PRÁTICA PEDAGÓGICA E FORMAÇÃO DE PROFESSORES DA
EDUCAÇÃO BÁSICA: REFLEXÕES A PARTIR DA EDUCAÇÃO
INACIANA E DA TEORIA DA COMPLEXIDADE
GUIDINI, Fernando - PUCPR1
[email protected]
MARTINS, Pura Lúcia Oliver - PUCPR2
[email protected]
Eixo Temático: Didática: Teorias, Metodologias e Práticas
Agência Financiadora: Não contou com financiamento
Resumo
O presente estudo tem como objetivo analisar as possibilidades teórico-práticas dos
princípios educativos da educação inaciana e da teoria da complexidade na prática pedagógica
de professores da educação básica. A pesquisa envolve sete professores com formação
acadêmica em diferentes licenciaturas e a vinculação com a proposta pedagógica de um
colégio particular. Apoia-se na concepção dialética de método, abordagem qualitativa de
pesquisa, modalidade Estudo de Caso, utilizando para coleta de dados o instrumento do
questionário aberto e o procedimento do grupo focal. O estudo revela que na prática
pedagógica desses professores: (i) coexistem elementos teóricos da educação inaciana e da
teoria da complexidade; (ii) é possível estabelecer uma relação com o conceito de autonomia
profissional docente; (iii) existe uma reflexão permanente sobre a prática mediante a pesquisa;
(iv) os professores aprendem por meio da prática, colaborando para a sua formação
permanente. O estudo contribui com reflexões para a formação de professores da educação
básica na análise de temas como desenvolvimento profissional docente, prática pedagógica,
educação inaciana e teoria da complexidade.
Palavras-chave: Prática Pedagógica, Educação Inaciana, Teoria da Complexidade, Formação
de Professores.
Introdução
Este texto propõe como tema de análise as possibilidades teórico-práticas presentes
nos princípios educativos da educação inaciana e da teoria da complexidade no processo
1
2
Mestre em Educação pela PUCPR. Professor de Educação Básica.
Doutora em Educação pela USP. Professora do Programa de Pós Graduação em Educação pela PUCPR.
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formativo de professores da educação básica. Em seu propósito, categoriza elementos
presentes nessas duas vertentes teóricas, atendendo à relação prática-teoria a partir da escola,
organicamente relacionados à formação de professores na e para a educação básica.
O estudo é resultado de uma pesquisa empírica de abordagem qualitativa, modalidade
estudo de caso, desenvolvida no período entre 2009 e 2010. Procurou responder à seguinte
questão: como os princípios pedagógicos da educação inaciana e da teoria da complexidade se
expressam na prática pedagógica dos professores? Para tanto, utilizou como coleta de dados o
instrumento do questionário aberto e o procedimento do grupo focal. Os sujeitos da pesquisa
– sete professores da Segunda Fase do Ensino Fundamental – foram selecionados segundo
critérios previamente discutidos e analisados no conjunto do trabalho, tendo em vista o
objetivo desta pesquisa.
Registra-se que o Projeto Político Pedagógico do colégio pesquisado encontra-se
fundamentado na educação inaciana. Ao mesmo tempo, estabelece relação com a teoria da
complexidade, a fim de fundamentar sua concepção atual de conhecimento. Os professores
sujeitos da pesquisa, portanto, entram em contato com essas duas vertentes teóricas e
possuem, segundo estratégias desenvolvidas na instituição, momentos de formação e estudo a
fim de fundamentar sua prática pedagógica segundo esse referencial de conhecimento e
educação. Assim, este texto traz à discussão os elementos sintetizadores desta temática,
expondo a relação entre os princípios da educação inaciana e da teoria da complexidade.
Críticas feitas às pesquisas em educação apontam para a pobreza teórica e também
metodológica dos conhecimentos constituídos ao longo dos estudos, bem como o pouco
impacto das pesquisas nas práticas escolares (ZAGO, 2003, p. 35). Defende-se, portanto, a
interdependência entre este estudo e a realidade escolar. Deste modo, o caminho a ser
percorrido neste texto propõe a análise de quatro categorias centrais que, no desenvolvimento
da pesquisa, sintetizam elementos da prática pedagógica e ao mesmo tempo formativa de
professores, relacionando educação inaciana e teoria da complexidade na educação básica.
Escritos e falas dos professores, nomeados aqui por letras alfabéticas, estabelecem interfaces
com as categorias.
Desenvolvimento
A análise da prática pedagógica dos professores relaciona-se ao princípio de formação
permanente presente no Projeto Político Pedagógico do colégio estudo de caso. Ao analisar o
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documento, percebe-se que o colégio defende a formação permanente de seus professores na
prática cotidiana de trabalho educativo, propondo estratégias de ação, tais como reuniões
pedagógicas semanais e seminários internos de estudos, procurando levar a cabo tal propósito.
Relacionando tal princípio à educação inaciana, defende-se no colégio a importância da
experiência pessoal e coletiva no fazer docente enquanto matriz também de formação pessoal
(categoria da experiência). Nesse sentido, partindo da prática e a situando diante das
contradições e discordâncias do cotidiano, admite-se no colégio a necessária postura de busca
e estudo constantes enquanto condições capazes de contribuir na formação pessoal e
profissional dos educadores.
Ao abordar a temática da formação de professores a partir da escola, Imbernón (2006)
defende tais pressupostos como uma alternativa de formação permanente do professor. Nesse
sentido, os fundamentos teóricos do Projeto Político Pedagógico do colégio se encontram
também em relação às ideias desse pesquisador da educação, quando o mesmo defende um
paradigma formativo colaborativo entre os professores (IMBERNÓN, 2006, p. 80). Diante
desse paradigma, a escola se estabelece como foco do processo ação-reflexão-ação.
Prática pedagógica e formação de professores: criatividade/autonomia
É assim que, no contexto desta pesquisa, a criatividade se estabelece como uma
categoria de formação permanente. Segundo o Professor G, a criatividade é consequência
desse movimento de questionamento constante pelo melhor. O professor, imbuído desse
princípio, procura, de forma criativa, melhorar a sua prática pedagógica enquanto educador.
Tal estímulo tem como objetivo final a melhor formação dos seus alunos. Assim ele se
expressa:
Acrescentaria que esse movimento dessa inquietude estimula nossa criatividade.
Talvez esse professor não seja uma pessoa criativa, está sempre reproduzindo. A
gente é estimulado a estar criando novas estratégias, novas formas para tentar
transmitir algo aos nossos alunos.
Ao falar sobre os aspectos sociais da criatividade do professor, Nóvoa (1999) a
relaciona ao ensino e, fazendo uso dos estudos de Clark e Yinger (apud Nóvoa, 1999),
argumenta que cada situação de ensino é única. Nesse sentido, os professores fazem
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constantemente uso da sua criatividade a fim de resolver os problemas levantados pela
complexidade, incerteza, instabilidade e conflito de valores na sala de aula (NÓVOA, 1999, p.
131).
Pelo olhar da teoria da complexidade, o ser humano se encontra em abertura constante
ao meio e com ele estabelece relações de troca, formando e ao mesmo tempo sendo formado
pelo ambiente em que vive. Desse processo nasce a cultura e com ela as diferentes formas de
adaptação ao meio em que se vive.
Seguindo esta análise, é possível argumentar que a criatividade tem raízes muito
antigas, constituindo-se com o próprio ser humano, estando na origem da vida e se
desenvolvendo em meio às mutações genéticas acontecidas ao longo da história humana
(MORIN, 2005, p. 305). Em relação à prática pedagógica do professor e à sua formação
permanente, a tomada de consciência do elemento da criatividade impulsiona a um agir
consciente e situado frente ao meio, determinando, inclusive, os modos de produzir o
conhecimento.
Durante a coleta de dados, uma das falas do professor E sobre a sua prática em sala de
aula, demonstrou a relação com os conceitos de criatividade e autonomia. Tal prática – leitura
de um texto, deixa transparecer que o professor, ao mesmo tempo em que carrega referenciais
claros de conhecimento, possui uma prática criativa e autônoma em sala de aula:
Sempre que eu proponho a leitura de um determinado texto, tenho, de acordo com o
meu horizonte de expectativas, um propósito de provocar a reflexão em meus
alunos. Para isso, primeiro eu os escuto e a partir de suas falas eu os provoco a
aprofundarem a discussão, para que o senso comum sobre o assunto seja superado.
Só então, a partir do que foi discutido em turma, mostro a minha leitura do texto e o
propósito da escolha daquele tema. (...) Acredito que assim a leitura se realiza de
modo mais complexo e oportuniza a todos reflexões que, a priori, não teríamos feito
sozinhos. A socialização das leituras é um momento privilegiado no ensino de
língua, pois podemos a partir dela revelar nossa visão ideológica e mostrála/questioná-la com e para os demais.
Percebe-se, a partir do relato do professor, o desenvolvimento claro e definido da sua
estratégia de trabalho. Deixa transparecer a sua postura em relação ao processo de ensino, e
como a mesma é pensada a partir das suas próprias convicções, partindo de expressões
evidenciadas em sua fala, tais como “proponho”, “propósito”, “provoco”, “mostro”,
“acredito”, sempre em primeira pessoa.
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A partir dos dados da pesquisa e da prática aqui relatada, a concepção de autonomia
defendida se refere à constituição permanente da independência do julgar, da constituição da
identidade pessoal no contexto das relações sociais, do distanciamento crítico frente às
situações, da consciência da parcialidade da própria compreensão, do autoconhecimento
contínuo (CONTRERAS, 2002, p. 214). Como expresso pelo professor B, “a gente, como
profissional, não poderia viver sem essa inquietude”.
Considera-se, assim, que o elemento da criatividade e da autonomia, evidenciado na
pesquisa, torna-se momento formativo de professores na prática analisada, e expressa a
prática pedagógica vivenciada pelos mesmos.
Prática pedagógica e formação de professores: utopia
Compreende-se a utopia como projeto e construção de homem, sociedade e mundo,
em consonância com os valores, atitudes e princípios defendidos pela educação inaciana. A
teoria da complexidade, por sua vez, em abertura e inter-relação entre os saberes
contextualizados e em atenção às culturas locais, estabelece o elemento do projeto, do sonho,
dos saberes e atitudes necessárias para que a educação cumpra seu fim (MORIN, 2003).
Utopia, assim, é o já e o ainda não na constituição dialética educativa do presente, movido
pela esperança depositada na educação (FREIRE, 2007). Essa categoria é citada pelo
Professor D como sendo de fundamental importância para a educação inaciana e ao menos
sugerida nos princípios da teoria da complexidade.
Não tem como exercer a profissão sem a utopia. Ser professor tem que ter
constantemente isso e é um ponto muito caro para a educação inaciana e é algo que a
teoria da complexidade pelo menos sugere. Outra questão é que somos provocados
constantemente, e o planejamento tem exatamente essa função, estar sempre em
busca de algo.
É possível analisar, pela fala do professor, a presença de elementos teóricos da
educação inaciana: o desacomodar-se e a provocação são dois desses princípios básicos. A
fala do professor também permite estabelecer a relação dos elementos teóricos da educação
inaciana em vinculação ao planejamento pessoal, quando o mesmo defende, ao final da sua
fala, a função do planejamento na busca constante e permanente por algo a mais.
A dimensão da utopia pode ser analisada ainda sob a expressão de prática pedagógica
desenvolvida em sala de aula pelo professor A. A estratégia (reescrita de prova), expressão
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também da sua prática pedagógica enquanto prática social, deixa claro a importância do
elemento da utopia no processo educativo frente à busca pelo sentido, pelo ser mais e melhor.
Acho que o exemplo mais relevante e que encaminhei nessa semana é a atividade de
reescrita da avaliação. Antes de iniciar, levanto a questão “para que fazer a
reescrita?”. Aí vão tentando responder até que alguém sugere “para ver os erros” e
vamos acrescentando que não só os erros, mas reler a avaliação é importante para
identificar o que fez bem, o que acertou, o que errou, o que ficou incompleto... que
anotações de correção foram feitas. E depois, para que mais? “para aprender certo”.
E continuamos discutindo como fazer isso – pesquisando no material as
informações, explicações, ideias, conceitos relativos ao assunto para reelaborar as
respostas, mesmo aquelas que já foram consideradas corretas ainda podem melhorar.
Pela pesquisa, percebe-se que a prática pedagógica desse professor demonstra como o
mesmo concebe o desenvolvimento da estratégia, exemplificando os passos a serem seguidos.
Permite analisar como o professor relaciona a estratégia pedagógica ao conjunto de alunos,
envolvendo-os e centrando sobre eles o desenvolvimento didático. O professor faz com que os
alunos percebam o sentido dos erros e também a importância dos acertos; em seguida,
demonstra o caminho a ser percorrido pelo aluno para que a prática tenha sentido. Por fim, o
elemento da avaliação, da superação, do mais e do melhor relacionados ao elemento da
utopia.
Ao falar em educação inaciana, a dimensão da utopia se estabelece como uma das
categorias centrais do processo formativo de homens e mulheres para os outros em atitudes de
serviço (KLEIN, 1997, PP. 58-59).
O posicionamento do autor estabelece interfaces com as falas dos professores acima
analisadas, relacionando a educação aos seus fins sociais e demonstrando que o conhecimento
gerado segundo esta perspectiva de trabalho é um conhecimento situado, concreto e em
relação ao contexto vivido. Considerando tais dimensões frente à prática pedagógica dos
professores em sua formação permanente, objetiva a formação de profissionais ao mesmo
tempo conscientes e críticos do ambiente e do espaço em que vivem.
Na constante viagem do educar, Morin (2003, PP. 13-18), reflete sobre os elementos
centrais que, em seu entender, podem ser estabelecidos como bússola a nortear os
navegadores da educação. Na prática acima é possível evidenciar a presença de dois desses
elementos: o pensar sobre o pensar e o erro como elemento de aprendizagem.
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Evidencia-se, assim, que a junção de alguns dos elementos teóricos da educação
inaciana e da teoria da complexidade, tendo neste contexto teórico a utopia como eixo
norteador capaz de dialogar entre e com os saberes em suas diferentes realidades, auxilia na
formação de professores que sejam referências de transformação radical, a partir do contato
com a realidade social e da reflexão sobre as diferentes causas da injustiça no mundo
contemporâneo.
Prática pedagógica e formação de professores: pesquisa
A análise das possibilidades teórico-práticas dos princípios educativos da educação
inaciana e da teoria da complexidade na prática pedagógica de professores da educação
básica, ao se constituir como foco desta discussão, vincula-se à formação de professores no
colégio pesquisado. Percebe-se que a prática pedagógica dos professores sujeitos da pesquisa
gera aprendizagens e saberes que, quando sistematizados, direcionam sua ação docente e
apontam para elementos que se vinculam à sua formação permanente.
É nesse contexto que a pesquisa se estabelece como uma nova categoria de análise
evidenciada em meio às falas dos professores no procedimento do grupo focal:
Sou o professor C. Basicamente, o que o colégio proporciona como incentivo e
aprendizagem constantes é o professor pesquisador. Eu nunca pesquisei tanto em
outros colégios como pesquiso aqui. Pela necessidade mesmo de estar qualificando
constantemente as nossas aulas e a exigência de você estar atualizado
constantemente. Então o que eu aprendi como professor no colégio foi pesquisar.
Isso influencia diretamente, modifica constantemente a nossa prática pedagógica,
visto que pesquisando você tem uma visão de vida, de contexto, de política, de
valores, enfim, é diferenciado.
O tom coloquial presente no posicionamento do professor reforça que a atitude de
pesquisa se encontra vinculada ao estudo e à educação em sua função social. Pesquisar, para o
Professor C, é buscar por novos referenciais e levar o aluno à reflexão, ao aprofundamento e à
abertura ao meio
É nesse sentido que o Professor B defende a necessidade de que o professor seja
pesquisador para que possa ensinar o aluno a pesquisar. O exercício constante da pesquisa o
qualifica para que trabalhe com seus alunos sob o olhar reflexivo mais amplo. Essa
oportunidade, segundo o professor, é dada para todos no colégio em um processo de formação
permanente. No entanto, nem todos internalizam essa necessidade:
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Nós estamos qualificados para cobrar do aluno, para instruir o aluno, para orientar o
aluno. O colégio está dando oportunidade e espaços para ler textos. Tem professor
que lê, internaliza e tem professor que não internaliza. Então fazer a leitura,
internalizar no seu dia-a-dia, ver uma qualificação que isso gera para o aluno, um
aluno pesquisador porque o professor é. Então esse é o caminho.
A temática da pesquisa, em sua abordagem estabelecida no colégio e expressa na
prática desses professores, vem ao encontro das ideias de Behrens (2005, p. 56). A autora
defende que o ensino trabalhado por meio da pesquisa é capaz de provocar a produção de um
conhecimento com autonomia, espírito crítico e investigativo. Enquanto sujeitos históricos, o
colégio assume a formação permanente dos seus professores não mais em uma perspectiva de
deficientes cívicos, mas sim em uma dimensão capaz de pensá-los em sua pessoalidade e
coletividade (PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO, 2007, p. 60).
Pelo estudo realizado, fica claro que, para os professores, a pesquisa é uma importante
prática de formação permanente no avanço e busca pelo conhecimento. Demonstra também
como a pesquisa possui seu espaço no colégio em meio às práticas de formação permanente.
O estudo evidencia ainda uma quantidade de práticas pedagógicas desenvolvidas pelos
professores que se relacionam à categoria da pesquisa. O professor F relata uma de suas
práticas pedagógicas relacionadas à pesquisa:
Nesse trabalho de pesquisa é possível abordar, a partir de um tema central, questões
históricas, questões da estruturação textual, da literatura da época, da cultura e arte
da região, da religião, bem como a utilização de gráficos e números que não serão
utilizados apenas na área de exatas, mas servirão para compor o uso do método de
pesquisa.
Observa-se que, pela pesquisa enquanto prática pedagógica, partindo de uma temática
central, o professor inter-relaciona questões textuais e as remete à história, à cultura, à arte, à
religião, além da importância dos conhecimentos matemáticos (outra ciência) em sua
disciplina. Depreende-se, assim, que o conhecimento gerado a partir dessa prática é um
conhecimento investigativo, indagativo e em relação de saberes, fazendo com que aluno e
professor se posicionem frente ao tema em questão.
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Outro exemplo de prática pedagógica relacionada à pesquisa no colégio é relatado pelo
professor G.
Propomos aos nossos alunos um trabalho de pesquisa sobre os ecossistemas
regionais. O objetivo desta pesquisa é conhecer os processos de formação,
desenvolvimento e manutenção desses ecossistemas, bem como o processo histórico
de ocupação humana e seus impactos sobre esta região, a fim de compreender a
dinâmica deste Bioma e contribuir para a sua preservação.
Pela pesquisa realizada, considera-se que o modelo indagativo ou de pesquisa,
compreendido como ferramenta para a produção de conhecimento, pode se tornar um modelo
formativo de professores da educação básica. Imbernón (2006, PP. 73-78) defende que esse
pressuposto se fundamenta na capacidade do professor de formular questões válidas sobre sua
própria prática e se prefixar objetivos que tratem de responder tais questões.
A conquista de novos conhecimentos, bem como o desenvolvimento de outras
capacidades, tais como o “processamento de informação, análise, reflexão crítica em, sobre e
durante a ação” (IMBERNÓN, 2006, p. 77), se relacionam aos dados desta pesquisa, segundo
o posicionamento dos professores, e se vinculam à concepção de pesquisa presente no Projeto
Político Pedagógico do colégio. Neste sentido, os estudos desenvolvidos demonstram que a
prática pedagógica desses professores, iluminada pela pesquisa, gera aprendizagem prática no
sentido do aprender a aprender, da reflexão constante, do autoconhecer-se.
Prática pedagógica e formação de professores: aprender por meio da prática
O aprender por meio da prática se estabelece como categoria formativa de professores
no corpo deste texto. Durante o grupo focal, o Professor A defende tal categoria que, em seu
entender, encontra-se relacionada aos saberes que ele mesmo obteve no tempo em que atua no
colégio como professor. Mediante a exemplificação de uma prática pedagógica de trabalho
(elaboração do seu próprio planejamento), o professor categoriza e fundamenta tal categoria a
partir da sua rotina de trabalho. Considera-se nesse exemplo a questão do currículo pensado a
partir da sequência de conteúdos e de como os mesmos serão trabalhados com os alunos.
Concomitantemente, o professor estabelece a sua concepção de avaliação, fruto de uma
aprendizagem prática, responsável por retomar de forma diagnóstica e ao mesmo tempo
diversificada a aprendizagem dos seus alunos:
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Eu ressaltaria a importância do planejamento. Eu acho que uma das melhores coisas
que eu aprendi na escola foi elaborar o meu planejamento no encadeamento e
cumulatividade dos conteúdos da minha série, pensando o ciclo, pensando com os
colegas de área a sequência, as séries anteriores e, nesse planejamento, como é que
os conteúdos serão apresentados, a importância da sensibilização para esse aluno,
colocada à frente desse novo desafio, desse novo tema, a importância da retomada
do conteúdo ao se tratar de um novo. Também em se tratando ai de planejamento, a
concepção de avaliação, de uma avaliação diversificada, diagnóstica, mas também a
retomada a partir disso e dos critérios estabelecidos.
A mesma categoria é exemplificada por meio de outra prática de trabalho: a
elaboração dos critérios avaliativos nas diferentes áreas do conhecimento.
Além disso, toda a experiência que a gente teve da elaboração dos critérios para
trabalhar. Isso na minha prática foi fantástico porque avaliar o aluno em sala em
uma produção artística, um poema, uma tira, se você não tem os critérios muito
claros, esclarecidos, vira um achismo, dentro de uma avaliação não cabe isso, não
cabe o achismo. Ou eu sei, ou eu não sei. Ele atende ou não atende aos critérios
estabelecidos. Então todas essas discussões, tudo o que a gente desenvolveu esse
tempo todo influencia diretamente na prática e deixa a gente muito mais seguro.
Nota-se, pelos depoimentos acima elencados, que a dimensão de uma práxis
consciente e política é defendida e torna-se prática no projeto da instituição pesquisada. A
prática pedagógica, nesse sentido, é levada em conta, não demonstrando na pesquisa uma
desarticulação ou mesmo uma situação de alienação entre as diferentes forças de trabalho. Ao
mesmo tempo, a avaliação é compreendida em seu objetivo formativo enquanto
acompanhamento ao aluno, e não como instrumento de controle ou verificação de resultados
no processo de ensino, como reforça Martins (1997, p. 62).
É nesse sentido que a lógica argumentativa tecida no corpo deste texto permite a
exemplificação de como os sujeitos da pesquisa, mediante uma prática pedagógica, aprendem
também por meio da prática, reavaliando o seu próprio trabalho docente e aprofundando
conhecimentos específicos. O Professor A, ao escrever no questionário aberto sobre uma
dessas estratégias (reescrita de provas), relata:
Conversamos sobre como é importante cada um encontrar sua melhor maneira de
estudar, lendo e fazendo anotações/esquemas pessoais, estudando sistematicamente,
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tirando dúvidas previamente. Então, passamos a discutir cada questão mais
importante pela leitura do seu enunciado – o que a questão solicitava, qual era o
comando, qual era o assunto da questão, onde esse assunto estava no material (que
texto tratava desse conteúdo) etc. Aí, com a contribuição de alguns alunos,
escrevemos em conjunto destacando o que era essencial e todos anotam do quadro e
reavaliam sua resposta inicial e por que a correção a julgou daquela forma. A cada
questão reescrita, os alunos que ainda têm dúvidas podem indicar com o dedo
erguido e ter auxílio na carteira. Esse é o trabalho inicial com a estratégia da
reescrita, quando destaco que as seguintes serão primeiro realizadas por eles e
depois discutidas coletivamente. Nessa estratégia procuro demonstrar que há várias
possibilidades de resposta, de argumentação, mas que precisam estar fundamentadas
pelos conceitos da ciência, por sua linguagem específica e pelas informações
centrais do nosso estudo. Além disso, a reescrita é um dos momentos mais
importantes em que promovemos a autoavaliação, pelo conhecimento dos critérios
da avaliação, pela explicitação dos parâmetros da correção, pela análise da resposta
dos demais colegas, pela reflexão sobre sua qualidade de trabalho, suas atitudes e o
quanto contribuem (ou não) para sua aprendizagem... Além disso, há o exercício do
debate, do questionamento sobre a correção, a possibilidade de manifestar sua
discordância e de expor sua opinião sobre o conteúdo, a avaliação etc., momento que
é muito importante para que também eu tenha a medida do meu trabalho.
Percebe-se, pela fala do professor, o tecer coletivo do conhecimento em sala de aula
quando professor e aluno são envolvidos na prática utilizada e juntos aprendem,
estabelecendo considerações e reflexões sobre o conhecimento produzido.
Dado interessante de ser mencionado nesta pesquisa é que a escrita acima tem origem
na resposta dada pelo professor A na coleta de dados utilizando o instrumento do questionário
aberto. Quando mencionado no corpo deste texto a dimensão da prática pedagógica e
formação de professores junto ao elemento da utopia, utilizou-se da fala do mesmo professor
em grupo focal ao relatar a mesma estratégia de trabalho. No corpo dessa pesquisa, tal
consideração torna-se relevante, pois corrobora a função desses instrumentos de coleta de
dados e permite reforçar dados extraídos em comparação ou sobreposição a partir de escritas
ou falas de professores.
Na pesquisa realizada, aprender por meio da prática é também desenvolver atividades
práticas junto aos alunos, levando-os a experienciar os conteúdos estudados em sala. O
professor D afirma que professor e aluno aprendem mediante a realização de semelhante
atividade:
Quando fazemos nossa aula de campo, cuja atração principal são as cavernas
calcárias ali presentes. Fazemos um circuito por uma trilha em uma mata que
recobre a colina que abriga as grutas. Durante esse percurso, comentamos e
discutimos a importância da conservação daquela mata para os ambientes
subterrâneos, que naquele instante está sob os pés dos alunos, algumas dezenas de
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metros abaixo, bem como para o próprio ecossistema da mata em si. Nessa ocasião a
ideia de um sistema complexo em rede se revela tanto na dinâmica da própria
natureza, como na que envolve a intervenção humana sobre a natureza. Alunos e
professor aprendem com essa atividade.
A possibilidade de uma formação de professores centrada na prática investigativa é
defendida por Zeichner (1993). Essa investigação é proposta pelo autor em sua relação ao
practicum dos professores enquanto todos os tipos de observação e práticas de ensino num
programa de formação de professores. Este estudo estabelece interfaces com as ideias do
autor.
Conclusão
Este estudo sobre a articulação entre os princípios educativos da educação inaciana e
da teoria da complexidade na prática pedagógica dos professores, procurou refletir sobre
alguns dos elementos eidéticos desta relação, vinculando-os ao processo formativo de
professores da educação básica. Ao mesmo tempo, dialogou e atendeu às aprendizagens
práticas do cotidiano docente, o que demarcou, no corpo da argumentação, o solo
gnosiológico sobre o qual se assentava a reflexão: a prática pedagógica vivenciada pelos
professores.
Neste caminhar, as categorias de criatividade/autonomia, utopia, pesquisa e aprender
por meio da prática foram as quatro grandes dimensões evidenciadas a partir dos dados
coletados durante a pesquisa. Destarte, neste momento de conclusão, é possível considerar
alguns elementos centrais evidenciados a partir da pesquisa e que se conectam as quatro
categorias, estabelecendo uma visão unitária de conjunto:
Inicialmente, a criatividade/autonomia, como compreendida pelos professores, gera
inquietações epistemológicas responsáveis por novas buscas diante do conhecimento,
possibilitando a relação com uma prática didática autônoma. Junto à criatividade, a autonomia
é responsável por gerar a singularidade da prática didática de cada professor. Por seu turno, a
utopia, em relação ao projeto educativo concreto, com uma imagem de homem, mundo e
sociedade definidos, reestabelece a confiança e a esperança na educação. A pesquisa, por sua
vez, enquanto dimensão prática, leva à constante curiosidade epistemológica. Por fim, o
aprender por meio da prática posiciona o professor em uma atitude de busca permanente,
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aprendendo na coletividade, atento ao saber do aluno e à sua própria formação enquanto
profissional.
Este estudo revela, portanto, a possibilidade inter-relacional entre as quatro categorias
apresentadas enquanto expressão da prática pedagógica dos professores de educação básica,
articuladas aos elementos teóricos da educação inaciana na atualidade e da teoria da
complexidade. Ao mesmo tempo, os referenciais expostos sistematizam elementos
responsáveis pela condição de possibilidade de se relacionar a temática ao processo formativo
de professores na educação básica.
Registra-se, ainda, que a presente discussão seria inócua se não estivesse em
permanente relação à temática da formação de professores da educação básica, sujeitos e
objetos de estudo durante a reflexão proposta.
Junto aos elementos acima expostos, demonstra-se a existência de uma reflexão sobre
a prática pedagógica mediatizada tanto pelas práticas utilizadas no colégio, quanto pelas
diferentes ações levadas a cabo de modo individual. Desse modo, ocorre por parte dos
professores uma mudança na concepção de conhecimento, revelando uma episteme em interrelações de saberes, elementos esses fundamentais diante da busca por novos referenciais
formativos de professores para a educação básica.
REFERÊNCIAS
BEHRENS, Marilda Aparecida. O paradigma emergente e a prática pedagógica.
Petrópolis: Vozes, 2005.
CONTRERAS, José. A autonomia dos professores. São Paulo: Cortez, 2002.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 33ed. São
Paulo: Paz e Terra, 2007.
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MORIN, Edgar. Educar na era planetária. São Paulo: Cortez, 2003.
______, Edgar. Os sete saberes necessários à educação do futuro. São Paulo: Cortez, 2003.
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NÓVOA, António. Profissão Professor. Porto: Porto Editora, 1999.
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ZAGO, Nadir et al. Itinerários de pesquisa. Perspectivas qualitativas em sociologia da
educação. Rio de Janeiro: D. P. & A, 2003.
ZEICHNER, Keneth M. A formação reflexiva de professores: ideias e práticas. Lisboa:
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prática pedagógica e formação de professores da educação básica