I:MKâ<B:IHKM>E:
PARA CIMA E NÃO PARA NORTE
Autora: Patrícia Portela
Design Gráfico: Panóplia®
© Editorial Caminho — 2008
ISBN: 9789722121965
www.editorial-caminho.pt
Nenhuma das palavras que se seguem teriam sido possíveis
sem o precioso incentivo da bolsa literária do Centro Nacional
de Cultura em 2003, o apoio incondicional de Helena Serra,
Ana Pais, Tonan Quito, Eva Nunes e André, o entusiasmo e
as bibliotecas roubadas a António Saraiva (mestre Bakali) e
a Koen Tachelet, as discussões intermináveis com Anton
Skrzypiciel durante os ensaios do espectáculo Flatland, onde
nasceu o primeiro esboço deste texto (curiosamente em 3D!),
a cinemateca do Pai Portela, o olhar ourives da Isabel e os
efeitos secretos e imprevisíveis dos argumentos e da paciência
intermináveis de Christoph de Boeck. Todos serviram de rede
às infinitas e perigosas tentativas de me lançar do espaço, para
mergulhar nos mistérios da dimensionalidade.
Aqui fica registado, no mundo plano, o meu grande obrigado.
PRIMEIRA EPÍGRAFE
Embora naveguemos diariamente num mundo de percepções
3D e, ocasionalmente, até possamos sonhar com mais dimensões com alguma facilidade matemática, toda a informação
captada no nosso mundo passa pelas flatlands infinitas de
papel e ecrãs de vídeo. A comunicação faz-se quase sempre a
um nível 2D.
Citação não rigorosa de Edward Tufte
UMA PEQUENA INTRODUÇÃO
Este relato baseia-se na história verídica de um ponto e do seu
percurso pessoal para se tridimensionar.
Encontrámos algumas semelhanças entre a conturbada história
da sua vida e estes três livros distintos:
Flatland de Edwin Abbot (1838-1926)
As Mil e Uma Noites (compilação de textos persas e outros)
O Paradoxo sobre o Actor de Denis Diderot (1713-1784)
A partir do estudo destas três obras, e da recolha de informação
sobre a vida deste ponto, surgiu este romance em três partes1 e 2:
PARTE I
Capítulo
Capítulo
Capítulo
Capítulo
Capítulo
Capítulo
Capítulo
Capítulo
Capítulo
1
2
3
4
5
6
7
8
9
-
A leitura .....................................................................................p. 33
Os acidentes também acontecem no Mundo Plano ...............p. 51
A conferência de imprensa ......................................................p. 67
O método virgiliano .................................................................p. 77
O emprego de merda .............................................................p. 101
A primeira partícula de luz ....................................................p. 113
Euclides ...................................................................................p. 125
Regresso ao emprego de merda ............................................p. 133
O anfiteatro anatómico ...........................................................p. 139
PARTE II
Ópera Minerália Cinematográfica ...............................................................p. 151
PARTE III
A notícia .......................................................................................................p. 173
1Ao longo da compilação desta obra, e por estrita necessidade, a relação entre a história e as folhas
de papel alterou-se.
2 Nem sempre as notas de rodapé se encontram em rodapé, mas estão sempre indicadas por um
número ou um asterisco.
DEDICATÓRIA
A quem se dedica um livro como este?
A Virgílio e às suas sibilas, alinhavando todas as profecias de
um Império Romano.
A Borges e aos seus leitores invisíveis.
Aos filósofos que seguram os livros com uma só mão, enquanto se passeiam e desenvolvem complexas teorias sobre
o mundo.
A todos os gregos, a todos mesmo, desenrolando intermináveis
pergaminhos no colo.
Aos homens que se tornaram santos porque gostavam de ler
livros particularmente proibidos.
Aos oradores,
Aos Socráticos,
Aos Pitagóricos,
Aos Aristotélicos,
Aos Cínicos,
A outros que lêem e leram para dar a ler.
Mas sobretudo, dedico este livro àqueles que lêem só por ler,
com os livros apoiados nos joelhos.
Àqueles que preferem ler deitados, na cama, no sofá, no chão, nas
suas varandas enquanto espreitam quem se passeia na avenida.
A todos os que não conseguem resistir e lêem sempre primeiro
a última página de um livro, e a todos os que não conseguem
começar o dia sem ler todas as frases do seu jornal diário
(incluindo as dos obituários),
Aos amantes que lêem aos amados,
Aos professores que lêem para um aluno,
Aos estudantes que relêem antes de entrar para um exame,
Às mães que lêem para os filhos, e a todos os que lêem nos
autocarros, nas paragens de eléctrico, nas estações de comboios, nas saídas do metro, nas prisões (eu que o diga!), ou
nas infinitas salas de espera dos serviços da Segurança Social
enquanto não chega a sua vez.
A todos os que lêem para aprender, para explorar, para resistir,
para esquecer, para passar o tempo, para alcançar, ou simplesmente perdurar, a todos
Sim!
A todos dedico esta história.
A todos os que quase me aniquilaram (simultaneamente os
mesmos que me ressuscitaram e me trouxeram, de volta,
aqui).
A todos os que me tornaram possível.
Eu, Homem Plano, conto convosco para virar as páginas que
se seguem.
É a Vocês, habitantes do Espaço em geral, e a Vocês, leitores
sólidos em particular, frente a este mesmo livro, neste preciso
momento, em que dedico estas páginas, desejando que, através da leitura (caminho pelo qual fui introduzido nos mistérios
das três dimensões), possam Vocês também compreender o
mundo bidimensional, e, lentamente, os parâmetros de uma
Vida Plana. De ora em diante, e em conjunto, mudaremos o
curso da História através das Leis da Ficção.
SEGUNDA EPÍGRAFE
Na verdade, na verdade, tudo o que está em baixo assemelha-se
ao que está em cima. E tudo o que está em cima assemelha-se
ao que está em baixo para realizar os prodígios do UNO, e como
todas as coisas emanam do UNO, da meditação do UNO, assim
também todas as coisas nasceram desse UNO, por adaptação.
Tradução livre de Hermes Trismegisto, Opus Magnum
primeira página
No princípio era o silêncio. A primeira vez que falei, fui preso.
Homem Plano
a página vira e ouve-se
ante
Download

Para Cima e Não Para Norte