 Em crianças com dissecção arterial
extracraniana
Considerar anticoagulação
 Em caso de doenças protrombóticas
Considerar anticoagulação
 Nos outros com doença cerebrovascular
Aspirina em baixa dose (1-3 mg/ kg/ dia)
PREVENÇÃO DA RECORRÊNCIA
 Para todos os doentes
Conselhos para prevenir factores de
risco na vida adulta: tabaco, exercício,
dieta
Medição anual da PA
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Acidentes Vasculares Cerebrais na Criança