SOBREVIVENDO DA ADVOCACIA
© Marília Zamoner 1
Carreira famosa e atraente pela possibilidade de altos ganhos, a
advocacia começa a atravessar uma séria crise que já põe em risco
a sobrevivência de muitos profissionais da área. É comum ouvir
histórias de advogados que, para garantir seu sustento, mantêm
dois ou três escritórios em várias cidades, ou daqueles que abrem
negócios paralelos à advocacia, como papelarias ou mercearias, ou
ainda os que mantêm seus escritórios no porta-malas do carro,
viajando de cidade em cidade à cata de causas e clientes.
Essas dificuldades, porém, não são exclusividade dos pequenos
escritórios ou dos advogados iniciantes. Atingem também bancas
tradicionais, médias e grandes, com décadas de funcionamento que,
pelo volume e qualidade de seus clientes, demoram a perceber que
algumas causas pagam por outras. Ou ainda, o que é pior, serviços
consultivos pagam por serviços do contencioso. Renomados
escritórios já diminuem suas dimensões, fundem-se com outros,
como imperiosa necessidade de sobrevivência.
Alertas para o problema já se esboçam e, ainda que timidamente,
começam a surgir tentativas para melhor controlar gastos,
d e s p e s a s , e r e e m b o l s o s 2. C o n t u d o , n ã o s e c h e g o u a i n d a a o â m a g o
da questão: as verdadeiras razões dessas dificuldades que
advogados e escritórios vêm sofrendo nos últimos anos.
Encarando o problema, analisei alguns fatos: 1. Os processos
judiciais levam muitos anos até sua extinção provocando excessiva
demora no recebimento integral dos honorários; 2. O constante
aumento de preços, especialmente os públicos, que se elevaram
estratosfericamente
na
última
década,
impactando
significativamente nas despesas e; 3. A única fonte de receita de
advogados ou escritórios são os honorários.
A renovação de equipamentos, as despesas com imóvel, o tempo
q u e o a d v o g a d o a g u a r d a p a r a s e r a t e n d i d o n o f ó r u m 3, e a q u e l e
empenhado em orientações e informações prestadas ao cliente, o
ônus financeiro pelo adiantamento de custas, enfim, uma gama
enorme de despesas e serviços disponibilizados para acompanhar as
causas em andamento, tudo é pago pelos honorários, que ainda
1
Ad v o g a d a a t u a n t e e m C u r i t i b a / P R
desde 1.997. Graduada pela UFPR, pós-graduada em
Magistério Superior pelo IBPEX, é autora do livro “Sobrevivendo da Advocacia – Uma
Solução de Rentabilidade”, Editora Protexto, 2007. www.protexto.com.br.Contato com o
autor pelo e-mail: [email protected]
2
Ver artigo intitulado “Esquecer de Cobrar o Cliente?”de autoria de Décio Sartore,
publicado em www.migalhas.com.br em 24.01.2007.
3
A O A B / P R r e a l i z o u p e s q u i s a d e c a m p o , e m q u e a p o n t o u e s p e r a m é d i a d e 3 0 a 4 0 m i n u t o s
para atendimento nos cartórios judiciais. devem pagar, lá no final, depois de tudo o mais, o trabalho
intelectual do advogado, a sua remuneração, o seu “salário”.
Dessa forma, para fazer frente às necessidades financeiras mensais,
é preciso contratar novas causas para poder receber novos
honorários. Essas outras causas serão diligentemente acompanhadas
até o final, quando há muito tempo não acontecem mais
recebimentos de honorários advindos delas, num ciclo que se
renova, somente quando as primeiras causas terminam. A excessiva
demora para o encerramento das causas acaba por gerar um
aumento exponencial de trabalho sem o correspondente aumento de
receita.
Em 2.005, dediquei oito meses (de maio a dezembro) para realizar
um estudo pormenorizado desse problema. Concluí que a duração
média de minhas causas era de aproximadamente seis anos.
No ano de 2.006, o Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário
(IBPT) avaliou quarenta mil ações cíveis na Justiça Estadual do
Paraná e concluiu que em média, a duração destas ações é de sete
a n o s e n o v e m e s e s 4. E s t a p e s q u i s a f o i e x c e l e n t e p a r a c o m p r o v a r
minhas conclusões, já que seu resultado, embora por critérios
diferentes, foi muito próximo ao apontado por meu estudo. Além
das ações cíveis na Justiça Estadual do Paraná, também atuo na
Justiça do Trabalho e na Justiça Federal e nestes órgãos as
características do procedimento das ações é um dos fatores que
diminuem o tempo de duração das causas.
Identifiquei também que as causas exigem um trabalho contínuo, de
custo assustador e muito variável. As características da ação, do
cliente, do procedimento, dos diversos órgãos e estruturas do Poder
J u d i c i á r i o e m q u e s e a t u a 5, s ã o a l g u n s d o s f a t o r e s q u e d e s á g u a m
numa variação de custos beirando 147%, podendo alcançar até R$
1.577,68 (mil quinhentos e setenta e sete reais e sessenta e oito
centavos) anuais!
Se tomarmos como exemplo uma causa que dure sete anos e nove
meses e que tenha custado R$ 1.577,68 anuais para acompanhá-la,
o advogado ou escritório pagou R$ 12.227,02 (doze mil duzentos e
vinte e sete reais e dois centavos)! Ou seja, os advogados e
escritórios estão assumindo parte do risco das demandas em que
atuam, abrindo mão de valor substancial de seus honorários!
O estudo do IBPT apontou, ainda, que os honorários advocatícios
são, em média, de R$ 12.760,28 (doze mil setecentos e sessenta
reais e vinte e oito centavos) por causa. Se, naquele exemplo, a
causa consumiu R$ 12.227,02 (doze mil duzentos e vinte e sete
4
P e s q u i s a
divulgada em 11.12.06 em www.oabfi.com.br Muitos são os fatores que implicam em custos diferentes, por exemplo, se a causa é
atendida em comarca contígua ou não, ou se um cliente possui várias causas, ou se em uma
5
causa são partes vários clientes etc. reais e dois centavos) em despesas com acompanhamento, restou
como “salário” para o advogado, apenas R$ 533,66 (quinhentos e
trinta e três reais e sessenta e seis centavos)! Ou seja, sete anos e
nove meses de trabalho valeram R$ 533,66, ou R$ 44,47 (quarenta
e quatro reais e quarenta e sete centavos) por ano, ou R$ 3,70 (três
reais e setenta centavos) por mês, ou R$ 0,01 (um centavo) por
hora de trabalho! Imagine agora, se os honorários recebidos forem
ainda menores que o valor médio apontado pelo IBPT!
O exemplo comprova que, freqüentemente, estaremos diante de
situações em que os honorários recebidos ao final, não cobrirão
sequer as despesas de acompanhamento. Ou seja, não serão poucas
as vezes em que o advogado estará, literalmente, pagando para
trabalhar!
Diante desse quadro alarmante, tornou-se urgente a busca de uma
solução.
O estudo que realizei em 2.005 apontou para uma lista com mais de
vinte itens entre despesas e serviços realizados diária, quinzenal,
mensal e alguns anualmente, para os quais jamais houve
ressarcimento.
Dessa forma, todo o ano de 2.006 foi dedicado para a implantação,
em meu escritório, de uma nova filosofia de remuneração que
incluiu estas despesas. Os honorários ficaram destinados
exclusivamente ao trabalho intelectual do advogado, enquanto as
despesas de acompanhamento passaram a ter dotação própria, como
todas as demais despesas reembolsáveis.
O resultado foi surpreendentemente positivo! Houve uma
diminuição de trabalho em cerca de 25% (vinte e cinco por cento),
com a perda de clientes e casos – 5% a menos do que a estimativa –
e um aumento de receita mensal de aproximados 65% (sessenta e
cinco por cento)!
Este impressionante aumento indica que a implantação do sistema
pode significar a diferença entre a sobrevivência, crescimento e
sucesso ou a morte do escritório.
A aplicação desta nova estratégia mostrou ainda, que a
transparência nos gastos e despesas com a causa, em conjunto com
a adoção de outras ações complementares, melhorou a relação de
confiança entre cliente e advogado, além de refletir profundo
profissionalismo e seriedade, o que significou enorme vantagem
competitiva.
É preciso alertar que, embora a solução apontada seja adequada
para todos os escritórios de advocacia expostos a este problema, o
mesmo não ocorre com sua implantação, pois esta depende de
muitos fatores que variam enormemente de escritório para
escritório. Um deles, e talvez o mais importante, é a disposição
para o risco de perder causas e clientes, sem prejuízos contratuais
e éticos, o que exige um cuidadoso trabalho conjunto do escritório
ou advogado que deseje adotar esta solução e a consultoria que
prestará tal serviço.
A recente lei 11.419/06 poderá dar início a uma eventual redução
nas despesas de acompanhamento, quando houver a total
“virtualização” dos processos.
Mas, enquanto isto não acontecer, caro advogado, você continuará
pagando esta conta?
Download

SOBREVIVENDO DA ADVOCACIA © Marília Zamoner Carreira