CENTRO UNIVERSITÁRIO UNA INSTITUTO DE EDUCAÇÃO CONTINUADA, PESQUISA E EXTENSÃO MESTRADO EM GESTÃO SOCIAL, EDUCAÇÃO E DESENVOLVIMENTO LOCAL Aparecida de Cássia Oliveira Lima ANÁLISE DA EVASÃO DO PROJOVEM URBANO NO MUNICÍPIO DE BETIM: vocalização dos atores envolvidos Belo Horizonte 2014 Aparecida de Cássia Oliveira Lima ANÁLISE DA EVASÃO DO PROJOVEM URBANO NO MUNICÍPIO DE BETIM: vocalização dos atores envolvidos Dissertação apresentada à Banca Examinadora do Mestrado em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento Local, do Centro Universitário UNA, como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre. Área de concentração: Inovações Sociais, Educação e Desenvolvimento Local Linha de pesquisa: Processos político-sociais: Articulações Interinstitucionais e Desenvolvimento Local Orientadora: Drª. Raquel Garcia Gonçalves Belo Horizonte 2014 AGRADECIMENTOS Com certeza nunca caminhamos sozinhos, o alcance dos nossos feitos depende do apoio de inúmeras pessoas que se relacionam conosco, e a qualidade dessas relações dita a qualidade de nossos feitos. Muitos contribuíram de variadas formas nesta caminhada até aqui. A todos, os meus sinceros e profundos agradecimentos. Mesmo correndo o risco de omitir o nome de alguém, não posso deixar de referendar algumas pessoas e instituições, consciente de que todo o apoio, incentivo e sugestões são muito mais amplos do que está aqui registrado. Àquele com quem eu sempre posso contar, por andar ao meu lado desde o primeiro sopro de minha vida, a Deus. Aos meus pais, que em toda a sua simplicidade sempre me viram e me fizeram me sentir um gigante quando eu era apenas uma pequena formiga. Ao meu amado companheiro Ricardo, que sempre me demonstrou seu amor, carinho, paciência e companheirismo. A Alice e à pequenina Manuela, minhas amadas filhas, que sempre me ensinam o quanto ainda tenho que aprender. À minha orientadora, professora Raquel, por toda a paciência e compreensão neste trilhar até aqui. Não posso deixar de agradecer aos professores que participaram da banca de qualificação, à querida professora Matilde, pelo seu carinho e dedicação, e ao professor Claudio, pela objetividade em suas observações. À querida professora Lucia Afonso, a quem muito admiro e com quem muito aprendi, meu muito-obrigado pela parceria proporcionada. Aos amigos e amigas que fiz no Mestrado, Michele, Celia, Jacira, Celina, Tania, Cleudes, Fabiana, Vanessa, Vera e Jefferson. O compartilhamento de angústia e o apoio de todos fazem de vocês também responsáveis por esta produção. Aos participantes desta pesquisa pela atenção e disponibilidade. Em especial, à Coordenação do ProJovem em Betim. Aos amigos professores e funcionários da Escola Estadual Juscelino Kubitschek de Oliveira, pela cooperação, incentivo e apoio. À Editora Escritório de Histórias, pelo livro enviado como cortesia. Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas, que já têm a forma do nosso corpo, e esquecer os nossos caminhos que nos levam sempre aos mesmos lugares. É tempo da travessia: e, se não ousarmos fazê-la, teremos ficado, para sempre, à margem de nós mesmos. Fernando Pessoa RESUMO Esta pesquisa teve como objetivo a análise sobre o fenômeno da evasão em um programa do Governo Federal intitulado Projovem Urbano, no município de Betim – Minas Gerais, por meio da percepção que os jovens frequentes e evadidos e demais atores envolvidos atribuem ao programa e aos fatores desencadeadores de sua evasão. O Projovem Urbano foi desenvolvido para atender jovens, de 18 a 29 anos, que não concluíram o Ensino Fundamental e que se encontram em situação de vulnerabilidade social. Por se tratar de uma política pública, esse programa busca uma forma de intervenção que proporcione mudanças em dimensões que abarcam questões sociais, confrontando-se com a imprevisibilidade das complexidades que as envolvem. Embora vários estudos sobre ele já tenham sido realizados, buscou-se neste trabalho uma visão voltada para seus atores, em especial, os jovens em situação de vulnerabilidade social beneficiados pelo Projovem. Esse novo olhar teve como objetivo reconstruir, por meio dos atores que vivenciam a dinâmica do programa, o conhecimento sobre os fatores que se correlacionam e interagem produzindo elementos que potencializam a evasão. Como meio para se atingir esse fim, baseado nos valores da gestão social, procurou-se a vocalização dos atores envolvidos (beneficiários, equipe pedagógica e coordenadores) através da realização de entrevistas semiestruturadas. Assim, trata-se de uma pesquisa qualitativa que, além das informações obtidas nas entrevistas, baseou-se em dados coletados em documentos do programa e outros disponibilizados pela coordenação local. As análises realizadas apontaram a relevância das estruturas de apoio ofertadas em consonância com as necessidades dos jovens, possibilitando estratégias para a permanência dos mesmos no programa. Observou-se, também, que a forma como o poder público disponibiliza esses recursos é que os torna ineficazes, causando frustrações e descrença, potencializando, dessa forma, a desmotivação dos jovens em participar do programa. Palavras-chave: Juventude. Evasão. Gestão Social. Política Pública. Projovem Urbano. ABSTRACT This study aimed to analyze the phenomenon of evasion in a federal government program called Projovem Urbano in the municipality of Betim - Minas Gerais, through the perception that young people frequent and dropouts and other stakeholders attach to the program and the factors triggers of his escape. The Projovem Urbano was developed to assist young people 1829 years who have not completed elementary school and are in a situation of social vulnerability. Because it is a public policy, this programa seeks a form of intervention that provides changes in dimensions that encompass social issues confronting the unpredictability of the complexities that surround them. Although several studies of the program have already been performed, we sought in this paper a forward vision for its actors, especially young people in situations of social vulnerability benefited by Projovem. This new look aimed to rebuild through the actors who experience the dynamics of the program, knowledge about the factors that correlate and interact producing elements that enhance high school dropout. As a means to achieve this goal, based on the values of social management, sought the vocalization of the stakeholders (beneficiaries, teaching staff and coordinators) by conducting semi structured interviews. Thus, it is a qualitative research, in addition to information obtained in the interviews, was based on data collected in the program and other documents made available by the local coordination. The analyzes indicated the importance of support structures offered in line with the needs of young people, enabling strategies for their permanence in the program. It was observed also that the way the government provides these features is what makes them ineffective, causing frustration and disbelief, enhancing thus the motivation of young people to participate in the program. Keywords: Youth. High School Dropout. Social Management. Public Policy. Projovem Urbano. LISTA DE FIGURAS E GRÁFICOS Figura 1 - Sistematização da estrutura organizacional do Projovem........................................ 49 Figura 2 - Mapa do município de Betim e alguns municípios limítrofes da região ................. 65 Gráfico 1 - Número de Matrículas na Educação de Jovens e Adultos no Ensino Fundamental – Brasil (2007-2011).................................................................................................................... 58 Gráfico 2 - Recebimento de bolsas no Projovem Urbano de Betim (2012 a 2013) ................. 75 LISTA DE TABELAS E QUADROS Tabela 1 - Informações referentes ao fluxo de alunos no Projovem Urbano de Betim (2009 a 2012) ......................................................................................................................................... 67 Tabela 2 - Informações referentes ao número de alunos por qualificação profissional inicial (2009-2010) .............................................................................................................................. 68 Tabela 3 – Percentual de alunos matriculados em relação ao sexo .......................................... 74 Tabela 4 – Percentual de alunos que permaneceram no programa no 1º mês em relação ao sexo ........................................................................................................................................... 75 Quadro 1 - Sistematização das divisões do Projovem Integrado.............................................. 53 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS CAED Centro de Apoio à Educação a Distância CNE Conselho Nacional de Educação CEB Câmara de Educação Básica CONJUVE Conselho Nacional de Juventude CRAS Centro de Referência e Assistência Social EJA Educação de Jovens e adultos FGV Fundação Getulio Vargas IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IPEA Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada MEC Ministério da Educação MTE Ministério do Trabalho e Emprego PEC Proposta de Emenda Constitucional PNAD Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios PNJ Plano Nacional de Juventude Projovem Programa Nacional de Inclusão de Jovem Pronatec Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego PROUNI Programa Universidade para Todos SAEB Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica SECADI Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão SENAI Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial SIMEC Sistema Integrado de Monitoramento Execução e Controle SMA Sistema de Monitoramento e Avaliação UFBA Universidade Federal da Bahia UFJF Universidade Federal de Juiz de Fora UFMG Universidade Federal de Minas Gerais UNB Universidade de Brasília UFPA Universidade Federal do Pará UFPE Universidade Federal de Pernambuco UFPR Universidade Federal do Paraná SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 12 2 DELINEANDO CONCEITOS ........................................................................................... 17 2.1 Educação, cidadania e o processo de exclusão ....................................................................................... 17 2.2 Juventudes, vulnerabilidade e o processo de exclusão social ............................................................... 23 2.3 Gestão social e desenvolvimento local .................................................................................................... 32 2.4 Avaliação de políticas públicas como ferramenta da gestão social – meio para potencializar o empoderamento dos beneficiários ........................................................................................................ 37 3 FOCALIZANDO CONCEITOS ........................................................................................ 40 3.1 Políticas públicas ...................................................................................................................................... 40 3.2 Políticas públicas para a juventude ........................................................................................................ 43 3.3 A Política Nacional da Juventude ........................................................................................................... 44 3.4 Projovem – Programa de Inclusão de Jovens ........................................................................................ 48 3.4.1 Histórico do programa ...................................................................................... 48 3.4.2 Estrutura organizacional do programa ............................................................ 49 3.4.3 O Sistema de Monitoramento e Avaliação (SMA)............................................. 51 3.4.4 O novo Projovem ............................................................................................... 52 3.4.5 O Projovem Urbano .......................................................................................... 54 3.4.6 Evasão ............................................................................................................... 61 3.4.6.1 Evasão no Projovem – Aproximações .............................................................................. 62 3.5 Contexto de atuação do programa ......................................................................................................... 64 3.5.1 O Projovem Urbano em Betim .......................................................................... 67 4 PERCURSOS TRILHADOS PARA O DESENVOLVIMENTO DA PESQUISA ....... 70 4.1 Definições e escolhas ................................................................................................................................ 70 4.2 Definição dos sujeitos............................................................................................................................... 72 4.3 A abordagem ............................................................................................................................................ 77 4.4 Tratamento e análise dos dados .............................................................................................................. 79 4.4.1 Conhecendo os sujeitos - Fragmentos da condição juvenil .............................. 79 4.4.1.2 Análise das entrevistas ..................................................................................................... 79 4.5 Análise dos dados levantados .................................................................................................................. 82 4.5.1 Perspectivas dos educandos frequentes ............................................................ 83 4.5.1.1 Motivações / Desmotivações ........................................................................................... 83 4.5.1.2 Ações comunitárias .......................................................................................................... 88 4.5.1.3 Notoriedade e apoio ........................................................................................................ 89 4.5.1.4 Sugestões para o Programa ............................................................................................. 90 4.5.2 Perspectivas dos educandos evadidos ............................................................... 91 4.5.2.1 Motivações / Desmotivações ........................................................................................... 91 4.5.2.2 Notoriedade e apoio ........................................................................................................ 93 4.5.2.3 Sugestões para o Programa ............................................................................................. 93 4.5.3 Perspectivas dos educadores............................................................................. 94 4.5.3.1 O aluno do Projovem, quem é? ....................................................................................... 94 4.5.3.2 Motivos da evasão ........................................................................................................... 96 4.5.3.3 Dificuldades encontradas dentro do Programa ............................................................... 97 4.5.3.4 Como contornar as dificuldades? ................................................................................... 101 4.5.3.5 A importância do programa para os jovens ................................................................... 103 4.5.4 Perspectivas da Coordenação ......................................................................... 104 4.5.4.1 O aluno do Projovem, quem é? ..................................................................................... 104 4.5.4.2 Dificuldades encontradas no Programa ......................................................................... 105 4.5.4.3 Como contornar as dificuldades? ................................................................................... 106 4.5.4.4 A importância do programa para os jovens ................................................................... 108 4.5.4.5 Participação dos beneficiários ....................................................................................... 109 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................ 111 REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 120 APÊNDICE A - ROTEIRO PARA ENTREVISTA COM O EDUCANDO FREQUENTE130 APÊNDICE B - ROTEIRO PARA ENTREVISTA COM O EDUCANDO EVADIDO131 APÊNDICE C - ROTEIRO PARA ENTREVISTA COM OS PROFISSIONAIS DA ÁREA DA EDUCAÇÃO .......................................................................................... 132 APÊNDICE D - ROTEIRO PARA ENTREVISTA COM OS PROFISSIONAIS DA ÁREA ADMINISTRATIVA .................................................................................... 133 APÊNDICE E - PROJETO DE INTERVENÇÃO ............................................................ 134 12 1 INTRODUÇÃO A relação do profissional de educação com os jovens é permeada por todos os conflitos e complexidades vivenciadas pelo próprio jovem. Essa situação é revelada quando ele se depara com certas limitações no agir e no atuar. Assim, a autora, como professora, busca nesta pesquisa não somente a compreensão de seus próprios valores e visão de mundo, mas também investiga como estes, de alguma forma, acabam repercutindo em sua atividade profissional por reproduzirem desigualdades, de maneira velada e inconsciente, distanciandoa do que a levou a exercer essa profissão. Refletir sobre a prática, hoje, assume um aspecto de proporções maiores, devendo ser considerados diversos fatores que necessitam de uma reflexão sobre as questões sociais. Portanto, ao realizar esta pesquisa, a autora passou por um processo de desconstrução do olhar produzido pelo lugar que ocupa como professora, mãe, adulta e cidadã. Essa pesquisa se debruçou sobre o Projovem Urbano, programa do Governo Federal implantado no município de Betim, em Minas Gerais, voltado para jovens em situação de exclusão social. Após um período como educadora desse programa, a autora confrontou-se com diversas questões, sendo a evasão aquela que mais a desafiou, provocando-lhe uma busca mais consistente e abrangente para entendimento da situação. Essa questão se revelou desafiadora, pois, num primeiro momento, o desenho do programa abrange algumas dimensões que não são contempladas se comparadas com o ensino regular, apresentando-se, de certa forma, condizentes com a realidade para o atendimento ao público a que se destina. Daí a necessidade da compreensão do sujeito, de sua historicidade, contexto social, interpretações, perspectivas, crenças e aspirações diante do mundo. Destaca-se nesse sentido a importância da participação dos beneficiários dessas políticas em sua implementação, corroborando a reflexão já realizada por Demo (2006), de que não há como eliminar a pobreza sem o pobre. Sendo assim, como implementar políticas pensadas e elaboradas baseadas em teorias de pesquisadores, mas que não contemplam a vocalização dos próprios interessados? Assim, surge a seguinte questão a ser investigada: quais percepções, sentidos e interpretações oferecem os jovens e demais atores diretamente envolvidos no Projovem Urbano sobre as deficiências desse programa, que possam lançar luzes sobre formas de superá-las, com vistas a diminuir a evasão? 13 Valorizar a participação ativa das partes interessadas e moldar os processos e procedimentos conforme as necessidades e particularidades dos mesmos é um aspecto de extrema importância para potencializar o sucesso de um programa. Nesse sentido, considerando que o programa é voltado para jovens que já se encontram em situação de vulnerabilidade social, o programa apresenta uma proposta de trabalho e uma metodologia específicas para o atendimento desse público. Surgem daí os seguintes questionamentos: 1. Na percepção dos jovens com passagem pelo Projovem Urbano e demais atores diretamente envolvidos, quais são os recursos, meios e processos necessários para potencializar a retenção do aluno no programa até à sua diplomação? 2. Quais são as necessidades e anseios dos educandos que não são contemplados no programa e que influenciam em sua decisão pela evasão? 3. O que favorece para que uma parcela desses educandos conclua o Programa e outra não? 4. De que forma as parcerias com o governo, sociedade civil e empresas devem ser realizadas para contemplar as necessidades desses jovens? 5. O participante que se encontra inserido de alguma forma no mercado de trabalho está conseguindo acompanhar o programa? Se não está, o que pode ser feito? 6. As ações realizadas no Programa favorecem que o jovem atue e participe ativamente do processo? E se sinta, dessa forma, corresponsável pelo seu desenvolvimento? Em busca de responder a essas questões, o estudo tem como objetivo geral analisar a percepção que os jovens, frequentes e evadidos, e demais atores envolvidos no Projovem Urbano atribuem ao programa e aos fatores desencadeadores de sua evasão. Apresenta como objetivos específicos: Identificar quais são as percepções e sentidos atribuídos pelos jovens ao Programa e como eles podem influenciar para que o participante desista e/ou não consiga finalizar o programa; Analisar as percepções e sentidos que os atores envolvidos no processo de formação e apoio desse jovem no programa têm a respeito do jovem, do programa; Identificar como acontece a participação efetiva do jovem em todos os processos do programa; Elaborar um relatório final da pesquisa sobre os resultados das análises realizadas a ser apresentado à coordenação do programa no município. Conforme já abordado, a proposta de análise parte do entendimento da necessidade da vocalização dos atores envolvidos no Programa a fim de obter uma aproximação da realidade, 14 de forma a desvelar os fatores que desencadeiam a evasão do programa. Para isso, foram realizadas entrevistas semiestruturadas, observações simples, análise de documentos do programa e de outros, produzidos pela coordenação local juntamente com os educadores. A fim de obedecer às diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas que envolvem seres humanos, esta pesquisa foi submetida ao Comitê de Ética em Pesquisa do Centro Universitário UNA, tendo sido aprovada e registrada na plataforma Brasil, sob o número de identificação 12500513.1.0000.5098. As entrevistas ocorreram individualmente com seis jovens frequentes selecionados com a ajuda dos educadores, cinco jovens evadidos escolhidos com base em critérios de representatividade e informações que permitissem o encontro e acesso a eles, sete educadores (incluindo a educadora da sala de acolhimento) e os profissionais da coordenação, composta por três pessoas; num total de 21 entrevistados. Todo o material colhido nas entrevistas com os beneficiários, educandos e coordenadores foi transcrito e organizado de forma que pudesse ser analisado, buscando-se comparar os dados levantados de cada sujeito e de uns com os outros, de acordo com os objetivos da pesquisa. A interpretação dos dados foi realizada utilizando-se como referência a análise de conteúdo segundo Bardin (2011). Com base no referencial teórico e na análise dos depoimentos, foram estabelecidas algumas categorias de análise, que serão apresentadas no decorrer desta pesquisa. O Projovem Urbano apresenta os seguintes eixos norteadores do programa para a inclusão social: a educação, instituída no âmbito da escola; o trabalho, através da qualificação profissional, com o objetivo de inserir o jovem no mercado; e as ações comunitárias, visando à participação social e ao exercício da cidadania. Assim, construiu-se o referencial teórico buscando-se o entendimento das relações entre educação, trabalho, cidadania e a condição juvenil, discutindo suas implicações sobre o fenômeno da vulnerabilidade social juvenil, tendo em vista que este conduz para a exclusão de jovens, demandando, em decorrência, a necessidade da criação e implementação de políticas públicas de inclusão. O primeiro capítulo apresenta uma contextualização do tema, as questões de pesquisa, a metodologia empregada, bem como os objetivos geral e específicos estabelecidos para responder às perguntas propostas. A partir de uma revisão bibliográfica, no segundo capítulo, discorre-se sobre as relações imbricadas entre educação e cidadania, em um cenário historicamente contraditório e excludente. Discute-se também como as juventudes e as vulnerabilidades se constituem frente 15 a esse cenário evidenciando-se, assim, a importância de compreender o jovem em sua vivência na condição juvenil. Ao correlacionar esses temas, converge-se para o aspecto da gestão social e seus valores, com intuito de propor uma reflexão sobre a participação dos beneficiários de programas sociais através da vocalização desses sujeitos, princípio fundamental para balizar ações exitosas que atendam às necessidades dos usuários de programas sociais e desencadeiem um processo de aprendizagem e reflexões, assim como um meio de empoderamento dos beneficiários, valorizando e efetivando processos de participação dos sujeitos envolvidos. No terceiro capítulo, trabalha-se o conceito de política pública como palco de disputas de interesses diversos com o intuito de direcionar o atendimento a demandas sociais diante de um contexto da diminuição do poder do Estado e recursos financeiros. Nesse sentido, buscase identificar quais fatores emergem no cenário nacional e colocam a juventude como foco da ação e intervenção do Estado. Assim, apresenta-se o Programa Nacional de Inclusão de Jovens (Projovem) e suas reformulações até a concepção do Projovem Urbano, tendo como base seus documentos de referência. Após a descrição do programa, discorre-se sobre o contexto de sua atuação no município de Betim e a problematização do fenômeno da evasão em âmbito local e nacional, por meio de dados levantados junto à coordenação local do programa e obtidos de referências diversas produzidas pelas avaliações nacionais do programa realizadas através do Sistema de Monitoramento e Avaliação (SMA). A metodologia e a análise dos resultados constituem os temas do quarto capítulo, que descreve os procedimentos utilizados na coleta do material empírico e realiza uma análise dos dados coletados. Apresenta-se a estratégia metodológica para a abordagem dos sujeitos entrevistados e para a realização das entrevistas semiestruturadas, de modo a entender as percepções daqueles no que se refere à dinâmica do programa no município de Betim, bem como as dificuldades e adversidades enfrentadas em relação à não permanência dos beneficiários no programa. Por fim, no quinto capítulo, são realizadas considerações acerca dos resultados da análise, que de maneira geral apontam para vários elementos que adquirem importância dentro da dinâmica do programa, mas enfatiza-se a relevância das estruturas de apoio ofertadas em consonância com as necessidades dos jovens possibilitando estratégias para a permanência no programa. Observa-se também que a forma como o poder público disponibiliza esses recursos é que os torna ineficazes, causando frustrações e descrença, potencializando, dessa forma, a desmotivação dos jovens em participar do programa. Evidencia-se a vocalização dos atores envolvidos como um instrumento que oportuniza 16 mecanismos que garantam o exercício e o fortalecimento da cidadania, assim como contribui para o fortalecimento e desenvolvimento da ação pública. 17 2 DELINEANDO CONCEITOS 2.1 Educação, cidadania e o processo de exclusão As desigualdades sociais apresentam-se como um problema estrutural inerente a diversos grupos humanos e pertencentes a variadas formas de organização governamental. Frente a essa realidade, surge a necessidade do Estado como moderador de forças, um interventor, que possui como funções garantir o bem-estar do grupo e proporcionar a redistribuição social. Redistribuição e intervenção necessárias na dinâmica do sistema capitalista inserido em um modelo neoliberal, que provocou a diminuição do Estado e a deterioração dos direitos sociais. Além disso, o processo de reestruturação produtivo, regido por esse sistema e potencializado pelos avanços tecnológicos ocorridos nos últimos tempos e pelo aumento da abrangência de dimensões globais, agravou esse cenário, historicamente contraditório e excludente. As consequências disso foram modificações no mundo do trabalho, nas relações sociais, na cultura. Nesse contexto, prevalece a lógica da relação de poder na qual o desenvolvimento e a prosperidade de uns só são possíveis através do subdesenvolvimento de outros. Esse modelo permeia todo o tecido social, intensificando situações que desencadeiam processos de exclusão social. Essa correlação desigual de forças atinge diretamente, como afirma Castel (1998), os “inúteis para o mundo”, os “desfiliados”, aqueles que não conseguem manter-se e sobreviver dignamente. Diante dessa conjuntura, a garantia da sobrevivência e da dignidade faz-se, principalmente, por meio da inserção do indivíduo no mercado de trabalho. Porém, a frequente situação de não adequação a ele desencadeia processos de vulnerabilidade social, que se agravam quando esse estado persiste. Não obstante, a inserção ou não no mercado de trabalho, ou mesmo o tipo de ocupação neste tornam-se cada vez mais incertos; revelando uma contradição, tendo em vista que a capacidade de produzir riquezas e o volume de conhecimento crescem de maneira nunca antes produzida na história da humanidade. A educação assume um papel relevante para essa adequação, num contexto em que o grau de competitividade ampliou a demanda por conhecimentos e informações, impondo ao trabalhador a necessidade de incorporar habilidades e competências essenciais para sua 18 sobrevivência no mercado de trabalho e para a diminuição de suas limitações e do risco associado ao desemprego e subemprego. O resultado da baixa escolarização é que, de maneira mais ou menos geral, a população brasileira é formada por pessoas que podem ser tuteladas e podem até atingir bons níveis de produtividade, mas têm baixa capacidade para realizar tarefas mais complexas, liderar, criar novo conhecimento e tomar decisões que exigem capacidade analítica mais sofisticada (IPEA, 2006, p. 125). Além disso, o nível de escolaridade aparece como um meio potencializador para possibilitar a mobilidade social e o aumento da renda, pois: Sabe-se então com segurança que as pessoas com níveis mais altos de educação têm maior probabilidade de receber salários mais elevados. Esses resultados se repetem ao longo do tempo e mostram que em média, no Brasil, a cada ano adicional de estudo, tem-se acréscimo de renda de mais de 10%. E esse retorno está entre os mais elevados do mundo. Mas a educação não está relacionada apenas à remuneração do indivíduo. Relaciona-se também com o desemprego (IPEA, 2006, p. 121). A educação no Brasil, porém, durante muito tempo não foi percebida como propulsora de mudanças e desenvolvimento, tendo em vista que: No passado o Brasil crescia com empresas grandes e com tecnologia relativamente sofisticada, mas estável. Sabe-se que a demanda por educação e formação depende do nível de complexidade da tecnologia e, ainda mais, da velocidade com que ela muda. Quando muda pouco, é sempre possível ensinar alguém a fazer o serviço à perfeição, mesmo que esse alguém não seja muito educado. Mas quando a tecnologia muda permanentemente, como é o caso atual, a velocidade de adaptação depende do nível de escolaridade. Isso porque, antes de tudo, a educação é o ingrediente que concede ao indivíduo maior capacidade para aprender ao longo da vida. Dada uma ocupação estável, há tempo para aprender a executá-la. Mas se a tecnologia e os equipamentos mudam o tempo todo, só quem tem mais educação consegue aprender o novo em um ritmo aceitável (IPEA, 2006, p. 123-124). Observa-se, assim, que a sociedade do conhecimento tem no capital intelectual seu valor diferencial, como fonte de produtividade e beneficio, contrapondo lógicas anteriores, centradas no capital físico e humano (GOMÀ in BRONZO; COSTA, 2004). Nesse sentido, o grau de escolaridade passa a ser o filtro para o acesso ao mercado de trabalho e a maneira de tutelar a população em relação ao nível de cidadania a que esta tem direito. Além disso, há de se ponderar, como afirma Castel (1998), que o trabalho não pode ser entendido como uma simples relação econômica, mas sim como uma forma de inserir o sujeito nas estruturas sociais, organizando, dessa forma, parte de sua rede de sociabilidade. Não desconsiderando a importância das relações familiares, a educação passa a ser promovida como o mecanismo central da nova ordem social, pois seria um dos meios para o sujeito se constituir enquanto cidadão. 19 Apesar disso, coexistem mais dimensões a serem abordadas na complexidade da dinâmica social que envolve o impacto das grandes mudanças tecnológicas. Entre elas, Gomà (2004) destaca as transformações socioeconômicas e socioculturais. A primeira se refere ao surgimento de outras formas de ocupação, que frequentemente não são consideradas como trabalho, impondo uma reconfiguração da ideia de trabalho como estruturador da vida e do conjunto de relações e direitos sociais. A segunda refere-se à diversificação dos lares e modelos de famílias, a entrada das mulheres no mercado de trabalho e todos os conflitos e tensões ocasionados por causa desse fenômeno, gerando novas instabilidades e conflitos sociais, novas formas de exclusão. Ainda segundo Gomà (2004), para tais mudanças podem ser considerados três vetores de impactos predominantes na estrutura das desigualdades e do espaço de articulação política: [...] o vetor da complexidade, a transição de uma sociedade de classes a uma sociedade cruzada por múltiplos eixos de desigualdade (de gênero, étnico-culturais, digitais, familiares, relacionais, de idade...) sem conexão direta com o âmbito produtivo-laboral. Em segundo lugar, o vetor da subjetivação, a transição de uma sociedade estruturada, certa e previsível, conformada por grandes agregados sociais, com interesses e valores padronizados, para uma sociedade de riscos e incertezas que devem ser confrontadas por uma individualidade com poucas conexões com estruturas coletivas; uma sociedade de natureza líquida como afirma Bauman. Em terceiro lugar, o vetor da exclusão a transição de uma sociedade onde predominava as relações de desigualdades e subordinação vertical, a uma sociedade onde tende a predominar uma nova lógica de polarização em termos de dentro/fora, que implica, para o novo conjunto de grupos excluídos, a ruptura de certos parâmetros básicos de integração social (GOMÀ, 2004, p. 15). Percebe-se o processo de exclusão como um fenômeno estrutural, muldimensional, dinâmico e político, que afeta de forma variável pessoas ou grupos. Ou seja, a exclusão apresenta-se inserida no conjunto das relações sociais e como resultado destas, não podendo ser caracterizada como um fenômeno fatalista. Ao ser enfatizado dessa forma, vislumbra-se que a superação da exclusão faz-se por meio da emancipação do sujeito e do fortalecimento da sua cidadania. Dentre os vários fatores que interferem e potencializam a emancipação está a educação, que, por outro lado, também pode ser utilizada como mecanismo de manutenção da ordem vigente. Dessa forma, as relações de poder existentes na sociedade refletem na educação como ferramenta de regulação do nível e da exclusão da cidadania. A educação acaba sendo mantida e oferecida dentro de concepções que promovem, de forma velada, a tutela do Estado sobre os cidadãos. Portanto, é necessário que a educação oferecida não apenas seja reprodutora e domesticadora, mas que seja realmente emancipadora. Nesse sentido, Demo (1995) apresenta a emancipação como um fenômeno profundo e 20 complexo, com teor tipicamente político, que pode formar no indivíduo uma competência de saber fazer-se sujeito histórico, capaz de pensar e conduzir seu destino, desvelando os determinantes sociais e econômicos que promovem a exclusão. Para isso, a educação não pode ser restrita a uma simples passagem pela escola, mas deve estar permeada e articulada com os atores sociais, instituições etc., de forma a possibilitar uma leitura crítica e reflexiva do mundo e do lugar do indivíduo no mundo. Demo (2008, p. 96) enfatiza que “a educação, na verdade, não opera nenhum milagre, como por vezes se imagina. Se bem conjugada com conhecimento crítico, aprendizagem reconstrutiva política e ética social, oferece elementos pertinentes para a possível gestação de sociedades menos perversas”. Para que se atinja a educação na construção de sociedades menos perversas e mais justas, são necessários sujeitos que consigam contrapor a dominação hegemônica, que sejam capazes de impor, reagir, organizar-se em um embate rumo a interesses do bem comum. Portanto, [...] não se pode conceber o bem-estar social apenas como concessão do Estado, como é comum entender no welfare state. Em boa medida – no seu lado mais digno historicamente-, bem-estar precisa ser conquista dos interessados, construção própria, elaboração consciente e crítica. É decorrência necessária da cidadania. Esta não substitui o “bom emprego” nem lhe é superior. E vice versa (DEMO, 2006, p. 63). A conquista do bem-estar como decorrência da cidadania se faz no provocar o ser consciente de seus direitos e com a apropriação de conhecimentos que o fortaleçam, instrumentaliza-o e potencializa suas formas de ação sobre o mundo, modificando-o. Nesse sentido, para que essa conquista se concretize, requer a promoção da competência política do sujeito, para pensar e concretizar uma sociedade mais equânime (DEMO, 1995). Pode-se apontar a pobreza política como uma das principais causas da falta de cidadania, ou de uma cidadania restrita, tutelada. [...] cidadania tutelada expressa o tipo de cidadania que a direita (elite econômica e política) cultiva ou suporta, a saber, aquela que se tem por dádiva ou concessão de cima. Por conta da reprodução da pobreza política das maiorias, não ocorre suficiente consciência crítica e competência política para sacudir a tutela. A direita apela para o clientelismo e o paternalismo principalmente, com objetivo de manter a população atrelada a seus projetos políticos e econômicos. O resultado mais típico da cidadania tutelada, que, na prática, é sua negação/repressão, é a reprodução indefinida da sempre mesma elite histórica (DEMO, 1995, p. 6). Portanto, o enfrentamento da pobreza política está em pensar na construção da cidadania como fenômeno amplo, e isso implica propiciar a emancipação do sujeito a fim de que ele se constitua historicamente e seja promotor de seu próprio destino. Dessa forma, ele 21 seria capaz de rejeitar a condição de objeto, imposta pela ordem dominante vigente: de excluído, de massa de manobra e de acomodação frente às injustiças sem manifestar nenhum tipo de reação; intervindo, assim, nas relações de poder existente, equilibrando-as. Nesse sentido, Demo (1995) enfatiza que a cidadania inclui a competência de interferir nas relações de mercado, pois, sem passar por elas, não há emancipação possível; o grande desafio é manter o mercado como mero instrumento e não um meio para a efetivação da cidadania. Entretanto, a vinculação entre cidadania, participação e liberdade com a educação não deve ser entendida como uma correlação única e necessária para que as outras se concretizem. Deve ser entendida como extensão da cidadania e resultado justamente do exercício desta; não como condicionante para graduar níveis de cidadania e fator determinante de exclusões. Portanto, [...] quando se continua defendendo a vinculação tão mecânica entre educação, cidadania e participação, continua se reforçando aquela lógica mais global em que ambos nasceram vinculados. Passar por alto dessa lógica global e dos efeitos reais que ela legitimou é continuar defendendo que a educação como o ritual sagrado de passagem para o reino da liberdade é uma forma de contribuir para que a cidadania continue a ser negada, reprimida e protelada (ARROYO in BUFFA et al., 1995, p. 40). Outra questão relevante sobre a inclusão social e a educação refere-se à transferência da responsabilidade do social para o individual, no que diz respeito à entrada e ao êxito do indivíduo no mercado de trabalho, ou seja, a ideia de sua inserção pelo mérito individualizado e de seu fracasso caracterizado como pouca vontade do indivíduo. Dessa forma, a sociedade atrela a condição de mobilidade social ao mérito da educação, premiando os que possuem escolaridade e punindo os que não têm. Portanto, a educação passa a ser um fator de mobilidade social para os que a têm, e de exclusão para os que não a têm. É nesse contexto que se apresenta a pedagogia das competências como uma nova forma de intensificar a exploração do trabalho, pois a mesma se refere a: Uma ideologia que aumenta sua eficácia a medida em que se efetiva a interiorização ou subjetivação de que o problema depende de cada um, e não da estrutura social, das relações de poder. Trata-se de adquirir o “pacote” de competências que o mercado reconhece como adequadas ao “novo cidadão produtivo” (FRIGOTTO in NOVAES; VANNUCHI, 2004, p. 197). Essa ideologia molda as concepções empregadas no cotidiano e que irão conduzir ao projeto social apropriado para os objetivos da globalização, ou seja, a redução do cidadão à condição de aceitar situações impostas. Entre elas, cumprir seu papel de trabalhador e pagar seus impostos, o que não exige senso crítico, capaz de expropriar o senso político, nem permite a ele a noção de seus direitos e de seu poder de reivindicação. 22 Assim, fica evidente o aspecto para o qual Gentili e Frigotto (2011) chamam a atenção: o afastamento da possibilidade de construção de uma sociedade na qual a integração seja garantida, a partir do reconhecimento de seus membros como cidadãos e da realização efetiva dos direitos inalienáveis. Direitos que lhes permitam seu reconhecimento como cidadãos e cidadãs de uma sociedade na qual a equidade seja o princípio norteador, e não os interesses repressores e aniquiladores dos que detêm o poder econômico. Nesse contexto, a universalização da educação passou a ser um fator importante, estando atrelada ao nível de desenvolvimento do país. Mas o ingresso à escola não é condição suficiente para a permanência do indivíduo e a conclusão de seus estudos. Segundo o IPEA (2006), o acesso à escola foi ampliado, mas a permanência não. De todos os que entram na escola, somente 84% concluem a 4ª série e 57% terminam o Ensino Fundamental. O funil se estreita ainda mais no Ensino Médio, cujo índice de conclusão é de apenas 37%. Nesse sentido, a educação ainda não conseguiu promover a equidade, pois a erosão se encontra no meio do processo e atinge principalmente os menos favorecidos, aqueles que estão à margem; ou seja, os que ainda apresentam dificuldades são os que possuem menos recursos, os mais pobres. Diante dessa conjuntura, Arroyo (2010) chama a atenção para a necessidade de retomar a análise da educação centrada na relação educação-sociedade, afirmando que esta se desenvolve como fator constitutivo e reprodutor de desigualdades. Consequentemente, de acordo com seu entendimento, não há que fechar o foco no meio intraescolar e imprimir uma visão reducionista e limitada que propicia a perpetuação das desigualdades escolares, educativas como produtoras das outras desigualdades. É preocupante que, na medida em que os mais desiguais chegam ao sistema escolar expondo as brutais desigualdades que os vitimam, as relações educação-políticasdesigualdades fiquem secundarizadas e sejam priorizadas políticas de inclusão, de qualidade, de padrões mínimos de resultados. É urgente retomar essa relação não superada entre educação e desigualdades. Primeiro, porque foi uma das relações mais instigantes do pensamento educacional. Segundo, porque essa relação foi desfigurada e soterrada nos escombros de relações de mercado, de educação e padrão mínimo de qualidade, de currículos por competências, gestão e avaliações de resultados. Terceiro, porque as desigualdades não só continuam, mas se aprofundam e vitimam milhões de famílias e alunos (as) pela miséria, o desemprego, a sobrevivência nos limites, a violência. As desigualdades dos coletivos sem-teto, sem-terra, sem-espaço, sem-comida, sem-universidade, sem-territórios entram na escola como nunca antes e interrogam as políticas educativas, sua gestão e suas análises (ARROYO, 2010, p. 1384). A tentativa de promover a educação para a conquista de uma igualdade social, equilibrando a distribuição de riquezas no país, passa pelo poder político. Como observado por Ferreira (2000), as desigualdades de renda no país são agravadas pelas desigualdades 23 educacionais e o caminho para superar essa situação seria o aumento do poder político das camadas mais pobres, sendo que: Esta desigualdade de renda ou riqueza, por sua vez, pode implicar numa distribuição desigual de poder político, na medida em que a riqueza gera influência sobre o sistema político. E a desigualdade de poder político reproduz a desigualdade educacional, já que os detentores do poder não utilizam o sistema público de educação, e não tem interesse na sua qualidade, dependendo apenas de escolas particulares. Os mais pobres, por sua vez, não tem meios próprios (nem acesso a crédito) para freqüentar as boas escolas particulares, nem tampouco poder político para afetar as decisões fiscais e orçamentárias que poderiam melhorar a qualidade das escolas públicas (FERREIRA, 2000, p. 25). Nessa perspectiva, a educação voltada para jovens em situação de vulnerabilidade social deve contemplar dimensões diversas que permitam a eles transpor a situação em que se encontram de forma permanente. A compreensão dessas dimensões torna-se um fator crucial para o desvelar da realidade por eles vivida, ou seja, a juventude em seu contexto sóciohistórico-cultural. Para conhecer e entender o que é juventude, ou seja, o que é ser jovem, quais são as percepções e visões de mundo criadas por ele e como se constitui a teia de relações onde ele se encontra inserido, é importante a imersão em seu mundo a fim de permitir que o próprio jovem vocalize as suas interpretações. 2.2 Juventudes, vulnerabilidade e o processo de exclusão social O termo ‘juventude’ torna-se limitado diante das diversidades nas quais se apresenta quando se faz referência aos jovens. Em várias bibliografias encontra-se o termo “juventudes”, também utilizado por Abramovay e Castro (2006), sendo este sugestionado pelas situações, vivências e identidades sociais de um segmento etário da população entre 15 a 29 anos,1 que em meio a esse movimento de transformações sociais, culturais e econômicas 1 “Em geral, a juventude é caracterizada como o tempo ou período do ciclo da vida no qual os indivíduos atravessam da infância para a idade adulta e produzem significativas transformações biológicas, psicológicas, sociais e culturais, que podem variar de acordo com as sociedades, as culturas, as classes, o gênero, a inscrição étnico-racial e a época. Nas sociedades contemporâneas, o período da juventude prolonga-se na medida que os processos de emancipação dos jovens são retardados, por diversos motivos, como a ampliação do período escolar para enfrentar as exigências do mercado de trabalho. Na medida em que a sociedades passam do rural ao urbano, do agrário ao industrial e do industrial a sociedade atual do conhecimento, a abrangência do que vem a ser jovem, em termos etários, alarga-se e assume dimensões que são inéditas na história da humanidade” (ABRAMOVAY; CASTRO, 2006, p. 10). 24 possui características específicas, práticas, valores e relações que vão constituindo a moderna condição juvenil. Entretanto, a juventude não pode ser considerada apenas como uma delimitação etária que define uma etapa da vida, mas deve também ser entendida como uma representação social construída em um dado momento histórico. Assim, a juventude passa a ser [...] produto da interpretação das instituições das sociedades sobre sua própria dinâmica. A juventude trata-se de uma categoria social usada para classificar indivíduos, normatizar comportamentos, definir direitos e deveres. É uma categoria que opera tanto no âmbito do imaginário social, quanto é um dos elementos “estruturantes” das redes de sociabilidade (GROPPO, 2004, p. 11). Dessa forma, a juventude é caracterizada como uma categoria social. Segundo Groppo (2004), para sua análise social e histórica é preciso relacioná-la com outras categorias sociais, e com condicionantes históricos e políticos. A definição etária delimita o tempo para essa transição concedida pela sociedade, no caso, a fase de transição para a vida adulta, onde se atingiria a almejada maturidade. Serve, dessa forma, como parâmetro para as ações institucionalizadas, a fim de normatizar comportamentos condizentes e aceitáveis. Mas a fronteira entre juventude e maturidade torna-se imprecisa, o alcance da autonomia (individual) e da independência (social e econômica) constitui-se de forma não contínua e linear. O que antes era uma sequência de acontecimentos vivenciados pelo jovem que, em certo ponto de sua vida, assumia sua independência financeira, constituía uma família, adquiria autonomia nas decisões sobre sua própria vida; não se observa mais. Hoje já não se identifica essa linearidade; muitos jovens são pais ou mães sem terem independência financeira e moram na casa de seus pais, por exemplo. Portanto, essa delimitação temporal perde sentido como processo de desenvolvimento pessoal, deixa de ser previsível em etapas da vida bem definidas como fases que conduzem progressivamente ao mundo adulto. [...] a biografia dos dias de hoje tornou-se menos previsível, e os projetos de vida passaram mais do que nunca a depender da escolha autônoma do indivíduo. Nas sociedades do passado, a incerteza quanto ao futuro podia ser o resultado de eventos aleatórios e incontroláveis (epidemia, guerra, colapso econômico), mas raramente envolvia a posição de cada um na vida, a qual era determinada pelo nascimento e se tornava previsível pela história da família e o contexto social. Para o adolescente moderno, por outro lado, a relativa incerteza da idade é multiplicada por outros tipos de incerteza que derivam simplesmente dessa ampliação de perspectivas: a disponibilidade de possibilidades sociais, a variedade de cenários nos quais as escolhas podem ser situadas (MELUCCI, 1997, p. 5). As esperanças em um futuro próximo deixaram de ser previsíveis para se tornarem incertas e abertas a várias possibilidades. Leccardi (2005) evidencia que a falta de certeza no futuro provoca a valorização do tempo presente e essa valorização pode ser vantajosa, pois 25 [...] aqueles que exprimem essa estratégia temporal parecem especialmente ricos em recursos – culturais, sociais e econômicos. Se os sujeitos dominantes de nossa época são aqueles que se diferenciam em virtude de sua capacidade de utilizar bem, em termos de poder, a velocidade e a mobilidade, esses jovens parecem trilhar esse caminho. Quem, pelo contrário, possui poucos recursos sociais e culturais parece, sobretudo, sofrer com a perda do futuro progressivo e da capacidade de propor projetos da primeira modernidade. Para esses jovens, o futuro, fora de controle, pode ser somente anulado, apagado para dar lugar a um presente sem fascínio. Nesses casos, como bem descreveu Robert Castel (1996), refletindo sobre o individualismo contemporâneo, estamos diante de uma forma de individualismo “por falta”: aqui, o indivíduo não possui os suportes necessários para construir sua própria autonomia e é expulso para uma identidade sem espessura temporal. A aceleração social torna-se, assim, de modo evidente, fonte de exclusão social, traduzindo-se em uma estaticidade passiva (LECCARDI, 2005, p. 52). A capacidade de traduzir e compreender as mudanças e reagir a elas depende dos recursos de que o jovem dispõe no caminho rumo à vida adulta. E, muitas vezes, a falta de capacidade para compreender as mudanças conduz à falta de reação e ação desses sujeitos, que sem perceberem, ou mesmo percebendo, não conseguem organizar ativos e/ou mesmo mobilizar recursos para se confrontarem com as diversas situações que irão aparecer em decorrência das mudanças. Isso cria uma sensação e/ou situação de não transposição para a idade adulta, ou seja, para sua independência financeira e social, sua autonomia. Assim, esse período pode se tornar campo fértil de potencialidades negativas, especialmente para o jovem que convive em um espaço urbano com todas as suas mazelas. Nesse contexto ele encontra facilidades e acessos a alguns bens e serviços, equipamentos etc., mas, por se tratar de um espaço onde a densidade populacional é maior, as relações sociais também são complexas e conflitantes e o ambiente é tendencioso a situações de violência. Dessa forma, algumas realidades desse ambiente tornam os jovens suscetíveis a vulnerabilidades e a riscos inerentes a esse período etário, tais como: altos índices de envolvimento com drogas ilícitas e criminalidades, corrupção, violência policial, altas taxas de mortalidade por causas externas, afetando principalmente os homens, como já referido em estudos realizados por Abramovay e Castro (2004). Os jovens também enfrentam altas taxas de fecundidade, bem como inexperiência e despreparo profissional, que acentuam sua exclusão do mercado de trabalho, fazendo com que se submetam a ocupações de má qualidade e mal renumeradas, ocasionando, assim, uma deterioração da qualidade de vida. No que diz respeito às potencialidades positivas, é um momento de vir a ser, ou seja, um ser que ainda tem um futuro a ser construído e que amanhã será o responsável por liderar, produzir, criar, transformar, impor e modificar a sociedade. Essa dualidade – ora o jovem é visto como um modelo cultural/um devir, ora como um problema social – orienta as políticas especificas para esse público. Assim, se esse período da 26 vida caracteriza-se pela ocorrência de problemas e de desajustes em relação aos padrões aceitos como normais pela sociedade, o jovem acaba atraindo a atenção dos poderes públicos, tornando-se alvo de políticas públicas. Groppo (2010) ressalta que a condição das juventudes modernas, também chamada de condição juvenil, configura-se a partir de uma relação dialética entre a sociedade versus indivíduos e grupos juvenis. Relação que: [...] está assentada sobre uma relação de contradição entre sociedade e juventudes. Esta contradição se expressa historicamente em ações de institucionalização da juventude seguidas ou precedidas de ações ou resistências dos indivíduos e grupos que são considerados ou se assumem como jovens (GROPPO, 2010, p.19). Dayrell (2007, p. 1108) relaciona a condição juvenil [...] à maneira de ser, à situação de alguém perante a vida, perante a sociedade. Mas, também, se refere às circunstâncias necessárias para que se verifique essa maneira ou tal situação. Assim existe uma dupla dimensão presente quando falamos em condição juvenil. Refere-se ao modo como uma sociedade constitui e atribui significado a esse momento do ciclo da vida, no contexto de uma dimensão histórico-geracional, mas também à sua situação, ou seja, o modo como tal condição é vivida a partir dos diversos recortes referidos às diferenças sociais – classe, género, etnia etc. O modo como a condição juvenil é vivida e a forma como se insere no contexto socioeconômico, gerando potencialidades positivas ou negativas, podem produzir situações de vulnerabilidade social. Segundo Bronzo (2005), a vulnerabilidade articula-se com a ideia de risco, ou seja, ela está relacionada à capacidade de resposta dos indivíduos, tanto material quanto simbólica, para mobilizar recursos com o objetivo de organizar estratégias para o enfrentamento dos eventos produtores do risco, que ameaçam ou prejudicam o bem-estar dos seres. Assim, a vulnerabilidade social pode ser compreendida como [...] resultado negativo da relação entre a disponibilidade dos recursos materiais ou simbólicos dos atores, sejam eles indivíduos ou grupos, e o acesso à estrutura de oportunidades sociais, econômicas, culturais que proveem do Estado, do mercado e da sociedade. Esse resultado se traduz em debilidades ou desvantagens para o desempenho e mobilidade social dos atores (VIGNOLI, 2001; FILGUEIRA, 2001 apud ABRAMOVAY; CASTRO, 2002, p. 3). Provindos de diversos fatores, os riscos surgem nas relações sociais de forma imbricada, configurando situações de: desigualdades, desrespeito à equidade, violações à integridade física e psíquica, relações de gênero, etnia, religião, orientação sexual, condições financeiras, bens e serviços etc., apresentando-se com intensidades e magnitudes diferentes. Essas situações privam e ameaçam o desenvolvimento do sujeito. Assim, o indivíduo, os 27 grupos e/ou comunidades são determinados pelas condições de vida e do meio, que se configuram como fatores interdependentes e inter-relacionados, que convergem para situações de vulnerabilidades diversas. Leão e Carrano corroboram essas afirmações sobre os riscos, mas enfatizam que elas: [...] dependem também do sentido e das disposições acionadas pelos indivíduos, do contexto em que cada um se encontra em um momento da vida, das referências e instituições de apoio a que têm acesso, do conjunto de experiências e relações sociais em que eles se inserem (2013, p. 899). Ao relacionar os riscos à juventude, Assis (apud IPEA, 2008) faz referência a três categorias distintas que, sistematizadas e empregadas pela autora, expressam em linhas gerais os fatores de dificuldades dos jovens com o seu meio mais imediato, tais como: problemas na vinculação com as instituições que apresentam como função de contribuir para a formação do jovem (família, comunidade e escola); condições em que se dá a construção de sua autoimagem; influência do grupo com o qual ele estabelece uma relação estreita; e as interrelações desse grupo com a sociedade. As formas como esses fatores se manifestam, bem como sua intensidade são condicionadas à singularidade de cada caso. Entretanto, o tempo de permanência e a extensão em que um indivíduo se encontra sob a influência de fatores de risco e de situações de vulnerabilidade podem conduzi-lo a processos de exclusão social. Ao mesmo tempo, podem levá-lo a atitudes e comportamentos de apatia, resignação, baixa autoestima, baixo protagonismo, descrença e desesperança com relação ao futuro, dificultando o sentimento de pertencimento à sociedade como um sujeito, um cidadão. Em sentido a contrapor essa situação, tem-se que a mudança, ou seja, a capacidade de resposta frente a um evento de risco, e o fortalecimento da resiliência passam pelo indivíduo e não somente pela manipulação de estruturas externas a ele, mas pela interação destas com ele, de forma a mobilizar os ativos individuais, familiares e comunitários do indivíduo. Neste sentido, Gomà (in BRONZO, 2004) enfatiza que, ao inter-relacionar à vulnerabilidade social a ideia de risco, as trajetórias e as relações ganham importância dentro de um contexto. Tendo-as como referências, essas trajetórias e relações orientam ações no sentido de buscar o enfrentamento desses eventos, por meio do fortalecimento das capacidades e habilidades dos indivíduos, famílias ou regiões. Essas ações devem ser centralizadas no protagonismo e na corresponsabilização, no manejo e estratégia de uso dos diferentes ativos (humanos, físicos, financeiros e sociais); na alteração positiva das estruturas de oportunidades (conjunto de recursos, bens e serviços, benefícios colocados à disposição), 28 com vistas a induzir um processo que resulte no empoderamento e na inclusão permanente do indivíduo. Para tanto, Martins adverte sobre a não existência da exclusão e sim de uma inclusão marginal, já que as pessoas consideradas em situação de exclusão são reincluídas economicamente de diferentes modos, transformando nossa sociedade em duas, duas humanidades. Para o autor, esse movimento “não cria mais pobres que nós conhecíamos até outro dia. Ele cria uma sociedade paralela que é includente do ponto de vista econômico e excludente do ponto de vista social, moral e até político” (MARTINS, 2012, p. 34), ou seja, uma inclusão em níveis e formas degradantes. Ainda segundo o autor, nessa nova forma de inclusão ocorre um estreitamento da possibilidade de mobilidade social entre a nova e a velha pobreza, ou seja, “a velha pobreza oferecia aos pobres a perspectiva de ascensão social, com base em pequenas economias feitas à custa de duras privações ou por meio de escolarização dos filhos e netos, quando possível” (MARTINS, 2012, p. 18-19). Entretanto, em uma sociedade capitalista, um dos elementos que alicerça a inclusão social é a inserção no mercado de trabalho. Mas o sistema vigente e a própria organização social não favorecem uma inserção plena, e sim uma inserção marginalizada, precária; enfraquecendo, dessa forma, a vinculação das possibilidades de mobilidade e ascensão social por meio do trabalho e da escolarização. Martins também ressalta a importância em se considerar a forma como o sujeito elabora e interpreta o fenômeno da exclusão, percebido como uma falsa igualdade alcançada através do consumo e do mercado. Em seu entendimento: Convém ter presente que a exclusão não se explica apenas pelo fenômeno em si, mas também, e sobretudo, pela interpretação que dele faz a vitima. [...] O favelado, que mora no barraco apertado da favela imunda, com o simples apertar do botão da televisão, pode mergulhar no colorido mundo de fantasia e luxo das grandes ficções inventadas pela comunicação de massa; exatamente como faz, pelo mesmo meio e, provavelmente, no mesmo horário e canal, o milionário que vive nos bairros ricos das grandes cidades. A nova desigualdade separa materialmente, mas unifica ideologicamente. No entanto, a nova desigualdade se caracteriza basicamente por criar uma sociedade dupla, como se fossem dois mundos que se excluem reciprocamente, embora parecidos na forma: em ambos podem ser encontradas as mesmas coisas, aparentemente as mesmas mercadorias, as mesmas idéias individualistas, a mesma competição. Mas, as oportunidades são completamente desiguais. A nova desigualdade resulta de encerramento de uma longa era de possibilidades de ascensão social, que foi característica do capitalismo até há poucos anos. Apesar disso, o imaginário cimenta essa ruptura é um imaginário único, mercantilizado, enganador e manipulável (MARTINS, 2012, p. 21-22). Portanto, o enfoque da exclusão/inclusão é descolado, como já se destacou, da vinculação do sujeito a sua capacidade de compra e acesso a bens de consumo, marginalizando-o. Nesse processo, “o excluído não escolhe a sua condição; ela se dá numa 29 evolução temporal como resultado das mudanças na sociedade como, por exemplo, as crises econômicas” (FEIJÓ; ASSIS, 2004, p. 158); evidenciando que se trata de uma questão com raízes mais sociais do que econômicas. Entretanto existem outras formas de exclusão, como a cultural, a étnica e a espacial, como destacam os referidos autores: [...] a segregação cultural priva o indivíduo de obter uma escolaridade que é o instrumento para maiores chances de um emprego com melhor remuneração, assim como, de ter acesso a informações que o habilitem a exercer sua cidadania de forma plena. A exclusão territorial afasta o cidadão do convívio com o restante da sociedade, do emprego, da escola e, até, da terra produtiva. A segregação étnica provoca comportamento de revolta entre os indivíduos, classificando-os como seres inferiores e diferentes, impedindo que usufruam plenamente dos bens de consumo, da escola, de serviços de saúde, alijando-os do convívio sadio e produtivo na comunidade (FEIJÓ; ASSIS, 2004, p. 158). Essas formas de exclusão levam à privação e à dificuldade de acesso a bens públicos e individuais, limitando os meios do indivíduo para conquistá-los e ampliá-los. Sen (2000) afirma que a privação da liberdade econômica pode gerar a privação da liberdade social, assim como a privação de liberdade social ou política pode, da mesma forma, gerar a privação de liberdade econômica. Ao analisar o problema da exclusão, não deve ser levado somente em consideração o viés econômico, mas também a necessidade de inclusão direcionada ao bemestar social, contrariando o paradigma econômico de acumulação exagerada e egoísta, geradora de desigualdades sociais e de marginalização, situação em que somente alguns poucos detêm as riquezas geradas pelo esforço e trabalho de muitos. Para Dowbor (2008, p. 2), “as raízes dessa situação catastrófica são mais políticas do que econômicas”. A centralização de poder político e econômico que caracteriza a nossa forma de organização como sociedade leva, em última instância, a um divórcio profundo entre as nossas necessidades e o conteúdo do desenvolvimento econômico e social. Nessa perspectiva, torna-se indispensável uma reflexão sobre a construção de uma sociedade que proporcione a todos, indistintamente, uma situação de equidade, de acesso aos meios e recursos sociais como educação, saúde, lazer etc., e promova uma expansão das capacidades humanas como meio para inclusão dos sujeitos excluídos e, consequentemente, na melhoria da situação econômica destes. O enfoque tem que ser sobre a expansão da liberdade humana para levar o tipo de vida que as pessoas com razão valorizam, então o papel do crescimento econômico na expansão dessas oportunidades tem que ser integrado à concepção mais fundamental do processo de desenvolvimento como a expansão da capacidade humana para levar uma vida mais livre e mais digna de ser vivida (SEN, 2000, p. 375). 30 Na busca de valorizar esse enfoque, ao caracterizar a juventude tendo em vista ampliar suas capacidades em todas as extensões, torna-se imprescindível compreender o seu contexto social, histórico, cultural, econômico, geográfico. É necessário entender como essas dimensões se articulam de forma a construir um determinado modo de ser jovem. Dayrell (2003) enfatiza que as diferentes imagens construídas a respeito dos jovens, ou seja, visões estereotipadas a partir do olhar adulto da sociedade, interferem na maneira de compreendêlos. Nesse sentido, é preciso considerar que só sabe o que é ser jovem quem é jovem hoje, pois nenhuma geração anterior vivenciou o que os jovens vivem no tempo atual. Sendo assim, torna-se importante enxergar o jovem como um sujeito social, não passivo ao mundo, mas um ser que reage a ele, interpreta, reflete sobre suas ações, sofre, deseja e constrói suas próprias representações através das interações, das apropriações nas relações vividas: em síntese, um ser em um processo de construção. Meu contato com os jovens que pesquisei deixa muito claro o aparente óbvio: eles são seres humanos, amam, sofrem, divertem-se, pensam a respeito de suas condições e de suas experiências de vida, posicionam-se, possuem desejos e propostas de melhoria de vida. Acreditamos que é nesse processo que cada um deles vai se construindo e sendo construído e sendo como sujeito: um ser singular que se apropria do social, transformado em representações, aspirações e práticas, que interpreta e dá sentido ao seu mundo e às relações que mantém (DAYRELL, 2003, p. 43-44). Portanto, é necessário encontrar mecanismos que permitam que os sujeitos expressem seus posicionamentos, desejos e propostas de superação das condições desfavoráveis em que se encontram, em um dado momento histórico, e consigam romper o ciclo vicioso que lhes é imposto por um processo de exclusão. Isso significa considerar o bem-estar social por meio da igualdade de oportunidades e da promoção da equidade. As transformações ocorridas no mercado de trabalho e as condições sócio-históricas de nossa sociedade provocaram o aumento de empregos precarizados e a elevação dos patamares de desemprego, atingindo a todos, sendo essa situação agravada para alguns segmentos, em especial para os jovens. A população mais jovem enfrenta dificuldades de inserção no mercado de trabalho, mesmo que possua escolaridade igual ou superior à das gerações passadas. Assim, jovens em condições de inserção no mercado de trabalho superiores aos dos pais, em termos de escolaridade e formação profissional, encontram-se diante da frustração do desemprego recorrente ou da desolação de baixa renumeração, responsável pela incapacidade de alcançar a independência econômica. [...] Na maior parte das vezes, os jovens não conseguem obter condições de vida e trabalho superiores às de seus pais, mesmo possuindo níveis de escolaridade e formação profissional superiores (POCHMANN, 2004, p. 223). 31 Embora a ampliação e a facilidade ao acesso ao sistema de ensino resultem num contingente de jovens mais escolarizados, não há a mesma proporção de vagas disponíveis no mercado e em atividades condizentes com o nível de formação. Esse contraste provoca duas situações: as empresas exigem cada vez mais qualificação para postos considerados até um passado recente como atividades pouco qualificadas; e, quanto mais qualificado o indivíduo, maior será sua probabilidade de êxito na ocupação desses postos de trabalho, configurando uma vantagem em relação aos menos qualificados. Portanto, a educação torna-se cada vez mais necessária, embora não seja suficiente para garantir êxito e colocação no mercado de trabalho. Agravando essa situação, [...] os filhos de pobres no país encontram-se praticamente condenados ao trabalho com poucas condições de mobilidade social. Porem, ao ingressar muito cedo no mercado de trabalho, o fazem com baixa escolaridade, ocupando as vagas de menor renumeração disponíveis, quase sempre subjulgadas com posições de subordinação no interior da hierarquia no trabalho (POCHMANN, 2004, p. 231). Portanto, pode-se verificar uma reprodução da situação de classe; ou seja, a questão da inserção, ou não, e de como acontece essa inserção ainda se apresenta vinculada ao segmento da sociedade ao qual o jovem pertence. Os jovens que necessitam buscar precocemente um trabalho, ou estão fora da escola, se encontram nessas situações pelo fato de serem filhos de trabalhadores que vivem em condições precárias, com uma rede de apoio2 fragilizada. Consequentemente, as ocupações que esses jovens conseguem são empregos precários,3 no setor informal da economia ou em empresas pequenas com baixa perspectiva profissional. Há ainda que se considerar que para muitos jovens a expansão da escolaridade depende, em grande parte, de terem uma ocupação, pois esta lhes proveria os meios para o alcance dessa expansão. Outro aspecto a ser levado em consideração é que a moratória4 concedida pela sociedade aos jovens com melhores condições econômicas não é uma realidade presente, da mesma forma, na vida dos jovens oriundos de famílias que possuem renda familiar menor. Sendo assim, pode-se observar duas situações, como abordado pelo IPEA (2008): aqueles que possuem situação social privilegiada podem adiar a procura por uma colocação no mercado de 2 Ao referir-se à rede de apoio, faz-se menção a todos que de alguma forma poderiam ajudar nesta entrada e permanência no mercado de trabalho como integrantes da família, amigos e outras redes. 3 São considerados empregos precários os que oferecem baixos rendimentos, geram instabilidade ocupacional, demandam longas jornadas de trabalho, e não apresentam mecanismos de proteção social e trabalhista, como também possuem baixa perspectiva de desenvolvimento profissional. 4 Segundo Margulis (2001), a “moratória social” faz alusão a um prazo concedido pela sociedade aos jovens que lhes permite gozar de uma exigência até que completem seus estudos e estejam preparados para assumir as responsabilidades sociais do mundo adulto e enfrentar o mercado de trabalho. É um estado de graça, um período de indulgência em que não são aplicadas com todo rigor as pressões aplicadas às pessoas adultas. O autor ainda destaca que a moratória tem origens históricas e sociais. 32 trabalho, porque são sustentados financeiramente por sua família, e estender sua formação educacional, ampliando sua capacidade de obter melhores postos de trabalho e, consequentemente, melhores renumerações, aumentando, assim, a sua empregabilidade.5 De outro lado, aqueles que se veem pressionados a trabalhar acabam sendo empregados, em grande parte, em ocupações de qualidade ruim, como já citado, o que não lhes permite a independência financeira, tornando-os, mesmo que de forma precária, dependentes de sua família. Diante dessas duas realidades apontadas, a juventude apresenta-se como um período que deve ser analisado observando-se a diferença social, econômica, regional, de gênero e raça, a fim de compreender todos os fatores que afetam de forma diferenciada os jovens. Além disso, o jovem é confrontado com enormes desafios frente às mudanças ocorridas no mercado de trabalho em termos de reestruturação produtiva e das novas profissões, que surgem com os avanços tecnológicos. Sendo assim, há que se destacar que o aumento da competição no ingresso ao mercado de trabalho também provoca outra forma de violência e exclusão, a simbólica, provocando estigmatizações e discriminações diversas desses jovens por causa de sua origem, local de moradia, gênero etc. 2.3 Gestão social e desenvolvimento local O termo social é ambíguo, indefinido, e pode ser utilizado de forma oportunista em uma sociedade permeada pela lógica do mercado e da competição, na qual se observa uma deformação nas prioridades que servem de base para sustentar a qualidade de vida dos cidadãos. Portanto, diante da complexidade, conflitos e do incentivo ao individualismo, o termo ‘social’ pode receber significações deturpadas, dificultando, assim, práticas e ações realmente voltadas para um bem comum. Não obstante, o adensamento dos problemas sociais apresenta-se como desafio, em que ações pontuais e focalizadas já não conseguem responder e resolver as demandas que se 5 Empregabilidade é um termo, segundo Machado (1998), utilizado para “referir-se às condições subjetivas da integração dos sujeitos à realidade atual dos mercados de trabalho e ao poder que possuem de negociar sua própria capacidade de trabalho, considerando o que os empregadores definem por competência” (p. 18-19). Um termo que traz embutidos os preceitos que a posição do indivíduo no mercado de trabalho é definida pelos “méritos individuais, para os quais seriam determinantes a qualidade de seus atributos, a gama de conhecimentos e a eficácia real de suas capacidades pessoais” (p. 19), encobrindo, assim, as relações sociais excludentes da sociedade capitalista. 33 avolumam e se tornam cada vez mais complexas. Dessa forma, impõe-se a necessidade da articulação de diferentes saberes, disciplinares e não disciplinares, de diferentes atores, assim como ações planejadas de forma sistêmica e integrada, utilizando-se da intersetorialidade, com vistas a promover um bem-estar integral e não fragmentado. Assim, a gestão social surge como um processo balizador para que possam ser concretizadas ações que priorizem o desenvolvimento humano, o aumento da capacidade dos indivíduos, famílias e comunidades de agir sobre questões que os afetam, proporcionando um movimento inclusivo na sociedade. Após a sistematização das concepções apresentadas por alguns autores, Maia (2005) evidencia que a gestão social sedimenta-se em valores, práticas e procedimentos pautados na democracia e cidadania, orienta-se para a mudança e pela mudança, em busca de igualdade e equidade para uma transformação societária. Sendo assim, os processos decisórios devem ser exercidos por diferentes sujeitos sociais, para que possam ser concretizados, e substanciados por meio da viabilização da participação efetiva, a fim de que o processo de exclusão conjuntural e historicamente constituído seja amenizado e até mesmo neutralizado. Nesse sentido, não se ignoram os movimentos constitutivos da sociedade e suas relações de força e poder, seus conflitos. Assim, os valores originados do conceito de gestão social se orientam contra o poder hegemônico de mitigação da sociedade, buscando o desenvolvimento de processos sociais que viabilizem o desenvolvimento dessa sociedade. Portanto, a gestão social pode ser compreendida como [...] um conjunto de processos sociais com potencial viabilizador do desenvolvimento societário emancipatório e transformador. É fundada nos valores, práticas e formação da democracia e da cidadania, vista do enfrentamento às expressões da questão social, da garantia dos direitos humanos universais e da afirmação dos interesses e espaços públicos como padrões de civilidade. Construção realizada em pactuação democrática, nos âmbitos local, nacional, mundial: entre os agentes das esferas da sociedade civil, sociedade política e da economia, com efetiva participação dos cidadãos historicamente excluídos dos processos de distribuição das riquezas e do poder (MAIA, 2005, p. 15-16). Tendo em vista ser ele um conceito em processo de construção, é imprescindível não confundir “gestão do social” com “gestão social”, este último fundamentado na contrahegemonia da ordem vigente. Já a gestão do social, como aponta Maia (2005), pode ser entendida como um conjunto de ações e procedimentos, seja na perspectiva gerencial ou voltada para as políticas públicas, que não provoca uma intervenção direta e significativa, de forma a promover alterações na trama do desenvolvimento societário. Não conduzem a um desenvolvimento local, ou seja, não desencadeiam um processo contínuo que tenha em vista a emancipação de ser humano. Desenvolvimento baseado na concepção do sujeito enquanto cidadão de um mundo dinâmico 34 e em constante transformação, na integração e articulação de meios, processos, escalas e, em relações que permeiam diversas formas de poder e conflitos. Todo esse processo é legitimado pelo respaldo adquirido por meio de uma participação ativa viabilizada pela democratização e descentralização de poder. O locus do sujeito e como se configuram as relações neste ganham importância nesse processo, pois o lugar toma a forma e a consistência que o ser humano dá a ele e se apropria dele como território, com as suas relações de poder e conflitos gerados. É nesse espaço socialmente constituído e instituído no vivido que a dimensão humana se manifesta, assim como suas angústias, seus anseios, seus sofrimentos, suas expectativas, suas realizações. Torna-se, portanto, um campo fértil para interação e articulação dos diversos atores sociais e instituições, objetivando a promoção da autonomia da sociedade em busca do desenvolvimento. Assim, entende-se o desenvolvimento como um processo que a partir das particularidades e singularidades dos sujeitos proporciona a eles autonomia e empoderamento, de forma a contrapor situações desfavoráveis e degradantes. Nesse processo, faz-se necessário o entendimento desses sujeitos, sob a visão e perspectiva dos mesmos, de suas demandas, necessidades e expectativas, que se apresentam determinadas pelas condições socioeconômicas e territoriais em que vivem. Para isso, é necessário dar voz, principalmente, a sujeitos advindos de grupos mais vulneráveis e excluídos, para que possam ser contemplados com políticas que não tenham um caráter meramente assistencialista. [...] Demandas referentes a necessidades de grupos e segmentos da população com menor capacidade de vocalização costumam ser atendidas por políticas públicas que geram ações de caráter compensatório (que visam a garantir o provimento pontual de bens e serviço) e não transformador (que visam à reversão estrutural do processo de exclusão), o que é ainda mais grave em um ambiente em que a política econômica mantém ou agudiza situações de profunda desigualdade social (INOJOSA, 2005, p. 4). Deve-se considerar que, quanto mais expostos a situações recorrentes de degradação e destituição de direitos, enquanto cidadãos e seres humanos, menos representatividade esses sujeitos possuem para expor suas demandas. Portanto, para que se possa atingir as reais necessidades e demandas desses grupos ou segmentos sociais, de forma a viabilizar intervenções que provoquem, de fato, um processo emancipatório; torna-se premente a participação desses sujeitos. Nesse sentido, Inojosa (2005) salienta que participação supõe capacidade de vocalização. Assim sendo, as políticas públicas direcionadas para jovens em situação de vulnerabilidade social necessitam fornecer mecanismos para que eles possam ter 35 voz e ser realmente considerados sujeitos de direitos, adquirindo e tomando forma verdadeiramente transformadora para que se efetive a sua cidadania. Vale ressaltar que a participação passa pelo envolvimento do sujeito nas ações e não somente em ações feitas para ele. Portanto, como ponderado por Sander (2010), deve ser um processo formativo e contínuo, realizado de forma gradativa, não se apresentando necessariamente de forma linear e restrita a espaços institucionalizados, podendo acontecer como um simples debate, troca de informações, ações etc. Nesse sentido, a ideia de participação está [...] diretamente relacionada à possibilidade de constituição de um capital político que permita a uma sociedade evoluir no manejo de seus instrumentos democráticos, bem como propiciar que os diversos interesses conflitantes sejam trazidos a tona para a arena publica (CASTRO; VASCONCELOS in ABRAMOVAY et al, 2007, p. 83). Além disso, a participação pode se apresentar como um mecanismo de valorização, integração, incentivo ao sentimento de pertencimento, desenvolvimento de novas capacidades, estímulo da noção de corresponsabilização social. Como enfatiza Bordenave (1994), por ser inerente à natureza social do homem, a participação [...] é o caminho natural para o homem exprimir sua tendência inata de realizar, fazer coisas, afirmar-se a si mesmo e dominar a natureza e o mundo. Além disso, sua prática envolve a satisfação de outras necessidades não menos básicas, tais como: a interação com os demais homens, a autoexpressão, o desenvolvimento do pensamento reflexivo, o prazer de criar e recriar coisas, e, ainda, a valorização de si mesmo pelos outros (BORDENAVE, 1994, p. 16). A participação pode ser vista como um meio de promoção do desenvolvimento humano de forma dialógica e reflexiva, ampliando a relação do sujeito com o meio, suas habilidades e capacidades, de forma a direcionar ações e comportamentos. Mas, como salienta Demo (2008), deve ser entendida como um processo de conquista, um constante vir a ser, não existindo, assim, participação suficiente, acabada ou completa e sim um eterno desafio, um processo contínuo em desenvolvimento. Dessa forma, não pode ser entendida como uma dádiva, concessão ou algo preexistente. Para tanto, há que se considerar que o jovem apresenta certa repulsa a situações impositivas e autoritárias, ao mesmo tempo que se mostra descrente com relação a formas de participação tradicionais e institucionalizadas. Porém, como relatado por Novaes (2009), os jovens de hoje apresentam novas formas de engajamento e participação social, através de organizações juvenis diversas nas periferias, que contribuem com variadas potencialidades de transformações, pois, a despeito do nível de escolaridade, possuem um acesso maior a 36 informação e um estranhamento frente a situações de desigualdades sociais. Nesse sentido, não se confirma a visão impregnada na sociedade de apatia juvenil de hoje; o que se deve considerar é que a forma de o jovem se expressar e participar mudou. Mas essa participação também está limitada aos espaços que a sociedade oferece a esse jovem, que, de maneira em geral, o enxerga com uma visão estereotipada e preconceituosa. Portanto, conceber a participação como um processo significa perceber essa teia de relações e interações construída entre os diversos atores. Relações complexas e contraditórias que durante o processo podem inibir a participação de alguns. Assim, surgem as seguintes questões: como efetivar e vocalizar as vontades e necessidades de sujeitos que são alvo de políticas públicas? Qual o papel desses sujeitos no processo de avaliação dessas políticas? Como inserir, no processo, sujeitos que se encontram em situação de vulnerabilidade social e, devido a essa situação, apresentam apatia e descrença em programas advindos do governo? Como a avaliação pode favorecer o desenvolvimento e a melhoria da qualidade de vida das pessoas a que esses processos se destinam? São questões que não apresentam soluções fáceis, mas apontam para um caminho pouco explorado no processo de avaliação, que é o da participação. A vocalização dos diversos atores envolvidos poderia ajudar a compreender as percepções que eles têm a respeito de determinado programa, como e de que forma efetivamente suas ações conseguiram modificar e/ou melhorar a qualidade de vida das pessoas para as quais essa política pública é direcionada. Entendendo-se que o conceito de qualidade de vida é complexo e difícil de ser esgotado, seria necessário levar em consideração dois aspectos na tentativa de sua mensuração: os aspectos subjetivos e os aspectos multidimensionais de percepção do ser, de construção do seu lugar no mundo, entre eles os biológicos (necessidades básicas), psicológicos, sociais e ambientais. O aspecto subjetivo é importante, porque “a qualidade de vida só pode ser avaliada pela própria pessoa” (SEIDL; ZANNON, 2004, p. 582); e multidimensional, porque se reconhece que é composto por “diferentes dimensões”. Considerar o bem-estar dos cidadãos é pensar em sua qualidade de vida, e, da mesma forma, é pensar em políticas públicas que possam contribuir para a melhoria dessa qualidade de vida. Ao discorrer sobre esse entendimento, toca-se na questão da cidadania ativa como meio promotor de mudanças sociais. Mudanças que “ocorrem a partir da interação de inúmeros fatores que não podem ser totalmente controlados pela ação prevista nos planos” (GOMES, 2001, p. 19), portanto, a ação na área social é marcada pelo alto grau de incerteza. 37 As mudanças sociais, no sentido de promover o desenvolvimento humano, social e a qualidade de vida aos cidadãos, relacionam-se diretamente com a capacidade de propiciar a participação ativa dos jovens como forma de compreender os aspectos constitutivos dos problemas sociais e suas prováveis soluções, pois [...] as relações entre juventude e sociedade se fazem como em uma espécie de jogo de espelhos: ora apenas retrovisor, ora retrovisor e agigantador. Neste peculiar jogo dialético se produzem marcas geracionais, sensibilidades e disposições simbólicas comuns aos jovens que vivem em um mesmo tempo social. Por isto mesmo, para compreender os processos sociais em curso, é preciso atentar para suas virtualidades. Não por acaso, entre os jovens sempre existem adesões ao estabelecido e, também, territórios de resistência e de criatividade. Assim como existem condicionantes sociais que provocam a total adesão à sociedade de consumo, existem outros que impulsionam a busca de novas alternativas. Medos e sentimentos de insegurança e desconexão desfavorecem a sociabilidade contemporânea e impõem limitações econômicas aos jovens, mas existem também uma série de sentimentos e predisposições simbólicas que impulsionam resistências, evidenciam potencialidades e possibilidades de invenções sociais historicamente inéditas (NOVAES, 2007, p. 23). Assim, trabalhar as potencialidades e possibilidades desses sujeitos, viabilizando sua participação em todas as instâncias é tornar viável seu aspecto criativo, de resistência em busca de novas alternativas frente a situações que degradam sua qualidade de vida. Em se tratando de um programa voltado para jovens em situação de vulnerabilidade social, torna-se um meio balizador, através de concepções advindas da gestão social, de viabilizar que ações por meio das políticas públicas se tornem ações de juventude, pensadas e concretizadas com o jovem, e não somente endereçadas a ele. 2.4 Avaliação de políticas públicas como ferramenta da gestão social – meio para potencializar o empoderamento dos beneficiários A gestão social pode abranger todo o processo de elaboração, implementação e avaliação de uma política pública. Nesse processo, a avaliação destaca-se como um instrumento gerencial com vistas à eficiência e eficácia das ações de implementação, bem como uma ferramenta necessária, tanto em uma escala macro quanto micro, como forma de desencadear um processo de empoderamento e aprendizado dos atores envolvidos por meio da participação. A participação desses atores é necessária devido à imprevisibilidade quanto aos efeitos que uma ação pode provocar, pois, ao se pensar em uma abordagem social, é imprescindível 38 entender quais das condições estruturais e materiais a que os sujeitos estão expostos podem ser percebidas por fatores observáveis, mensuráveis. Mas também é necessário abranger as dimensões culturais e psicossociais, que colaboram para que as situações a que são submetidos se tornem recorrentes, criando um ciclo vicioso. A compreensão da articulação e interdependência, pelo menos em parte, dos fatores imbricados nessas dimensões e de como se inter-relacionam de forma a perpetuar a permanência e produção de condições desfavoráveis, torna-se fundamental para o planejamento e execução de ações que potencializem a possibilidade do sujeito de transpor essas condições e, assim, contribuir para a efetividade das ações de determinada intervenção social. Dessa forma, a complexidade pressiona a uma redefinição conceitual e operativa das políticas sociais. A ausência da interação entre os atores diretamente beneficiados na implementação e avaliação de uma política pública tende a produzir ações ineficazes e incapazes de alcançar integralmente os objetivos propostos. Além disso, correm o risco de se tornarem efêmeras, reduzindo sua sustentação política, pois os sujeitos alvo dessas ações são tratados como objetos e não como sujeitos, de fato, do processo. Desse modo, [...] concebe que a avaliação deve abarcar desde o processo decisório até a execução dos programas sociais, pois entende que não é suficiente comparar os seus resultados alcançados com metas propostas sem considerar os condicionantes e os interesses que informaram a tomada de decisão. O processo de decisão é eminentemente político, por isso não pode ser colocado em segundo plano, sob pena de todo o resto da análise ser prejudicado. Dessa forma, os aspectos políticos da avaliação devem ser resgatados, desde o processo de formulação até a implantação das políticas sociais (GOMES, 2001, p. 28). A avaliação de uma política pública não constitui ato desinteressado, pois o ato de avaliar, em si, já pressupõe a intenção de auferir valor, fazer um julgamento, uma comparação. Essa avaliação baseia-se em valores tais como eficiência, justiça social, redução dos custos e concepções sobre a realidade social. Nesse sentido, as avaliações de programas e projetos voltados para a área social contribuem para o fortalecimento e o desenvolvimento das ações públicas. Assim sendo, processos dinâmicos de avaliação que contemplem o antes, o durante e o depois da atuação do programa possibilitam a correção e/ou reformulação das ações, garantem o entendimento do percurso e não somente dos resultados alcançados após sua implementação, visando à melhoria de programas futuros. O acompanhamento dos atores diretamente envolvidos torna-se um instrumento importante para oportunizar mecanismos que garantam o exercício e o fortalecimento da cidadania. 39 Destaca-se que a cidadania deve ser entendida como um processo contínuo e necessário para a formação de sujeitos conscientes e que, somente através do seu exercício, estes podem construir sociedades menos perversas, mais equânimes e justas. Outra parte importante do processo de avaliação é a publicização dos resultados obtidos, de forma a serem apresentados e discutidos com os beneficiários dos programas sociais, assegurando-lhes o entendimento e a reflexão do que foi avaliado, pois “a participação é um conceito eminentemente político e supõe a informação, o preparo para atuação, a clareza com relação aos objetivos” (GOMES, 2001, p. 30). A avaliação participativa é um método que permite avaliar a capacidade de resposta às demandas dos beneficiários de um programa, possibilitando a apreensão dos múltiplos fatores, processos e resultados da ação pública. Como referido por Carvalho (2009, p. 90), “é o coletivo de sujeitos implicados na ação que pode aportar a diversidade de valores, opiniões e “verdades” sobre o programa em avaliação”; assim aflorando opiniões, expectativas, valores e representações que esses sujeitos possuem sobre o programa. Portanto, a avaliação participativa possibilita uma maior densidade e profundidade na análise dos resultados obtidos e permite corrigir falhas ou estratégias inadequadas. A avaliação participativa deve permitir o envolvimento de todos em um processo reflexivo de autoconhecimento crítico da realidade, possibilitando que surjam dos atores proposições alternativas para mudanças. Assim, ela também se torna uma ferramenta poderosa de formação de conscientização cidadã, desencadeadora de um processo de aprendizagem social e emancipação. Também há que se destacar que a avaliação tem que fornecer informações úteis para a tomada de decisão. Portanto, deve ser realizada num prazo curto para que seus resultados possam repercutir na realidade. Num processo demorado, a realidade pode se modificar e tornar sem sentido os resultados da avaliação. A rapidez e agilidade ensejadas dependem, em grande medida, da objetividade nos processos de coleta e análise de dados. 40 3 FOCALIZANDO CONCEITOS 3.1 Políticas públicas Ao contexto onde as demandas da sociedade se multiplicam, impulsionado por um sistema que vincula o ser cidadão ao ser com poder de compra, somam-se as complexidades inerentes a todo esse processo de mercantilização da cidadania e surgem pressões nas estruturas sociais e econômicas que desencadeiam situações de vulnerabilidades, exclusões e risco social. Tais condições se configuram de forma a instituir fragilidades sociais, que adensam de maneira a provocar a negação/destituição dos direitos de parte da população. Tem-se, através da elaboração de políticas públicas, o meio para que demandas sociais, estruturais e econômicas, ocasionadas por processos diversos que geraram desequilíbrios, possam ser contempladas com ações direcionadas. Dessa forma, pode-se definir políticas públicas como [...] um fluxo de decisões públicas, orientado a manter o equilíbrio social ou a introduzir desequilíbrios destinados a modificar essa realidade. Decisões condicionadas pelo próprio fluxo e pelas reações e modificações que elas provocam no tecido social, bem como pelos valores, idéias e visões dos que adotam ou influem na decisão. É possível considerá-las como estratégias que apontam para diversos fins, todos eles, de alguma forma, desejados pelos diversos grupos que participam do processo decisório. A finalidade última de tal dinâmica – consolidação da democracia, justiça social, manutenção do poder, felicidade das pessoas – constitui elemento orientador geral das inúmeras ações que compõem determinada política. Com uma perspectiva mais operacional, poderíamos dizer que ela é um sistema de decisões públicas que visa a ações ou omissões, preventivas ou corretivas, destinadas a manter ou modificar a realidade de um ou vários setores da vida social, por meio da definição de objetivos e estratégias de atuação e da alocação dos recursos necessários para atingir os objetivos estabelecidos (SARAIVA; FERRAREZI, 2006, p. 28-29). As políticas públicas são formuladas por iniciativa do Poder Legislativo e/ou Executivo, a partir de propostas e demandas que emergem da sociedade para diversos segmentos. Orientam a atuação do poder público em determinada área, tendo como objetivo o enfrentamento de situações sociais que submetem o sujeito à negação de sua cidadania, e visam assegurar direitos garantidos constitucionalmente, de forma difusa ou diretiva, a um grupo social, étnico, cultural etc. Podem também garantir a instituição de novos direitos reconhecidos pela sociedade e/ou pelo poder público. 41 Segundo Pereira (2008), as políticas públicas podem ser consideradas em três dimensões, que estão inter-relacionadas: as políticas sociais, envolvendo saúde, habitação, segurança pública, educação, transporte, cultura etc.; as políticas estruturais, voltadas à promoção do desenvolvimento, a política agrícola e agrária, a ambiental, a construção civil, a relação com o mercado financeiro internacional etc.; e as políticas compensatórias ou reparadoras e redistributivas, também chamadas de emergenciais ou paliativas, como as de combate à fome, à seca, a desastres naturais, a distribuição de cotas das universidades, que trabalham como instrumentos de redistribuição de renda aos mais desfavorecidos na sociedade. Ao se pensar em políticas públicas, faz-se necessário clarear a concepção do termo público e sua dimensão: O termo público, associado à política, não é uma referencia exclusiva ao Estado. Refere-se antes a coisa pública, do latim res (coisa), publica (de todos), ou seja, coisa de todos, para todos, que compromete todos – inclusive a lei que está acima do Estado – no atendimento de demandas e necessidades sociais, sob a égide de um mesmo direito e com o apoio de uma comunidade de interesses. Portanto, embora a política pública seja regulada e freqüentemente provida pelo Estado, ela também engloba demandas, escolhas e decisões privadas, podendo (e devendo) ser controlada pelos cidadãos. Isso é o que se chama de controle democrático (PEREIRA, 2008, p. 174). Apesar de o poder hegemônico utilizar o fenômeno da globalização e a adoção de políticas neoliberais como justificativa para a diminuição do poder do Estado de intervir e formular políticas públicas, ele ainda tem a função de regular as relações de poder, para a garantia dos direitos sociais promulgados pela Constituição de 1988, ao mesmo tempo que a formulação das políticas públicas se dá em um cenário de embates e disputas de interesses. Como os recursos financeiros não conseguem atender a todas as demandas sociais, o processo de formulação de uma política pública passa a ser palco de disputas de interesses diversos, pois elas direcionam as prioridades dos gastos públicos. Repercutem, dessa forma, na economia e na sociedade. Sendo assim, através de uma análise detalhada das políticas implantadas é possível identificar: Para quem? Por quê? E que diferença fará? A partir dessa análise, pode-se identificar as relações de poder que atuam e os objetivos das ações saindo de uma esfera micro, pontual, para uma esfera macro, onde se busca que prevaleçam os interesses coletivos e não individuais. A política pública pode apresentar caráter paliativo e conservador, ou emancipatório e transformador, impregnado das intenções que a permeiam. Esse caráter pode ser observado não somente na sua formulação, mas também no método para a sua execução. 42 Além da sua proposição, a política pública passa pelos processos de implementação, execução, monitoramento e avaliação, que devem permitir a participação da sociedade. Há a possibilidade de envolver e articular diversos segmentos e atores sociais no processo de participação e controle, através de conselhos federais, estaduais e municipais, audiências públicas, encontros e conferências etc. Essa possibilidade e a criação de condições viáveis, com mecanismos que permitam a participação em todo o processo garantem a credibilidade, legitimação, eficiência e eficácia das ações. Partindo dessa análise, a política pública passa por uma construção de participação política social necessária, pois as ações direcionadas afetam a todos, a curto ou a longo prazo. Essas ações apresentam-se como conjunto de planos, ações, programas, metas, atividades desenvolvidas pelo governo (nacional, estadual ou municipal). Os planos estabelecem diretrizes, prioridades e objetivos gerais a serem alcançados em períodos relativamente longos. Os programas, por sua vez, estabelecem objetivos gerais e específicos tendo como foco determinado tema, público, conjunto institucional ou área geográfica. As ações visam atingir determinado objetivo estabelecido pelo programa, e a atividade visa dar forma à ação. Assim sendo, vale enfatizar que a participação deve significar em todo o processo não uma concessão amigável ou preferência política do gestor, mas uma obrigação do Estado e um direito da população. A política pública foco de análise e observação nesta pesquisa é o Projovem Urbano, constituído como um programa advindo de demandas da sociedade para a implantação de políticas para a juventude, culminando no Plano Nacional da Juventude (PNJ). Ela está voltada para o aspecto social e procura promover a inclusão de jovens articulando as dimensões de educação, trabalho e cidadania. Sendo assim, faz-se necessário interpretar essa política e analisar se ela realmente ataca as estruturas produtoras de desigualdades. As diferentes possibilidades e alcance das políticas públicas, para fazer face aos problemas [...] em relação aos jovens como trabalho e a educação, estão inscritos na compreensão da especificidade da fase atual do capitalismo e das particularidades históricas do tipo de sociedade que construímos no Brasil. Isso nos permite, de imediato tanto a não-naturalização do trabalho precoce, da educação dual e da mutilação de direitos quanto a não-adoção de uma perspectiva moralista em face desses problemas. Também nos indica que a crença de que o problema é conjuntural pode conduzir a políticas públicas focalizadas e de natureza filantrópica ou de “administração e controle da pobreza”, sem atentar para políticas que atacam as estruturas produtoras da desigualdade (FRIGOTTO, 2004, p. 194). Dessa forma, torna-se pertinente trazer elementos que permitam o entendimento do que são e como se deram os processos e a necessidade de formulação de políticas públicas 43 voltadas para a juventude. Isso se justifica por que as ações e políticas do Estado voltadas para esse público refletem um inter-relacionamento entre o momento político, as questões sociais que afloram pressionando sua discussão na agenda pública e as relações econômicas. Embora os programas e projetos destinados a jovens traduzam a visão social sobre a juventude, para os que conduzem as formulações e a implantação de políticas públicas; essa visão não é concebida de forma homogênea pela sociedade. 3.2 Políticas públicas para a juventude Durante muito tempo os jovens de 18 a 29 anos não foram alvo de discussões para a formulação de políticas públicas específicas. Mas esse panorama começou a mudar, pois aumentou a pressão que o contingente populacional entre 15 a 29 anos começou a exercer sobre a economia, demandando postos de trabalho. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2010, o Brasil possuía 51,3 milhões de pessoas nessa faixa etária, o que corresponde a 26,1% de toda a população do país. Esse reforço populacional pode ser visto com enfoque positivo na dinâmica do desenvolvimento socioeconômico, pelo aumento da força produtiva do país, contraposta pelas novas estruturações e exigências do mercado de trabalho, e também por novos padrões comportamentais e arranjos familiares, que provocam o prolongamento desta fase denominada juventude. Por outro lado, há aspectos negativos a serem considerados ao se analisar o processo crescente de exclusão, vulnerabilidades e situações recorrentes de violências envolvendo jovens, resultado de um processo conjuntural da sociedade. Assim, a juventude se tornou uma questão relevante, foco das atenções das políticas públicas. Nesse sentido, é imprescindível que os jovens não sejam vistos como um "problema"; devem, sim, ser tutelados por políticas de controle e prevenção contínua, materializadas em programas e projetos, sejam eles governamentais ou não. Porém esse tipo de abordagem não tem apresentado resultados positivos, muito pelo contrário, tem agravado o processo de exclusão. Por isso, é necessário que essas políticas comportem ações que visem à emancipação e ao reconhecimento dos jovens como sujeitos de direitos. Além disso, o interesse pela juventude ainda convive com o desconhecimento e o descaso. Para conseguir novos avanços e evitar retrocessos, o caminho viável pode ser a promoção da participação. 44 Outro aspecto que merece destaque no âmbito das políticas públicas de juventude é a necessidade de construção de espaços de participação no acompanhamento e na gestão para os usuários desses serviços, programas e projetos. Poucos programas apresentam mecanismos institucionais que possibilitem aos jovens trazerem críticas, sugestões e contribuírem para o aprimoramento do que está sendo realizado. Para além dos jovens atendidos pelos programas, essa reflexão aponta também para a dificuldade dos espaços institucionais de participação estabelecerem diálogo com uma juventude que não se encontra organizada através de movimentos, instituições, fóruns. Nesse sentido, é preciso que as informações e os debates também atinjam estes jovens, procurando construir caminhos para garantir a horizontalização da participação no âmbito das políticas públicas (CONJUVE, 2011, p. 96). Torna-se, assim, premente a criação de mecanismos diversos de participação do jovem de forma que ele tenha um meio através do qual possa exteriorizar suas vontades e necessidades, orientando as políticas focalizadas nesse público para um rumo certo e possibilitando uma maior probabilidade de êxito nas ações. 3.3 A Política Nacional da Juventude O Plano Nacional da Juventude1 foi elaborado pela Comissão Especial da Juventude, que realizou audiências públicas a fim de identificar as demandas e necessidades através da opinião dos jovens e das organizações que militam com a juventude. O entendimento do momento histórico, social e político em que as ações e políticas voltadas para a juventude foram geradas será sintetizado a seguir, com o intuito de permitir a visualização do processo histórico de discussões, construção e conquistas pelas quais passaram as políticas para a juventude. A fim de compreender a construção desse plano, apresenta-se uma linha do tempo da Política Nacional de Juventude, fundamentada no documento-base da 1ª Conferência Nacional da Juventude,2 que compilou as principais ações voltadas para esse público: 1965: Aprovada pela ONU a “Declaração sobre o fomento entre a juventude dos ideais de paz, respeito mútuo e compreensão entre os povos”; 1 2 1985: Ano Internacional da Juventude – ONU; O Plano Nacional da Juventude é o Projeto de Lei nº 4.530/2004, que cria um conjunto de políticas que beneficiam jovens entre 15 a 29 anos de idade. Os dados apresentados foram retirados do documento-base para a Conferência Nacional de Políticas Públicas de Juventude, que aconteceu através de diálogos e debates entre o Governo Federal e a sociedade civil durante o ano de 2007 e culminou em uma grande reunião em 2008. 45 1990: Institui-se o “Estatuto da Criança e do Adolescente” (ECA), que traz para a agenda pública o reconhecimento da necessidade dos direitos de crianças e adolescentes até os 18 anos; 1995: Programa de Ação Mundial para Jovens (PAMJ) – ONU; 1997: Seminário “O jovem nas trilhas das políticas públicas”, iniciativa da Comissão Nacional de População e Desenvolvimento (CNPD). Primeiras experiências de implantação de secretarias e coordenadorias de juventude em prefeituras municipais brasileiras; 1998: “Plano de Ação de Braga” e “Declaração de Lisboa”, elaborados, respectivamente, na I Conferência Mundial de Ministros de Juventude e no Fórum Mundial de Juventude do Sistema das Nações Unidas; 2001: Elaborada a “Estratégia de Dakar para o Empoderamento da Juventude”, em evento no Senegal; 2002: Seminário “Políticas Públicas: Juventude em Pauta", iniciativa da Ação Educativa e Fundação Friedrich Ebert; Em 2002 e 2003, respectivamente, a Universidade Federal Fluminense (UFF) e a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) constituíram os primeiros Observatórios de Juventude em instituições universitárias brasileiras, juntamente com a Universidade Católica de Brasília, que, em parceria com a UNESCO, lançou o Observatório de Violência nas Escolas. 2003: Início do “Projeto Juventude”, do Instituto Cidadania. Criada a “Comissão Especial de Políticas Públicas para a Juventude” e realizada a “Semana Nacional de Juventude”, na Câmara dos Deputados. Realizado o 1º Encontro Nacional da Juventude pelo Meio Ambiente e criada a Rede de Juventude pelo Meio Ambiente (Rejuma); 2004: Criado o Grupo de Trabalho Interministerial, no Poder Executivo. Realizada a “Conferência Nacional de Juventude” pela Câmara dos Deputados. Lançado o Índice de Desenvolvimento da Juventude (IDJ) pela UNESCO. Realizado o “Vozes Jovens” pelo Banco Mundial e promovido o “Diálogo Nacional de Movimentos e Organizações Juvenis” pela UNE. Criados o Fórum Nacional de Movimentos e Organizações Juvenis e a Rede Nacional de Juventude (RENAJU). Apresentados na Câmara dos Deputados os projetos de lei referentes ao Plano Nacional de Juventude, ao Estatuto dos Direitos da Juventude e à 46 Proposta de Emenda Constitucional, que propõe a inclusão do termo “juventude" na Constituição; 2005: Lançada pelo Governo Federal a Política Nacional de Juventude e criados a Secretaria, o Conselho e o Projovem - Programa de Inclusão de Jovens (Lei nº 11.129/2005). Finalizado o texto da “Convenção Iberoamericana dos Direitos dos Jovens”, pela Organização Ibero-Americana de Juventude (OIJ); 2007: Lançado o Projovem Integrado, uma versão nova, reformulada com base nas avaliações do Projovem original; 2010: Aprovada e promulgada em julho de 2010 a PEC nº 042/2008, conhecida como a PEC da Juventude, foi transformada na Emenda Constitucional nº 65, inserindo o termo “jovem” no texto constitucional, no capítulo dos Direitos e Garantias Fundamentais, a exemplo do que já ocorria com a criança, o adolescente e o idoso; 2012: Com a finalidade de facilitar a integração do Programa às políticas educacionais do Ministério e dos sistemas de ensino estaduais e municipais, o Projovem é transferido para o MEC, ganhando força como política pública da modalidade de Educação de Jovens e Adultos (EJA). Destaca-se que no plano internacional o assunto juventude já é foco de discussões desde 1965, quando a ONU aprovou a “Declaração sobre o fomento entre a juventude dos ideais de paz, respeito mútuo e compreensão entre os povos”. No Brasil, começa a se falar em políticas de juventude em meados de 1990. O ano de 2005 pode ser considerado um marco no Brasil, tanto pela criação de uma política direcionada ao jovem, até então inexistente, quanto pela promoção e elaboração de políticas públicas tendo o jovem como sujeito de direitos. Esse entendimento foi viabilizado por meio de uma construção coletiva da juventude e de outros setores e segmentos da sociedade. As ações e estratégias voltadas para a juventude necessitam de estudos constantes em uma construção contínua, pois os desafios se tornam complexos na proporção da complexidade das dinâmicas das relações sociais e econômicas em que se vive. O desafio passa pela articulação e pela incorporação desses elementos em uma ação coordenada, plural e decidida, impulsionada pelo Estado brasileiro. Nesses termos, no Estado de Minas Gerais, a Lei nº 18.136 de 2009, que institui a Política Estadual da Juventude, destinada a jovens de 15 a 29 anos, define as seguintes diretrizes: 47 Art. 3º. I - a singularidade da juventude; II - a concepção do jovem como sujeito de direitos; III - a valorização da diversidade juvenil; IV - o fortalecimento dos segmentos juvenis vulneráveis; V - a adoção de políticas transversais e ações intersetoriais para a promoção integral dos direitos da juventude; e VI - a participação juvenil. (MINAS GERAIS, 2009). No art. 4º, onde são destacadas as prioridades da Política Estadual da Juventude para os dez anos subsequentes à sua implementação; observa-se a ênfase dada à educação, à formação profissional e à participação juvenil como eixos centrais: Art. 4º. [...] I - auxiliar na erradicação do analfabetismo da população juvenil; II - universalizar progressivamente o ensino médio público e gratuito, estabelecendo mecanismos para democratizar o acesso e a permanência; III - auxiliar na ampliação da oferta de vagas e de oportunidades de educação profissional complementar à educação básica; IV - incentivar o empreendedorismo juvenil3; V - incentivar a participação política dos jovens; VI - auxiliar na promoção da participação juvenil no mercado de trabalho; VII - contribuir para a promoção de atividades preventivas na área da saúde; VIII - auxiliar na criação de áreas de lazer e ampliar a prática desportiva; IX - divulgar e fomentar projetos culturais produzidos por jovens; X - incentivar a inclusão digital de forma universalizada; XI - estimular a criação de Centros de Referência de Juventude como locais de difusão de políticas públicas; XII - desenvolver programas de transferência de renda destinados a jovens em situação de vulnerabilidade social; e XIII - elevar a oferta de vagas nas universidades estaduais, promovendo a interiorização e estabelecendo mecanismos para democratizar o acesso e facilitar a permanência do aluno na instituição. (MINAS GERAIS, 2009). Ao observar as diretrizes acima transcritas, pode-se inferir como o Projovem é uma ação que encontra respaldo também no Estado de Minas Gerais, pois viabiliza ações que contemplam a objetivação da Política Estadual da Juventude. Art. 7º No campo da participação política, cabe ao Estado, com o auxílio do órgão gestor específico: I - apoiar a participação dos jovens na elaboração das políticas públicas, por meio de conselhos, conferências, seminários, fóruns e debates; II - promover a integração e a capacitação dos membros do Conselho Estadual da Juventude; III - realizar a cada dois anos a Conferência Estadual da Juventude; IV - estimular a participação dos estudantes do ensino médio no processo de gestão educacional; e 3 Empreendedorismo juvenil pode ser visto como uma forma do poder público de aliviar a pressão dos jovens sobre a demanda por postos de trabalho. 48 V - facilitar a criação de entidades de representação estudantil nas escolas estaduais de nível médio, orientando a direção das escolas a oferecer espaço para as sedes dessas entidades. (MINAS GERAIS, 2009). Embora a participação receba respaldo na forma institucionalizada, denotando a importância a ela conferida, não alcança a maioria dos jovens, principalmente os que estão em situação de vulnerabilidade social e fora das instituições de ensino. 3.4 Projovem – Programa de Inclusão de Jovens 3.4.1 Histórico do programa O Programa Nacional de Inclusão de Jovens (Projovem) foi lançado em 2 de fevereiro de 2005 por meio de medida provisória. Desenhado e formulado na esfera do governo federal como ação integrante do Plano Nacional de Juventude (PNJ), foi estruturado de forma a contemplar uma de suas dimensões – a inclusão. Em princípio, o prazo de validade do programa era de dois anos com o objetivo de assegurar a qualidade do mesmo, devendo ser avaliado no término do segundo ano. O público-alvo, nessa primeira versão, seriam os jovens na faixa de idade entre 18 (dezoito) e 24 (vinte e quatro) anos que atendessem, cumulativamente, aos requisitos de terem concluído a 4ª (quarta) série e não terem concluído a 8ª (oitava) série do Ensino Fundamental, além de não possuírem vínculos empregatícios formais (carteira assinada) no ato da matrícula e serem residentes em uma das cidades onde o programa se realiza. O Programa foi caracterizado como emergencial e experimental. Primeiro, por atender uma parcela da população que apresenta necessidade em retomar e dar prosseguimento aos estudos e chegar ainda jovem ao Ensino Médio. Segundo, por apresentar uma proposta curricular baseada em concepções inovadoras de ensino e aprendizagem. A proposta curricular do programa permite articular o Ensino Fundamental com a qualificação profissional, em um dos arcos de ocupações,4 e com a participação cidadã através de ações comunitárias, culturais, esportivas e de lazer, cujo objetivo seria a formação integral 4 Arcos ocupacionais são apresentados como ramos de profissões. Estes são subdivididos em quatro ocupações de mesma base técnica, e estas são trabalhadas na qualificação profissional, de acordo com a ocupação escolhida dentro das que foram oferecidas pelo polo, no qual o aluno se inscreveu. 49 do jovem. Assim, o que se pretende é que o aluno seja protagonista do seu processo de ensino-aprendizagem. 3.4.2 Estrutura organizacional do programa O Projovem apresenta a seguinte estrutura na organização e articulação do programa: Figura 1 - Sistematização da estrutura organizacional do Projovem Secretaria Geral da Presidência da República SNJ (Secretaria Nacional da Juventude) Convênio com a UFJF (coordenação do SMA) e outras universidades Federais. CONJUVE (Conselho Nacional de Juventude) Assessorar o SNJ junto a Política Nacional de Juventude (PNJ) Parceria com: MEC – Ministério da Educação. MTE- Ministério do Trabalho e Emprego MDS- Ministério do Desenvolvimento Social e combate a fome. SMA (Sistema de Monitoramento e Avaliação) PROJOVEM Fonte: Elaborada pela autora, com base nas informações extraídas do Manual do Educador (SALGADO, 2008). 50 De acordo com Salgado (2008), a Secretaria Nacional de Juventude (SNJ) e o Conselho Nacional de Juventude (CONJUVE) foram criados simultaneamente ao programa Projovem. A SNJ tem a finalidade de: a) Formular, supervisionar, coordenar, integrar e articular políticas públicas para a juventude; b) Articular, promover e executar programas de cooperação com organismos nacionais e internacionais, públicos e privados, voltados para a implementação de políticas para a juventude. Já o CONJUVE é composto por representantes de órgãos governamentais, organizações juvenis, organizações não governamentais e personalidades reconhecidas pelo seu trabalho com jovens; sendo um terço representantes do poder público e dois terços representantes da sociedade civil. As funções atribuídas ao Conselho, de acordo como o Decreto nº 5.490, de 14 de julho de 2005, são: Art. 2º Ao CNJ compete: I - propor estratégias de acompanhamento e avaliação da política nacional de juventude; II - apoiar a Secretaria Nacional de Juventude da Secretaria- Geral da Presidência da República na articulação com outros órgãos da administração pública federal, governos estaduais, municipais e do Distrito Federal; III - promover a realização de estudos, debates e pesquisas sobre a realidade da situação juvenil, com vistas a contribuir na elaboração de propostas de políticas públicas; IV - apresentar propostas de políticas públicas e outras iniciativas que visem a assegurar e ampliar os direitos da juventude; V - articular-se com os conselhos estaduais e municipais de juventude e outros conselhos setoriais, para ampliar a cooperação mútua e o estabelecimento de estratégias comuns de implementação de políticas públicas de juventude; e VI - fomentar o intercâmbio entre organizações juvenis nacionais e internacionais. (BRASIL, 2005a). O Projovem apresentou, segundo o Manual do Educador (SALGADO, 2008), as seguintes metas iniciais de atendimento aos jovens: 2005 – Atuar nas 27 capitais brasileiras. Inicialmente foi aplicado como projetopiloto em quatro cidades em 2005 (Recife, Porto Velho, Salvador e Fortaleza) e, somente em 2006, houve a ampliação para as demais capitais dos Estados e para o Distrito Federal; 2005 a 2008 – Atender, nesse período, a 200.000 jovens, em todas as capitais brasileiras e no Distrito Federal; 51 2006 – Não atingida a meta anterior, diante da necessidade de atender jovens excluídos e que se encontravam geograficamente dispersos, ampliou-se o atendimento a cidades que possuíam 200.000 habitantes ou mais, abrangendo 29 cidades; 2012 – O programa aumentou a sua base territorial de atuação, ampliando seu atendimento para os municípios com 100.000 habitantes ou mais. Segundo informações disponibilizadas no site do programa Projovem Urbano sobre o balanço de jovens beneficiados por participarem do programa, tem-se que em 2008 a 2009 foram atendidos 350.000 jovens, e em 2010, 200.711. 3.4.3 O Sistema de Monitoramento e Avaliação (SMA) Segundo Salgado (2008), as instituições universitárias que integram o Sistema de Monitoramento e Avaliação (SMA), mediante convênio firmado com a Secretaria Geral da República, coordenado pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e operacionalizado pelo Centro de Políticas Públicas e Avaliação Educacional (CAEd), divididas por regionais, são: Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) – Regional Sudeste I, responsável pelas capitais Belo Horizonte, Rio de Janeiro, Vitória e suas respectivas regiões metropolitanas; Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) – Regional Sudeste II, responsável pela capital São Paulo e região metropolitana; Universidade Federal do Paraná (UFPR) – Regional Sul, responsável pelas capitais Curitiba, Florianópolis, Porto Alegre e suas respectivas regiões metropolitanas; Universidade Federal da Bahia (UFBA) – Regional Nordeste I, responsável pelas capitais Aracaju, Maceió, Salvador, São Luís e Teresina; Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) – Regional Nordeste II, responsável pelas capitais Fortaleza, João Pessoa, Natal, Recife, e respectivas regiões metropolitanas; 52 Universidade Federal do Pará (UFPA) – Regional Norte, responsável pelas capitais Belém, Boa Vista, Manaus, Porto Velho, Rio Branco e respectivas regiões metropolitanas; Universidade Federal de Brasília (UNB) – Regional Centro-Oeste, responsável pelas capitais Brasília, Campo Grande, Cuiabá, Goiânia, Palmas e respectivas regiões metropolitanas. O SMA tem como competências: supervisão das condições de oferta local do programa; avaliação externa dos alunos;5 monitoramento da matrícula, frequência e realização das atividades pedagógicas; avaliação do programa. 3.4.4 O novo Projovem Em 2007, constituiu-se um grupo de trabalho denominado GT Juventude, composto por representantes dos seguintes órgãos públicos: Secretaria Geral da Presidência da República, Casa Civil, e os Ministérios da Educação, do Desenvolvimento Social, do Trabalho e Emprego, da Cultura, do Esporte e do Planejamento. O resultado de discussões, embasadas em avaliações realizadas interna e externamente ao Projovem, culminou no lançamento de um programa amplo e diversificado de inclusão de jovens, o Projovem Integrado. Tendo como base o Projovem original, os requisitos iniciais foram revogados pela Lei nº 11.692, de 10 de junho de 2008, a qual estabelecia o Projovem como um programa estratégico da Política Nacional da Juventude, em ação compartilhada com os Ministérios da Educação, do Trabalho e Emprego, e do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. A reelaboração do programa teve como objetivo integrar seis programas federais já existentes 5 O Programa apresenta uma concepção de avaliação como um processo de ensino e aprendizagem composto por três modalidades: o diagnóstico (o início, verificação do estado inicial), a formação (o processo, o meio; realizada de forma sistemática durante o programa pelos educadores) e a somativa (a verificação do trabalho realizado, realizada sempre no final de duas unidades formativas, sendo de responsabilidade do Centro de Apoio à Educação a Distância – Caed, ou seja, a elaboração, aplicação e correção). Segundo o Manual do Educador (SALGADO, 2008), na avaliação somativa são utilizados instrumentos padronizados que permitem: mensurar o progresso dos alunos durantes os ciclos; comparar o desempenho dos alunos do Projovem Urbano com os da rede regular de ensino, padronizando os itens e escalas com o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (SAEB), utilizado para avaliar alunos do 5º e 9º anos no país. A combinação de várias modalidades de avaliação é apresentada pelo programa como inédita e como um ganho muito maior no que se refere ao aperfeiçoamento do Projovem Urbano, para pesquisa educacional e na elaboração de políticas públicas. 53 voltados para a juventude, que se apresentavam de certa forma desconexos e desarticulados, com investimento aproximado de cinco bilhões até 2010, visando atender mais de quatro milhões de jovens. Nesse sentido, o programa manteve a base anterior, mas passou por reformulações, orientadas pelos resultados e reflexões das avaliações internas e externas, nas quais foram propostas estratégias para superar as dificuldades encontradas e reforçar os aspectos que haviam sido bem-sucedidos. A faixa etária a ser contemplada pelo programa passou a ser de jovens entre 15 (quinze) a 29 (vinte e nove) anos que saibam ler e escrever e não tenham concluído o Ensino Fundamental. O programa desenvolve-se por meio das seguintes modalidades: Projovem Adolescente – serviço socioeducativo – 15 a 17 anos, Projovem Campo – 18 a 29 anos; Projovem Trabalhador – 16 a 24 anos; e Projovem Urbano – 18 a 29 anos (apresentado em detalhes no QUADRO 1): QUADRO 1 - Sistematização das divisões do Projovem Integrado Programa anterior Novo Projovem Projovem Urbano – 18 a 29 anos Projovem Original - 18 a 24 anos Vinculado: Secretaria-Geral da Presidência República, por meio da Secretaria Nacional Juventude, em parceria com os Ministérios Educação, do Trabalho e Emprego, e Desenvolvimento Social e Combate à Fome. da de da do Requisitos para participar: Não ter carteira profissional assinada. Ter a 4ª série, mas não concluído a 8ª série do Ensino Fundamental. Vinculado: Secretaria-Geral da Presidência República, por meio da Secretaria Nacional Juventude, em parceria com os Ministérios Educação, do Trabalho e Emprego, e Desenvolvimento Social e Combate à Fome. da de da do Requisitos para participar: Saber ler e escrever, não ter concluído a 8ª série (9º ano do Ensino fundamental) Objetivo: Proporcionar aos jovens a conclusão do Ensino Fundamental, o aprendizado de uma profissão e o desenvolvimento de ações comunitárias Objetivo: Proporcionar aos jovens a conclusão do Ensino Fundamental, o aprendizado de uma profissão e o desenvolvimento de ações comunitárias Inclusão digital Benefício: bolsa-auxílio de R$ 100,00 Benefício: bolsa-auxílio de R$ 100,006 Duração: 12 meses Duração: 18 meses Fonte: Elaborado pela autora com base nas informações extraídas do Manual do Educador (SALGADO, 2008), do Guia de Políticas Públicas de Juventude (2006). 6 Em 2005, segundo a Medida Provisória nº 248/2005, de 20.04.2005, o salário mínimo era de R$ 300,00, e a bolsa-auxílio correspondia a um terço desse valor. No ano da reformulação do Projovem Urbano, segundo s Medida Provisória nº 421, de 2008, o salário mínimo passou para R$ 415,00. Em 2013, ano de realização da presente pesquisa, o valor do salário mínimo é de R$ 678,00; como a bolsa-auxílio continua com o mesmo valor, ela corresponde a menos de um sexto desse valor. Segundo o DIEESE, o valor do salário mínimo necessário, ou seja, que realmente cubra as despesas básicas, é, em média, para o ano de 2013 acima de R$ 2600,00. 54 O prolongamento da faixa etária (antes até os 24 anos e no novo formato até os 29) deveu-se a questões diversas que recaem sobre as juventudes, conforme já abordado, tendo em vista que esse prolongamento reduz o obstáculo da idade para que o jovem ingresse no programa. Nessa mesma perspectiva, os requisitos mínimos de escolaridade também são alterados, assim como a duração do programa. A intersetorialidade no programa é entendida e materializada além da gestão compartilhada, na integração e nas ações promovidas pelos ministérios parceiros, com o intuito de assegurar um atendimento integral e contínuo aos jovens, oferecendo-lhes a possibilidade de participação nas diversas modalidades do programa. 3.4.5 O Projovem Urbano O Projovem Urbano tem como objetivos a elevação da escolaridade, a qualificação profissional – na forma inicial em um dos arcos de ocupações – e a participação cidadã, através do desenvolvimento de ações comunitárias, culturais, esportivas e de lazer. Pretende, ainda, ampliar o acesso dos jovens à cultura e promover a experiência de atuação social na comunidade (em ações coletivas de interesse público), sendo que a inclusão digital apresentase como instrumento de inserção produtiva e de comunicação, como especificado no Parecer CNE/CEB nº 18/2008: O ProJovem Urbano é um dos eixos fundamentais da Política Nacional de Juventude e representa o compromisso do atual Governo Federal para com os jovens brasileiros que mais sofrem com as conseqüências de um processo de exclusão dos bens sociais, entre os quais a educação e o trabalho. O Programa trabalha na perspectiva de contribuir especificamente para a reinserção do jovem na escola; a identificação de oportunidades de trabalho e qualificação profissional inicial dos jovens para o mundo do trabalho; a oferta de oportunidades de desenvolvimento de vivências desses jovens em ações comunitárias; e o acesso dos seus participantes à inclusão digital como instrumento de inserção produtiva e de comunicação (BRASIL, 2008b, p. 5). A execução de ações integradas na forma de curso que visem à formação e à elevação da escolaridade do jovem deve ter caráter interdimensional, sendo tais ações executadas com a observância da necessidade de que sua gestão seja intersetorial, compartilhada por quatro ministérios, e pelos órgãos de administração de políticas de juventude, educação, trabalho e desenvolvimento social, em todos os níveis de implementação. O Manual do Educador (SALGADO, 2008) destaca a necessidade de criação/implementação/potencialização de 55 instâncias da juventude, como secretaria e conselhos, no intuito de promover a transversalidade da política e dar sustentação às coordenações locais na articulação devida às dimensões do Projovem Urbano. O Projovem possui duração de 18 meses e exige dos participantes que tenham no mínimo 75% de frequência e cumpram na mesma proporção as tarefas propostas em sala de aula previstas para cada mês, sendo estas algumas das condições exigidas para que eles recebam uma bolsa-auxílio de R$ 100,00, paga pelo Governo Federal por meio das prefeituras. Como benefício, todos os participantes têm direito a refeição na escola. A proposta do programa inclui um currículo integrado, dividido em três ciclos, de seis unidades formativas, com duração de três meses cada uma. Apresenta uma inovação na metodologia de trabalho dos conteúdos, de forma a integrar a teoria com a prática, além de propor uma relação professor-aluno diferenciada. O programa foi concebido com um projeto pedagógico próprio e interdisciplinar. O material didático elaborado por especialistas contempla uma perspectiva dialógica e reflexiva, na qual propõe uma ruptura em relação às divisões disciplinares clássicas e estanques, a fim de promover uma aprendizagem significativa, que integre educação básica, qualificação profissional e ação comunitária. Apesar de as propostas serem consideradas inovadoras, há críticas em relação ao material no sentido de que este já vem pronto, engessando o processo pedagógico na medida em que limita e/ou não permite aos educadores adequar-se ao público e suas necessidades. A carga horária do Projovem Urbano compreende 2000 horas de atividades pedagógicas, sendo 1440 horas de atividades presenciais e 560 horas de atividades não presenciais, cumpridas ao longo de 18 meses ininterruptos. O curso é organizado em seis unidades formativas e cada uma delas deve ser desenvolvida em 12 semanas, totalizando 72 semanas de aulas e 1440 horas. O espaço onde é implantado o programa é a rede pública de Estados, Municípios e Distrito Federal que a ele aderirem, mediante aceitação das condições estabelecidas no Decreto nº 6.628 e assinatura de termo de adesão a ser definido pela Secretaria Geral da Presidência da República. Através de convênios com o governo, as prefeituras municipais envolvidas recebem recursos e orientação/formação técnica da instância federal, em um esquema bastante padronizado. No que se refere ao estabelecimento das respectivas metas por Estado, Municípios e no Distrito Federal, o mesmo decreto institui que elas são proporcionais à população estimada que possua o perfil do jovem em condições de participação. 56 Segundo Salgado (2008), o programa é organizado por uma coordenação geral nacional e outra regional. As coordenações locais, ou polos, são responsáveis por organizar, coordenar as ações nos núcleos. Vinculados aos polos, os núcleos devem conter, cada um, de 150 a 200 alunos divididos em 5 turmas. Cada núcleo é composto por 5 educadores de formação básica (profissional especializado na área de formação do conteúdo básico), 1 educador de participação cidadã (assistente social – atende a dois núcleos, tendo 10 turmas), 1 educador de qualificação profissional (profissional que tem formação afim com o arco profissional escolhido). Ressalte-se que um núcleo pode funcionar em até dois locais diferentes. A qualificação profissional do programa é preconizada como um direito do jovem. Buscam-se através dela novas formas de inserção produtiva, com a devida certificação, correspondendo, na medida do possível, tanto às potencialidades econômicas, regionais e locais quanto às vocações dos jovens. Assim, a articulação entre o trabalho, a vida social, a tecnologia e as teorias transformariam a educação em elemento-base da cidadania e preparação para o mundo do trabalho. Segundo o Manual do Educador (SALGADO, 2008), a qualificação profissional é composta por três elementos: a Formação Técnica Geral (FTG), que trabalha as dimensões referentes ao mundo do trabalho; a Formação Técnica Específica (FTE), que se dá por meio dos arcos ocupacionais;7 e o Projeto de Orientação Profissional (POP), no qual o educando discorre sobre suas experiências e ocupações relacionadas ao mundo do trabalho e elabora, no decorrer do curso, suas expectativas futuras. Para o funcionamento do programa é utilizada a estrutura pública existente, sendo que em determinadas escolas o espaço é compartilhado com alunos regularmente matriculados em outro programa, a EJA (Educação de Jovens e Adultos). Isso produz conflitos entre os profissionais pertencentes à rede e os profissionais do programa, pois em alguns casos pode gerar um receio de que o Projovem poderia substituir e absorver os alunos da EJA. A EJA é uma modalidade de ensino ofertada a alunos do Ensino Fundamental acima de 15 anos e Ensino Médio acima dos 18 anos, com especificidade própria. As aulas são ministradas no turno noturno e visam atender alunos que não completaram o ensino na idade apropriada, abrangendo jovens de idades diferenciadas, pois só há limite superior de idade. Historicamente no Brasil, a implantação dessa modalidade tinha o objetivo de atender uma parcela considerável da população que era iletrada, a fim de reparar um problema decorrente 7 Segundo o Manual do Educador (SALGADO, 2008), são 23 arcos ocupacionais, cada arco corresponde a um conjunto de 4 ocupações, com uma base técnica comum e as divisões são baseadas conforme classificação brasileira de ocupações feita pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). 57 das lacunas do sistema regular de ensino, propondo-se a restaurar esse sistema. A EJA aparece como uma necessidade dos Estados para acabar com os altos índices de analfabetismo e melhorar essa situação frente à comunidade internacional. Ela evidencia [...] a educação de adultos como resultado da ineficácia do Estado em garantir, por meio de políticas públicas adequadas, a oferta e a permanência da criança e do adolescente na escola. Sendo assim, as iniciativas em EJA, em sua grande maioria, caminham na marginalidade do processo educativo brasileiro e as questões mais incisivas no tocante a esta afirmação dizem respeito às propostas de governo criadas de acordo com as necessidades políticas de cada sistema ideologicamente dominante (FRIEDRICH et al., 2010, p. 405). Como resultado desse processo de ineficácia, observa-se um crescente número de jovens com baixa escolaridade, marcados por experiências escolares fragmentadas e negativas. Soma-se a essa situação um enorme contingente de adultos provenientes de uma demanda educacional reprimida há anos, que não teve acesso à escolarização na infância e adolescência, compondo uma legião de cidadãos que demanda novas e mais adequadas oportunidades educacionais. O Censo da Educação Básica 2011, ao referir sobre os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) (IBGE, 2010, p. 24), revela: “o Brasil tem uma população de 57,7 milhões de pessoas com mais de 18 anos que não frequentam a escola e não têm ensino fundamental”. Esse contingente populacional entra como uma demanda da modalidade EJA, podendo ser atendido também pelo Projovem Urbano. Contrapondo essa demanda para a EJA, observa-se, segundo resumo do Censo da Educação Básica 2011, um decréscimo nas matrículas para essa modalidade, como pode ser observado no GRÁF. 1: 58 Gráfico 1 - Número de Matrículas na Educação de Jovens e Adultos no Ensino Fundamental – Brasil (2007-2011) 4.000.000 3.500.000 3.000.000 2.500.000 Total 2.000.000 Anos Iniciais 1.500.000 Anos Finais 1.000.000 500.000 0 2007 2008 2009 2010 2011 Notas: 1) Não inclui matrículas em turmas de atendimento complementar e atendimento educacional especializado (AEE). 2) O mesmo aluno pode ter mais de uma matrícula. 3) Educação de Jovens e Adultos: inclui matrículas de EJA presencial e semipresencial e não inclui matrículas de EJA integrada à educação profissional de nível fundamental e médio. Fonte: Elaborado pela autora com base no Resumo Técnico do Censo Escolar da Educação Básica 2011 (INEP, 2012). A EJA preconiza uma metodologia específica voltada para o aluno que não é mais criança e possui especificidade própria, como, por exemplo: encontra-se inserido de alguma forma no mercado de trabalho, possui responsabilidades sociais e familiares, e pela experiência de vida já apresenta valores éticos e morais formados. Dessa forma, como já abordado, ela abrange uma faixa etária muito extensa e não possui o jovem como foco central, absorvendo somente uma parcela de jovens de 15 a 29 anos (faixa etária em que são considerados jovens) que não concluíram o Ensino Fundamental e Médio em idade própria. O Projovem Urbano se enquadra como um programa na modalidade EJA, de iniciativa do Governo Federal. O diferencial do Projovem em relação à EJA é a metodologia do primeiro, focada para atender ao público jovem, no caso de 18 a 29 anos, tendo como aspectos diferenciais: modelo de gestão, currículo, perfil do profissional, benefício como ajuda de custo, currículo com conteúdos contextualizados com a vida imediata dos jovens. Estudos já realizados pelo SMA identificaram que as inscrições realizadas para o Projovem não causam impactos quantitativos nas inscrições para a EJA regular. Observa-se, 59 assim, o não atendimento pela EJA ao público-alvo do Projovem, pois os públicos apresentam características diferentes. Cabe destacar que, além do conjunto de profissionais da educação envolvidos no Projovem, há a presença importante do assistente social, que também é um educador e orienta os alunos com relação aos seus direitos e aos caminhos para ter acesso a eles e usufruir deles. O programa apresenta um percentual de frequência maior de mulheres, e como a maioria delas não têm com quem deixar os filhos enquanto participam das aulas, muitas os levam para a escola, o que resulta na presença de crianças pequenas no ambiente escolar, causando transtornos diversos. A qualificação profissional é promovida pela escolha do educando de um dos arcos ocupacionais oferecidos, sendo estes definidos pela coordenação local, que decide baseada em critérios julgados relevantes, tais como: levantamento feito junto a algumas empresas da região sobre as ocupações com relação às quais há carências. Mas não existe uma consulta prévia ou mesmo um estudo sobre as preferências dos beneficiários do programa em relação à qualificação que desejariam. Observa-se, assim, que o Projovem Urbano é uma política pública de corte social, operacionalizada por meio de um programa que objetiva o atendimento aos jovens em situação de vulnerabilidade social/risco. Contudo esse entendimento não parece ser compartilhado por esses jovens, mas uma denominação construída pelo poder público a fim de torná-los foco de atenção das políticas públicas. Foi criado como um sistema paralelo ao sistema escolar, com caráter emergencial, com estrutura verticalizada e burocracia específica. Também cabe salientar que na proposta do Projovem original há referência à criação das Estações da Juventude, peça central de articulação e integração das ações voltadas para a juventude, espaços destinados ao convívio e desenvolvimento cultural, mas que praticamente não saíram do papel e em sua primeira reformulação não aparecem mais. Embora o programa apresente a dimensão da escolarização, qualificação profissional e participação cidadã, há argumentos que indicam que o tempo disponibilizado para os conteúdos não proporciona o efetivo acesso às bases do conhecimento cientifico e tecnológico, e que também não garante uma qualificação profissional apropriada. Nesse sentido, o programa [...] representa uma perda sensível para a educação pois que, além de seu caráter assistencialista, representa uma iniciativa que não oferece à juventude efetivo acesso a educação mas, apenas, a certificação de conclusão do Ensino Fundamental de discutível qualidade. O PROJOVEM constitui mais um exemplo de ação política que, sob a aparência da inovação, gera a continuidade da submissão ao instituído. E 60 o instituído, em nosso pais, e gerador de diferenças de caráter socioeconômico cada vez mais extensas e profundas (RUMMERT, 2007, p. 43). Com relação à qualidade da educação oferecida pelo programa, a base de comparação deve ser com o mesmo nível do curso do ensino regular da rede pública. Nos documentos de avaliação do Projovem – período 2005 a 2008 –, a proficiência atingida pelos participantes do programa em português e matemática, aferida pelas avaliações do SMA, comparativamente a alunos do Ensino Fundamental regular – 8ª série –, aferida pelo Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (SAEB), apresentam-se semelhantes. Observa-se, através das análises feitas, que o aluno que entra com uma defasagem maior em termos de conhecimento e habilidades supostamente obtém um ganho maior, pois o desvio-padrão entre as avaliações realizadas durante o programa diminui. Outra explicação possível é que os alunos com maior dificuldade vão desistindo no decorrer do programa, produzindo uma homogeneidade entre os que permanecem. Em relação à qualificação profissional, dimensão abordada pelo programa como elo com o mercado de trabalho, observa-se, através dos dados do relatório final de avaliação do ProJovem 2005-2008 (BRASIL, 2010), que o maior ganho do aluno do programa é o acesso a níveis mais elevados de ensino, limitando o aluno participante do programa para conseguir um emprego que requeira qualificação mais elevada, restringindo sua mobilidade social. O Relatório aponta também como positiva a mudança nas perspectivas futuras dos alunos quanto à valorização do vínculo empregatício e à consciência de direitos trabalhistas. Em 2012, com a transferência do programa para o MEC, foram feitas algumas outras modificações, como: criação da sala de acolhimento para os filhos dos educandos; fim do convênio com as universidades federais (conforme já comentado, a certificação dos alunos passa a ser de responsabilidade da escola em que o programa estiver funcionando); alteração da Formação Técnica Específica (FTE), passando a ser ofertados também cursos oferecidos pelo Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec);8 extinção das avaliações externas (avaliações somativas, responsabilidade do convênio com as universidades federais); alteração do cadastro dos alunos, que passa a ser feito pelo sistema do MEC denominado Sistema Integrado de Monitoramento, Execução e Controle (SIMEC); 8 O Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec), segundo o site do programa, foi criado pelo governo federal em 2011, com a finalidade de ampliar a oferta de cursos de Educação Profissional e Tecnológica. Esse programa oferece qualificação profissional para públicos com diversos níveis de escolaridade, disponibilizada por município. A pesquisadora, com intuito de verificar se havia algum curso de qualificação voltado para o nível de escolaridade dos alunos do Projovem Urbano no município de Betim, realizou pesquisa através do site do Pronatec, mas não havia oferta de cursos para esse público. A pesquisa foi realizada em 10/07/2013 e novamente em 10/12/2013 pelo endereço: http://pronatec.mec.gov.br/ - cursos de qualificação. 61 sistema que fornece um banco de dados aos educadores (avaliação formativa), que o utilizam para elaborar as questões utilizadas nas provas. De acordo com a nota técnica sobre as orientações de implantação das salas de acolhimento (BRASIL, 2012),9 estas aparecem como atendimento a uma necessidade, já que uma parcela considerável dos beneficiários do programa, por não terem com quem deixar os filhos, ou não poderem deixá-los em outro local, os levam para a sala de aula. Assim, a sala de acolhimento, considerada como um serviço de apoio às famílias de jovens matriculados no programa, é destinada a crianças de 0 a 8 anos. Para a organização desse atendimento, no ato da matrícula, requisita-se ao interessado que informe a necessidade desse apoio nos horários que frequentará as aulas. Baseado nessas informações, é calculada a demanda para a implantação de uma a duas salas destinadas ao acolhimento, sendo essa implantação custeada com recursos do programa. Caso haja necessidade de um número maior de salas, não há empecilhos para que o executor do programa as promova com recursos próprios. O funcionamento dessas salas é determinado por uma série de orientações, tanto sobre a habilitação do profissional que nelas irá trabalhar (no caso, é exigido que ele tenha no mínimo Nível Médio, modalidade Normal – Magistério, e que atenda a certos critérios), quanto à estrutura e organização, que exigem requisitos mínimos em termos de materiais, produtos, mobiliários e equipamentos necessários para a acomodação de maneira apropriada e confortável das crianças. 3.4.6 Evasão A evasão é um fenômeno recorrente na esfera educacional brasileira e apresenta-se como um problema histórico, resultado da inter-relação de múltiplos e complexos fatores. Além de evidenciar, de certa forma, o fracasso da escola, não constitui meramente uma questão pedagógica e possui como implicações: o desperdício de recursos públicos que são investidos sem retorno; perdas sociais e psicossociais, que incidem em todos os aspectos da vida e que, em determinados casos, podem causar danos com consequências irreversíveis. 9 Nota Técnica nº 001/2012/MEC/SECADI/GAB, que discorre as orientações para a implementação das salas de acolhimento no Projovem Urbano. 62 O fenômeno se agrava à medida que a idade do aluno avança, ou seja, quanto mais o aluno vai se aproximando da idade de entrada no mercado de trabalho, mais significativa é a evasão. Portanto, a necessidade de ingressar no mercado de trabalho acaba sendo um dos fatores que contribui para o adiamento da conclusão dos estudos. Essa situação, segundo estudo realizado pela Fundação Getulio Vargas (2009), é pior nas regiões que apresentam maiores oportunidades de trabalho, que são as que mais atraem os jovens para fora da escola. O trabalho não pode ser visto apenas como um problema. Ele é o meio para o acesso a uma renda. Mas, também, segundo Siqueira (2010), pode ter um caráter moral, ou seja, por meio dele se adquire senso de responsabilidade. O trabalho também pode gerar independência, possibilitando o acesso aos bens de consumo. Pode ainda representar uma forma de adquirir conhecimento através da experiência e da expansão das redes de sociabilidade. Além de tudo, pode ser visto como uma necessidade de subsistência, meio de garantir proventos para a família. Ainda segundo Siqueira (2010), para os jovens a escola tem um papel importante para o aprendizado, mas perde para o trabalho. Há uma desvalorização dos saberes escolares frente ao mercado de trabalho. Portanto, a evasão do programa é comprovada por números, o que pressupõe a necessidade de reformulações e adequações à realidade local. Para esse fim, a compreensão de como os diversos fatores se articulam evidencia a necessidade de uma abordagem qualitativa, abrangendo aspectos ainda não explorados e potencializando a participação dos atores envolvidos. 3.4.6.1 Evasão no Projovem – Aproximações Em estudo quantitativo realizado sobre o programa (no âmbito nacional) e a evasão, com informações referentes a 2010, Soares, Ferrão e Marques (2011) registram as seguintes observações: O número de indivíduos que manifestaram interesse no Programa foi de 95.037. Desses, cerca de metade desistiu de participar efetivamente. A desistência pode ter ocorrido num período que chega a ser superior a seis meses; O número de participantes no Programa é de 47.142 indivíduos, o que representa aproximadamente 49,6% do total de inscritos. Desse total, tem-se que: o número 63 de alunos que evadiram é bastante elevado, em torno de 19.199, cerca de 41% do total; já os reprovados representam 26% (12.519), enquanto apenas 15.424 alunos (33%) foram aprovados; O Programa tem uma frequência de 65% de mulheres;10 A evasão é maior quanto menor a faixa etária, sugerindo que se verifica maior evasão entre os mais jovens comparativamente com o grupo dos alunos com 25 anos ou mais; Em relação à região metropolitana onde o aluno vive, os resultados sugerem que a probabilidade do aluno de se evadir na Região Sudeste II11 é 5.5 vezes maior comparativamente com o que acontece na Região Nordeste II (controlando por faixa etária e sexo). A mesma relação é quantificada em 2.8 no Sul, 2.7 no CentroOeste, 2.2 no Nordeste I, 2.0 no Norte I, 1.9 no Sudeste III e 1.8 no Nordeste III; O perfil predominante no Programa é de indivíduos negros e pardos (50,4% considerando todos os casos; 73% dos casos válidos). Na população brasileira de 15 a 29 anos, a percentagem de negros e pardos é de 45,8%; Incluindo os 31,3% que não responderam, 17% dos jovens participantes estão entre 18 e 19 anos, 25,7% entre 20 a 24, e 26,3% entre 25 ou mais; Já cursaram a 4ª série 13% dos participantes. O estudo considera evadidos os jovens que frequentaram o programa, chegando mesmo a completar alguma de suas etapas, mas que não permaneceram nele até à sua finalização. Como desistentes consideram-se os alunos matriculados que chegaram a frequentar o programa, receberam bolsa-auxílio, mas não passaram pelas fases do programa. O Projovem vem apresentando um alto índice de evasão desde que foi implementado, sendo que esse fenômeno se apresenta recorrente em todos os locais em que foi implantado no Brasil. Segundo o Relatório Final de Avaliação do Projovem Urbano, referente ao período de 2008 a 2009, os motivos mais citados por alunos evadidos para seu afastamento do programa foram: incompatibilidade do Projovem com o trabalho (32,8%); problema de saúde pessoal ou 10 Problematizando essa situação, Duarte, Silva, Costa e Siva (2009), após analisarem estudos feitos por Pochmann sobre as dimensões que afetam os jovens em relação ao desemprego, ressaltam que, “[...] por motivos de gravidez precoce e o crescimento de mulheres que chefiam famílias, atualmente elas sofrem pressão familiar maior para arrumar emprego quando comparadas aos homens. Isso faz com que elas entrem mais cedo no mercado de trabalho e sejam responsáveis por taxas ainda maiores de desemprego” (p. 85). 11 Os estados pertencentes a essas regiões estão agrupados conforme já descrito no item 3.4.3, sobre o Sistema de Monitoramento e Avaliação (SMA). 64 na família (9,1%); distância até o núcleo/transporte (11%); cuidar dos filhos ou parentes (7,8%); gravidez (5,2%); questões familiares/pessoais (4,1%). 3.5 Contexto de atuação do programa O contexto de atuação desse programa a ser analisado é o município de Betim, situado a 32 km de Belo Horizonte. O município apresenta uma urbanização recente, que se inicia mais intensamente por volta da década de 60 e 70, e tem uma população que cresce em ritmo acelerado, com um aumento de cerca de 23% de 2000 (306.675) a 2010 (378.089), segundo a Sinopse do Censo Demográfico (IBGE, 2010b), sendo que 99% dessa população se encontra em área urbana. Esse crescimento acelerado se deve, em parte, a migrações advindas da própria região metropolitana, influenciadas por grandes empresas do setor industrial que movimentam o parque econômico e tecnológico, como, por exemplo, a Fiat e a Refinaria Gabriel Passos (Regap), que geram empregos, diretos e indiretos, para a região e municípios vizinhos, além de uma população flutuante. Diante desse quadro, a especulação imobiliária exagerada elevou os preços dos imóveis da região central, que possui melhor infraestrutura, o que acaba por empurrar as camadas mais pobres para a periferia, que cresce em um ritmo acelerado, gerando bolsões geograficamente posicionados de exclusão social, marcados em geral por situações de violência. 65 Figura 2 - Mapa do município de Betim e alguns municípios limítrofes da região Fonte: Google Mapas (2013). A população jovem do município, compreendida entre 18 a 29 anos, representa cerca de 22,8% da população total, segundo dados do IBGE (2010). De acordo com o Atlas de Desenvolvimento Humano no Brasil 2013 (ATLAS, 2013), referente ao ano de 2010, a porcentagem de jovens com Ensino Fundamental completo, no município, na faixa etária de 18-24 anos é de 82,89%, para 25 anos ou mais é de 53,01%. Ou seja, existe uma parcela considerável da população que não concluiu o Ensino Fundamental, aproximadamente 17% da população entre 18-24 anos; em relação aos que possuem 25-29 anos pode-se inferir um valor maior.12 Dentre estes, 27,01% das pessoas com 18 anos ou mais que não possuem Ensino Fundamental completo e encontra-se em ocupação informal.13 Como muitas cidades da região metropolitana, o município não apresenta concentrações de áreas homogêneas, contrastando regiões conurbadas com o município de Contagem e outras áreas isoladas e mais distantes, como é o caso da Regional de Vianópolis e da Regional de Citrolândia. Esta última cresceu aos arredores de uma área marcada por situações históricas de exclusão e preconceitos, vinculados à presença da Colônia Santa Isabel (abrigo para os portadores de hanseníase na década de 20). 12 Considerando a promulgação da Lei nº 9.394/96 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira), o que favorecer a universalização da educação básica em 1996, ou seja, decorridos 17 anos. 13 São considerados em ocupação informal, segundo o Atlas de Desenvolvimento Humano no Brasil 2013, os que trabalham, mas não são empregados com carteira assinada; os militares do Exército, da Marinha, da Aeronáutica; os integrantes da Polícia Militar, do Corpo de Bombeiros, os funcionários públicos ou autônomos com contribuição para o instituto de previdência oficial. 66 Outra região do município que chama a atenção por sua densidade demográfica e problemas sociais enfrentados é a região do Teresópolis. Encontra-se às margens da BR-381, na divisa com o município de Contagem e muito próxima à empresa FIAT. De acordo com pesquisa realizada pelo IBOPE (2010),14 e divulgada pelo Movimento Nossa Betim, destacam-se os seguintes dados: em relação à educação, 95% afirmam ter acesso à escola pública perto de casa e 86% a creche; com relação à biblioteca pública, 33% relatam frequentá-la. Assim, percebe-se que de maneira geral os habitantes do município possuem acesso a escola pública e a creche. Alguns temas abordados pela referida pesquisa foram mensurados através de uma escala com pontuações de 1 a 10, em que as extremidades variam de totalmente insatisfeito a totalmente satisfeito. Os valores aferidos foram estratificados em três subgrupos, da seguinte forma: 1-5, 6-8, 9-10. Assim, foram obtidos os seguintes resultados para os itens: Satisfação em relação à oportunidade do primeiro emprego para os jovens: 47% de 1-5; 46% de 6-8 e 7% de 9-10; Espaços culturais e centros de juventude nos bairros: 60% de 1-5, 35% de 6-8, 5% de 9-10; Atratividade das escolas para os jovens: 58% de 1-5, 38% de 6-8, 4% de 9-10; Tratamento dado pelos policiais aos jovens: 64% de 1-5, 32% de 6-8, 4% de 9-10. Pode-se inferir dos dados obtidos que o acesso à educação é amplo, mas não atrativo para os jovens. Há uma carência de espaços culturais voltados para a juventude e certo receio com relação ao tratamento dado pelos policiais aos jovens. Um dado proveniente da pesquisa realizada chama a atenção: existe a percepção de que o governo federal é a principal instituição que tem contribuído para melhorar a qualidade de vida da cidade, seguido pela Igreja e a prefeitura. Em relação a viver em outra cidade ou permanecer em Betim, 56% dos entrevistados informaram que não sairiam da cidade. 14 Destacam-se desta pesquisa dados sobre o mundo dos jovens, como trabalho, educação, lazer, participação, mesmo que tenha sido realizada com um público de 16 anos para cima e que somente 36% dos que foram entrevistados estão na faixa etária de 16 a 29 anos. 67 3.5.1 O Projovem Urbano em Betim Como o programa ampliou o atendimento a cidades com no mínimo 200.000 habitantes, o município de Betim se enquadrou nesse requisito e passou, dessa maneira, a integrá-lo como participante. A prefeitura visualizou as potencialidades do programa e a sua importância para essa região que, como outras tantas, possui uma quantidade considerável de jovens em situação de vulnerabilidade social. Assim, conforme informações fornecidas pela coordenação local, diretamente e por meio de documentos disponibilizados à pesquisadora, o Projovem Urbano em Betim iniciouse com a primeira entrada de alunos em 2009 (3ª entrada nacional), sendo que a gestão do programa é compartilhada entre as secretarias de Administração Municipal e de Políticas de Juventude, Educação, Trabalho e Desenvolvimento Social. A segunda entrada ocorreu em 2010; já a terceira iniciou em maio de 2012, com formatura prevista para o final de 2013. O horário de funcionamento do programa é das 18h às 22h, de segunda a sexta-feira. Segundo a coordenação local, como contrapartida para o funcionamento do programa, o município oferece transporte aos alunos gratuitamente, por meio da estrutura que também atende os alunos do ensino regular diurno, e também provê a merenda. Quanto à situação da evasão em Betim, foram levantados os seguintes dados junto à coordenação local: Tabela 1 - Informações referentes ao fluxo de alunos no Projovem Urbano de Betim (2009 a 2012) Entrada 1ª (2009) 2ª (2010) 3ª (2012) Meta 1600 1200 900 Coleta de dados 1900 1280 1000 Efetivaram a matrícula 1283 983 600 Receberam auxílio 1º mês 1240 394 268 Alunos no sistema 428 200 94 Alunos aprovados 377 157 53 Quantidade de núcleos 8 5 3 Quantidade de Escolas 15 10 3 Fonte: Elaborada pela autora com base nos dados apresentados pela coordenação local do município de Betim. 68 Em 2010, segundo a coordenação local, o início das aulas foi adiado por duas vezes, sendo essa a justificativa para a considerável diferença entre o número de alunos que efetivaram a matrícula e os que receberam bolsa-auxílio no primeiro mês. Conforme dados nacionais do programa, disponibilizados no Relatório Final da Avaliação do Projovem (2005-2008), o número de desistentes é de 34,3%; as perdas somam 5%; os evadidos são de aproximadamente 17%; e os concluintes totalizam 44,1%.15 Os participantes do programa que alcançaram 75% de frequência e realizaram 75% das tarefas pedagógicas propostas receberam o auxílio do 1º mês; então, pode-se inferir que esse valor retrata os jovens frequentes no primeiro mês. Ao utilizar como referência tanto esse valor como o número de alunos no sistema no último mês do programa, percebe-se que há uma quantidade considerável de alunos evadidos. Outra questão é a aparente perda de força do programa, pois se observa, paulatinamente, uma queda no número de jovens que participam desde 2009. De acordo com a coordenação local, a divulgação do programa e a captação de alunos foram feitas por meio de visitas de porta em porta como forma de busca ativa dos jovens; mediante parcerias com Bolsa-Família e Cesta-Escola; e também através do Centro de Referência de Assistência Social (CRAS) e das Regionais Administrativas. Em relação aos arcos ocupacionais, em 2009, foram oferecidos os cursos de Administração, Construção e Reparos II e Telemática; em 2010, Administração e Serviços Pessoais; em 2012, somente Administração. Tabela 2 - Informações referentes ao número de alunos por qualificação profissional inicial (2009-2010) Arcos Quantidade de Alunos Administração 419 Construção e Reparos II 30 Telemática 160 Serviços Pessoais 33 Total 642 Fonte: Elaborada pela autora com base nos dados apresentados pela coordenação local do município de Betim. 15 Segundo Relatório Final da Avaliação do Projovem (2005-2008), as “perdas” podem ser entendidas como a não efetivação da matrícula por algum motivo: falta de documentação, idade fora da faixa permitida pelo programa etc. Os desistentes são considerados aqueles que passaram pelo programa, mas abandonaram logo nas primeiras semanas, não havendo registro de sua participação efetiva. Os evadidos seriam a terceira situação nesse processo, ou seja, aqueles que desistiram do programa após participarem efetivamente das atividades. 69 A quantidade de alunos nas entradas anteriores a 2012 que optaram pelo arco ocupacional de Administração justifica a sua escolha pela coordenação local em oferecê-lo em detrimento dos outros. Foram firmadas parcerias com duas empresas e o Senai, nas entradas referentes a 2009 e 2010. Na primeira foram selecionados 60 alunos através de uma prova para o curso de Instalação Elétrica Industrial, em que 40 deles foram certificados e 39 foram admitidos pela empresa. Na segunda, a seleção foi de 20 alunos para o curso de Mecânica Industrial, sendo certificados 12 alunos. Cabe destacar que no período em que a pesquisadora participou do programa como educadora, algumas impressões que os jovens tinham em relação a ele foram coletadas: Alguns jovens não acreditam que o programa tenha a mesma validade da escola formal, pois o tempo de ação do programa é reduzido; Alguns têm vergonha de falar que são alunos do Projovem; As relações com os educadores são de carinho e respeito; Há uma participação maior de mulheres no programa; Como o índice de evasão é elevado, se faz necessária a fusão de núcleos e, com isso, o remanejamento e/ou dispensa de alguns profissionais de um núcleo para o outro. Também alguns alunos que se encontravam alocados em um núcleo sofrem remanejamento para outros. Como há diminuição de turmas por causa da quantidade de alunos, e cada núcleo é constituído com o mínimo de 150 e no máximo 200 alunos, para reorganizar as turmas, alguns núcleos são fechados, provocando dessa maneira a dispensa de alguns profissionais e o remanejamento de alunos. Essa situação recorrente cria nos alunos insegurança, desconfiança e perda de vínculos gerados a partir do relacionamento com os educadores, principalmente quando se faz necessário o remanejamento de alunos de um núcleo para outro. Contudo, apesar de todas as situações acima pontuadas e levando em conta os benefícios oferecidos pelo programa, já descritos anteriormente, há necessidade de compreensão dos fatores que favorecem a permanência desse jovem e/ou a inviabilizam, partindo da visão do sujeito egresso evadido e dos que dele participam. 70 4 PERCURSOS TRILHADOS PARA O DESENVOLVIMENTO DA PESQUISA 4.1 Definições e escolhas A produção do material empírico, em que se baseia a análise desta pesquisa, apresenta uma abordagem qualitativa. Cabe ressaltar que o método qualitativo de pesquisa não substitui o método quantitativo nem se sobrepõe a ele, pelo contrário, muitas vezes o complementa. O qualitativo tem sua implementação justificada quando emana da necessidade de compreensão de aspectos subjetivos, relacionados aos sujeitos envolvidos em um dado fenômeno. Sujeitos que estão sendo moldados dentro de um contexto social, cheio de significados historicamente construídos, que muitas vezes não se apresentam de forma explícita e/ou consciente. Como já enfatizado por Bourdieu (2010), a dificuldade em realizar uma análise relacional sobre o objeto de estudo está, na maior parte dos casos, em não ser possível apreender os espaços sociais de outra forma a não ser por meio das propriedades entre os indivíduos. Dessa forma, existem aspectos que não são passíveis de serem analisados pela simples manipulação de dados explícitos e quantitativos. O método qualitativo é o método que se aplica ao estudo da história, das relações, das representações, das crenças, das percepções e das opiniões, produto das interpretações que os humanos fazem a respeito de como vivem, constroem seus artefatos e a si mesmos, sentem e pensam. [...] as abordagens qualitativas se conformam melhor a investigações de grupos e segmentos delimitados e focalizados, de histórias sociais sob a ótica dos atores, de relações e para análises de discursos e de documentos (MINAYO, 2007, p. 57). Assim sendo, a escolha da metodologia e do método dependerá da natureza e dos objetivos da pesquisa. No caso, o estudo das percepções, sentidos e representações construídas pelos jovens possuem um caráter subjetivo do sujeito, sendo necessário um método que faça emergir, no discurso dos mesmos, indícios que permitam ao pesquisador elaborar explicações ou elucidar aspectos ainda não contemplados, não observados. Tendo em vista que o objetivo da pesquisa é a compreensão de um fenômeno que não se encontra estanque e que se apresenta como o resultado de um processo gerado historicamente, o método que serviu de guia aos procedimentos a serem realizados nesta pesquisa foi o dialético, pois: Para a dialética, as coisas não são analisadas na qualidade de objetos fixos, mas em movimento: nenhuma coisa está “acabada”, encontrando-se sempre em vias de se 71 transformar, desenvolver; o fim de um processo é sempre o começo de outro. Por outro lado, as coisas não existem isoladas, destacadas umas das outras e independentes, mas como um todo unido, coerente. Tanto a natureza quanto a sociedade são compostas de objetos e fenômenos organicamente ligados entre si, dependendo uns dos outros e, ao mesmo tempo, condicionando-se reciprocamente (LAKATOS, MARCONI, 2001, p. 75) Nessa perspectiva, tenta-se perceber quais são esses objetos e fenômenos e de que forma se entrelaçam, se condicionam. Para isso, ao provocar o sujeito por meio de questionamentos, busca-se possibilitar que ele se expresse e, assim, emerjam suas percepções, permitindo a compreensão de como os fatos se efetivam de maneira a influenciar o jovem na decisão pelo abandono do programa, no contexto analisado. Com essa mesma finalidade, busca-se a vocalização dos demais atores envolvidos no programa (equipe pedagógica, administrativo e coordenação). Para tanto, o material analisado é composto de entrevistas semiestruturadas, individuais e gravadas, realizadas com: jovens frequentes ao Projovem Urbano de Betim, jovens considerados evadidos,1 equipe pedagógica (educadores e pedagogas), pessoal da área administrativa e da coordenação. A escolha desse instrumento se justifica por permitir a interação entre a pesquisadora e os entrevistados, o que possibilita uma análise abrangente dos sentidos e significados que envolvem o fenômeno para além de uma análise limitada ao discurso. Enquanto técnica de coleta de dados, a entrevista é bastante adequada para a obtenção de informações acerca do que as pessoas sabem, creem, esperam, sentem ou desejam, pretendem fazer, fazem ou fizeram, bem como acerca das explicações ou razões das coisas precedentes (SELTIZ, 1967, p. 273 citado por GIL, 2009, p. 109). Essa escolha também é justificada pela dificuldade em reunir os alunos evadidos, tendo em vista que eles não possuem, de certa forma, vínculos com o programa, o que inviabiliza a utilização de outros instrumentos de pesquisa. Assim, foram elaborados quatro tipos de entrevistas. Uma direcionada ao educando frequente (APÊNDICE A), a segunda para o educando que se encontra na situação de evadido (APÊNDICE B), a terceira para os profissionais envolvidos na parte pedagógica (APÊNDICE C) e a quarta para os profissionais do setor administrativo (APÊNDICE D). Destaca-se ainda que este estudo buscou, em parte, apoiar suas análises em dados secundários, em estudos já realizados sobre o tema, na documentação existente sobre o 1 Evadido, neste caso, será considerado o aluno que frequentou o programa pelo menos durante um mês e não mais retornou ao mesmo. 72 programa, em parte da documentação elaborada pela coordenação local e em dados provenientes das entrevistas realizadas. O fenômeno objeto de estudo desta pesquisa – evasão do Projovem Urbano – apresenta-se de forma recorrente em todos os municípios onde ele foi implantado. A escolha de Betim para o desenvolvimento desta pesquisa, como já comentado, se deve ao fato de a pesquisadora ter participado do programa no referido município, como educadora. Desde o momento em que a pesquisadora relatou à coordenação local do programa o interesse em realizar o estudo, esta se prontificou a dar todas as informações necessárias e a facilitar o acesso à escola, professores e alunos. Havia a expectativa de que a pesquisa pudesse, de alguma forma, encontrar elementos que auxiliassem no que, segundo professores e a coordenação, é considerada a maior dificuldade do programa: a fidelização e manutenção dos alunos até a conclusão do curso. Assim sendo, demonstraram interesse em saber se teriam acesso ao resultado desta pesquisa, e de pronto obtiveram como resposta que o objetivo da pesquisa, baseado nos conceitos da gestão social, é de servir como um instrumento de aprendizagem e valorização da opinião dos atores envolvidos, apontando aspectos e fatores que podem ser melhorados no programa. 4.2 Definição dos sujeitos Apesar de o programa já ter passado por duas entradas no município e atualmente se encontrar na 3ª entrada, as análises da pesquisa empírica se restringiram a esta última, por se entender que, mesmo transcorrido pouco tempo desde a 1ª entrada, ou seja, três anos de existência do programa no município, houve mudanças dos atores que nele atuavam. Portanto, há especificidades em relação aos atores que não podem ser aprofundadas sem a presença dos mesmos, justificando, dessa forma, a restrição aos atores atuais. A pesquisa empírica foi realizada entre os meses de junho, julho, agosto e setembro de 2013, quando esta entrada completava 12 meses de vigência. Assim, na entrada analisada, o programa funcionava inicialmente em três núcleos;2 que foram reduzidos para apenas um em consequência dos altos índices de evasão. Os alunos 2 Os núcleos estavam alocados em três regiões do município: Núcleo Clóvis Salgado, no bairro Angola - região do centro; Núcleo Maria Mourici Granieri, bairro Guanabara - região do PTB; núcleo Aristides José da Silva, bairro Jardim Teresópolis – região do Teresópolis. 73 dos outros núcleos foram remanejados para esse núcleo no início do ano de 2013, após a transição do governo municipal.3 Portanto, na época da realização da presente pesquisa, havia somente um núcleo, situado em um bairro nas proximidades do centro da cidade, na escola Municipal Clóvis Salgado. Para a escolha dos sujeitos, foram solicitadas junto à coordenação local informações para a análise e a elaboração de critérios para a seleção de alunos a serem pesquisados. Ocorreu aí o primeiro obstáculo, pois o sistema do MEC não possui facilidades para gerar relatórios dos alunos do programa através da coordenação local. Para obter as informações, é necessário fazer uma solicitação formal ao MEC, o que, segundo a coordenação local, não era uma tarefa que fosse possível de realizar em tempo hábil, levando em consideração que os mesmos já haviam feito uma solicitação parecida e que ela nunca foi respondida. Foi então que a pesquisadora, referindo-se à época em que trabalhou no programa como educadora, questionou sobre um arquivo, independente do sistema vinculado ao MEC, que a coordenação local elabora e alimenta por conta própria no início das entradas do programa. De posse das informações fornecidas por esse documento, a pesquisadora entrou em contato com os alunos evadidos. Do cruzamento desse arquivo com outro, também cedido pela coordenação, referente ao acompanhamento do pagamento da bolsa-auxílio, em que constam os meses em que o aluno recebeu a bolsa, resultou um terceiro arquivo. Nesse novo arquivo estão relacionados os alunos considerados evadidos, conforme critério já mencionado, e as informações referentes à identificação e endereço de cada um. Cerca de 21% dos dados provenientes dos arquivos que serviram de base estavam incompletos, faltando telefone para contato e/ou endereço. Essa situação fez com que o contato com essa parcela de alunos fosse inviabilizado, sendo utilizado o restante dos dados. Para uma visualização geral sobre o fenômeno na esfera local, foram feitas algumas análises com base nos dados disponibilizados: Com relação à idade e sexo dos alunos que efetivaram a matrícula no programa: 62% possuem idade entre 18 a 24 anos; sendo 18% entre 18 e 19 anos; os 38% restantes possuem idade entre 25 a 29 anos;4 3 4 32% são do sexo masculino; 68% do sexo feminino. Após as eleições municipais de 2012, houve a transição do governo do PT (Partido dos Trabalhadores) para o governo do partido que ganhou as eleições, o PSDB (Partido da Social Democracia Brasileira). Segundo o site do Movimento Nossa Betim, no município há uma quantidade maior de jovens na faixa etária entre 18 e 24 anos do que entre 25 e 29 anos. Em relação à escolaridade, a pesquisadora não encontrou informações estratificadas por faixa etária. 74 Conforme já citado anteriormente, no programa predomina uma presença maior de mulheres. A observação de uma frequência maior de determinada faixa etária, ou de uma predominância de gênero, contribui para o entendimento de diversos fatores que favorecem ou não a situação de evasão. Assim, procura-se com os dados disponibilizados obter informações relevantes para a compreensão do fenômeno. A idade chama a atenção quando é realizada a comparação entre os alunos que se matricularam e aqueles frequentes. Dos alunos frequentes 53% estão entre 18 e 24 anos e 47% entre 25 a 29 anos. Assim, o programa parece chamar a atenção do público entre 18 a 24 anos, fato que pode estar também relacionado ao maior número de jovens nessa faixa etária no município. Portanto, na estratificação da quantidade de alunos por idade e sexo, tem-se: Tabela 3 – Percentual de alunos matriculados em relação ao sexo Faixa etária Sexo 18-24 25-29 Fem. 67% 70% Masc. 33% 30% Fonte: Elaborada pela autora com base nos dados apresentados pela coordenação local do município de Betim. Através da análise dos dados da TAB. 3, observa-se que, à medida que a faixa etária aumenta, há uma proporção maior de mulheres com interesse em participar do programa. Conforme dados da TAB. 1, dos 600 alunos que efetivaram a matrícula, somente 151 receberam a bolsa-auxílio,5 ou seja, frequentaram o programa pelo menos durante um mês. Dentre eles observa-se a seguinte distribuição: 5 As informações disponibilizadas pela coordenação local apresentam dois valores diferentes quando se refere aos alunos que receberam bolsa-auxílio no 1º mês. Na TAB. 1 aparece um valor de 268 alunos; em outro arquivo disponibilizado, esse valor aparece como 151 alunos. Como esse segundo arquivo é descrito o nome dos alunos a quem o benefício foi pago, a pesquisadora o considerou como válido e baseou suas análises nesses dados. 75 Tabela 4 – Percentual de alunos que permaneceram no programa no 1º mês em relação ao sexo Faixa etária Sexo 18-24 25-306 Fem. 74% 68% Masc. 26% 32% Fonte: Elaborada pela autora com base nos dados apresentados pela coordenação local do município de Betim. Desse montante que recebeu bolsa-auxílio no 1º mês, cerca de 60% (91 alunos) haviam evadido do programa até a data da realização da presente pesquisa. Através do histórico mensal de bolsas-auxílio pagas pelo programa, pode-se observar a evolução desse fenômeno até a realização da presente pesquisa (GRÁF. 1). Gráfico 2 - Recebimento de bolsas no Projovem Urbano de Betim (2012 a 2013) 160 140 120 100 80 60 40 20 0 Fonte: Elaborado pela autora com base nos dados cedidos pela coordenação local. Observa-se que desde o início do programa há queda no número de alunos que receberam bolsa (no caso, o recebimento da bolsa comprova a frequência no programa), mas, nos meses de outubro a dezembro de 2012, constata-se uma queda em proporções maiores se comparada aos outros meses. Tal fato pode estar relacionado ao receio de fusão dos demais núcleos após as eleições municipais para prefeito e à confirmação dessa situação anunciada 6 Como já haviam decorrido 12 meses, os alunos que efetivaram matrícula com 29 anos nessa época já haviam ultrapassado o limite da faixa etária de atuação do programa. 76 em janeiro de 2013, quando ocorreu a transferência de todos para a escola do centro do município. Por se tratar de um município com grande extensão geográfica e com regiões de características heterogêneas, tentou-se selecionar pessoas a serem entrevistadas considerando o local de sua residência. Para isso, foi necessário saber quais eram os bairros em que houve uma quantidade maior de alunos matriculados. Em busca desse fim, foram feitas análises em relação à quantidade de alunos matriculados por núcleo7 distribuídos por bairros. As informações disponibilizadas pela coordenação local8 não possuíam dados que permitissem uma análise qualitativa em uma perspectiva que aprofundasse o olhar para a realidade social desses alunos em suas singularidades. Portanto, as análises foram generalistas conforme conhecimento sobre as regiões de residência desses alunos e seus respectivos bairros. O núcleo Maria Mourici, que representa a região PTB, apresenta uma quantidade grande de alunos que pelo menos efetuou a matrícula, com residência nos bairros Guanabara, Jardim das Alterosas e Petrovale. No núcleo Aristides, região do Teresópolis, o bairro Jardim Teresópolis se destaca com uma quantidade considerável de alunos registrados, seguido do bairro São Caetano. Os bairros Cachoeira, Citrolândia, Bandeirinhas e Marimbá foram os que destacaram no núcleo Clóvis, região do centro. Residir em um desses bairros foi usado como critério de escolha dos alunos evadidos para a realização das entrevistas. Com esse intuito foram selecionados 6 alunos de um total de 79. Para a entrevista com os educadores, foram selecionados todos os que estavam em efetivo exercício na época da realização da pesquisa, pois, conforme já abordado, como dois núcleos fecharam, restou somente um, permanecendo apenas uma equipe de educadores, totalizando 6 indivíduos. 7 A princípio, existiam três núcleos que foram escolhidos devido a sua localização no município. Assim sendo, eles já caracterizam uma divisão geográfica. 8 Lembrando-se que as informações provenientes do sistema do MEC foram desconsideradas para a utilização na pesquisa, devido à dificuldade de acesso. No arquivo do MEC, além de informações de identificação geral (nome, filiação, cor/raça, documentação, naturalidade, estado civil), são dispostas outras, como: se é beneficiário de outro programa, se tem: ocupação; alguma deficiência; algum transtorno global de aprendizado, se é egresso de algum programa de alfabetização. Poderia ainda conter campos de observação destinados a informações que a coordenação local julgasse necessárias para controle e análise posteriores e que estas fossem de algum modo integradas a outros sistemas de informação social. Por exemplo, há um campo na ficha cadastral do beneficiário onde se solicitam dados referentes ao segmento social ao qual o aluno pertence, porém, nas fichas analisadas pela pesquisadora, constava como preenchimento desse campo a seguinte informação: não pertence aos segmentos citados. Situação que se torna relevante, pois das 26 fichas analisadas, em todas constava essa mesma resposta. Portanto, percebe-se uma lacuna, uma falta de sintonia dos dados solicitados ao público a que ele se direciona. Não se ignora que o sistema do MEC tem a finalidade de funcionar como base de informações, que servirão para posteriores avaliações sobre a educação. 77 No desenvolvimento da pesquisa e devido à relevância da presença de uma profissional na sala de acolhimento para os filhos dos alunos do programa, a pesquisadora incluiu a educadora responsável nas entrevistas. Na área administrativa foi realizada entrevista com o coordenador do Projovem Urbano no município, também responsável pela coordenação de outras políticas públicas voltadas para a educação. A outra pessoa entrevistada foi o responsável pelo cadastro e pela parte operacional relacionada ao sistema a que o programa está vinculado. Mesmo havendo uma delimitação na quantidade de entrevistados, o critério mais preponderante foi o de saturação. A riqueza dos dados obtidos através das entrevistas provoca a necessidade de uma análise que aborde diversas variáveis e um conjunto de fatores para interpretação. Para trabalhar com os dados, as entrevistas foram divididas em três grupos, cada um conforme a afinidade dos entrevistados por área de atuação, interesse e vínculo com o programa. Assim, foram realizadas análises por categorias, conforme orienta Bardin (2011). 4.3 A abordagem O trabalho de campo foi realizado no município de Betim, na Escola Municipal Clóvis Salgado (local de funcionamento do programa), na Secretaria Municipal de Educação (lugar onde se encontra a parte administrativa do programa). Depois de trabalhar com os dados fornecidos pela coordenação local, partiu-se para o contato com os sujeitos que iriam participar das entrevistas. A coleta do material empírico desta pesquisa foi realizada no período de junho a setembro de 2013. As entrevistas com os jovens frequentes e os educadores foram feitas no próprio ambiente escolar onde o programa funcionava. Escolheu-se para esse fim uma sala isolada, que pudesse propiciar um ambiente tranquilo a fim de que não houvesse interrupções e/ou distrações. Como já havia sido feito um contato com a coordenação e com as pedagogas responsáveis, os professores já sabiam sobre a pesquisa, mas antes do início dos trabalhos houve uma apresentação da pesquisadora, na qual foi explicado o objetivo da pesquisa, as intencionalidades e o motivo de interesse da pesquisadora em realizá-la, bem como a não vinculação da pesquisa a nenhum financiamento e/ou interesses partidários. Esse procedimento foi repetido com todos os participantes das entrevistas. 78 Os professores mostraram-se interessados e se dispuseram a ajudar no processo de abordagem com os alunos evadidos, prontificando-se a fazer uma intermediação, caso houvesse dificuldades em encontrá-los, pois, mesmo não frequentando mais as aulas, alguns deles mantêm contato com alguns professores. Os alunos frequentes foram escolhidos pelos professores, que selecionaram aqueles que, segundo eles, se expressavam com maior facilidade. Atendendo ao pedido da pesquisadora, foram utilizados também como critérios para essa seleção: alunos originados de núcleos diferentes, de idade diversificada e de gêneros diferentes,9 totalizando 6. Para as entrevistas com os jovens considerados evadidos, foram feitas cinco tentativas por contato telefônico com 45 deles, selecionados conforme o critério de quantidade de alunos por bairro, idade e gênero. Deste montante obteve-se sucesso somente com 7 jovens evadidos, sendo consideradas válidas para a pesquisa as entrevistas de 6 jovens.10 Com o intuito de facilitar e viabilizar a realização das entrevistas, foi solicitado que os jovens evadidos marcassem data, local e horário para o encontro. Como não conseguiu contato prévio por telefone, a pesquisadora, com o objetivo de manter a diversificação dos sujeitos entrevistados, foi à procura deles em suas residências, não obtendo, entretanto, êxito em nenhuma das tentativas.11 Além de possibilitar à pesquisadora verificar a dificuldade e a distância para locomoção até o núcleo, o interessante nesse deslocamento até o jovem evadido foi oportunizar uma forma de contato com esse jovem em seu local de referência, de vivência e com parte de sua família. Essas impressões e demais observações coletadas no decorrer da pesquisa foram anotadas como complemento para as entrevistas, pois oferecem um rico material de auxílio às análises realizadas. 9 Alguns desses alunos demonstraram aparente satisfação e sentimento de valorização pessoal em participar da pesquisa. 10 Ao serem abordados por telefone, alguns atenderam com certa desconfiança até a pesquisadora se identificar e explicar o motivo da pesquisa. Mesmo com essa desconfiança inicial, ao chegarem ao local marcado para as entrevistas, alguns demonstraram certa ansiedade, esperando a pesquisadora no portão de suas residências. Em uma das entrevistas houve um fato que fez com que a pesquisadora a desconsiderasse das análises. No momento da realização da entrevista, além da presença da jovem, o companheiro dela acompanhou atentamente as perguntas e as respectivas respostas. Como a jovem apresentou certo desconforto com aquela situação, a pesquisadora resolveu não considerar essa entrevista como válida. Na tentativa de abranger um universo diversificado, houve a preocupação em selecionar homens e mulheres, por entender que há algumas situações que interferem de forma diferenciada para cada um em relação à não permanência no programa. Mas, nas tentativas realizadas, não houve êxito no contato com os homens, portanto, a pesquisa foi realizada somente com mulheres na seleção de alunos evadidos. 11 Em todos os casos realizados sem contato prévio, não houve êxito em encontrar a pessoa. 79 4.4 Tratamento e análise dos dados 4.4.1 Conhecendo os sujeitos - Fragmentos da condição juvenil Ao iniciar as entrevistas, foi proposto aos sujeitos envolvidos que falassem sobre a vida deles e suas trajetórias. Margulis e Uresti, citados por Esteves e Abramovay (2007, p. 25), elucidam que “vivencia[-se] a condição juvenil de diferentes maneiras, em função das diferenças sociais e de parâmetros concretos, como o dinheiro, a educação, o trabalho, o lugar de moradia, o tempo livre etc.”. Assim, após transcrever as gravações das entrevistas, buscouse levantar informações que auxiliassem a pesquisadora a conhecer e entender um pouco sobre as características dos entrevistados, expectativas, conquistas, limitações, como esses jovens vivenciam a sua condição juvenil. O objetivo foi encontrar na diversidade percebida do perfil desse jovem indícios em sua trajetória que explicassem o que faz com que alguns permaneçam no Projovem e outros não. A intenção foi se aproximar de uma realidade sem se prender aos aspectos quantitativos. Na descrição das entrevistas, serão utilizados nomes fictícios a fim de preservar o anonimato dos jovens entrevistados. 4.4.1.2 Análise das entrevistas Ao serem abordados para as entrevistas, esses jovens demonstraram satisfação pelo fato de alguém querer ouvi-los. Entre eles aqueles que frequentaram o programa se mostraram mais dispostos e articulados ao exporem suas trajetórias, detalhando-as e demonstrando certa satisfação com o fato de, apesar das dificuldades, ainda frequentarem o programa. As trajetórias de vida dos jovens evadidos e dos frequentes ao programa são complexas, mas se assemelham nos percursos irregulares e cheios de situações de abandono e desigualdades. Nas falas dos alunos encontram-se muitos elementos que moldam e constituem a condição juvenil deles em relação a: desigualdades sociais vividas e dificuldades, composição familiar e origem, escolarização e trabalho. 80 Em relação à composição familiar e origem, a maioria dos entrevistados (tanto os frequentes quanto os evadidos) mora ou nasceu no município, somente dois moravam no município havia 5 anos ou menos. [...] eu vim do interior para cá, sou do interior, [...,] vim assim a destino de trabalhar, procurar assim por uma condição financeira melhor, a crescer. [...]Eu vim de Carlos Chagas, que fica próximo de Nanuque, fica depois de Teófilo Otoni, ela que é bem na divisa da Bahia. Já tem cinco anos que eu moro aqui. (João) Entre os solteiros, somente um morava sozinho, os outros ainda moram com os pais. Entre os casados ou com união estável, a predominância é de mulheres, todas com mais de um filho. No relato delas percebe-se a importância do apoio de alguém para que pudessem voltar a estudar. [...] mas eu dou graças a Deus por Deus ter colocado esse rapaz na minha vida, porque foi o único e se eu estou estudando hoje, eu tenho que agradecer a ele porque eu achava que eu não tinha dom para a escola, ele me apóia para mim estudar, ele fala que eu tenho que estudar para mim melhorar. (Rosa) [...] quando minha irmã ficou viúva, aí eu fui morar com ela e minha meninas, aí eu ajudo ela e ela me ajudava e assim íamos levando e eu pude voltar a estudar. (Angélica) O processo de escolarização é marcado por trajetórias irregulares, com abandonos e tentativas de retomar os estudos, devido aos mais diversos motivos: conflitos, dificuldades de integração ao ambiente escolar e de desempenho escolar. [...] eu comecei a aprontar, falei com meu pai que eu não ia mais para a escola e não fui. Aí, comecei a ir para a escola e fazer muita baderna, então eles me expulsaram, nenhuma escola me aceitou, aí eu parei. (Rosa) [...] Parei de estudar na 5ª série, parei porque a Diretora não deixou estudar lá mais por causa da minha idade, aí eu fui pro CESEC e agora estou aqui e estou gostando de ficar aqui. (Gardenia) [...] eu fiquei sem a minha mãe, aí a gente teve um pouco de dificuldade financeiramente como também em todas as áreas, mas é, aí foi que teve que desistir da escola, para ser sincero a gente nem tinha roupa para poder vestir direito, a gente tinha roupa por que ganhava dos outros. (João) [...] a minha mãe falou que eu teria que ou trabalhar ou estudar, só que não era só trabalhar ou estudar, era trabalhar mesmo, não tinha essa opção. E parei na 2ª serie e comecei a trabalhar em casa de família como babá, foi uns anos bons trabalhando de babá e em um desses anos trabalhando de babá, eu voltei a estudar. Trabalhando e estudando ao mesmo tempo, passei para a 3ª série, ia passar para a 4ª série, mas eu não me recordo o que aconteceu porque que eu saí, mas mesmo o que eu sei que primeiro era o trabalho, depois era o estudo, então acabou que o trabalho prevaleceu na época. (Bromélia) [...] eu parei de estudar na 8ª série, faltava 3 meses para mim formar, eu sai porque tinha que ganhar o neném. (Palma) 81 Ao analisar os que já trabalham, encontra-se um histórico de inserções precárias, com ocupações informais, de baixa qualificação, baixos rendimentos e sem garantias sociais. Entre os que estavam desempregados, observa-se a situação das mulheres que ainda não ingressaram no mercado de trabalho, o que evidencia a situação das mulheres de terem maiores dificuldades de inserção, mesmo apresentando um nível de escolaridade maior. Tal fato ainda corrobora a realidade de um número maior de participantes do sexo feminino no programa. Observa-se também dificuldade ao acesso e permanência na escola por questões que podem levar à inferência da manutenção dos papéis tradicionais de gênero quando se analisam as relações entre atividade e estudo, conforme IPEA (2008, p. 25): [...] cabe aos homens, por mais jovens que sejam, trabalhar para garantir a subsistência da família – daí procura-se mais cedo o mundo do trabalho ou permanecerem na inatividade (estudando ou não) quando não são chefes de domicílios... As jovens mulheres, por sua vez, apresentam melhores taxas de frequência líquida, embora ainda tendam a assumir o trabalho doméstico e o cuidado com os filhos quando se casam; com isso, a proporção de jovens mulheres que não estudam e nem trabalham é crescente de acordo com a faixa etária. Essa proporção, já referida neste texto por Duarte et al. (2009), pode estar relacionada também à gravidez precoce e ao aumento de mulheres que chefiam famílias, pressionando o mercado de trabalho. Também evidenciada por dados levantados das avaliações das diversas entradas do programa, essa situação traz à tona a necessidade de atenção especial a políticas públicas que garantam o direito dessas alunas, considerando suas necessidades específicas. No programa, a única estratégia nesse sentido foi a de garantir a sala de acolhimento para os filhos de quem tivesse a necessidade de trazê-los para que pudessem estudar. Os dados levantados por esta pesquisa corroboram o que já foi constatado em outros estudos sobre o perfil dos participantes do Projovem Urbano. Através dos relatos dos jovens, pode-se observar singularidades e semelhanças na diversidade de experiências vividas por eles, mas busca-se identificar outras evidências ainda não exploradas, como a questão do apoio recebido em determinada situação, podendo se tornar um diferencial para que os jovens possam concluir os estudos. Essa falta de apoio revela a negligência do Estado por um lado, mas também os seus limites de ação, fato que Leão (2004, p. 8) também destaca, pois “parece claro que a re(inserção) escolar para os jovens e adultos depende de uma série de fatores, o que certamente seria facilitado pela ação articulada de outras políticas sociais”. O programa Projovem Urbano apresenta como finalidade atuar na promoção social por meio da educação e da qualificação profissional, e está voltado para o atendimento de um 82 setor da população considerado vulnerável. Porém, essa proposta parece não atingir todos aqueles que se enquadram no perfil focalizado pelo programa, haja vista a quantidade de jovens que poderiam participar e não o fazem. Portanto, a variedade de situações e modos como os jovens vivenciam a sua condição juvenil impõe a necessidade de diversificação de formas para atendimento a esse público e articulação das políticas sociais. Para o direcionamento de como essas políticas devem ser moldadas e articuladas, a vocalização dos atores envolvidos ganha importância, a fim de que as ações direcionadas aos beneficiários sejam eficientes e eficazes. 4.5 Análise dos dados levantados As entrevistas foram divididas em três grupos: i) alunos frequentes e alunos evadidos; ii) equipe pedagógica (educadores e pedagoga) e iii) coordenação (parte de coordenação e operação). Para cada grupo, foram criadas categorias baseadas nas respostas dos entrevistados. Para o grupo dos alunos frequentes e dos evadidos foram relacionadas as seguintes categorias: motivações/desmotivações, ação comunitária, notoriedade e apoio, e sugestões para o programa. À equipe pedagógica e à coordenação vinculam-se as seguintes categorias: o aluno do Projovem, quem é?; motivos da evasão; dificuldades encontradas dentro do programa; como contornar as dificuldades; a importância do programa para os jovens; participação dos beneficiários. A evasão é um fenômeno muldimensional, portanto, apresenta fatores nos quais não é possível intervir, pois decorrem da dinâmica estrutural, assim como outros que são passíveis de serem abordados e/ou sofrerem modificações por meio de ações, parcerias etc., mas que necessitam ser norteados através da vocalização das dificuldades e anseios dos sujeitos beneficiários do programa e demais atores que lidam e são afetados por esse fenômeno. Com o intuito de trazer elementos que permitam verificar como possíveis fatores, não sensíveis a uma análise quantitativa, se correlacionam potencializando a evasão no programa, busca-se a opinião dos atores envolvidos. 83 4.5.1 Perspectivas dos educandos frequentes 4.5.1.1 Motivações / Desmotivações A análise da motivação, ou seja, quais foram os fatores que chamaram a atenção desses jovens para participar do Projovem, desvela as expectativas geradas neles. A satisfação ou não dessas expectativas pode potencializar ou não a permanência no programa. Em análises já realizadas, por meio dos resultados obtidos através do sistema de avaliação, essas expectativas variam conforme o tempo de permanência no programa e as contingências ocorridas na vigência dele. Nas falas dos jovens frequentes, a motivação em participar evidencia a forte relação entre a possibilidade de conclusão do Ensino Fundamental e a qualificação profissional, como uma oportunidade e diferencial para entrar no mercado de trabalho e/ou melhorar sua colocação nele: a renumeração. O que me motivou a participar do Projovem foi os estudos que eu quero terminar e ter mais chances de ir para o mercado de trabalho com o ensino do Projovem. (Pedro) Eu vi uma oportunidade para eu terminar meus estudos, vi que era um programa bom, aí eu falei, é lá que eu vou. O que mais me chamou atenção foram os cursos, que tipo assim, a gente está iniciando os cursos, a qualificação, porque ali eu iniciando eu colocando no meu currículo que eu estou iniciando, que eu iniciei, já é uma porta de emprego, que a gente já tem uma noção de como é que é, de como é que funciona, por exemplo, um almoxarifado, um arquivo, então a gente tem oportunidade de arrumar um emprego bom, bem renumerado. (Angélica) A união da escolarização e da capacitação profissional oferecida pelo programa é relacionada com a perspectiva de um futuro melhor, conquistado com o emprego. Como ressalta Gardenia, “o Projovem é importante, é muito bom para meu futuro, quero ter um futuro melhor, trabalhar”. Rosa já havia participado do programa em 2010, desistiu após frequentá-lo por dois meses, e retornou em 2012. Ela percebe o programa como uma forma de socialização, uma preparação para que ela possa integrar e expressar-se melhor, e com isso, conseguir uma melhor colocação no mercado de trabalho. [...] meu esposo, ele falou comigo assim: volta estudar, porque você é uma menina inteligente e você voltando a estudar, você vai..., faxineira tá certo é uma profissão, mas você pode ter um alvo melhor, um emprego melhor, convivendo com as 84 pessoas, até mesmo para você aprender a conversar mais porque tudo para você é palavrão, tudo para você é gíria, conversa errada. [...] Eu acho que, voltar para a escola tá me ajudando bastante, e vai me fazer crescer. (Rosa) Destaca-se que o Projovem aparece como uma oportunidade de conclusão dos estudos que apresenta uma estrutura de apoio, flexibilizando o retorno à escola. Assim, Bromélia, após algum tempo querendo participar do Projovem, só conseguiu depois que o programa ofereceu o que ela precisava, no caso um lugar onde ela pudesse deixar suas filhas. Foi a estrutura que eles ofereceram para minhas filhas primeiro. Fiquei sabendo da estrutura que ia ter pedagogo que ia olhar os filhos, que podia levar os filhos, que ia ter escolar para buscar e trazer e ainda ia ter um recurso financeiro de R$100,00 mensais, então assim, juntou aquele pacote, foi o que me convenceu mesmo assim, porque por mais que eu tivesse vontade de estudar, se não tivesse estrutura para as minhas meninas estarem vindo, com quem que eu ia deixar, não ia ter como. (Bromélia) João pondera a importância do conhecimento, da necessidade de aprender como motivação maior em participar do programa, “o que me motivou, acho que o estudo também é buscar uma clareza, buscar mais conhecimento, com os estudos a vida da gente muda, aprende mais, o estudo faz parte da vida da gente também”. Dentre os fatores que motivaram os jovens a participar do programa, nota-se que a bolsa-auxílio não aparece com relevância, fato observado também na avaliação do Projovem Urbano 2008-2009. Quando questionados sobre o que ainda os motiva a continuar participando do programa, os entrevistados relatam a importância das relações, dos vínculos criados entre os alunos e os profissionais que atuam no programa. É são os colegas e os professores, principalmente. (Pedro) [...] continua sendo a estrutura, tá muito boa, os professores, os colegas da escola das salas, as cantineiras, todo esse movimento, essa amizade, que eles dão para gente aqui, esse acolhimento. (Bromélia) As aulas de qualificação profissional também aparecem como um diferencial para a motivação em concomitância com o término dos estudos, condições necessárias para alcançar uma colocação no mercado de trabalho. O que me motiva hoje a participar do programa são as aulas de qualificação profissional, porque eu vou ficar mais informada das profissões, como eu me comportar em uma entrevista e até mesmo como executar aquele serviço que me foi passado, eu acho que pra mim a motivação está sendo tanto os professores quanto a qualificação profissional. (Rosa) O que me motiva mesmo é o término dos estudos, o que está me motivando é isso, eu terminar o ensino fundamental, acabar de concluir e ter um emprego bem renumerado. (Angélica) 85 Até quem já encontrou uma colocação no mercado de trabalho atribui à busca pela conclusão do Ensino Fundamental e à qualificação profissional o motivo e a necessidade para o alcance dessa colocação. [...] já encontrei um trabalho, por que por causa do meu incentivo de estudo e também por que a empresa também interessa pela pessoa que tem um estudo e que tem uma qualificação, que tá buscando uma qualificação que também vem através do estudo, isso acho que eles olham muito, mais também isso e, foi através disso mesmo que eu encontrei meu trabalho. (João) Em seus documentos oficiais, o programa aborda a qualificação profissional voltada para o “mundo do trabalho”, entendendo a inserção do jovem não somente em uma ocupação específica, mas como forma de ampliar as possibilidades de escolha dele em relação ao mercado de trabalho. Percebe-se também, no depoimento a seguir, que a qualificação profissional é vista e percebida como uma ampliação na estrutura de oportunidades dos beneficiários. É arquivador, office-boy e office-girl, almoxarife, então assim, você tira experiência de um pouquinho de cada, e outra, eu me formando, concluindo a área de qualificação profissional, eu ganho o diploma. Então, já é uma grande coisa para mim, já abre a porta, vamos dizer assim, eu passo no Projovem, abre um pouquinho da porta, eu ganho esse certificado de qualificação profissional e ai abre mais um pouquinho, então vai dando essa oportunidade para gente, aí você vai e faz um curso ali, e eles estão sempre informando emprego para gente, sempre estão atualizando as coisas para gente, correndo atrás também. (Bromélia) A qualificação profissional oferecida pelo programa no município é do arco ocupacional de Administração.12 Assim, ao serem questionados sobre a área de qualificação que mais os atenderia, conforme suas expectativas com relação à colocação no mercado de trabalho, alguns não souberam especificar outra além da que é oferecida pelo programa, ponderando que estavam satisfeitos com a que lhes era oferecida. Infere-se uma desinformação sobre as profissões e um certo conformismo, ou mesmo passividade frente à objetivação por uma ocupação. Outros sugeriram cursos de mecânica, cabeleireiro, libras para trabalhar com crianças nas escolas, direito e até mesmo “polícia, promotor, juiz”. Observa-se a falta de perspectiva futura em uma determinada área e a percepção que o importante é ter uma qualificação, seja ela qual for; o necessário é aproveitar o que está sendo oferecido. Dessa forma, o trabalho é entendido apenas como um meio de garantia da subsistência. Observa-se também em alguns depoimentos, conforme já abordado, a ideia de que o êxito do indivíduo em entrar e permanecer no mercado de trabalho depende somente dele. 12 No caso, o arco profissional de administração abrange as ocupações de arquivador, contínuo, almoxarife e auxiliar administrativo. 86 [...] eu gostei do ensino de qualificação profissional, e eu acho que se eu me esforçar mais, eu consigo sim arrumar um serviço nessa área que eu estou aprendendo, eu consigo ser melhor. E vai ser melhor para eu aprender tudo isso e mais tarde eu posso estar passando até para os meus filhos o que eu aprendi aqui na escola e com a qualificação. (Rosa) Em um dos relatos, sugere-se o curso de informática como um daqueles para serem oferecidos pelo programa. Nos objetivos do programa, é informado que a inclusão digital deveria ser promovida como instrumento de inserção produtiva e de comunicação (BRASIL, 2008). Mas o depoimento abaixo deixa transparecer uma falha local em uma das escolas em que o Projovem funcionou no município, evidenciando desigualdades de condições estruturais do funcionamento do programa em regiões diferentes. Ah... computação também seria uma boa, mas toda vez o computador está estragado, a chave sumiu. Porque aqui tem muito isso, a chave sumiu, o computador não está funcionando, está tudo muito lento. Que nem lá no Aristides, nós nem mexia, porque os computadores nenhum prestava. (Rosa) A falta de estrutura relatada acaba demonstrando uma deficiência no preparo e apoio técnico aos profissionais para lidarem com os recursos eletrônicos presentes na escola. Equipamentos ultrapassados, ausência de manutenção e de um técnico para auxiliar o manuseio desses equipamentos, como também, às vezes, o despreparo do próprio profissional da educação em exercício na escola acabam propiciando que essas salas sejam subutilizadas. Mas esse fato que parece ocorrer na rede municipal acaba afetando o funcionamento do programa, já que utiliza a estrutura dela para funcionar. Na sintetização dos dados levantados na avaliação feita pelo Sistema de Monitoramento e Avaliação (SMA) sobre o perfil e percepções dos alunos do Projovem 20082009, problemas semelhantes também foram relatados pelos alunos, tais como: insuficiência de aulas, falta de computadores ou baixa qualidade dos mesmos, restrições de acesso e uso impostas pela escola, falta de internet, entre outros. Há que se destacar que as escolas em que funcionavam os núcleos já haviam participado do programa em outras edições, o que indica uma falta de comprometimento do poder público em relação às necessidades para a operacionalização do programa, pois se apresenta como uma situação recorrente. Em relação às desmotivações, os entrevistados ressaltam dificuldades relacionadas ao transporte, que provocam faltas e descontinuidades, bem como o atraso no pagamento das bolsas-auxílio e o cansaço das várias jornadas enfrentadas no dia a dia. Destaca-se que no município o transporte é disponibilizado pela prefeitura. 87 Na hora de vir a escola, às vezes a gente tem problema com o transporte, que quando a gente fez a inscrição foi destacado na hora que a gente teria o transporte, às vezes, a gente não tem o transporte, o motorista entra de férias e a gente fica sem vir a escola, isso é o que me dá preguiça, a gente se perde todinho, se a gente perde dois ou três dias de aula, a gente se perde totalmente, a gente fica parecendo quando volta, parece que é a primeira vez que está voltando na escola. (Angélica) Esse, do transporte, para mim é, porque muitas vezes em época de férias o passe não funciona, aí precisa ficar correndo atrás, e muitas trabalham e não tem tempo de ficar indo e voltando para resolver isso, e a gente não tem como ficar correndo atrás disso todo dia. (Rosa) Porque tenho uma vida, quando a gente vem pra cá a gente passa de uma porta para outra, e lá fora, eu tenho as dificuldades, eu tenho que enfrentar algumas coisas, eu tenho minha casa, eu tenho minhas filhas, então assim, eu passo o dia enfrentando isso, lutando, realizando coisas boas e aí chega no final da tarde eu estou cansada. Então isso me dá uma canseira, meu dia a dia mesmo. (Bromélia) Os depoimentos abaixo mostram que tanto o transporte quanto o pagamento da bolsaauxílio constituem um problema quando passam a ser algo prometido e não cumprido, parecendo interferir na credibilidade, frustrando os beneficiários e potencializando a desmotivação em participar do programa. Eu acho assim que, não que R$ 100,00, seja um dinheiro grande, mas, eles depositam muito atrasado, tem vez que atrasa dois, três meses. Se não tivesse, desde o primeiro momento não tivesse incluído R$ 100,00, eu acho que não teria problema nenhum, porque tudo é tranquilo. [...] E se eu fosse olhar o atraso do dinheiro, eu já tinha parado, porque muita gente parou por causa do atraso e, até mesmo por causa de preguiça e força de vontade. (Rosa) [...] Essas falhas atrapalham, atrapalham o estimulo da pessoa que está ali a todo gás, ai vai o transporte não vem mais, ai ela desanima. [...] mas desde o momento que você oferece uma coisa para aquela pessoa é tentar não deixar isso falhar, ainda mais na área da educação. A gente já não tem mais sete e oito anos, não está iniciando o seis anos ou iniciando estudar agora não, uns já estudou, agora já tem família, já tem toda aquela dificuldade do mundo lá fora, e se tiver mais no ambiente que você está achando que tá perfeito, vai dificultar mais. (Bromélia) Quando questionados a respeito das expectativas futuras a partir do Projovem, percebe-se que os beneficiários se baseiam na volta e continuidade aos estudos e na qualificação como forma de investimento para entrar no mercado de trabalho e/ou melhorar sua colocação nele. Assim que eu terminar no Projovem, eu vou fazer uma prova para mim entrar na faculdade, eu quero ser técnico em segurança do trabalho. (Pedro) Eu espero terminar, concluir o ensino fundamental e conseguir um emprego bom. (Rosa) Depois que eu terminar? Continuar, entrar no ensino médio e concluir, e correr atrás mesmo, igual mesmo, a esses cursos que oferecem aí, a gente tentar entrar nos profissionalizante para concluir. Para ter alguma coisa boa para por no currículo. (Angélica) 88 Já me inscrevi no ENEM, então assim, eu passando, eu vou correr atrás, vou continuar a estudar, fazer cursos. Eu quero entrar na área de Administração, não sei qual área perfeitamente. Quero fazer eletricista predial e residencial, esses dois lados que eu quero, na área de construção que está o auge, também, e eu gosto disso eu sempre gostei, e eu quero especializar nessas áreas, por enquanto não vejo outra coisa para mim não. (Bromélia) Verifica-se, dessa forma, que o programa contribui para reinserir os jovens no processo de escolarização, e para despertar neles o desejo e a vontade em continuar os estudos como um meio para se prepararem e, assim, conseguirem postos melhores no mercado de trabalho. Portanto, o Projovem é visto como uma passagem, um caminho, uma nova chance para os jovens obterem um futuro melhor – que seria a conquista de uma colocação no mercado de trabalho – através da conclusão do Ensino Fundamental junto com a qualificação profissional. Não se percebe em nenhum dos relatos a ideia da participação no programa como um direito, mas sim como algo concedido. A partir dessa percepção, questiona-se o entendimento do programa como um direito desses jovens e não simplesmente uma oportunidade oferecida pelo Governo. É um futuro melhor, é o caminho para um futuro melhor. (Bromélia) O Projovem é uma chance que nos deram de ingressar no mercado de trabalho, proporcionar mais atualizado para ingressar no mercado. (Pedro) Ah, é bom, para mim é bom assim, eu acho muito importante, é uma conclusão do ensino fundamental, é uma conclusão que a gente não pode perder e muito boa. Eu acho que fizeram isso para incentivar mais a gente também a terminar os estudos, porque hoje em dia se você não estiver os estudos, você não consegue nem um emprego de faxineira, para mim é isso. (Angélica) 4.5.1.2 Ações comunitárias O intuito da pesquisadora, ao questionar sobre as ações comunitárias, é identificar através das falas como essas ações proporcionam a consciência do reconhecimento dos sujeitos enquanto sujeito de direitos, aquisição de outros valores que favoreçam a promoção da cidadania. Portanto, as ações comunitárias elaboradas nas aulas de participação cidadã, através da perspectiva dos beneficiários, aparecem como instrumentalizadoras, pois fornecem aos cidadãos o conhecimento de seus direitos, o que promove um sentimento de valorização 89 pessoal, desperta a responsabilidade na proteção de si mesmo e de outras pessoas, e atua como uma forma de expansão da capacidade de socialização. Um dos temas trabalhados nas aulas de participação cidadã e citado com frequência pelos entrevistados foi o da violência contra a mulher, como se pode verificar pelas falas abaixo. Eu acho a aula muito interessante, me valoriza, em certo ponto eu me sinto segura. (Rosa) Para mim foi muito bom porque a gente pode conhecer vários locais que as mulheres agredidas são assistidas. Igual a gente tem amigas que passam por isso, a gente tem como instruir eles a procurar ajuda. Porque, às vezes, a gente passa por coisas e não tem como agir, então a gente aprende, de uma forma sutil a agir. [...] no caso a gente tá casado, casado não, juntado, a gente está sujeito a esses tipos de problema, então a gente esta aí para aprender, isso que me marcou. (Angélica) Além da gente conhecer, seja qual for o tema, lei, como é que é, como é que não é, nós vamos chegar ali no público e se apresentar, a gente ali perde um pouco da timidez, aprende a lidar com o público, que é outro fator positivo. (Bromélia) Em um dos relatos é evidenciado que, apesar da relevância dos temas no cotidiano dos jovens, algumas atividades propostas não são amplamente aderidas por todos. [...] muitos não participaram, porque lá na minha sala todo mundo fala assim, ah, eu não vou fazer, não vou pagar mico, não vou fazer nada disso, por que eu não vou sair na rua. Porque nós vamos fazer um negócio lá na comunidade, para falar sobre o lixo, então tem muitos que fala assim, que não vai entregar folhetim, não vai bater de porta em porta, que não vai passar vergonha. Muitas das vezes, a pessoa não quer ouvir, não quer atender, então eu acho assim, se a gente não for, não tentar, como a gente vai saber se realmente eles querem ouvir ou não. (Rosa) A não disposição para essas ações pode evidenciar a falta de identificação desses jovens com as ações e/ou com a forma de interação proposta. A participação cidadã no programa é vista como experiência de atuação social na comunidade materializada com a participação dos jovens em ações coletivas de interesse público (SALGADO, 2008). O senso de responsabilização imposto a eles como agentes transformadores das comunidades não é, no geral, por eles apropriado. 4.5.1.3 Notoriedade e apoio Segundo os relatos dos entrevistados, a família e a igreja foram citadas como referência de estímulo e notoriedade para que prossigam no programa. O apoio recebido, 90 principalmente da família, é relatado como principal fonte de estímulo e a base para estruturar estratégias que de certa forma permitem a permanência no programa. [...] lá em casa, eles me apoiam, eles importam muito com isso, porque eu saio de casa, trabalho, chego em casa 3:30 para as 4 horas, faço janta, 5:20, 5:25 eu saio de casa, então ali eu deixo meus filhos, meu marido, meu pai, minha mãe, meus irmão, tudo lá, eles me apoiam muito nessa parte nessa questão das crianças. Porque às vezes, é assim nossa, não dá vontade nem de vir a escola mais. Mas eles fala para mim não desistir, para pensar no futuro, você já desistiu uma vez, vai desistir de novo. Porque como tudo está em evolução, essa evolução que tá tendo aí, a gente tem que estar andando junto, pelo menos lado a lado. (Angélica) Eu moro sozinho, são o pessoal da igreja, que são o pessoal que se tornam a família da gente. Apesar que não tenho nenhuma família aqui, mas eu considero eles mesmo como minha família. Eles falam que assim, não desiste, que tem que conhecer que tem dificuldade, mas também que a gente são capazes, sempre tem alguém que me ajuda ainda mais fortalecer. (João) 4.5.1.4 Sugestões para o Programa Ao serem questionados se havia algum aspecto sobre o programa que não tinha sido abordado e que eles consideravam relevante, os beneficiários reafirmaram questões já mencionadas, como o transporte, a importância da valorização e investimento nos professores, a sala de acolhimento, a necessidade de que houvesse escolas com o programa mais próximas a suas casas. Bromélia acrescenta em sua fala a necessidade de mais um profissional a ser integrado na equipe do programa e deixa transparecer uma dimensão não contemplada pelo programa, que é a família. Eu acho que eles deveriam acrescentar no Projovem é psicólogo, para as mães, para os pais, porque tem homens, ou independente de quem tiver, até para criança, por que eu acho que tudo gira em torno da família [...], tem mães, esposo, mulher que vem pra cá, vem destroçado emocionalmente, vem desabando. Então, por mais que os professores dão essa base para gente, que eles aconselham, mas ter uma pessoa ali adequada para isso, você sabe que a pessoa tá ali, ela sabe que ela tá dizendo, é essencial e é certo também porque ela estudou para aquilo, então assim, vai dar uma melhor sustentabilidade, porque, às vezes elas não retornam por causa disso, muitas vezes é por causa do marido, do companheiro que faz aquela pressão, e ela já tá com a vida psicológica toda danada ali de outros fatores, então chega aqui ela fica difícil conciliar toda essa luta, então acaba não voltando. (Bromélia) 91 4.5.2 Perspectivas dos educandos evadidos 4.5.2.1 Motivações / Desmotivações Nos depoimentos dos jovens evadidos, a motivação em participar do programa está ligada à possibilidade de conclusão do Ensino Fundamental como forma de se adequar às exigências do mercado de trabalho. A qualificação profissional não é abordada explicitamente como um diferencial para a motivação em participar do programa. Eu queria me formar, eu queria me formar, só por isso eu voltei. (Palma) O interesse de terminar, de concluir os estudos, só que eu não consegui. (Astromeia) Para mim terminar os estudos, porque os estudos hoje em dia é importante na vida da gente. Eu estava assim com planos de terminar meus estudo e depois fazer eliminação de matéria para terminar meu 2º grau. (Margarida) Eu queria me formar, o estudo faz muita falta, sabe, eu tava querendo fazer um concurso aí de um tal de agente de saúde, mas tem que ter 8ª série e eu não tenho. (Amarilis) A diferença na abordagem do programa em relação ao ensino regular e outros tipos de modalidade que atendem a esse público na área da educação é evidenciada nas falas abaixo: O Projovem ele é diferente, não é uma escola normal. O ensino, ele é diferente, o tempo para concluir por mais que seja um ano e meio, vale a pena, porque você aprende, você sai, você conhece. Achei interessante muita coisa no programa. (Astromeia) Eu acho que me adaptei mais ao Projovem. O Projovem para mim, acho que foi uma coisa que eu gostei. Eu já frequentei o EJA, já estudei no EJA, mas o Projovem me fez me sentir melhor do que no EJA, tanto os professores, tanto a forma de tá ali estudando. (Cravina) Ao responderem sobre os fatores que os desmotivaram a participar do programa, são destacadas as mudanças decorrentes da necessidade de realizar a fusão dos núcleos e, como consequência, a transferência dos alunos para a escola no centro do município e a troca de professores. [...] troca de professores, juntar as escolas, aí eu não quis mais não. Porque eu acho que fica muito bagunçado. Você acostuma com uma turma depois vem outra, você acostuma com um professor depois vem outro, então eu fui e saí, não quis ficar mais não. (Palma) [...] essa troca de professores, foi um dos motivos, o primeiro, porque a gente já estava acostumado, já estava se adaptando a eles, aí veio essa troca, deixaram os 92 alunos um pouco confuso, meio que desmotivado. E a mudança da escola, porque a gente estava estudando na escola aqui do bairro, isso facilitava para a gente bastante, e a saída. Ter que juntar todas as escolas, as turmas no Clóvis Salgado, acho que dificultou um pouquinho também. (Cravina) A mudança de núcleo interfere de forma a dificultar e até mesmo gerar obstáculos às estratégias elaboradas, tendo em vista a necessidade de conciliar a rotina familiar com os estudos e o trabalho. Primeiro foi a mudança de sair daqui do meu bairro para ir lá para o centro de Betim, por causa que eu já tenho dificuldade que eu tenho que carregar meus dois meninos, e minha bebezinha. [...]. E outra também por causa que meu menino mais velho, ele vai comigo e ele tinha que acordar cedo para ir para a escola e isso já estava atrapalhando ele, porque ele não estava conseguindo prestar atenção na escola, e ele até caiu na escola, tirou notas ruins por causa dessa mudança e aí eu tive que parar. E também porque eu arrumei serviço a noite e não tinha como eu ir, queria continuar, querer continuar eu queria. (Margarida) Por causa do neném que eu tive aí, eu fui desanimando de ir, porque ele estava muito novinho, e andava muito doentinho também, muito gripado e estava muito frio para ficar andando com ele a noite, quando eu tava querendo ir participar. (Amarilis) No depoimento abaixo surge a questão da segurança, dentro e fora da escola: A motivação do meu sair da escola foram as brigas porque, aonde eu estudei achei assim muito perigoso, só eu daqui do bairro não tinha ninguém para tá vindo comigo, aí eu achei, assim... muito perigoso, era uso de droga dentro da escola, e... assim como se fosse uma coisa normal e eu não tinha muito, eu nunca convivi com isso, aí eu fui desistindo aos poucos. (Astromeia) Para esses jovens, o Projovem aparece como uma segunda chance, como forma de recuperar o tempo perdido, uma escola diferente, um programa que oferece vários incentivos e motivação. Corroborando os depoimentos dos alunos frequentes, nos depoimentos dos evadidos não se percebe referência ao programa como um direito. Projovem é uma segunda chance que a gente tem de formar, recuperar o tempo perdido. Eu acho..., segunda oportunidade que a gente tem na vida da gente, para estudar de novo, começar de novo, porque eu não me formei, eu queria me formar, mas não me formei. (Palma) O Projovem para mim é como uma outra escola, só que, uma escola assim que não é regrada. (Astromeia) O Projovem eu acho que é para ajudar as pessoas, que já tem uma idade avançada e fica com vergonha de voltar a estudar junto com os outros alunos que já estão lá com 17, 15 anos. Então esse Projovem veio para essas pessoas que já tem uma idade certa avançada, entendeu? (Margarida) O Projovem para mim é um programa, que ajuda a gente, o aluno a se desenvolver, tem vários incentivos, motivação. (Cravina) Para mim é um monte de jovem, (risos), jovem adulto, só. (Amarilis) 93 4.5.2.2 Notoriedade e apoio A família também aparece nos relatos dos jovens evadidos como referência de estímulo e notoriedade para que busquem concluir o Ensino Fundamental. A figura da mãe nos relatos surge com mais destaque em relação ao incentivo e apoio. Eles me incentivam a concluir para que futuramente eu possa arrumar um emprego, um trabalho, e eles queriam mesmo que eu tivesse concluído, para poder estar formando o 2º e 3º ano. (Angélica) Olha minha família dá muita importância. Minha mãe principalmente, ela não estudou também, ela parou também na 5ª série. Ela, assim quando eu era mais nova quando eu não tinha filho nem nada ela ficava no meu pé para eu estudar, eu não estudei porque eu não quis. É porque é assim a gente quando é adolescente a gente faz o que dá na teia. Hoje, eu sei o quanto ele é importante. Aí o que acontece¸ eu pego muito no pé do meu filho, minha mãe também pega, o estudo hoje em dia é importante na vida da gente, para que a gente tenha um conhecimento para melhorar na vida. (Margarida) Minha mãe pega no meu pé, puxa a minha orelha. Ah, você não vai voltar, já perdeu muito tempo. Então eu acho assim se fosse por eles eu já teria voltado, inclusive eu não teria nem parado, mas aconteceu muita coisa que acabou me impedindo de estudar, uma fase na adolescência que eu tive, que eu não queria saber de família, não queria saber de nada. (Cravina) 4.5.2.3 Sugestões para o Programa A flexibilização do horário de funcionamento do programa e a insatisfação com o cuidado dispensado às crianças na sala de acolhimento aparecem como pontos a serem melhorados. Destaca-se também que a falta do que sugerir pode transparecer ausência de parâmetro que sirva de comparação, ou seja, não significa que não existam pontos que possam ser melhorados. O programa é bom, eu acho lá muito bom, isso é que eu falo com você, eu acho lá muito bom, sabe tudo, mais (pausa), não sei o que ele pode melhorar não. Para mim, do jeito que ele é tá bom, muito bom. (Palma) [...] ter oportunidade na parte da manhã, porque o Projovem é só mais é a noite, não tem. (Margarida) Não, só em questão das professoras olhar as crianças mais, porque eles não olham direito. (Amarilis) 94 Todos os entrevistados manifestaram interesse em retornar ao programa, mas uma ponderou a necessidade de conciliar o trabalho com a escola. Tenho sim, tenho mas eu quero ver se... eu quero me adaptar ao emprego e a escola. (Cravina) 4.5.3 Perspectivas dos educadores A equipe de educadores é composta por profissionais que já participaram do programa em outras entradas e alguns que vivenciam essa experiência pela primeira vez. Mas somente um deles não relatou experiências anteriores com programas e projetos sociais. No intuito de manter o anonimato, os educadores serão identificados como A, B, C, D, E e F. 4.5.3.1 O aluno do Projovem, quem é? Com o objetivo de identificar as imagens dos alunos construídas pela equipe pedagógica a fim de compreender os sentidos que guiam a prática e a elaboração, execução de ações direcionadas a eles no programa, foram feitos questionamentos a respeito de quem é o aluno do Projovem. Assim, nos depoimentos aparecem ideias como: sujeitos que se perderam no caminho, perderam a oportunidade quando não acompanharam o processo educativo oferecido pela escola, desmotivados por fatores como a violência, gravidez precoce etc. Portanto, na visão dos educadores, tais sujeitos apresentam trajetórias irregulares, tendo sido expulsos da escola pela falta de adequação de ambos: da escola diante da diversidade de aspectos sociais e culturais desses sujeitos, dos alunos por não se adaptarem às regras impostas a eles pela escola. Então, devido à situação social com a qual se deparam, esses jovens apresentam-se como instáveis, carentes necessitados de assistência para prosseguir, pois se encontram perdidos diante do que o mundo está cobrando deles. Nas falas abaixo, percebe-se que os educadores têm o entendimento de que os alunos não desvalorizam a escola como instituição de formação e promoção do desenvolvimento, mas buscam nela principalmente apoio, e, como há uma concorrência entre a escola e outras necessidades mais imediatas, não priorizam os estudos. 95 O perfil do Projovem são alunos que, não é que eles não conseguiram valorizar a escola como uma instancia saber, de desenvolvimento, de ascensão social. Não acredito que seja isso, são pessoas que talvez foram arrancadas desse espaço saber, que não conseguiram de fato dar para escola e ser acolhido pela escola no momento que mais, vamos assim dizer, em momento normal de idade e estudo. (C) [...] ele é um aluno que é muito carente, e ele tem um perfil que ele tem outras prioridades na vida do que o estudo, infelizmente. Ele já passou por uma série de problemas pessoais, uma história de vida mais complicada que ele busca hoje essa escola, mas uma escola que talvez lhe dê mais apoio, [...] então, ele tem esse perfil de querer mais atenção, do que talvez até mesmo conhecimento. Então, ele prioriza mais, talvez, o ficar como o filho, o ficar em casa, do que vir para a escola estudar. (A) [...] muitas vezes chega a essa escola em busca de alguma coisa que não necessariamente esse conhecimento formal que a escola está habituada. Eu percebo hoje que antes de ser o professor de uma disciplina, eu sou o educador de ciências humanas no sentido de formação do cidadão, formação desse sujeito. Então é um jovem em situação de risco, uma situação de vulnerabilidade social e, com isso, consequentemente muito carente, ele precisa de mim muito mais como ser humano do que como educador propriamente dito da disciplina formal. (D) A vulnerabilidade social dos beneficiários do programa é vista pelos profissionais da educação como falta de estrutura e recursos necessários para uma vida digna. Apresentam-se duas vertentes: a não inserção no mercado de trabalho e a carência de estruturas de referências (no caso específico, a família), situações que os conduzem à ausência de perspectivas de futuro, onde o tempo presente torna-se seu fim mais imediato. Vulnerabilidade social porque é um jovem que ainda não está inserido no mercado de trabalho, então, muitas das vezes, ele não tem uma condição de vida mínima para sobrevivência, do que comer, onde dormir, de uma casa para morar, de uma água para beber. E, cultural, porque ele vem desprovido aí de um conceito de família, que está perdido, ele não tem uma referência, ele não tem uma perspectiva de futuro, ele não sabe o que quer da vida dele para frente, ele vive o presente, é o hoje, é o agora. (C) Pondera-se, em relação à fala acima transcrita, que o conceito de família hoje adquire uma complexidade muito maior, diante da existência de diversos arranjos familiares e várias mudanças ocorridas nessa instituição histórica e sociocultural, estruturando, assim, novas adversidades, que impõem outras formas de vulnerabilidade. Ao resgatar-se que o programa apresenta um número considerável de mulheres e que muitas delas já são mães, o conceito de família nesse sentido precisa ser abordado com uma reflexão dos atores sobre a configuração de seu campo social e suas relações, e as implicações destas no desenvolvimento de estratégias que possam atuar sobre o fenômeno da evasão. Infere-se, portanto, uma visão restrita dos atores do programa em relação a esse conceito, limitando o alcance de suas ações. 96 4.5.3.2 Motivos da evasão Ao serem questionados sobre os motivos para a ocorrência da evasão no programa, os membros da equipe pedagógica destacam: o choque entre a cultura do aluno e a cultura da escola, a falta de êxito na tentativa de conciliar o estudo com o trabalho, a falta do costume de estudar, a dificuldade que alguns alunos apresentam em leitura e escrita, a dificuldade de retorno à escola após alguns anos de afastamento; tudo isso é agravado pelas responsabilidades e outros problemas socioeconômicos enfrentados por eles que, de certa forma, concorrem com a escola. Consegui fazer com que eles vejam hoje a importância da escola é um trabalho árduo dos professores, que tentam ainda minimizar, assim vamos dizer, esses problemas sociais que ainda continuam enquanto marca, ou às vezes até na própria atualidade mesmo do aluno, continuam vivenciando vários problemas mesmo e aí eles não conseguem continuar. (C) De acordo com a percepção da equipe pedagógica e da coordenação, a bolsa-auxílio é considerada como um dos principais atrativos para a participação do jovem no programa. O atraso em seu pagamento é relacionado como um motivador da evasão e aparece no relato de um dos educadores como uma das reclamações feitas no início do programa. Segundo ele, o fato passa a não ter tanta importância quanto a vivência do aluno no programa, mas não há referência se os que reclamavam ainda permanecem no programa. Através de análises sobre os resultados da avaliação do Projovem Urbano 2008-2009, é levantada a hipótese de que a intensidade da participação dos alunos e os vínculos estabelecidos com o programa influenciem diretamente nas decisões cotidianas e motivações individuais que afetam a permanência. Após determinado patamar de participação, as chances de evasão se tornam mais remotas. No início a gente tinha muitas reclamações sobre a questão do dinheiro, da bolsa. Porque a bolsa era o atrativo principal no início, porque eles não conhecem ainda como é o projeto, o quanto que o projeto é atrativo e gostoso depois que você começa a vivenciar ele, então no início, é de fato, cadê minha bolsa, cadê minha bolsa. Depois, hoje a gente percebe que não tem nenhuma pergunta sobre a bolsa, se a bolsa atrasou e se não atrasou, a gente não tem isso, eles estão de fato procurando os estudos por que hoje vislumbram e acreditam que o estudo é uma instância que vai promovê-los para uma vida melhor. (D) A questão da bolsa-auxílio apresenta visões contraditórias em sua relação com a evasão: Essa bolsa de R$100,00 devia mesmo ser paga? Porque os que estão aqui hoje não estão pela bolsa, estão pelo conhecimento. E, às vezes, se paga a bolsa, se ela atrasa 97 dois meses, já é um motivo para o aluno desistir. Ah, eu vou desistir porque não estão pagando mais não e simplesmente param de vir na escola. (C) A bolsa-auxílio é oferecida como ajuda de custo para os beneficiários no transporte de casa para o local de funcionamento do programa. No município, conforme já abordado, o transporte é oferecido pela prefeitura. Dessa forma, o beneficiário recebe esse valor de forma livre. O recebimento desse benefício é considerado por um educador como importante devido à situação econômica desfavorável dos alunos: A renda dos nossos alunos é muito pequena para cada morador. A grande maioria de nossos alunos moram com muitas pessoas dentro de casa, em casas muito precárias, em famílias que vivenciam muitos problemas. Então esse R$ 100,00 ele salva, por mais que ele não fica por conta desses R$ 100,00. Hoje eu percebo que eles ficam porque conseguem ver na educação uma saída, mas no início o que os atrai para o programa é essa bolsa. Como auxílio para o transporte, se não houver ajuda do município não dá, pois muitos moram muito distante e pelo valor que eles iriam gastar para chegar até aqui esses R$ 100,00 não dá. (D) 4.5.3.3 Dificuldades encontradas dentro do Programa A permanência do aluno no programa é declarada como a maior dificuldade encontrada pelos profissionais da educação. Baseado na estrutura e desenho do programa, quando comparado ao ensino regular, agrava-se a falta de compreensão dos fatores que desencadeiam o fenômeno da evasão e a impotência em encontrar ferramentas eficazes que a reduzam, produzindo um sentimento de frustração e incompletude profissional. Então eu acho que uma das dificuldades que eu tive foi essa, por que o Projovem ele sai muito, [...] Ele sai muito do padrão assim das escolas [...]. E aí eu falava, como que pode esses meninos, eles não vão continuar, eles vão perder essa oportunidade, e eu vejo que o Projovem ele cria muito desvio na vida das pessoas [...]. Então isso me deixava uma frustração, mas meio que uma frustração pessoal, assim sabe, por que não consegue, será que a gente tá errando? Aí entra até uma questão de incompletude profissional, será que a gente tá errando? Será que eu estou fazendo alguma coisa de errado? Ou o grupo, ou a equipe? Então acho que é uma dificuldade que tive de trabalhar assim no Projovem, foi essa de conseguir até de dá um aceite para isso: não, eles vão evadir mesmo que para eles isso é difícil no momento, mas quem sabe no próximo eles vão conseguir, e por aí vai. (C) A dificuldade primeira é de manter esse aluno dentro do programa, [...] o programa ele tem uma proposta, um currículo fantástico, então o aluno tem a área do que ele precisa vencer: curricular, a grade formal de estudo. Além disso, ele tem uma perspectiva em formação em cidadania que são os conceitos sociais e sobrevivência, para ele poder sobreviver no meio social em que ele está inserido e uma perspectiva ao mundo do trabalho. Então talvez isso fosse a necessidade que ele precisaria para suprir a necessidade inicial dele, só que ainda existe um entrave quanto a permanência desse aluno dentro da sala de aula. (E) 98 Essa dificuldade de permanência é vista como falta de perspectiva futura dos beneficiários, como ausência de interesse da escola e como falência da legitimidade da escola como instituição formadora. E quando a gente fala dessa dificuldade de permanência, é porque, talvez, ele ainda não consiga perceber a necessidade que esse estudo faz ou vai fazer para a vida dele. Então, a gente percebe que talvez esteja muito mais voltado para o imediatismo, para a situação momentânea de vida dele, ele não consegue perceber uma perspectiva de futuro, do que isso pode mudar a vida dele, talvez a escola ainda não é um sentido amplo na vida desse aluno. Ele pode estar aqui pelos R$ 100,00 que ele está recebendo, ele pode estar aqui porque tem uma acolhedora cuidando dos filhos, ele está aqui porque ele recebe a merenda no final do dia e, ele está aqui muitas vezes para fugir de casa, para fugir da família, para fugir do esposa, para fugir do marido, para fugir do pai, da mãe, onde ele é espancado, onde ele não vive uma relação de... a relação de conflito é muito presente, talvez a escola serve de uma válvula de escape. (E) Outra dificuldade identificada diz respeito ao tempo reduzido para trabalhar os conteúdos devido à dificuldade dos alunos, pois “o programa já vem com aquele número x de aulas, e você tem ali um tempo para que tudo seja organizado e muitas vezes eles não se adaptam porque eles têm muita defasagem” (A). Essa situação se agrava pela diversidade do nível em que os alunos se encontram e também pela linguagem do material. O material didático é primordial, bacana demais. Agora, se esse material condiz com a linguagem do aluno, ai é evasivo. Neste sentido o material não funciona. Primeiro, porque o Projovem não é seriação, então eu tenho aluno da 1ª serie fundamental 1 até o aluno da 8ª serie na mesma turma. Então os conhecimentos são diferentes, são muito divergentes. De fato é, o conhecimento do nosso aluno é primário, se eu fizer uma análise geral eu vou ter de 1ª a 5ª série e olhe lá. Um ou outro aluno tem nível de 5ª ao 8º ano, agora 6º ao 9º ano. Então o material didático ele não condiz com essa linguagem de perfil de aluno que nós temos. [...] a linguagem do livro didático, porque ainda é erudita, é muito formal para ele. (B) O material não condiz com a realidade dos meninos. Eu acho que os conteúdos são um pouco pesados, não falam a língua deles, são textos que não condiz com o dia a dia deles. Eu acho que deveria ser um material mais lúdico, [...] muita coisa que tinha que voltar lá atrás e, a gente não pode fazer, nisso infelizmente, o programa é engessado. (A) O fato de o programa durar 18 meses ininterruptos aparece como desanimador para os beneficiários e profissionais, devido ao desgaste proporcionado pela ausência de um período reservado para o descanso que coincida com o calendário letivo das escolas de ensino regular. [...] eu acho que podia dar uma enxugada sabe, eu acho que os 18 meses pesa, não ter férias, os meninos precisam de ter um tempo sabe, até coisa de descansar e de curtir a família para depois voltar e dar um gás maior. Então eles não tem férias, [...] Mas assim, eu acho que o tempo é um fator também que faz com que os alunos ao longo do processo vão se perdendo. Assim por exemplo, tem aluno, que para aquele que terminou a terceira série 18 meses é maravilhoso, mas para o aluno que estava na sétima. (B) [...] uma das coisas que elas questionaram é a questão de ser os dezoitos meses corridos sabe, elas acham puxado. Igual assim, elas falam comigo assim: que muita 99 gente desistiu era por isso, porque são dezoitos meses corridos. Elas reclamam que a maioria tem filhos e como elas trabalham, é no período de recesso escolar que elas têm para ter um tempo maior para ficar com os filhos (A) O programa tem como um dos seus objetivos a reinserção dos jovens no processo de escolarização, ou seja, tem a escola como instituição de produção de referências sociais na socialização e transmissão de conhecimentos, articulando seus sentidos e significados na formação dos sujeitos. Mas, como pondera Dayrell (2007), ao abordar a juventude no espaço escolar, é necessário questionar quais são as dimensões constitutivas da juventude, suas experiências sociais, demandas e necessidades. Dimensões que não aparecem incorporadas pela escola, que apresenta “os mesmos parâmetros consagrados por uma cultura escolar construída em outro contexto” (DAYRELL, 2007, p. 1125). Essa situação é evidenciada na percepção do educador abaixo, que indica o espaço como um fator dificultador. Eu acho o local, primeiro o local. O aluno do Projovem abandonou o ensino regular, então ele não gosta do ambiente de escola, talvez até a própria estrutura de escola deixa eles meio arredios, a maioria ou foi expulso da escola, ou a escola não quis mais ele. [...]. Então no Projovem, caiu no ambiente de escola novamente. Talvez o ambiente mesmo de local do Projovem não seja ideal usar a estrutura da escola. Eu acho que se utilizássemos uma outra estrutura talvez, tivéssemos mais sucesso. (B) A estrutura da sala de acolhimento é mencionada como não adequada ao atendimento das crianças: “o acolhimento não é apropriado, onde as crianças ficam, pois é um lugar que não tem muita estrutura” (E). Fato também reclamado pela aluna evadida Amarilis. Vale destacar que, na documentação do programa (BRASIL, 2012)13 sobre as salas de acolhimento, há orientações para a estrutura das salas, que têm que contemplar a faixa etária a que elas são destinadas, ou seja, 0 a 8 anos. Porém, foi observado através de visitas a campo que não passam de salas comuns, onde as carteiras são amontoadas no fundo para liberar espaço para as crianças brincarem, mas não há equipamentos e objetos específicos para a faixa etária observada, conforme determinado na nota técnica, o que também dificulta o trabalho do educador responsável e a acomodação de forma apropriada das crianças. A utilização do espaço físico pela escola, mas com coordenação e autonomia externas, gera uma dinâmica em que imperam relações ambíguas que dificultam a apropriação dos objetivos do programa pelos demais atores presente na escola. Esse foi um dos motivos para a transferência para o MEC da gestão do Projovem, a fim de integrá-lo às demais políticas de educação. No caso, os participantes do Projovem são contabilizados como alunos da rede pública de ensino na modalidade EJA, gerando verbas para a escola. A diplomação é de 13 Nota Técnica nº 001/2012/MEC/SECADI/GAB – orientações para a implementação das salas de acolhimento no Projovem Urbano. 100 responsabilidade da instituição à qual eles estão vinculados. Mas, ainda assim, observa-se um distanciamento com o programa. Eu percebo que, não pelos professores que os acolheram, mas pelos outros profissionais da escola, um olhar crítico e discriminador para eles. Em relação às crianças também, inclusive nesta escola aqui, eu já tive problema com a direção da escola, porque ela acha que as crianças do Projovem não têm os mesmos direitos que as crianças que estudam aqui no horário normal. Não tem os mesmos direitos de usufruir de uma televisão, dos brinquedos. [...]. Uma vez que eu estava na outra escola, a diretora disse assim: esses meninos são a escória da sociedade. (D) No depoimento do educador, transcrito abaixo, é ressaltada a falta da estrutura das escolas periféricas,14 corroborando em parte a fala da beneficiária Rosa, ao relatar sobre as aulas de informática. Fato que justifica, também, a escolha pela escola no bairro do centro do município para a transferência das outras turmas na junção dos demais núcleos, “as outras unidades no início, que eram três unidades, eram muito sem estrutura, o Clóvis avistou uma estrutura física boa, [...]”. Na continuação de seu depoimento, emerge a questão da transferência dos alunos para a escola no centro como um possível motivador para a evasão de parte dos jovens beneficiários do programa. E, de certa forma, evidencia uma decisão centralizada, motivada no sentido de facilitar a gestão do programa, mas que não contemplou a vontade dos beneficiários. [...] questão da comunidade, e isso para eles foi muito forte. Teresópolis é uma turma que lá tínhamos muito mais alunos e quando veio para cá, isso minou. Eu acredito muito que isso tem relação, com a ligação que eles tem com a comunidade, o fato da escola estar perto ali, e é a escola deles e vir para o centro, então o centro já tem um embate, por questões "n". A coordenação decidiu e para os professores isso foi bem melhor, por que a gente rodava de três em três escolas, então ficava segunda e terça aqui, quarta e quinta lá e ai em outro lugar, então isso diminui o cansaço claro dos professores, mas eu acredito que foi uma mudança estrutural e espacial na verdade que foi complicada para os alunos, eu percebi isso. [...] mas não foi só isso, entendeu, foi uma junção de causas, multi causal, não é uma causa só, há então mudei de escola então não fui mais, não acredito que seja só isso. (B) Em relação à qualificação profissional, a falta de um espaço adequado e de subsídios para compra de materiais necessários aos alunos para as aulas práticas, são identificados como pontos a serem melhorados e cogitados como diferenciais para a motivação dos beneficiários, possibilitando, dessa forma, uma abordagem mais voltada para a prática, para o fazer. Falta no programa, é uma iniciação para a qualificação profissional, com um subsidio maior. Vamos construir uma empresa modelo para que os alunos tenham uma visão do que é um empresa. Eu acho que falta material permanente [...] o Projovem é excelente. O material didático é bom, mas ter as outras ferramentas de trabalho seria bom também. Vamos fazer um teste, será que quem faz a gerência do programa fornecer a título de experiência esse tipo de equipamento para ver se 14 Fato também mencionado em um dos documentos produzidos nos encontros dos educadores através da formação a que eles são submetidos durante o programa. 101 realmente fideliza esses alunos, para montar uma empresa modelo, em um espaço bacana, para dar uma aula de qualificação mais adequada. [...] A iniciação não deixa a desejar para nenhum curso profissionalizante que Betim dá. Eu acho até que a informação é um pouco a mais, que os cursos ai fora, devido a essas visitas técnicas mesmo que são realizadas e tal. (D) Segundo a coordenação local e relatos obtidos durante encontro de formação dos professores, os beneficiários realizaram uma visita técnica à FIAT, empresa de automóveis, e também participaram dos eventos Empresário do Ano 2012 e Encontro de Negócios Itinerante. Essas visitas não deixam de ter valor ao ampliar o olhar dos jovens com relação ao mercado de trabalho e às possibilidades a serem alcançadas, mas são limitadas em relação à prática. No que diz respeito ao espaço escolar, as escolas do município não apresentam uma estrutura apropriada para oferecer cursos profissionalizantes, carecendo de equipamentos e materiais que possibilitem aulas práticas. Nesse sentido, o indicado seria estabelecer parcerias com escolas profissionalizantes, instituições de ensino superior e empresas. Porém, como já abordado, em outras entradas no município, o programa já realizou parcerias com empresas locais e o SENAI, mas observa-se que alguns alunos não concluem os cursos oferecidos, mesmo com a possibilidade de uma colocação no mercado de trabalho no final do curso. Segundo a coordenação e alguns educadores que participaram dessas entradas e através de relatos dos próprios jovens, o motivo de não concluírem os cursos foi a falta de conhecimentos básicos para conseguirem acompanhar e absorver os conteúdos ministrados. 4.5.3.4 Como contornar as dificuldades? Quando questionados sobre o que seria necessário para que pudessem contornar as dificuldades elencadas por eles, os educadores manifestam novamente a não apropriação do programa pelos diversos agentes no município, e principalmente no interior das escolas, ocasionando a falta de apoio necessário diante das complexidades a que são sujeitados no cotidiano do programa. A gente precisava de um apoio maior do município, que mais pessoas mesmo, abraçassem esse programa, que a nossa dificuldade até mesmo a direção da escola, os funcionários da escola, a direção, eles não abraçam muito o programa, é o que a gente sente, a gente sente um pouco nesse sentido. Eu acho que ajudaria muito, mais apoio. (D) 102 O trabalho em equipe surge corroborando a ideia da necessidade de apoio, conjugando esforços, saberes e até mesmo setores diversos a fim de alcançar os objetivos do programa e garantir o direito dos jovens beneficiários. Tem que ter um trabalho de equipe efetivo, não pode ter trabalho individual, o Projovem se não for no coletivo não vai a nada, então essas dificuldades a gente tem que sentar mesmo, conversar e discutir essas dificuldades em equipe juntamente com a coordenação, para a gente tá resolvendo mesmo a situação, porque senão no individual a gente não consegue resolver. (B) Os vínculos criados entre os educadores e os beneficiários são abordados como um meio para criar proximidade com os alunos e conseguir com que eles exponham suas dificuldades de forma a permitir algum tipo intervenção. Quando a gente cria uma proximidade maior com o aluno, ele fica mais disposto a te mostrar o que está acontecendo com ele, aí ele facilita a nossa ajuda, nosso auxílio. (E) Apesar de tudo o que foi sugerido e das qualidades apontadas, há a percepção por parte dos educadores de que, de certa forma, o programa ainda não atinge o jovem em sua condição juvenil, fato relatado pelo educador C. O que acontece no Projovem hoje, não é diferente com o que acontece na escola regular, no sentido em que o aluno também ainda não percebe o interesse pela escola, pela instituição. E aí, é um processo difícil de dizer porque a escola talvez tenha que mudar o perfil dela, é tradicionalista ainda, conteudista, [...] A gente precisa pensar em um outro programa social, e isso é contraditório. [...] Eu acho que a escola está distante da necessidade que o aluno precisa. A linguagem da escola, não é a linguagem do aluno e, é por isso que o aluno não está presente na escola, porque ele não se sente acolhido. Não acolhido no sentido de receber, porque o Projovem mais do que nunca abraça o aluno de todas as formas, mas, quando eu digo que ele ainda precisa ser acolhido, a escola precisa investigar qual é a linguagem desse aluno que esta evadindo dessa instituição. Eu acho que a linguagem da escola é muito formal, uma linguagem muito clássica e não interessa ao aluno, como, também, não tem interessado a escola. Porque o aluno que chega para agente hoje é um aluno que não cumpre as atividades de casa, ele não se esforça, ele não tem o hábito de estudo, ele não sente a necessidade do estudo. Então, de certa forma para a escola também, é...., não é interessante, não é esse tipo de aluno que a escola quer receber. A escola quer alunos que tenham compromisso com o estudo, alunos que estejam interessados, que tenham perspectivas de futuro, e esse não é o aluno que nós temos hoje. Então, cria um distanciamento de ambas as partes, do aluno com relação ao conceito de escola e, da escola em aceitação a essa realidade que nós vivemos dentro da escola hoje. (C) 103 4.5.3.5 A importância do programa para os jovens Ao relatarem sobre a importância de um programa como o Projovem para os jovens, os educadores apontaram os seguintes motivos: a necessidade de levantar a autoestima, justificada pela percepção de que os jovens se sentem inferiorizados, marginalizados por causa da falta de estudos; a oportunidade que o programa oferece aos jovens que não conseguiram concluir o Ensino Fundamental e talvez não chegassem a concluí-lo sem o programa, devido à estrutura e flexibilidade por ele oferecida em comparação ao ensino regular; a possibilidade de reinserção desses jovens na escola revertendo a imagem construída da escola por eles mesmos. A importância desse programa no município de Betim, e outro município é de inserir esse jovem, de trazer esse jovem de novo para a escola, para que ele veja a escola de uma forma agradável, a escola como uma forma de atuação. Porque muitos desses jovens que saíram da escola, que é o caso de nossos alunos, eles tinham outra visão da escola, que é triste para nós, para nos profissionais da educação, de vê que os alunos tem essa visão da escola, como uma escola ditadora talvez, que dita as regras e os alunos tem que aceitar aquilo. Então, eu acho que esse programa vem com essa forma de trazer essa escola diferente. (E) O programa, segundo os educadores, proporciona um resgate de jovens em situação de risco social, fato considerado relevante por se tratar de um município constituído de diversas áreas de risco social, visto que “talvez não precisaríamos desse programa, se nossa educação fosse melhor, tivéssemos mais estrutura, mas ele é muito importante, principalmente aqui em Betim, que a gente tem muitas áreas de risco sociais. Então esse programa é importante para resgatar alguns desses jovens no município” (A). Esse resgate é proporcionado pelo sentimento de inclusão. Eles chegam aqui, muito carentes de afeto mesmo e, para eles se sentirem mesmo incluídos na sociedade, da cidade, uma coisa que eles não sentem, não se sentem. Conhecer os ambientes, os lugares que essa cidade tinha que oferecer, os direitos, os deveres deles. O programa é muito bacana, muito bacana, o que falta mesmo é um apoio maior. (D) Assim, a forma imediata para identificar esse impacto do programa na vida desses jovens pode ser percebida através das mudanças, um desvio criado pelo programa na trajetória desses jovens. O Projovem ele cria desvio, eu tenho certeza que eu vou ver alunos ai com a outra trajetória que talvez eu não veria se eu não tivesse aqui. Principalmente por conhecer assim, a gente tem mudanças tão significativas de alunos que chegam até a ser assustadoras. Alunos que eram extremamente agressivos no início, que não 104 respeitavam nada e nem ninguém e de repente hoje, são os nossos melhores alunos. (B) Em relação à participação dos beneficiários, segundo os educadores, a escuta desse jovem se faz principalmente de maneira informal na sala de aula, em conversas, em que o receptor é o professor. Assim, as ações formuladas por esses profissionais são baseadas nas informações absorvidas e identificadas por eles como necessidades desses sujeitos. 4.5.4 Perspectivas da Coordenação A equipe da coordenação é composta por um coordenador geral, também coordenador de políticas públicas do município; um coordenador pedagógico, e um coordenador administrativo. Nos depoimentos, eles serão identificados através das letras G, H e I com o propósito de preservar o anonimato. 4.5.4.1 O aluno do Projovem, quem é? Na visão da Coordenação, o beneficiário do programa é descrito como um sujeito carente do convívio escolar, carente de tudo. São alunos que, por motivos sociais diversos, ficaram à margem do processo educacional no período em que deveriam estar dentro da escola. Diante dessa situação, apresentam-se como sujeitos que necessitam de inclusão, sendo que esta se concretizará por meio da elevação da escolaridade, por isso, “é aquele aluno que precisa estudar, e enxerga no Projovem essa oportunidade” (F). Entretanto, mesmo com essa necessidade de estudar, é ressaltado que esse sujeito ainda não se enquadra nos moldes almejados pela escola, e o auxílio disponibilizado a ele aparece como um chamariz que mascara o verdadeiro sentido de sua presença no programa. Assim, o aluno do Projovem hoje é aquele aluno que não teve a oportunidade no tempo certo. Porém o que a gente tem acompanhado que é dada a oportunidade para ele mas, a gente não encontrou o ponto de equilíbrio entre essa dívida social que nós temos, com o objetivo que é a aprendizagem. Então, eu avalio que o aluno do Projovem hoje, até pela questão do recebimento da ajuda de custo que ele tem, ele ainda não se encontrou como um aluno que tem um tempo a recuperar e, uma imediata necessidade dessa recuperação. Então eu avalio que ele ainda não 105 encontrou o ponto dele enquanto estudante, então esse é o aluno do Projovem hoje. (H) 4.5.4.2 Dificuldades encontradas no Programa Dentre outras dificuldades, a evasão é referida como o maior desafio encontrado no processo de implementação do programa no município, fenômeno incompreendido ao se considerar que as prováveis necessidades dos beneficiários em frequentar o programa são por ele supridas. O maior desafio é manter o aluno que se matriculou o tempo todo no decorrer do programa. [...] as questões operacionais nós estamos conseguindo vencê-las. Primeiro, porque existe o recurso Federal, segundo porque a contrapartida do município não é muito significativa. Ou seja, em se tratando de estrutura o município dá todas, transporte, espaço, espaços bons para o programa funcionar, profissionais a mais que os previstos e pagos pelo programa, estão lá trabalhando. Mas, manter esse aluno matriculado e frequente é o maior desafio, porque os outros recursos nós temos, praticamente todos, todos. Eu não vejo nem um problema do ponto de vista administrativo, do ponto de vista estrutural, pedagógico que justificasse a evasão da forma como aconteceu (F). Por isso, a falta de identificação com a proposta do programa é apontada pela Coordenação como um dos motivos da evasão. Aí eu posso até acrescentar, avalio que um dos motivos da evasão, ainda é essa não identidade com o programa. Não posso generalizar, mas a maioria acha que é nosso dever está pagando a ele e oferecer tudo a ele. Eu percebo que ele ainda não se encontrou como responsável pelo processo de aprendizagem dele. Então, ele ainda acha que vai ter esse tempo, a todo tempo. Então ele sai e volta, sai e volta, porque não é prioridade para ele ainda, então não tem identidade, da necessidade de estudante ele ainda tem as outras coisas como prioridades e não os estudos. (H) Diante disso, a dificuldade de manter o aluno frequente ao programa é atribuída ao fato de este não se enquadrar nos moldes e perfil adequados à escola, por isso, ele não segue regras. Ele é um aluno que não está ambientado com a escola mais. Alguns, não falo 100%, mas grande parte deles, não estão ambientados com escola, não estão ambientados a seguir normas. Então ele chega e qualquer motivo é motivo para ele não ir à escola, ele não vai porque tem jogo à noite, ele não vai porque a novela está terminando. (I) Essa falta de adaptação do aluno aos espaços escolares é apresentada como uma dificuldade dos profissionais da educação em se adequarem às necessidades e desejos desse aluno enquanto estudante. 106 [...] quando a gente vem de uma formação tradicional, a dificuldade aparece em se adaptar a essa realidade de nossos alunos, buscar o equilíbrio entre a necessidade e o desejo do aluno. (H) Outra questão pontuada refere-se à não adequação do espaço escolar tradicional às propostas do programa, conflitando com a necessidade do convívio no espaço escolar, fato já mencionado por um dos educadores. A forma como o programa está instituído, talvez não seria para a escola, seria para um outro espaço. O espaço escola regular para gente adequar a proposta do programa tem conflito aí, sabe, o espaço mesmo. Então a gente tem essa dificuldade de adaptação do programa quanto a instituição escola, mas ao decorrer do programa também eu observo que eles tem essa necessidade do convívio num espaço escolar pela questão da construção da identidade enquanto cidadão responsável. (H) O acompanhamento dos alunos egressos do programa surge como uma necessidade para a avaliação do impacto do programa na vida desses jovens. A minha preocupação maior é qual é o jovem que está saindo do programa, e eu ainda não monitorei. Porque Betim já está na 4ª ou 5ª entrada e aí é importante a gente ter esse retorno, onde e como está esse aluno do Projovem? Porque a ideia do governo é, dar a ele esta condição para que ele cresça, mas e aí onde estão, como estão, que diferença o programa fez na vida deles? E isso eu não sei, precisa de outra pesquisa. (H) Assim, pode-se inferir que a avaliação do impacto do programa na vida dos egressos aparece como um fator importante para a legitimação de suas ações como relevantes para o município e para a visibilidade política ampliando o poder de captação de apoio. 4.5.4.3 Como contornar as dificuldades? A autonomia para a construção de um projeto político e pedagógico adequado à realidade do município é apontada como uma condição necessária para que se consiga atingir o público-alvo do programa, de forma a alterar seu viés assistencialista,15 considerado um obstáculo para que os beneficiários se sintam corresponsáveis em seu processo de aprendizagem dentro do programa, limitando as ações dos educadores. O projeto político pedagógico existe, vindo do governo federal, mas quando ele bate no município, aí a gente aqui no município é que nós sabemos a clientela que temos e o que, que a gente enfrenta no dia a dia. (H) 15 Referido dessa forma pelo entrevistado por entender que o programa “oferece dinheiro, transporte, estadia para os filhos, merenda, n benefícios, conteúdo adaptado para ele, o material, mas não ofereço a ele a cobrança de responsabilidades” (H), cobrança necessária como contrapartida do beneficiário. 107 Apesar de avaliar a proposta do programa como adequada, coloca-se também a questão da autonomia local para adequação e/ou elaboração do material e avaliações a fim de dinamizar e diversificar o processo de ensino-aprendizagem. O próprio material, a questão do sequencial desse material, a forma engessada. [...], a forma tanto do material quanto das avaliações muito sequencial para um público que tem outras habilidades e contatos, eu, na verdade eu vi um meio que Mobral, na verdade só vejo diferença de nomenclatura. Eu tenho um pouco de resistência nessa questão do método, porque eu acredito que o ser humano aprenda com um único método. Então na verdade a metodologia, ela tem que ser modificada sim, é importante o município ter liberdade de gerenciar o programa no município. Porque o material que é enviado para Betim é o material que é enviado para o Amazonas. O material que é enviado para Betim é o material que é enviado para a Paraíba. A gente tem que ter esse cuidado, porque pedagogicamente, nós já avançamos nessa discussão, e eu não vejo esse avanço no Projovem. (H) A falta da autonomia local também transparece na questão da verba disponibilizada pelo governo federal para o programa, limitando suas ações no âmbito da escola. O Projovem oferece a verba para a prefeitura, mas essa é uma verba que vem carimbada, e muitas vezes a gente não consegue atender uma demanda, ou algo a mais que a gente quer fazer porque a gente não pode gastar com aquilo. Por exemplo, a questão do transporte, se a gente propõe em levar o aluno para uma atividade fora da escola a gente sempre tem dificuldades com questão do transporte, merenda, isso externamente, não internamente dentro da escola. (I) A apropriação do programa pelo município é mencionada como algo necessário para que se obtenha maior êxito em sua atuação junto aos jovens. Eu acho que falta de fato, porque a ideia é muito boa, mas eu acho que precisa ser melhorada, no Brasil, não só aqui em Betim, em Minas Gerais. O governo municipal, ele precisa se apropriar mais do programa do que ele se apropria. Porque por ser um programa Federal com vida própria, as vezes ele fica meio que a margem do processo de educação dos município, do próprio Estado, entendeu? Eu acho que essas questões precisariam também ser melhor acertadas para que tivéssemos um sucesso maior. [...] O Projovem ele é enxergado, ele é visto, como algo que não é nosso, não é do município. Ele é do governo Federal e como tal vai ser tratado, então falta essa proximidade. (F) Dessa forma, a falta de uma legislação que explicite e oriente os deveres e obrigações do município, necessárias para que haja interação entre as políticas federais, estaduais e municipais dificulta e enfraquece a intersetorialidade e a interação do programa às políticas do município. O que é realizado nesse sentido fica a cargo da boa vontade do gestor municipal. Essa interação com as outras políticas parte muito mais do desejo de administrador que propriamente pela legislação. Neste sentido, é que falta uma legislação que case as ações, clareza do que é obrigação do município, o que ele tem que fazer, o que você pode oferecer a mais. Porque o que é oferecido aqui em Betim, além do que o programa prevê vai muito da vontade do gestor, do secretário. Por exemplo, nós temos cinco ou quatro pessoas pagas pelo município que estão lá prestando serviço, isso é um valor agregado muito importante. Mas porque isso aconteceu? Em função de uma movimentação da administração, ou seja, o Projovem quando é implantado, 108 ele funciona a revelia do município, o governo diz assim: Se vira, se funcionar bem se não funcionar. Aqui a gente está conseguindo esse casamento digamos assim, a duras penas. (F) O público que poderia ser atendido pelo programa é considerado uma demanda que está reprimida e, portanto, poderia ser motivada a participar do programa se houvesse maior empenho do poder público, se ele oferecessem mais incentivos, como no caso do valor da bolsa-auxílio, considerado um valor inexpressível. O poder público precisa dar mais importância, mais valor para isso, abraçar mais. As pesquisas mostram que esse público que está lá no Projovem, ele é muito maior do que a gente consegue enxergar, eles estão por ai, eles não se manifestam, eles acham que por ter uma idade mais avançada eles se sentem deslocados. Então eu acho que falta sim mais empenho do poder público no sentido até de melhorar isso. Então quando a gente vê lá a questão da bolsa de R$100,00, o que significa isso? Esse R$100,00 afinal de contas? Ele é um valor que não tem expressividade nenhuma, nem para esses alunos de poder de compra nenhum, nós sabemos disso. Então nós podemos começar por aí. Essa é uma coisa muito importante que deveria ser pensada, se é para dar uma bolsa, se é para dar um incentivo, que ela seja melhor pensada, que ela tenha um valor que represente alguma coisa, isso a gente sabe que não resolveria nada, mas precisaria ser melhor. Então eu acho que ela precisa ser melhor pensada, ou então não tenha nada porque isso é um engodo, e se acaba atrasando, e esse atraso acaba desestimulando o aluno. (F) 4.5.4.4 A importância do programa para os jovens A percepção de que Betim possui um grande número de jovens que abandonaram a escola por causa da necessidade de ingressarem no mercado de trabalho faz com que o Projovem seja considerado importante não somente para o município, mas também para o atendimento de jovens advindos de outros municípios e que ali passam a residir, tendo esses jovens a mais alta taxa de abandono do programa. O Projovem é importante tanto para o jovem como para o município, por causa da questão da diminuição desse número de jovens nessa faixa etária, não só no que diz respeito ao estudo mas, o trabalho. Porque nós temos um grande número de jovens que abandonaram a escola para o trabalho e nem sempre é um trabalho digno. Então uma política leva a outra. Então se a gente tem o programa, tanto é que o município até agora não ia participar da nova entrada e ai a gente argumentou junto à prefeitura da necessidade justamente por isso, para a gente continuar atendendo os nossos jovens. Agora, uma característica específica também de Betim é que Betim não atende a demanda só de Betim, hoje se você monitorar, com certeza a maioria dos alunos evadidos não é de Betim. São pessoas que vieram para Betim, então a clientela de Betim ela é muito rotativa. Então, talvez, eu não tenho esse dado, mas talvez o jovem de Betim esteja inserido no fundamental, teve a oportunidade, mas os jovens que vem de fora também é que engrossam o nosso índice nessa faixa etária de 15 a 29 anos, mas a importância dele é indiscutível. Enquanto a gente tiver a demanda é importante o município estar atendendo. (H) 109 4.5.4.5 Participação dos beneficiários A escuta das necessidades dos beneficiários é observada como um procedimento realizado somente através dos educadores na sala de aula, de maneira informal. Portanto, não há uma dinâmica, momentos ou espaços reservados para essa finalidade que valorizem a participação dos sujeitos como um processo contínuo e formativo. Os profissionais dentro do possível eu vejo essa escuta na sala de aula, mas não tem uma dinâmica que eu entendo para um programa como esse, a gente teria que ter uns espaços de maior participação ativa do aluno, através de seminários, palestras, ele construindo e ele organizando. Porque ao fazer ele já tem essa condição de ter, ele já tem essa maturidade de ter esse momento, mas a escuta ela acontece dentro da sala de aula. (H) A junção dos núcleos, fato apontado como necessário, não é percebida como um dos fatores que potencializaram a evasão no município, contrapondo os depoimentos dos outros atores envolvidos, que o consideram relevante para que houvesse a evasão no programa. Outra questão a se discutir é a concepção de participação que permeia os processos decisórios, pois não há um diálogo entre as partes interessadas e sim a imposição e comunicação de uma decisão. Então uma ação muito interessante que nós resolvemos fazer com muita responsabilidade foi a de aglutinar esses três núcleos aqui no centro. Porque, primeiro que a estrutura exigida ela estava ficando subutilizada, em função do número de alunos que tinha em núcleo daquele ali, questão de transporte, de alimento, de pessoal, nós não fizemos isso de forma imposta, sentamos e conversamos com eles, houve uma certa resistência no primeiro momento dos que viriam, mas nós fizemos uma coisa muito bacana com eles, conversar com eles, colocar a situação. Nós corríamos o risco de dessa movimentação haver evasão, e nós tivemos uma surpresa muito boa de perceber que depois dessa ação efetivada não tivemos nenhuma evasão em função disso, houve uma interação muito maior entre os três núcleos, foi bom para o professor não tinha que se deslocar da forma que deslocava, ou seja, foi uma experiência extremamente positiva nessa ação que nós lotamos. É claro que se nós percebêssemos que nos traríamos prejuízos nos teríamos mantido, mas foi uma aposta que nós fizemos que felizmente deu certo. E houve também a escuta deles em determinado momento, alguns se mostraram resistentes, mas no final das contas deu tudo certo e foi muito bom, mas houve a escuta também nesse momento antes de tomar a decisão e de bater o martelo. (I) Nas observações desenvolvidas neste capítulo, tentou-se cercar o objeto de estudo através das percepções dos atores diretamente envolvidos. Percebe-se que o papel que cada um assume traz consigo expectativas e posicionamentos em relação ao programa, aos jovens e aos fatores desencadeadores da evasão. Mesmo não tendo conseguido uma composição amostral, principalmente dos jovens evadidos do sexo masculino, que pudesse fornecer 110 elementos mais ricos e, assim, permitir possíveis generalizações; os dados levantados apontam alguns indícios em que se baseiam as conclusões desta pesquisa. 111 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS Esta dissertação apresenta a pesquisa que foi desenvolvida com o objetivo de investigar a percepção que os jovens, frequentes e evadidos, e demais atores envolvidos atribuem ao programa Projovem Urbano, implantado no município de Betim, e em relação aos fatores desencadeadores de sua evasão. Estudos sobre o programa já foram realizados, destacando-se entre eles as análises feitas através dos dados levantados pelo Sistema de Monitoramento e Avaliação (SMA). Entretanto, ao se considerarem, neste trabalho, os conceitos e valores presumidos pela gestão social no processo de avaliação de uma política pública que está focalizada no atendimento de jovens em situação de vulnerabilidade social; buscou-se um novo olhar sobre o local e os atores que dele compartilham e, assim, compreender por meio dos sujeitos que vivenciam a dinâmica do programa como os fatores envolvidos no fenômeno da evasão se correlacionam e interagem de modo a produzirem elementos que a potencializam. Por ser multidimensional, a evasão é um fenômeno complexo e constitui um problema de difícil solução, pois coexistem elementos subjetivos e estruturais intangíveis através de uma intervenção setorizada; e outros fatores passíveis de sofrerem interferência por meio da articulação de ações simples. Portanto, para enfrentar esse problema, é necessário saber quais devem ser essas ações e como devem ser articuladas. Porém, a dificuldade em se analisar o tempo presente impõe a necessidade de avaliar os acontecimentos considerando os pontos de vista que os cercam e identificar e compreender as forças que nele atuam. Assim, ao promover a vocalização dos sujeitos, pequenos elementos e fragmentos foram surgindo, como partes de um mosaico, compondo uma imagem a ser interpretada visando à compreensão do fenômeno da evasão no Projovem. É nesse cenário que são apresentadas estas considerações, de modo a destacar que as interpretações apresentadas neste estudo não são, e nem serão, únicas, mas limitam-se ao alcance da visão e interpretação da pesquisadora. Portanto, não se pretende esgotar o assunto, mas sim oferecer uma contribuição para a produção de conhecimento sobre o fenômeno da evasão, que reflete a ineficácia do programa no atendimento de parte dos jovens que nele ingressam. Com esse intuito, propôs-se identificar quais são as percepções e sentidos atribuídos pelos jovens ao Projovem Urbano e como esses podem influenciar para que o participante desista e/ou não consiga finalizá-lo. Para esse fim, foram considerados fatores relacionados a 112 motivações/desmotivações dos jovens em frequentar o programa, as ações comunitárias, a notoriedade e apoio recebidos e sugestões para sua melhoria. Para tanto, ao tecer reflexões sobre um programa voltado para jovens, faz-se necessário resgatar que o termo juventude é polissêmico e não pode ser considerado apenas como uma delimitação etária que define uma etapa da vida, mas deve também ser entendida como uma representação social construída em um dado momento histórico. Assim, a juventude passa a ser o resultado da interpretação das instituições da sociedade. Determinada como uma categoria social, serve como base “[...] para classificar indivíduos, normatizar comportamentos, definir direitos e deveres. É uma categoria que opera tanto no âmbito do imaginário social, quanto é um dos elementos “estruturantes” das redes de sociabilidade” (GROPPO, 2004, p. 11). Assim, a definição etária delimita o tempo para essa transição concedida pela sociedade, no caso, a fase de transição para a vida adulta, onde se atingiria a almejada maturidade. Serve, dessa forma, como parâmetro para as ações institucionalizadas, a fim de normatizar comportamentos condizentes e aceitáveis. Portanto, para realizar uma análise social e histórica da juventude, é preciso relacionála a outras categorias sociais e a condicionantes históricos e políticos (GROPPO, 2004). Assim, ao elaborar os fundamentos teóricos, buscou-se apresentar temas importantes para a compreensão da juventude e como as transformações sociais, culturais e econômicas compõem-se de práticas, valores e relações que constituem a moderna condição juvenil. Dentre as consequências dessas transformações evidencia-se nas análises desta pesquisa que hoje não há um vínculo linear entre a educação e o mundo do trabalho. A necessidade do jovem em aproveitar as oportunidades que aparecem frente às incertezas e demandas provenientes de seu contexto, faz surgirem diversas variáveis na sua vivência e relação como o mercado de trabalho. E, este, como ao bordado no capítulo 2, por apresentar-se como o único meio de promover a subsistência e o alcance da dignidade do jovem, passa a ser um fim e uma necessidade desejada. Porém, a frequente situação de não adequação a esse mercado desencadeia processos de vulnerabilidades sociais, que se agravam quando esse estado persiste. Não obstante, a inserção ou não no mercado de trabalho, ou mesmo o tipo de ocupação neste tornam-se cada vez mais incertos. Em resposta a demandas focalizadas que afetam aos jovens mais vulnerabilizados na estrutura de nossa sociedade, o Projovem Urbano foi concebido como uma política pública de trabalho e transferência de renda, considerando que um dos maiores problemas dos jovens é a entrada e permanência no mercado de trabalho por diversos fatores. Conforme já destacado por Gomà (2004), é preciso considerar que o trabalho também deve ser visto como estruturador da vida e do conjunto de relações e direitos 113 sociais; sua ausência revela uma destituição de direitos promovida pela própria estruturação e pelas relações da sociedade, dessa forma, limitando, privando e ameaçando os meios para o desenvolvimento do sujeito. Nesse contexto, a busca por uma qualificação que permita o acesso às ocupações no mercado de trabalho torna-se a principal motivação do jovem ao aderir à proposta do Projovem Urbano. Ao observar e analisar que quase não há qualificação oferecida para grupos com baixa ou nenhuma escolaridade, reforça-se a ideia de que a qualificação profissional oferecida pelo programa passa a ser o principal motivador para sua aderência a ele. Entretanto, segundo estudos do IPEA (2006), a escolarização também vem associada à adequação necessária para atingir esse fim, qual seja a colocação no mercado de trabalho. Entretanto, torna-se necessário enfatizar que a percepção predominante da equipe pedagógica e da coordenação é de que a motivação primeira dos jovens para aderirem ao programa é a bolsa-auxílio ofertada, que o que os move é seu condicionamento por serem, como aborda Demo (1995), tutelados por meio de programas e bolsas advindos do governo. Porém esse benefício é observado também como um fator dificultador quando ocorrem falhas em seu recebimento. Conforme já abordado, o êxito na inserção e permanência no mercado de trabalho depende de vários outros fatores. Assim, ao considerar o fator escolarização, ressalta-se que o nível de qualidade da educação alcançada irá refletir sobre a forma dessa inserção, mantendo a tutela do cidadão ou potencializando sua emancipação. Observa-se que o Projovem apresenta uma proposta, como referido por um dos educadores, que “cria um desvio na trajetória desses jovens” (C), pois amplia a estrutura de oportunidades, mas se apresenta incipiente diante das necessidades exigidas pelo mercado de trabalho e frente à não reversão da situação de inclusão marginal, apontada por Martins (2012). Pondera-se que é um começo, mas percebe-se que o programa tem limitações na tentativa de reversão da condição de submissão ao instituído, condição alcançada ao tocar-se nas relações de poder (FRIGOTTO, 2004; RUMMERT, 2007). Demonstra-se, assim, a necessidade de continuidades e de limites de sua ação enquanto opera como uma política pública de inclusão isolada e focalizada. Reforça-se também, como enfatizado por Demo (2010), a necessidade em retomar a discussão sobre educação e desigualdades, pois o Projovem, ao ser priorizado como um programa de inclusão de padrões mínimos, embora o nível de proficiência alcançado pelos beneficiários do programa (fato constatado pelo SMA), não consegue tocar nos fatores constitutivos e reprodutores das desigualdades a que esses jovens estão submetidos. 114 Além disso, o interesse pela juventude ainda convive com o desconhecimento e o descaso. Para obter novos avanços e evitar retrocessos, o caminho viável pode ser a promoção da participação e, dessa forma, possibilitar por meio de um processo baseado nos valores da gestão social o entendimento desses sujeitos, sob a visão e perspectiva dos mesmos, de suas demandas, necessidades e expectativas, que se apresentam determinadas pelas condições socioeconômicas e territoriais em que vivem. Para isso, é necessário dar voz, principalmente, a sujeitos advindos de grupos mais vulneráveis e excluídos, para que possam ser contemplados com políticas que não tenham um caráter meramente assistencialista. Deve-se considerar que, quanto mais expostos a situações recorrentes de degradação e destituição de direitos, enquanto cidadãos e seres humanos, menos representatividade esses sujeitos possuem para expor suas demandas. Portanto, para que se possa atingir as reais necessidades e demandas desses grupos ou segmentos sociais, de forma a viabilizar intervenções que provoquem, de fato, um processo emancipatório; torna-se premente a participação desses sujeitos. Nesse sentido, Inojosa (2005) salienta que participação supõe capacidade de vocalização. Assim sendo, as políticas públicas direcionadas para jovens em situação de vulnerabilidade social necessitam fornecer mecanismos para que eles possam ter voz e ser realmente considerados sujeitos de direitos, adquirindo e tomando forma verdadeiramente transformadora para que se efetive a sua cidadania. Em busca desse fim, quando é dada voz aos alunos, é possível perceber em seus relatos que o Projovem Urbano é considerado como uma nova chance, uma nova oportunidade, o que evidencia a limitação das possibilidades desses jovens em concluírem seus estudos através de outra modalidade ofertada pela rede pública. Nesse sentido, o fator que se destaca são as estruturas de apoio ofertadas em consonância com as necessidades dos jovens, possibilitando estratégias para sua permanência no programa, conforme destacado pela aluna Bromélia. Nesse caso, enfatiza-se o auxílio financeiro oferecido, a sala de acolhimento, o transporte, o atendimento da assistente social, que aparecem como elementos diferenciais e relevantes compondo essa estrutura. Além disso, surge, na fala da aluna evadida Margarida, a necessidade da flexibilização do horário de funcionamento, que no momento da pesquisa era das 18 às 22 horas, diversificando-o de forma a ampliar o atendimento a outros alunos, com o objetivo de possibilitar que alguns consigam o que Cravina aponta como necessário para a sua permanência no programa: conciliar o emprego e a escola. No entanto, baseado no relato dos alunos, observa-se que a forma como o poder público disponibiliza esses recursos os torna ineficazes, causando frustrações e descrença no jovem, consequentemente, potencializando sua desmotivação em participar do programa. A 115 frustração é ocasionada quando algo é prometido e não é cumprido, gerando, assim, desconfianças. Ressalta-se, ainda, que a forma como esses recursos são ofertados é que determina a relação do programa com seus beneficiários, ou seja, a manutenção da tutela ou a emancipação, e demonstra a falta de comprometimento do poder público, situações que podem ser inferidas pela percepção do programa por seus beneficiários como uma oportunidade oferecida pelo governo federal e não como um direito. Assim, ao ser proposto como uma modalidade à parte para atendimento a jovens em situação de vulnerabilidade social, o programa em si já proporciona um viés favorável à discriminação e, como adverte Frigotto (2004), para uma educação dual. Soma-se a isso o fato de que participam do programa, em grande parte, jovens que foram, de certa forma, alijados do processo escolar e que, ao retornarem ao ambiente escolar regular, atraem para si um olhar discriminatório dos atores que não possuem vínculo direto com eles, situação observada mesmo com a transferência do programa para o MEC. Assim, os alunos do programa são vistos como “estranhos no ninho”, ou seja, não são considerados como parte integrante do ambiente escolar pelos demais sujeitos da escola. Dessa forma, identifica-se a falta de apropriação pelos demais atores da escola ao programa e o entendimento desses jovens como sujeitos de direitos, vistos como “a escória da sociedade”, fala destacada por um dos educadores. Esse olhar também revela as visões estereotipadas e o desconhecimento sobre o jovem e a sua condição juvenil (DAYRELL, 2003; GROPPO, 2010), além de evidenciar a ideologia que permeia e orienta as ações voltadas para o público do programa no espaço da escola. Destaca-se, portanto, a necessidade de uma integração e participação maior de todos os envolvidos na escola, a fim de evitar, desse modo, novamente, situações que convergem para a exclusão desse aluno do ambiente escolar. Além disso, ao se deparar com outros fatores constitutivos do cotidiano dos beneficiários do programa, fica evidenciado através dos relatos dos alunos que a junção de elementos e a forma como esses se associam é que torna possível a permanência desses jovens no programa. Nesse sentido, o apoio que é oferecido em diferentes situações que eles enfrentam pode tornar-se um diferencial tanto para os que permaneceram no programa quanto para os que decidiram abandoná-lo. Assim, pode-se evidenciar a questão das instituições que promovem apoio e notoriedade a esses sujeitos e propiciam articulações no sentido de possibilitar sua permanência no programa. Nesse sentido, a família, considerada em seus diversos arranjos, ganha destaque, contudo essa dimensão não é contemplada no programa como uma articulação e parceria a ser trabalhada. Além disso, ao incorporar a dimensão das 116 relações dos beneficiários, a aluna Bromélia destaca, também, a necessidade do acompanhamento e visão de outras área de conhecimento, como a psicologia. Portanto, o apoio merece destaque ao serem considerados os poucos recursos a que esses jovens têm acesso, a falta de uma estrutura que lhes dê suporte adequado e que os atenda em suas diversas necessidades. Assim sendo, a escola, apesar de todos os conflitos nela vivenciados, é considerada uma instituição de apoio, pois através dela se observa um meio para o alcance da sua necessidade mais imediata, que é a renda através de uma ocupação. Há aumento da evasão observada pelo receio da fusão dos núcleos, fato inferido ao se observar o número de evasões ocorridas no período correspondente aos meses de outubro a dezembro de 2012 em relação aos demais meses (GRÁF. 2). Reforça-se que as mudanças como troca de professores e de escola provocam a sensação de instabilidade e propiciam descrença e desmotivações, como enfatizado pelas alunas Palma e Cravina. Essa quebra dos vínculos formados enfraquece o que os alunos ressaltam como uma das motivações para continuarem a participar do programa, que são justamente os vínculos criados, ou seja, “os professores, os colegas da escola das salas, as cantineiras, todo esse movimento, essa amizade, que eles dão para gente aqui, esse acolhimento” (Bromélia). Não se verificou nesta pesquisa quantas vezes houve mudanças dessa natureza, mas percebe-se pelas falas dos alunos evadidos uma forte correlação entre elas e a desmotivação em continuar a participar do programa. Outra questão a ser destacada é a conjunção de fatores, causados pela dinâmica do programa, que se apresentam como relevantes para dificultar a permanência do aluno. Assim, como exemplificado com a junção dos núcleos, fato que em si não se apresenta como um problema, mas cujas consequências dificultam a permanência de alguns alunos no programa, como destacado pelas alunas evadidas Amarilis e Margarida. Salienta-se também que a junção dos núcleos diminui a abrangência territorial do programa no município, reduzindo, assim, seu poder de alcance. Ao analisar as percepções e sentidos que os atores envolvidos no processo de formação e apoio têm a respeito do jovem e do programa, aparecem vários elementos que corroboram alguns fatos apontados pelos jovens, e também surgem novas evidências e dimensões por eles não contempladas. Assim, destaca-se nas análises realizadas que as divergências entre a estrutura necessária para a operacionalização do programa e a estrutura apresentada pela escola impõem circunstâncias que aparecem como comprometedoras para o alcance dos objetivos do programa. Nesse sentido, evidencia-se que, observada a importância que a qualificação 117 profissional adquire no programa, a falta de espaços, equipamentos e recursos que viabilizem a abordagem prática nas aulas de qualificação compromete a apropriação e a ampliação das possibilidades de aprendizagem. Esse fato poderia ser solucionado, em parte, por meio de parcerias com empresas e demais instituições voltadas para o ensino profissionalizante, como já ocorreu no município, desde que tais parcerias se apresentem adequadas à proposta e às concepções do Projovem. Nesse sentido, destaca-se a possibilidade de ampliação da diversificação de qualificações ofertadas pelo programa através da articulação com o Pronatec. Ainda em relação à estrutura das escolas, identifica-se também a falta de um local apropriado para o cuidado e acomodação dos filhos dos alunos que seja condizente com as orientações para a implementação das salas de acolhimento. Essa situação fortalece a discussão sobre a inadequação do espaço escolar para a implementação do programa. Outro aspecto que chama a atenção é a falta de autonomia local, apontada como um dos fatores que poderia favorecer uma maior dinamicidade do Projovem e sua adequação à realidade local. A adequação repercute também na discussão sobre o material didático, a respeito do qual foram elencadas as seguintes observações: um mesmo tempo e material para trabalhar com alunos com níveis diferentes de aprendizado; a limitação imposta ao professor em oferecer sugestões e mudanças a serem realizadas no material conforme a realidade de seus alunos e construídas a partir dos saberes dos alunos; o distanciamento entre a linguagem abordada no material e a realidade dos alunos. Suscita-se, assim, a necessidade de investigar a correlação entre esses aspectos, tendo em vista que o programa, desde a sua criação, passou por algumas modificações, embora o material não tenha sido alterado. Há que se destacar, também, a frustração profissional causada pela sensação de incapacidade dos educadores ao não conseguirem mobilizar os jovens de forma a evitar que eles evadam do programa. Esses profissionais acreditam que o abandono ocorre pela falta de compreensão dos sentidos e significados atribuídos pelos jovens à escola e a falta de adequação dela as necessidades impostas pela sua condição juvenil, por isso, sentem-se impotentes, por não conseguirem apresentar a eles a importância da escola em suas vidas. Segundo Dayrell, Gomes e Leão (2010, p. 250), “a escola é um dos espaços privilegiados para o processo de aprendizagem de formas e mecanismos de participação”. Assim, ao abordar a participação no programa, enfatiza-se que esta tem que ser fomentada como um processo educativo e contínuo a ser desenvolvido e realizado de forma gradativa (SANDER, 2010), e proporcionar a mobilização dos sujeitos por meio de abertura de espaços de discussão e debates. Nos relatos dos educadores e da equipe pedagógica, a escuta dos 118 alunos é realizada de maneira informal, sem privilegiar uma elaboração consciente e crítica dos alunos (DEMO, 2006). Portanto, a participação deve se apresentar como prática incorporada e expandir esse movimento para além dos muros da escola. Para tanto, torna-se relevante propiciar aos alunos a participação no planejamento da equipe pedagógica através de representantes e incorporar, como prática do programa, a sistematização de discussões e análises elaboradas a partir da opinião dos alunos sobre o Projovem. É preciso atentar para as virtualidades dos processos sociais em curso e para os jovens, apesar de todas as limitações que os desfavorecem. Como enfatiza Novaes (2007, p. 2-3), “existem também uma série de sentimentos e predisposições simbólicas que impulsionam resistências, evidenciam possibilidades e potencialidades de invenções sociais historicamente inéditas”. Nesse sentido, ressalta-se que as discussões e análises serviriam para direcionar melhor as ações a serem tomadas em conjunto, não somente aquelas endereçadas aos jovens, possibilitando melhorias e propiciando um sentimento de corresponsabilidade e a percepção de aprendizado mútuo, além de, como já abordado, oportunizar mecanismos que garantam o exercício e o fortalecimento da cidadania através de uma participação ativa e crítica. As divergências observadas nos relatos dos entrevistados entre as percepções dos alunos, equipe pedagógica e coordenação fortalece a afirmação de que a participação dos beneficiários através de sua vocalização reduz a ineficácia das ações voltadas para esse público e promove um senso de corresponsabilidade (INOJOSA, 2005). Dessa forma, evita-se a imposição de decisões pautadas na tutela do indivíduo, que coíbem a emancipação desses jovens. Além disso, ao serem incorporados mecanismos de participação dos atores envolvidos, permite-se viabilizar uma permanente reflexão sobre as dimensões que constituem a condição juvenil e orientar ações públicas na elaboração de estratégias para enfrentar os diversos desafios frente às questões que afetam a juventude, em um processo contínuo de aprendizado. Dessa forma, as ações e procedimentos devem ser pautados na emancipação do ser humano, de modo a proporcionar igualdade de oportunidades que conduzam ao desenvolvimento local. O programa foi implementado em Betim como mais uma forma de captar recursos do governo federal. De acordo com o Atlas de Desenvolvimento Humano no Brasil 2013, conforme já abordado, há uma parcela considerável de jovens no município na faixa etária contemplada pelo Projovem Urbano que ainda não concluíram o ensino fundamental. Assim, enfatiza-se a importância de iniciativas como esta frente à realidade local com relação aos jovens. Entretanto, desde a primeira entrada no município, observa-se que a procura pelo programa diminuiu a cada entrada, apesar de os coordenadores perceberem a existência de 119 uma demanda muito grande de potenciais alunos. Essa redução no número de entrantes pode ser analisada como a perda de força de sua visibilidade política percebida pela ênfase midiática dada ao longo das entradas, ou seja, a preocupação governamental em divulgá-lo parece ter diminuído ao longo dos anos. Aliada a essa questão, a mudança de gestão por causa da mudança do governo municipal faz com o programa passe por um processo contínuo de resignificações e construções. Esse cenário é agravado pela falta de apropriação do município das concepções do Projovem Urbano e do movimento necessário de articulação com as demais políticas já existentes, o que o torna uma ação isolada. Tal fato é observado pela coordenação do programa como falta de direcionamento da própria política no sentido de explicitar as obrigações e atribuições dos demais setores para a efetivação das articulações necessárias. Espera-se que este estudo possa contribuir para as discussões relacionadas aos valores da gestão social incorporados na avaliação e monitoramento de um programa social voltado para a juventude em situação de vulnerabilidade social, com o objetivo de amenizar o fenômeno da evasão. Espera-se também colaborar para que se produza uma análise que inspire caminhos e alternativas frente a esse complexo fenômeno, assim como suscitar novas indagações que possam, de alguma forma, colaborar para o fortalecimento e desenvolvimento da ação pública voltada para jovens. 120 REFERÊNCIAS ABRAMOVAY, M.; CASTRO, M. Jovens em situação de pobreza, vulnerabilidades sociais e violências. Caderno de Pesquisa, n. 116, p. 143-176, jul. 2002. ABRAMOVAY, M.; CASTRO, M. (coords.). 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Acesso em: 20 out. 20. 130 APÊNDICE A - ROTEIRO PARA ENTREVISTA COM O EDUCANDO FREQUENTE Fale um pouco sobre você, nome, se possui filhos, como foi sua trajetória escolar. 1-O que o motivou a participar do Projovem? 2- Para você, o que é o Projovem? 3- Hoje, o que motiva a frequentar o Projovem? 4- O que te dá preguiça em frequentar o Projovem? 4- Quais são os problemas que você acha que o programa tem? 5- Quais são suas expectativas em relação ao futuro a partir do Projovem? 6- A capacitação profissional oferecida no programa te atende? Por quê? 7- Qual tipo de capacitação profissional você gostaria que o programa oferecesse? 9-Descreva as ações comunitárias (participação cidadã) realizadas pelo programa. 10-Dê a sua opinião sobre essas ações. 11-Qual a importância que sua família e pessoas próximas dão aos estudos? 12- Existe alguma questão sobre o programa que não falamos e que você gostaria de comentar? 131 APÊNDICE B - ROTEIRO PARA ENTREVISTA COM O EDUCANDO EVADIDO 1-O que o motivou a participar do Projovem? 2- Para você o que é o Projovem? 3- Quais são os fatores que o desmotivaram a frequentar o Projovem? 4- Baseado nos fatores que você descreveu o que poderia ser feito para melhorar o Projovem? 5- Você tem interesse em voltar a participar do Projovem? 6- Qual a importância que sua família e pessoas próximas a você dão aos estudos? 7- Existe alguma questão sobre o programa que não foi abordada e que você gostaria de comentar? 132 APÊNDICE C - ROTEIRO PARA ENTREVISTA COM OS PROFISSIONAIS DA ÁREA DA EDUCAÇÃO Descrição profissional, disciplina que leciona, tempo de experiência no programa. 1-Como você descreveria o aluno do Projovem? -Esclareça o que é um aluno de inclusão? 2- A partir de sua experiência dentro do programa, quais são as principais dificuldades encontradas? 3- Como essas dificuldades poderiam ser contornadas? 4- Qual a importância de um programa, como esse, para os jovens? 5- Em sua opinião, a metodologia e o material didático utilizado no programa é adequada ao público a que se destina? Por quê? 6- Para a formulação das ações, atividades, projetos e eventos direcionados para o jovem, no programa, a opinião e desejos do dele são levados em consideração? -Descreva a realização de algum projeto e como você percebeu a participação dos alunos. 7- Quais os meios utilizados para a escuta desse jovem? 8- Existe alguma questão sobre o programa que não foi abordada e você gostaria de comentar? 133 APÊNDICE D - ROTEIRO PARA ENTREVISTA COM OS PROFISSIONAIS DA ÁREA ADMINISTRATIVA 1-Como você descreveria o aluno do Projovem? 2- A partir de sua experiência dentro do programa, quais são as principais dificuldades encontradas? 3-Para a formulação das ações direcionadas para o jovem, no programa, a opinião e desejos do mesmo são levados em consideração? Por quê? 4- Quais os meios utilizados para a escuta desse jovem? 5- Existe alguma questão sobre o programa que não foi abordada e que você gostaria de comentar? 134 APÊNDICE E - PROJETO DE INTERVENÇÃO CENTRO UNIVERSITÁRIO UNA INSTITUTO DE EDUCAÇÃO CONTINUADA, PESQUISA E EXTENSÃO MESTRADO EM GESTÃO SOCIAL, EDUCAÇÃO E DESENVOLVIMENTO LOCAL RELATÓRIO FINAL DE ANÁLISE DA EVASÃO DO PROJOVEM URBANO NO MUNICÍPIO DE BETIM Belo Horizonte 2014 135 RELATÓRIO FINAL DE ANÁLISE DA EVASÃO DO PROJOVEM URBANO NO MUNICÍPIO DE BETIM Relatório elaborado como produto técnico a ser entregue à coordenação local do Projovem Urbano em Betim - MG, baseado nos dados e informações levantadas por meio da pesquisa realizada e apresentada pela Dissertação do Mestrado em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento Local, do Centro Universitário UNA, intitulada “Análise da Evasão do Projovem Urbano no município de Betim: vocalização dos atores envolvidos”. Pesquisadoras: Aparecida de Cássia Oliveira Lima (Mestranda) Drª. Raquel Garcia Gonçalves (Orientadora) Belo Horizonte 2014 136 LISTA DE TABELAS E GRÁFICOS Tabela 1 - Informações referentes ao fluxo de alunos no Projovem Urbano de Betim (2009 a 2012) .............................................................................................. 141 Tabela 2 - Informações referentes ao número de alunos por qualificação profissional inicial (2009-2010) ..................................................................................................... 142 Tabela 3 – Percentual de alunos matriculados em relação ao sexo ........................................ 143 Tabela 4 – Percentual de alunos que permaneceram no programa no 1º mês em relação ao sexo ..................................................................................................... 144 Gráfico 1 – Recebimento de bolsas no Projovem Urbano de Betim (2012 a 2013)............... 144 137 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS CRAS Centro de Referência e Assistência Social EJA Educação de Jovens e adultos FGV Fundação Getulio Vargas IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IPEA Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada MEC Ministério da Educação MTE Ministério do Trabalho e Emprego PEC Proposta de Emenda Constitucional PNAD Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios PNJ Plano Nacional de Juventude Projovem Programa Nacional de Inclusão de Jovem Pronatec Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego PROUNI Programa Universidade para Todos SAEB Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica SECADI Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão SENAI Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial SIMEC Sistema Integrado de Monitoramento Execução e Controle SMA Sistema de Monitoramento e Avaliação UFBA Universidade Federal da Bahia 138 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................ 139 2 O PROJOVEM URBANO EM BETIM .......................................................................... 140 3 DESENVOLVIMENTO DA PESQUISA ....................................................................... 142 3.1 Definições e dados levantados ................................................................................... 142 3.1.1 Fragmentos da condição juvenil ....................................................................... 145 3.2 Análises dos Dados ..................................................................................................... 146 3.2.1 Perspectivas os educandos frequentes e evadidos............................................. 146 3.2.3 Perspectivas dos educadores ............................................................................. 148 3.2.3 Perspectivas da Coordenação ........................................................................... 151 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................ 153 REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 159 139 1 INTRODUÇÃO Este relatório refere-se ao produto técnico que deverá ser encaminhado à Coordenação do Projovem em Betim – Minas Gerais. São apresentados os resultados obtidos através da pesquisa realizada com o intuito de investigar a evasão de participantes do Projovem Urbano neste município. Objetivou-se a análise do fenômeno por meio da percepção que os jovens frequentes e evadidos e demais atores envolvidos atribuem ao programa e aos fatores desencadeadores de sua evasão. Embora vários estudos sobre o programa já tenham sido realizados, buscou-se neste trabalho uma visão voltada para seus atores, em especial, os jovens em situação de vulnerabilidade social beneficiados pelo Projovem Urbano. Esse novo olhar teve como objetivo reconstruir, por meio dos atores que vivenciam a dinâmica do programa, o conhecimento dos fatores que se correlacionam e interagem produzindo elementos que potencializam a evasão. Como meio para se atingir esse fim, baseado nos valores da gestão social, procurou-se a vocalização dos atores envolvidos (beneficiários, equipe pedagógica e coordenadores) através da realização de entrevistas semiestruturadas. Considera-se que os atores envolvidos neste programa são os maiores interessados nos resultados desse trabalho e pondera-se que o maior objetivo de uma pesquisa é que ela consiga contribuir trazendo elementos que produzam e/ou indiquem caminhos que de alguma forma possam produzir melhorias no objeto-alvo da investigação. Assim, justifica-se a apresentação deste relatório como um meio conciso de disseminação dos resultados obtidos. De maneira geral, as análises realizadas apontam para vários elementos que adquirem importância dentro da dinâmica do programa, mas enfatiza-se a relevância das estruturas de apoio ofertadas em consonância com as necessidades dos jovens, possibilitando estratégias para a permanência no programa. Observa-se também que a forma como o poder público disponibiliza os recursos é que os torna ineficazes, causando frustrações e descrença, potencializando, dessa forma, a desmotivação dos jovens em participar do programa. Evidencia-se a vocalização dos atores envolvidos como um instrumento que oportuniza mecanismos que venham a garantir o exercício e o fortalecimento da cidadania, assim como contribuir para o fortalecimento e desenvolvimento da ação pública. 140 2 O PROJOVEM URBANO EM BETIM A população jovem do município de Betim, compreendida entre 18 a 29 anos, representa cerca de 22,8% da população total, segundo dados do IBGE (2010). De acordo com o Atlas de Desenvolvimento Humano no Brasil 2013 (ATLAS, 2013), referente ao ano de 2010, a porcentagem de jovens com Ensino Fundamental completo, no município, na faixa etária de 18-24 anos é de 82,89%, para 25 anos ou mais é de 53,01%. Ou seja, existe uma parcela considerável da população que não concluiu o Ensino Fundamental, aproximadamente 17% da população entre 18-24 anos; em relação aos que possuem 25-29 anos pode-se inferir um valor maior.1 Dentre estes, 27,01% das pessoas com 18 anos ou mais que não possuem Ensino Fundamental completo e encontra-se em ocupação informal.2 De acordo com pesquisa realizada pelo IBOPE (2010),3 e divulgada pelo Movimento Nossa Betim, destacam-se os seguintes dados: em relação à educação, 95% afirmam ter acesso à escola pública perto de casa e 86% a creche; com relação à biblioteca pública, 33% relatam frequentá-la. Assim, percebe-se que de maneira geral os habitantes do município possuem acesso a escola pública e a creche. Através de alguns temas abordados pela referida pesquisa, pode-se inferir que o acesso à educação no município é amplo, mas não atrativo para os jovens. Há uma carência de espaços culturais voltados para a juventude. O Projovem Urbano em Betim iniciou-se com a primeira entrada de alunos em 2009 (3ª entrada nacional), sendo que a gestão do programa é compartilhada entre as Secretarias de Administração Municipal e de Políticas de Juventude, Educação, Trabalho e Desenvolvimento Social. A segunda entrada ocorreu em 2010; já a terceira iniciou em maio de 2012, com formatura prevista para o final de 2013. O horário de funcionamento do programa é das 18h às 22h, de segunda a sexta-feira. Em relação à situação da evasão em Betim, foram levantados os seguintes dados junto à coordenação local (TAB. 1) 1 Considerando a promulgação da Lei nº 9.394/96 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira), o que favorecer a universalização da educação básica em 1996, ou seja, decorridos 17 anos. 2 São considerados em ocupação informal, segundo o Atlas de Desenvolvimento Humano no Brasil 2013, os que trabalham, mas não são empregados com carteira assinada; os militares do Exército, da Marinha, da Aeronáutica; os integrantes da Polícia Militar, do Corpo de Bombeiros, os funcionários públicos ou autônomos com contribuição para o instituto de previdência oficial. 3 Destacam-se desta pesquisa dados sobre o mundo dos jovens, como trabalho, educação, lazer, participação, mesmo que tenha sido realizada com um público de 16 anos para cima e que somente 36% dos que foram entrevistados estão na faixa etária de 16 a 29 anos. 141 Tabela 1- Informações referentes ao fluxo de alunos no Projovem Urbano de Betim (2009 -2012) Entrada 1ª (2009) 2ª (2010) 3ª (2012) Meta 1600 1200 900 Coleta de dados 1900 1280 1000 Efetivaram a matrícula 1283 983 600 Receberam auxílio 1º mês 1240 394 268 Alunos no sistema 428 200 94 Alunos aprovados 377 157 53 Quantidade de núcleos 8 5 3 Quantidade de Escolas 15 10 3 Fonte: Elaborada pela autora com base nos dados apresentados pela coordenação local do município de Betim. Em 2010, segundo a coordenação local, o início das aulas foi adiado por duas vezes, sendo esse o motivo que justifica a considerável diferença entre o número de alunos que efetivaram a matrícula e os que receberam bolsa-auxílio no primeiro mês. Os participantes do programa que alcançaram 75% de frequência e realizaram 75% das tarefas pedagógicas propostas receberam o auxílio do 1º mês; então, pode-se inferir que esse valor retrata os jovens frequentes no primeiro mês. Ao utilizar esse valor como referência e o número de alunos no sistema no último mês do programa, percebe-se que há uma quantidade considerável de alunos evadidos. Outra questão é a aparente perda de força do programa, pois se observa, paulatinamente, a queda do número de jovens que participam desde 2009. De acordo com a coordenação local, a divulgação do programa e a captação de alunos foram feitas por meio de visitas de porta em porta como forma de busca ativa dos jovens; mediante parcerias com Bolsa-Família e Cesta-Escola; e também através do Centro de Referência de Assistência Social (CRAS) e das Regionais Administrativas. Em relação aos arcos ocupacionais, em 2009, foram oferecidos os cursos de Administração, Construção e Reparos II e Telemática; em 2010, Administração e Serviços Pessoais; em 2012, somente Administração. 142 Tabela 2 - Informações referentes ao número de alunos por qualificação profissional inicial (2009-2010) Quantidade de Alunos Arcos Administração 419 Construção e Reparos II 30 Telemática 160 Serviços Pessoais 33 Total 642 Fonte: Elaborada pela autora com base nos dados apresentados pela coordenação local do município de Betim. A quantidade de alunos nas entradas anteriores a 2012 que optaram pelo arco ocupacional de Administração justifica a sua escolha pela coordenação local em oferecê-lo em detrimento dos outros. Foram firmadas parcerias com duas empresas e o Senai, nas entradas referentes a 2009 e 2010. Na primeira foram selecionados 60 alunos através de uma prova para o curso de Instalação Elétrica Industrial, em que 40 deles foram certificados e 39 foram admitidos pela empresa. Na segunda, a seleção foi de 20 alunos para o curso de Mecânica Industrial, sendo certificados 12 alunos. 3 DESENVOLVIMENTO DA PESQUISA 3.1 Definições e dados levantados A produção do material empírico, em que se baseia a análise desta pesquisa, apresenta uma abordagem qualitativa, tendo sua coleta ocorrido no período de junho a setembro de 2013. O trabalho de campo foi realizado no município de Betim, na Escola Municipal Clóvis Salgado (local de funcionamento do programa), na Secretaria Municipal de Educação (lugar onde se encontra a parte administrativa do programa). O material analisado é composto de entrevistas semiestruturadas, individuais e gravadas, realizadas com: jovens frequentes ao Projovem Urbano de Betim, jovens considerados evadidos,4 equipe pedagógica (educadores e pedagogas), pessoal da área administrativa e da coordenação. Destaca-se ainda que este 4 Evadido, neste caso, será considerado o aluno que frequentou o programa pelo menos durante um mês e não mais retornou ao mesmo. 143 estudo buscou, em parte, apoiar suas análises em dados secundários, em estudos já realizados sobre o tema, na documentação existente sobre o programa, em parte da documentação elaborada pela coordenação local e em dados provenientes das entrevistas realizadas. Para uma visualização geral sobre o fenômeno na esfera local, foram feitas algumas análises com base nos dados disponibilizados: Com relação à idade e sexo dos alunos que efetivaram a matrícula no programa: 62% possuem idade entre 18 a 24 anos; sendo 18% entre 18 e 19 anos; os 38% restantes possuem idade entre 25 a 29 anos;5 32% são do sexo masculino; 68% do sexo feminino. Com base nos dados acima, percebe-se que no programa predomina uma presença maior de mulheres. A idade chama a atenção quando é realizada a comparação entre os alunos que se matricularam e aqueles frequentes. Dos frequentes 53% estão entre 18 e 24 anos e 47% entre 25 a 29 anos. Assim, o programa parece chamar a atenção do público entre 18 a 24 anos, fato que pode estar também relacionado ao maior número de jovens nessa faixa etária no município. Portanto, na estratificação da quantidade de alunos por idade e sexo, tem-se: Tabela 3 – Percentual de alunos matriculados em relação ao sexo Faixa etária Sexo 18-24 25-29 Fem. 67% 70% Masc. 33% 30% Fonte: Elaborada pela autora com base nos dados apresentados pela coordenação local do município de Betim. Através da análise dos dados da TAB. 3, observa-se que, à medida que a faixa etária aumenta, há uma proporção maior de mulheres com interesse em participar do programa. Conforme dados da TAB. 1, dos 600 alunos que efetivaram a matrícula, somente 151 receberam a bolsa-auxílio,6 ou seja, frequentaram o programa pelo menos durante um mês. Dentre eles observa-se a seguinte distribuição: 5 Segundo o site do Movimento Nossa Betim, no município há uma quantidade maior de jovens na faixa etária entre 18 e 24 anos do que entre 25 e 29 anos. Em relação à escolaridade, a pesquisadora não encontrou informações estratificadas por faixa etária. 144 Tabela 4 – Percentual de alunos que permaneceram no programa no 1º mês em relação ao sexo Faixa etária Sexo 18-24 25-307 Fem. 74% 68% Masc. 26% 32% Fonte: Elaborada pela autora com base nos dados apresentados pela coordenação local do município de Betim. Desse montante que recebeu bolsa-auxílio no 1º mês, cerca de 60% (91 alunos) haviam evadido do programa até a data da realização da presente pesquisa. Através do histórico mensal de bolsas-auxílio pagas pelo programa, pode-se observar a evolução desse fenômeno até a realização da presente pesquisa (GRÁF. 2). Gráfico 1 – Recebimento de bolsas no Projovem Urbano de Betim (2012 a 2013) 160 140 120 100 80 60 40 20 0 Fonte: Elaborado pela autora com base nos dados cedidos pela coordenação local. Observa-se que desde o início do programa há queda no número de alunos que receberam bolsa (no caso, o recebimento da bolsa comprova a frequência no programa), mas, nos meses de outubro a dezembro de 2012, constata-se uma queda em proporções maiores se 6 7 As informações disponibilizadas pela coordenação local apresentam dois valores diferentes quando se refere aos alunos que receberam bolsa-auxílio no 1º mês. Na TAB. 1 aparece um valor de 268 alunos; em outro arquivo disponibilizado, esse valor aparece como 151 alunos. Como esse segundo arquivo é descrito o nome dos alunos a quem o benefício foi pago, a pesquisadora o considerou como válido e baseou suas análises nesses dados. Como já haviam decorrido 12 meses, os alunos que efetivaram matrícula com 29 anos nessa época já haviam ultrapassado o limite da faixa etária de atuação do programa. 145 comparada aos outros meses. Tal fato pode estar relacionado ao receio de fusão dos demais núcleos após as eleições municipais para prefeito e à confirmação dessa situação anunciada em janeiro de 2013, quando ocorreu a transferência de todos para a escola do centro do município. 3.1.1 Fragmentos da condição juvenil As trajetórias de vida dos jovens evadidos e dos frequentes ao programa são complexas, mas se assemelham nos percursos irregulares e cheios de situações de abandono e desigualdades. Em relação à composição familiar e origem, a maioria dos entrevistados (tanto os frequentes quanto os evadidos) mora ou nasceu no município. Entre os solteiros a maioria ainda mora com os pais. Entre os casados ou com união estável a predominância é de mulheres, todas com mais de um filho. O processo de escolarização desses jovens é marcado por trajetórias irregulares, com abandonos e tentativas de retomar os estudos, devido aos mais diversos motivos: conflitos, dificuldades de integração ao ambiente escolar e de desempenho escolar. Ao analisar os que já trabalham, encontra-se um histórico de inserções precárias, com ocupações informais, de baixa qualificação, baixos rendimentos e sem garantias sociais. Entre os que estavam desempregados, observa-se a situação das mulheres que ainda não ingressaram no mercado de trabalho, o que evidencia a situação das mulheres de terem maiores dificuldades de inserção, mesmo apresentando um nível de escolaridade maior. Tal fato ainda corrobora a realidade de um número maior de participantes do sexo feminino no programa. Assim, observa-se também dificuldade ao acesso e permanência na escola por questões que podem levar à inferência da manutenção dos papéis tradicionais de gênero quando se analisam as relações entre atividade e estudo. Essa proporção pode estar relacionada também à gravidez precoce e ao aumento de mulheres que chefiam famílias, pressionando o mercado de trabalho. Também evidenciada por dados levantados das avaliações das diversas entradas do programa, essa situação traz à tona a necessidade de atenção especial a políticas públicas que garantam o direito dessas alunas, considerando suas necessidades específicas. No programa, a única estratégia nesse sentido foi a de garantir a sala de acolhimento para os filhos de quem tivesse a necessidade de trazê-los para que pudessem estudar. 146 Nesse cenário, a importância da questão do apoio recebido através das estruturas do município, família, escola e comunidade em determinada situação ganha relevância, podendo se tornar um diferencial para que os jovens possam concluir os estudos. Essa falta de apoio revela a negligência do Estado por um lado, mas também os seus limites de ação, fato que Leão (2004, p. 8) também destaca, pois “parece claro que a re(inserção) escolar para os jovens e adultos depende de uma série de fatores, o que certamente seria facilitado pela ação articulada de outras políticas sociais”. Destaca-se que a proposta do programa parece não atingir todos aqueles que se enquadram no perfil focalizado por ele, haja vista a quantidade de jovens que poderiam participar e não o fazem. Portanto, a variedade de situações e modos como os jovens vivenciam a sua condição juvenil impõe a necessidade de diversificação de formas para atendimento a esse público e articulação das políticas sociais. Para o direcionamento de como essas devem ser moldadas e articuladas, a vocalização dos atores envolvidos ganha importância, a fim de que as ações direcionadas aos beneficiários sejam eficientes e eficazes. 3.2 Análises dos dados 3.2.1 Perspectivas dos educandos frequentes e evadidos A análise da motivação, ou seja, quais fatores chamaram a atenção desses jovens para participar do Projovem, desvela as expectativas geradas neles. A satisfação ou não dessas expectativas pode potencializar ou não a permanência no programa. Em análises já realizadas, por meio dos resultados obtidos através do sistema de avaliação, essas expectativas variam conforme o tempo de permanência no programa e as contingências ocorridas na vigência dele. Assim, após análise dos dados levantados por esta pesquisa, observou-se que: O programa apresenta-se como atrativo para os jovens ao unir a escolarização e a capacitação profissional; A oportunidade de conclusão dos estudos que apresenta uma estrutura de apoio, flexibilizando o retorno à escola, diferencia o Projovem Urbano em relação a outras modalidades de ensino ofertadas para o público-alvo do programa; A bolsa-auxílio não aparece com relevância como fator motivador para os jovens participarem do programa; 147 A importância das relações, dos vínculos criados entre os alunos e os profissionais que atuam no programa aparece como um diferencial expressivo na motivação dos alunos em continuar frequentando o programa; As aulas de qualificação profissional também aparecem como um diferencial para a motivação em concomitância com o término dos estudos, condições necessárias para alcançar uma colocação no mercado de trabalho e assim percebida também como ampliação na estrutura de oportunidades dos beneficiários. Em relação às desmotivações, os alunos frequentes ressaltam: Dificuldades relacionadas ao transporte, principalmente na época de férias escolares do ensino regular no município, provocando faltas e descontinuidades; O atraso no pagamento das bolsas-auxílio e o cansaço das várias jornadas enfrentadas no dia a dia. Enfatiza-se que esses fatos relatados constituem um problema quando passam a ser algo prometido e não cumprido, parecendo interferir na credibilidade, frustrando os beneficiários e potencializando a desmotivação em participar do programa. Já os alunos evadidos destacam como fatores que motivaram a sua evasão: As mudanças decorrentes da necessidade de realizar a fusão dos núcleos e, como consequência, a transferência dos alunos para a escola no centro do município e a troca de professores; A falta de segurança dentro e fora da escola. A mudança de núcleo interfere de forma a dificultar e até mesmo gerar obstáculos frente às estratégias elaboradas diante da necessidade de conciliar a rotina familiar com os estudos e o trabalho. Através dos relatos, evidenciaram-se desigualdades de condições estruturais do funcionamento do programa em regiões diferentes, configurando, assim, uma falha local. Destaca-se que as escolas em que funcionavam os núcleos já haviam participado do programa em outras edições, o que indica uma falta de comprometimento do poder público em relação às necessidades para a operacionalização do programa, pois se apresenta como uma situação recorrente. Observou-se também que a participação do jovem no programa não é algo apropriado por ele como um direito, mas como algo concedido. A partir dessa percepção, questiona-se o entendimento do programa como um direito desses jovens e não simplesmente uma oportunidade oferecida pelo Governo. 148 Apesar da relevância dos temas abordados no cotidiano dos jovens pelas aulas de participação cidadã, algumas atividades propostas não são amplamente aderidas por todos. Essa não disposição para tais ações pode evidenciar a falta de identificação desses jovens com as ações e/ou com a forma de interação proposta. O senso de responsabilização imposto a eles como agentes transformadores das comunidades não é, no geral, por eles apropriado. A família e a igreja foram citadas como referência de estímulo e notoriedade para que prossigam no programa. O apoio recebido, principalmente da família, é relatado como principal fonte de estímulo e a base para estruturar estratégias que, de certa forma, permitem a permanência no programa. A figura da mãe nos relatos aparece com mais destaque em relação ao incentivo e apoio. Assim, para a melhoria o programa, foram apresentadas as seguintes sugestões: Flexibilização e diversificação do horário de funcionamento do programa; Funcionamento do programa em escolas mais próximas à casa dos alunos; Integração de um profissional de Psicologia à equipe do programa; Incorporação da família como uma dimensão contemplada nas ações do programa; Melhorias nas condições de cuidado e estrutura na sala de acolhimento, principalmente com as crianças de 0 a 1 ano. Todos os entrevistados evadidos manifestaram interesse em retornar ao programa, mas uma ponderou a necessidade de conciliar o trabalho com a escola. 3.2.2 Perspectivas dos educadores Na percepção dos educadores, os alunos do Projovem aparecem como: sujeitos que se perderam no caminho, perderam a oportunidade quando não acompanharam o processo educativo oferecido pela escola, desmotivados por fatores como a violência, gravidez precoce etc. Portanto, na visão deles, tais sujeitos apresentam trajetórias irregulares, tendo sido expulsos da escola pela falta de adequação de ambos: da escola diante da diversidade de aspectos sociais e culturais desses sujeitos, dos alunos por não se adaptarem às regras impostas a eles pela escola. Entretanto, os alunos não desvalorizam a escola como instituição de formação e promoção do desenvolvimento, mas buscam nela principalmente apoio, e, como há uma concorrência entre a escola e outras necessidades mais imediatas, não priorizam os estudos. Assim, devido à situação social com a qual se deparam, esses jovens apresentam- 149 se como instáveis, carentes e que necessitam de assistência para conseguirem prosseguir, pois se encontram perdidos diante do que o mundo está cobrando deles. A vulnerabilidade social dos beneficiários do programa é vista pelos profissionais da educação como falta de estrutura e recursos necessários para uma vida digna. Apresentam-se duas vertentes: a não inserção no mercado de trabalho e a carência de estruturas de referências (no caso específico, a família), situações que os conduzem à ausência de perspectivas de futuro, onde o tempo presente torna-se seu fim mais imediato. Ao serem questionados sobre os motivos para a ocorrência da evasão no programa, os membros da equipe pedagógica destacam: Choque entre a cultura do aluno e a cultura da escola; Falta de êxito na tentativa de conciliar o estudo com o trabalho; Falta do costume de estudar, a dificuldade que alguns alunos apresentam em leitura e escrita, a dificuldade de retorno à escola após alguns anos de afastamento; Atraso da bolsa-auxílio, principalmente no início do programa; Fatores externos como responsabilidades e outros problemas socioeconômicos enfrentados pelos alunos que, de certa forma, concorrem com a escola. De acordo com a percepção da equipe pedagógica e da coordenação, a bolsa-auxílio é considerada um dos principais atrativos para o jovem participar do programa. Contudo, a questão da bolsa-auxílio apresenta visões contraditórias em sua relação com a evasão: como um problema quando há falhas em seu recebimento, portanto, levanta-se a hipótese que ela deveria ser extinta e, em contraposição, como um benefício importante devido à situação econômica desfavorável dos alunos. Foram abordadas como dificuldades encontradas no programa e fatores desmotivadores: Manter o aluno frequente no programa devido: à falta de perspectiva futura dos beneficiários, ausência de interesse pela escola e falência da legitimidade da escola como instituição formadora; Tempo reduzido para trabalhar os conteúdos devido à dificuldade dos alunos, situação que se agrava pela diversidade do nível em que os alunos se encontram e também pela linguagem do material; 150 A duração do programa de 18 meses ininterruptos, devido ao desgaste proporcionado pela falta de um período reservado para o descanso que coincida com o calendário letivo das escolas de ensino regular; A inadequação do espaço escolar, estrutura e material adequado à proposta do programa, destaque para a sala de acolhimento, as aulas de informática e a qualificação profissional; A não apropriação dos objetivos do programa pelos demais atores da escola, fato em parte provocado devido ao programa que, mesmo utilizando o espaço escolar, apresenta coordenação e autonomia externas a escola. Ao ser elencado o que é necessário para contornar as dificuldades, aparece novamente a questão da não apropriação do programa pelos diversos agentes no município, e principalmente no interior das escolas, ocasionando a falta de apoio necessário diante das complexidades a que são sujeitados no cotidiano do programa. Também foram apontadas: O trabalho em equipe que surge corroborando a ideia da necessidade de apoio, conjugando esforços, saberes e até mesmo setores diversos a fim de alcançar os objetivos do programa e garantir o direito dos jovens beneficiários; Os vínculos criados entre os educadores e os beneficiários são abordados como um meio para criar proximidade com os alunos e conseguir com que eles exponham suas dificuldades de forma a permitir algum tipo de intervenção; Parcerias a serem estabelecidas com escolas profissionalizantes, instituições de ensino superior e empresas. Ao relatarem sobre a importância de um programa como o Projovem para os jovens, os educadores indicaram os seguintes motivos: a necessidade de levantar a autoestima, justificada pela percepção de que os jovens se sentem inferiorizados, marginalizados por causa da falta de estudos; a oportunidade que o programa oferece aos jovens que não conseguiram concluir o Ensino Fundamental e talvez não chegassem a concluí-lo sem o programa, devido à estrutura e flexibilidade por ele oferecida em comparação ao ensino regular; a possibilidade de reinserção desses jovens na escola revertendo a imagem construída da escola por eles mesmos. Apesar de tudo o que foi sugerido e das qualidades apontadas, há a percepção por parte dos educadores de que, de certa forma, o programa ainda não atinge o jovem em sua condição juvenil. Assim também, ao resgatar-se que o programa apresenta um número considerável de mulheres e muitas delas já são mães, o conceito de família nesse sentido 151 precisa ser abordado com uma reflexão dos atores sobre a configuração de seu campo social e suas relações, e as implicações destas no desenvolvimento de estratégias que possam atuar sobre o fenômeno da evasão. Em relação a participação dos beneficiários, segundo os educadores, a escuta desse jovem se faz principalmente de maneira informal na sala de aula, em conversas, em que o receptor é o professor. Assim, as ações formuladas por esses profissionais são baseadas nas informações absorvidas e identificadas por eles como necessidades desses sujeitos. Destacase, neste sentido, a decisão centralizada em realizar a fusão dos núcleos, motivada no sentido de facilitar a gestão do programa, mas que não contemplou a vontade dos beneficiários. 3.2.3 Perspectivas da Coordenação Na visão da Coordenação, o beneficiário do programa é descrito como um sujeito carente do convívio escolar, carente de tudo. São alunos que, por motivos sociais diversos, ficaram à margem do processo educacional no período em que deveriam estar dentro da escola. Diante dessa situação, apresentam-se como sujeitos que necessitam de inclusão, sendo que esta se concretizará por meio da elevação da escolaridade. Entretanto, mesmo com essa necessidade de estudar, é ressaltado que esse sujeito ainda não se enquadra nos moldes almejados pela escola, e o auxílio disponibilizado a ele aparece como um chamariz que mascara o verdadeiro sentido de sua presença no programa. Dentre outras dificuldades, a evasão é referida como o maior desafio encontrado no processo de implementação do programa no município, fenômeno incompreendido ao se considerar que as prováveis necessidades dos beneficiários em frequentar o programa são por ele supridas. Assim, são apontadas como motivos da evasão: Falta de identificação dos jovens com a proposta do programa; Falta de adaptação do aluno nos espaços escolares, apresentada como uma dificuldade dos profissionais da educação em se adequarem às necessidades e desejos desse aluno enquanto estudante; Não adequação do espaço escolar tradicional às propostas do programa, conflitando com a necessidade do convívio no espaço escolar. A questão da junção dos núcleos, fato apontado como necessário, não é percebida como um dos fatores que potencializaram a evasão no município, contrapondo os depoimentos dos outros atores envolvidos, que o consideraram relevante para que houvesse a evasão no programa. Outra questão a se discutir é a concepção de participação que permeia os 152 processos decisórios, pois não há um diálogo entre as partes interessadas e sim a imposição e comunicação de uma decisão. Como dificuldades no programa foram levantadas as seguintes observações: Falta de autonomia para a construção de um projeto político-pedagógico adequado à realidade do município, apontada como uma condição necessária para que se consiga atingir o público-alvo do programa de forma a alterar seu viés assistencialista, considerado um obstáculo para que os beneficiários se sintam corresponsáveis em seu processo de aprendizagem dentro do programa, limitando as ações dos educadores; Falta de autonomia local para adequação e/ou elaboração do material e avaliações a fim de dinamizar e diversificar o processo de ensino-aprendizagem. Falta de autonomia local para definir outras utilizações da verba disponibilizada pelo governo federal para o programa, limitando suas ações no âmbito da escola; Falta de uma legislação que explicite e oriente os deveres e obrigações do município, necessárias para que haja interação entre as políticas federais, estaduais e municipais o que dificulta e enfraquece a intersetorialidade e a interação do programa às políticas do município. O que é realizado nesse sentido fica a cargo da boa vontade do gestor municipal. Esse último tópico ganha relevância para a apropriação do programa pelo município, fato mencionado como algo necessário para que se consiga maior êxito em sua atuação junto aos jovens. Assim, também o acompanhamento dos alunos egressos do programa surge como uma necessidade para a avaliação do impacto do programa na vida desses jovens, fator importante para a legitimação de suas ações como relevantes para o município e para a visibilidade política ampliando o poder de captação de apoio. A escuta das necessidades dos beneficiários é observada como um procedimento realizado somente através dos educadores na sala de aula, de maneira informal. Portanto, não há uma dinâmica, momentos ou espaços reservados para essa finalidade que valorizem a participação dos sujeitos como um processo contínuo e formativo. Por fim, destaca-se, através da percepção da coordenação, que o público que poderia ser atendido pelo programa é considerado uma demanda que está reprimida e, portanto, poderia ser motivada a participar do programa se houvesse maior empenho do poder público, se ele oferecesse mais incentivos, como no caso do valor da bolsa-auxílio, considerado um valor inexpressível. 153 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS Este relatório apresenta os dados e análises feitas na pesquisa que foi desenvolvida com o objetivo de investigar a percepção que os jovens, frequentes e evadidos, e demais atores envolvidos atribuem ao programa Projovem Urbano, implantado no município de Betim, e em relação aos fatores desencadeadores de sua evasão. Por ser multidimensional, a evasão é um fenômeno complexo e constitui um problema de difícil solução, pois coexistem elementos subjetivos e estruturais intangíveis através de uma intervenção setorizada; e outros fatores passíveis de sofrerem interferência por meio da articulação de ações simples. Portanto, para enfrentar esse problema, é necessário saber quais devem ser essas ações e como devem ser articuladas. Para tanto, ao tecer reflexões sobre um programa voltado para jovens, faz-se necessário analisar como as transformações sociais, culturais e econômicas compõem-se de práticas, valores e relações que constituem a moderna condição juvenil. Dentre as consequências dessas transformações evidencia-se, ao realizar as análises desta pesquisa, que hoje não há um vínculo linear entre educação e o mundo do trabalho. A necessidade do jovem em aproveitar as oportunidades que aparecem frente às incertezas e demandas provenientes de seu contexto, faz surgirem diversas variáveis na sua vivência e relação como o mercado de trabalho. E este, por apresentar-se como o único meio de promover a subsistência e alcance da dignidade do jovem, passa a ser um fim e uma necessidade desejada. Porém, a frequente situação de não adequação a esse mercado desencadeia processos de vulnerabilidades sociais, que se agravam quando esse estado persiste. Não obstante, a inserção ou não no mercado de trabalho, ou mesmo o tipo de ocupação neste tornam-se cada vez mais incertos. Nesse contexto, a busca por uma qualificação que permita o acesso às ocupações no mercado de trabalho torna-se a principal motivação do jovem ao aderir à proposta do Projovem Urbano. Ao observar e analisar que quase não há qualificação oferecida para grupos com baixa e/ou nenhuma escolaridade, reforça-se a ideia de que a qualificação profissional oferecida pelo programa passa a ser o principal motivador para sua aderência a ele. Entretanto, torna-se necessário enfatizar que a percepção predominante da equipe pedagógica e da coordenação é de que a motivação primeira dos jovens para aderirem ao programa é a bolsa-auxílio ofertada, que o que os move é seu condicionamento por serem tutelados por meio de programas e bolsas advindos do governo. Porém esse benefício é observado também como um fator dificultador quando ocorrem falhas em seu recebimento. 154 Observa-se que o Projovem apresenta uma proposta que amplia a estrutura de oportunidades, mas se apresenta incipiente diante das necessidades exigidas pelo mercado de trabalho e frente à não reversão da situação de inclusão marginal. Pondera-se que é um começo, mas percebe-se que o programa tem limitações na tentativa de reversão da condição de submissão ao instituído. Demonstra-se, assim, a necessidade de continuidades e de limites de sua ação enquanto opera como uma política pública de inclusão isolada e focalizada. Além disso, o interesse pela juventude ainda convive com o desconhecimento e o descaso. Para obter novos avanços e evitar retrocessos, o caminho viável pode ser a promoção da participação e, dessa forma, possibilitar por meio de um processo baseado nos valores da gestão social o entendimento desses sujeitos, sob a visão e perspectiva dos mesmos, de suas demandas, necessidades e expectativas, que se apresentam determinadas pelas condições socioeconômicas e territoriais em que vivem. Para isso, é necessário dar voz, principalmente, a sujeitos advindos de grupos mais vulneráveis e excluídos, para que possam ser contemplados com políticas que não tenham um caráter meramente assistencialista. Deve-se considerar que, quanto mais expostos a situações recorrentes de degradação e destituição de direitos, enquanto cidadãos e seres humanos, menos representatividade esses sujeitos possuem para expor suas demandas. Portanto, para que se possa atingir as reais necessidades e demandas desses grupos ou segmentos sociais, de forma a viabilizar intervenções que provoquem, de fato, um processo emancipatório; torna-se premente a participação desses sujeitos. Assim sendo, as políticas públicas direcionadas para jovens em situação de vulnerabilidade social necessitam fornecer mecanismos para que eles possam ter voz e ser realmente considerados sujeitos de direitos, adquirindo e tomando forma verdadeiramente transformadora para que se efetive a sua cidadania. Assim, ao dar voz aos jovens, foram identificadas as seguintes observações: Evidencia-se que há limitação das possibilidades desses jovens em concluírem seus estudos através de outra modalidade ofertada pela rede pública. Então, o fator que se destaca no programa são as estruturas de apoio ofertadas em consonância com as necessidades dos jovens, possibilitando estratégias para a permanência no programa, como: o auxílio financeiro oferecido, a sala de acolhimento, o transporte, o atendimento da assistente social. Além disso, surge a necessidade da flexibilização do horário de funcionamento, diversificando-o de forma a ampliar o atendimento a outros alunos, com o objetivo de possibilitar que alguns consigam o que é apontado como necessário para a permanência no programa: conciliar o emprego e a escola; 155 Enfatiza-se que a forma como o poder público disponibiliza os recursos é que os torna ineficazes e determina a relação do programa com os beneficiários. A frustração ocorre quando algo é prometido e não é cumprido, gerando, assim, desconfianças e descrença no jovem, consequentemente potencializando sua desmotivação em participar do programa; Identifica-se a falta de apropriação pelos demais atores da escola ao programa e o entendimento desses jovens como sujeitos de direitos e de sua condição juvenil. Destaca-se, portanto, a necessidade de uma integração e participação maior de todos os envolvidos na escola, a fim de evitar, desse modo, novamente, situações que convergem para a exclusão desse aluno do ambiente escolar; Evidencia-se a questão das instituições que promovem apoio e notoriedade a esses sujeitos e propiciam articulações no sentido de possibilitar sua permanência no programa. Nesse sentido, a família, considerada em seus diversos arranjos, ganha destaque, contudo essa dimensão não é contemplada no programa como uma articulação e parceria a ser trabalhada. Destaca, também, a necessidade do acompanhamento e visão de outras áreas de conhecimento, como a Psicologia. A escola também aparece como uma instituição de apoio, pois através dela se observa um meio para o alcance da sua necessidade mais imediata, que é a renda através de uma ocupação; Destaca-se que as mudanças como troca de professores e de escola provocam a sensação de instabilidade e propiciam descrença e desmotivações. Essa quebra dos vínculos formados enfraquece o que os alunos ressaltam como uma das motivações para continuarem a participar do programa, que são justamente os vínculos criados; Ressalta-se que a junção dos núcleos, fato que em si não constitui um problema, mas cujas consequências dificultam a permanência de alguns alunos no programa. Salienta-se também que a junção dos núcleos diminui a abrangência territorial do programa no município, reduzindo, assim, seu poder de alcance. Ao analisar as percepções e sentidos que os atores envolvidos no processo de formação e apoio têm a respeito do jovem e do programa, aparecem vários elementos que corroboram alguns fatos apontados pelos jovens, e também surgem novas evidências e dimensões por eles não contempladas. Assim, destaca-se nas análises realizadas: 156 Divergências entre a estrutura necessária para a operacionalização do programa e a estrutura apresentada pela escola impõem circunstâncias que aparecem como comprometedoras para o alcance dos objetivos do programa. Nesse sentido, evidencia-se que, observada a importância que a qualificação profissional adquire no programa, a falta de espaços, equipamentos e recursos que viabilizem a abordagem prática nas aulas de qualificação compromete a apropriação e a ampliação das possibilidades de aprendizagem. Esse fato poderia ser solucionado, em parte, por meio de parcerias com empresas e demais instituições voltadas para o ensino profissionalizante, desde que tais parcerias se apresentem adequadas à proposta e às concepções do Projovem. Nesse sentido, destaca-se a possibilidade de ampliação da diversificação de qualificações ofertadas pelo programa através da articulação com o Pronatec; Falta de um local apropriado para o cuidado e acomodação dos filhos dos alunos que seja condizente com as orientações para a implementação das salas de acolhimento; Falta de autonomia local, que é apontada como um dos fatores que poderia favorecer uma maior dinamicidade do Projovem e sua adequação à realidade local. Assim, dentre outras considerações, destaca-se: o material didático e a limitação imposta ao professor em oferecer sugestões e mudanças a serem realizadas no material conforme a realidade de seus alunos e construídas a partir dos saberes dos alunos; o distanciamento entre a linguagem abordada no material e a realidade dos alunos; Falta de apropriação do município das concepções do Projovem Urbano e do movimento necessário de articulação com as demais políticas já existentes, o que o torna uma ação isolada. Tal fato é observado como falta de direcionamento da própria política no sentido de explicitar as obrigações e atribuições dos demais setores para a efetivação das articulações necessárias; Falta de adequação da escola as necessidades dos jovens impostas pela sua condição juvenil, causando frustração profissional e a sensação de incapacidade dos educadores ao não conseguirem mobilizar os jovens de forma a evitar que eles evadam. Ao abordar a participação no programa, enfatiza-se que esta tem que ser fomentada como um processo educativo e contínuo a ser desenvolvido e realizado de forma gradativa, e 157 proporcionar a mobilização dos sujeitos por meio de abertura de espaços de discussão e debates. Nos relatos dos educadores e da equipe pedagógica, a escuta dos alunos é realizada de maneira informal, sem privilegiar uma elaboração consciente e crítica dos alunos. Portanto, a participação deve se apresentar como prática incorporada e expandir esse movimento para além dos muros da escola. Para tanto, torna-se relevante propiciar aos alunos a participação no planejamento da equipe pedagógica através de representantes e incorporar, como prática do programa, a sistematização de discussões e análises elaboradas a partir da opinião dos alunos sobre o Projovem. Ressalta-se que as discussões e análises serviriam para direcionar melhor as ações a serem tomadas em conjunto, não somente aquelas endereçadas aos jovens, possibilitando melhorias e propiciando um sentimento de corresponsabilidade e a percepção de aprendizado mútuo, além de, como já abordado, oportunizar mecanismos que garantam o exercício e o fortalecimento da cidadania através de uma participação ativa e crítica. As divergências observadas nos relatos dos entrevistados entre as percepções dos alunos, equipe pedagógica e coordenação fortalece a afirmação de que a participação dos beneficiários através de sua vocalização reduz a ineficácia das ações voltadas para esse público e promove um senso de corresponsabilidade. Dessa forma, evita-se a imposição de decisões pautadas na tutela do indivíduo, que coíbem a emancipação desses jovens. Além disso, ao serem incorporados mecanismos de participação dos atores envolvidos, permite-se viabilizar uma permanente reflexão sobre as dimensões que constituem a condição juvenil e orientar ações públicas na elaboração de estratégias para enfrentar os diversos desafios frente às questões que afetam a juventude, em um processo contínuo de aprendizado. Dessa forma, as ações e procedimentos devem ser pautados na emancipação do ser humano, de modo a proporcionar igualdade de oportunidades que conduzam ao desenvolvimento local. De acordo com o Atlas de Desenvolvimento Humano no Brasil 2013, há uma parcela considerável de jovens no município na faixa etária contemplada pelo Projovem Urbano que ainda não concluíram o Ensino Fundamental. Assim, enfatiza-se a importância de iniciativas como esta frente à realidade local com relação aos jovens. Entretanto, desde a primeira entrada no município, observa-se que a procura pelo programa diminuiu a cada entrada, apesar de os coordenadores perceberem a existência de uma demanda muito grande de potenciais alunos. Essa redução no número de entrantes pode ser analisada como a perda de força de sua visibilidade política percebida pela ênfase midiática dada ao longo das entradas, ou seja, a preocupação governamental em divulgá-lo parece ter diminuído ao longo dos anos. Aliada a essa questão, a mudança de gestão por causa da mudança do governo municipal faz com o programa passe por um processo contínuo de resignificações e construções. 158 Por fim, espera-se que este estudo possa contribuir para que se produza uma análise que inspire caminhos e alternativas frente a esse complexo fenômeno da evasão no Projovem Urbano, assim como suscitar novas indagações que possam, de alguma forma, colaborar para o fortalecimento e desenvolvimento da ação pública voltada para jovens, especialmente no município de Betim. 159 REFERÊNCIAS ATLAS DO DESENVOLVIMENTO HUMANO NO BRASIL 2013. Município de Betim (MG): Educação - Escolaridade. Disponível em: <http://atlasbrasil.org.br/2013/pt/consulta>. Acesso em: 3 set. 2013. IBOPE INTELIGÊNCIA. Pesquisa Satisfação Betim 2010: Job 10084, Estudo Quantitativo. Betim: IBOPE INTELIGÊNCIA, 2010. Disponível em: <http://nossabetim.org.br/wordpress/wpcontent/uploads/2012/02/PesquisasatisfacaoBetim_2010.pdf>. Acesso em: 10 out 2012. LEÃO, G. M. P. A gestão da pobreza juvenil: uma análise de um programa Federal de inclusão social para jovens pobres. In: REUNIÃO DA ANPED, 27., Caxambu (MG), 21 a 24 de novembro de 2004. Disponível em: <http://cgca.com.br/userfiles/file/Uma%20analise%20de%20um%20programa%20%20Anpe d.pdf>. Acesso em: 12 jun. 2012. LIMA, Aparecida de Cássia Oliveira. Análise da evasão do Projovem Urbano no município de Betim: vocalização dos atores envolvidos. 2014. 161 p. Dissertação (Mestrado em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento Local) – Centro Universitário UNA, Belo Horizonte, 2014.