Política social e economia política brasileira na era Lula1
Elaine Rossetti Behring2
[email protected]
Sandra Oliveira Teixeira3
Luana Siqueira 4
Giselle de Souza 5
Tainá Conceição6
Wagner Florentino 7
Aline Abreu8
Modalidad de trabajo:
Eje temático:
Palabras claves:
Resultados de investigaciones
Políticas Sociales y desarrollo en el contexto neoliberal y los
desafíos para el Trabajo Social
política social, política econômica, orçamento público,
neoliberalismo
A América Latina tem sido o cenário de várias experiências caracterizadas de uma
maneira geral como um giro à esquerda, após três décadas – desde a experiência chilena
com Pinochet – nas quais o sub-continente foi campo de experimentação das orientações
neoliberais (Vilas, 2008). Numa aproximação mais rigorosa, é evidente que há mais
diferenças que identidades entre as trajetórias recentes de países como a Venezuela,
Equador, Bolívia, Argentina, Nicarágua Chile e Brasil. O presente trabalho não tem a
pretensão de realizar um estudo comparado, tendo em vista observar a validade dessa
caracterização, o que demandaria um estudo muito mais amplo. Esta comunicação é
produto do acompanhamento que vimos realizando do orçamento público brasileiro e de
processos que envolvem a relação entre política econômica e política social neste país de
dimensão continental, fortemente desigual. Procuramos apontar alguns limites de
interpretações que advogam a existência de um giro à esquerda no Brasil. Tal impressão
– já que não há qualquer fundamento factual e científico nesta caracterização - funda-se
provavelmente no forte componente simbólico da eleição de Lula, em 2002. Vindo do
movimento operário do ABC paulista e do processo de redemocratização após 20 anos de
1
Ponencia presentada en el XIX Seminario Latinoamericano de Escuelas de Trabajo Social. El Trabajo Social en la
coyuntura latinoamericana: desafíos para su formación, articulación y acción profesional. Universidad Católica
Santiago de Guayaquil. Guayaquil, Ecuador. 4-8 de octubre 2009.
2
Coordenadora do Grupo de Estudos e Pesquisas do Orçamento Público e da Seguridade Social - GOPSS e Docente da
Universidade do Estado do Rio de Janeiro – Brasil – CNPq/CAPES.
3
Doutoranda – GOPSS - FSS/UERJ.
4
Doutoranda – GOPSS - FSS/UERJ.
5
Mestranda – GOPSS - FSS/UERJ.
6
Mestranda – GOPSS - FSS/UERJ.
7
GOPSS - IC-FSS/UERJ.
8
GOPSS - IC-FSS/UERJ.
1
Ditadura Militar, Lula mobilizou fortes expectativas, mas após oito anos, a experiência real
de governo não se traduziu em políticas que aprofundassem reformas democráticas no
país, ampliando significativamente o acesso a direitos, numa perspectiva de emancipação
política e humana.
1- Opção por uma política econômica nos mesmos parâmetros do período anterior
Um dos principais limites à possibilidade histórica de um giro à esquerda no Brasil
foi o aprofundamento do ajuste fiscal, substrato do Plano Real9, diga-se, a continuidade
da política econômica. Segundo Carvalho, os eixos básicos da economia brasileira e que
condicionam os demais aspectos residem no gerenciamento da dívida pública,
especialmente após o ataque especulativo de 1998, com fortes impactos no exercício
seguinte – 1999 – advindos do acordo firmado com o FMI. Naquele ano, além de absorver
os prejuízos do setor privado com a crise cambial, para evitar o aumento contínuo da
dívida em contexto de altas taxas de juros, “a opção foi gerar superávits primários
expressivos e elevar a carga tributária, tudo para pagar os custos do endividamento”
(2007:100). Para este autor, tese que compartilhamos, aí reside a essência do
continuísmo da política econômica de Lula. O parâmetro para esta afirmação é o de que o
Governo Lula assumiu a intensificação da produção do superávit primário, elevando-o
para 4,25% em seu primeiro mandato. Na verdade, esse mecanismo de prestação de
contas ao mercado financeiro e agências de definição de risco vem retendo recursos
públicos que poderiam ser destinados a investimentos e políticas sociais. Ele permanece
sempre acima do percentual fixado desde a sua criação, como se pode observar na
tabela 1. Com o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), lançado no segundo
mandato do Governo Lula, uma pequena parte desses recursos passou a ser destinada a
um fundo específico de investimentos no PAC, o que reduziu o superávit primário para
3,75%. No entanto, os balanços divulgados a respeito desse programa mostram que os
investimentos têm sido pífios. Desde seu lançamento, apenas 15% dos recursos previstos
foram efetivamente aplicados, mantendo o Governo Lula longe de qualquer característica
desenvolvimentista, como se estivesse realizando o sonho de Celso Furtado, afirmação
de seus mais ardorosos apologetas. Vejamos o impacto do superávit primário em alguns
anos estudados pela pesquisa:
9
O Plano Real, plano de estabilização econômica implementado no Brasil desde 1994, com Fernando Henrique Cardoso no
Ministério da Fazenda e, e especialmente, na Presidência da República a partir de 1995, combinou controle da inflação,
moeda forte e ajuste fiscal (incluindo a partir de 1999 o chamado superávit primário). A partir desse período aprofunda-se o
que caracterizamos como uma contra-reforma do Estado (Behring, 2003).
2
Tabela 1
Superávit Primário
Retenção de
% do Recursos em Valores
Correntes (violes de
PIB
R$)
1999
3,19
31
2001
3,64
43,6
2003
4,32
66,1
2004
5,76
81,1
2007
3,98
101,6
Fonte: FBO, 2004 e MPOG (indicadores fiscais)
Outro mecanismo do Plano Real e que canaliza recursos para o superávit primário
atingindo diretamente a seguridade social é a Desvinculação de Receitas da União
(DRU). Trata-se de um instrumento de política econômica que retira 20% de impostos e
contribuições, estas últimas compondo as receitas da seguridade social. Contudo, atinge
também outras políticas sociais financiadas pelo orçamento fiscal, a exemplo da
educação, reforma agrária, dentre outras.
Este mecanismo de manipulação orçamentária foi prorrogado por recentes
decisões tributárias do Congresso Nacional, que extinguiu a CPMF (fonte da seguridade
que vinha sistemáticamente sendo canalizada para o ajuste fiscal), mas mostrou-se
extremamente resistente a mudanzas no que se refere à DRU, Esta foi mantida, numa
rara unanimidade entre a “oposição” e a “situação” no parlamento brasileiro, o que mostra
sua importância para a política fiscal brasileira. A incidência da DRU nos recursos da
seguridade social tem sido nefasta, fazendo com que a mesma transfira recursos
crescentes para o mercado financeiro, já que as fontes da seguridade - as contribuições
sociais - vêm tendo um desempenho crescente em termos de arrecadação, em especial a
COFINS, e estão sendo apropriadas para a formação do superávit primário e pagamento
de serviços da dívida pública. A DRU também interfere na produção contábil do tão
difundido déficit da previdência, política social freqüentemente indicada como a grande
vilã das contas públicas no Brasil. A DRU constitui-se numa estratégia de transferir
recursos do orçamento da seguridade social para o orçamento fiscal, tendo em vista o
pagamento de dívida ou a contenção do recurso para a formação do superávit primário.
Este expediente inicialmente justificado em nome do pagamento de encargos trabalhistas
3
da União e financiamento de ações em saúde e educação passa a ser progressivamente
utilizado para o pagamento da dívida. Vejamos seu impacto em 2004, transformando
uma situação superavitária em deficitária:
Resultado da Seguridade Social 2004 (Receitas e Despesas)
Total de Receitas
Despesa
Total
213.153.563,00
da
Seguridade
Ajustada
230.798.014,00
Resultado Seguridade
-17.644.451,00
DRU
29.812.683,00
Resultado da Seguridade Ajustada +
DRU
12.168.232,00
Fonte: BGU 2004
Outro aspecto que atesta a direção político-econômica e social, na contramão de
qualquer perspectiva gauche é a proposição de uma contra-reforma tributária que ataca
frontalmente a seguridade, a educação e as políticas voltadas ao mundo do trabalho, a
exemplo do seguro-desemprego, dentre outras, ao invés de estabelecer um sistema de
tributação progressiva sobre a riqueza e a propriedade. Senão, vejamos. Uma das
principais características do sistema tributário brasileiro é a sua regressividade. Ele tem
impacto sobre os trabalhadores, realizando uma punção dos salários (principalmente,
realizando uma super exploração do trabalho, já que dele já foi extraída a mais-valia que
compõe o excedente) e da mais-valia socialmente produzida e que se transforma em
lucros, juros e renda da terra. Essa capacidade extrativa compõe o fundo público, cuja
alocação será disputada no âmbito da correlação de forças entre as classes e seus
segmentos na sociedade civil e no Estado. Disputa, claro, fortemente desigual.
Do ponto de vista da capacidade extrativa, o fundo público no Brasil é composto
por tributação indireta (impostos sobre o consumo), em 58,7%%. Isso significa que
apenas 25,2% % incidem sobre a renda e 3,4% sobre o patrimônio. (Salvador, 2007), ou
seja, sua incidência principal recai sobre os trabalhadores.. A carga tributária brasileira
4
cresceu nos últimos anos de 29% em 1994, primeiro ano do Plano Real, para 35,8% do
PIB (dado de 2009), o que mostra que o neoliberalismo não construiu no Brasil nenhum
Estado mínimo. Para Salvador (2008) vem ocorrendo já há alguns anos uma contrareforma tributária silenciosa que desonera o capital e a propriedade e onera a renda,
sobretudo as baixas rendas. Seu estudo revela que a carga tributária incidiu mais sobre
as rendas de 1 a 3 salários mínimos do que sobre as rendas de 30 salários mínimos.
Então, a reforma tributária que o Brasil precisa, e que seria uma política de esquerda, é
aquela que vai redistribuir renda no país de maior concentração de renda do mundo,
financiar políticas sociais consistentes, universais e redistributivas, atacar a iniqüidade da
distribuição funcional da renda no Brasil, e não apenas o coeficiente de Gini tão
comemorado e que considera as desigualdades entre os assalariados revelados na PNAD
e não a desigualdade entre a renda do capital e do trabalho 10; impor os princípios da
eqüidade, da progressividade e da capacidade contributiva, no caminho da justiça fiscal e
social e não o da neutralidade, que aponta o Estado como um ente que não deve invadir
as relações de mercado.
A PEC 233/2008, proposta de “reforma” tributária do Governo Lula, não é uma
reforma. Seu principal objetivo é a simplificação tributária e não o enfrentamento das
questões que apontamos anteriormente e porque não reverte recursos para as políticas
sociais, pelo contrário atinge as fontes das políticas de seguridade social, de educação e
do trabalho, colocando a seguridade numa condição de insegurança de financiamento
ainda maior que a de hoje.
Na boa síntese de Salvador
(2007): “os três tributos mais relevantes que
financiam a seguridade social no Brasil serão modificados. A Cofins e a CSLL serão
extintas e haverá desoneração da contribuição patronal sobre a folha de pagamento, por
meio de legislação específica, após as mudanças constitucionais. Para a seguridade
social passam a ser destinados 38,8% do produto da arrecadação dos impostos sobre
renda (IR), produtos industrializados (IPI) e operações com bens e prestações de serviços
(IVA-F).” Ele continua: “essa modificação é o sepultamento da diversidade das bases de
financiamento da seguridade social inscrita no Artigo 195 da Constituição de Federal (CF)
de 1988, que ampliou o financiamento da previdência, saúde e assistência social para
10
Essa reflexão sobre o Índice de Gini é corroborada por Pochmann, quando afirma que este “mede fundamentalmente a
realidade da desigualdade social nointerior da renda do trabalho, deixando de fora, portanto, as outras formas de renda que
mais têm crescido no Brasil, como lucros, juros, renda da terra e aluguéis. Dessa forma, a desigualdade de renda e riqueza
no Brasil tem sido maior, sobretudo quando a política monetária do governo federal garante uma renda mínima para cerca
de 20 mil clãs parentais por meio do pagamento dos juros da dívida pública” (2007:77). Análises na mesma direção
podemos encontrar em Gonçalves e Filgueiras (2007) e Fiúza (2008)
5
além da folha de salários, incluindo, a receita, o faturamento e lucro”. Então, “ restará
inscrito no Art. 195 da CF, como base de financiamento da seguridade social, a
contribuição sobre a folha de salários, a contribuição do trabalhador para a previdência
social e a receita de concursos e prognósticos, sendo que a contribuição sobre folha de
pagamento deverá ser reduzida ao longo dos próximos anos”. Tem-se, assim, um
retrocesso à situação anterior a Constituição de 1988, que marcou a volta ao regime
democrático. Está em perspectiva a perda da exclusividade de recursos para a
seguridade social, fragilizando seu financiamento. Como se sabe, a seguridade social é o
núcleo central da política social do Estado. O mesmo autor11 ainda chama a atenção para
o fato de que “a desoneração da folha de pagamento via a redução da contribuição
patronal para a previdência social, conforme Projeto Lei a ser envidado 90 dias após
aprovação da PEC, vai significar uma perda de R$ 24 bilhões para previdência social.
Não existe nenhuma previsão de substituição desta contribuição por outro tributo no
financiamento
da
previdência.
Além
do
enfraquecimento
da
solidariedade
no
financiamento da previdência social, um compromisso historicamente construído no
Brasil.” A maior tragédia para a seguridade social que se enuncia é a de que “mesmo que
seja garantido um repasse à seguridade social com base em parte do orçamento fiscal,
vão deixar de existir as receitas próprias da seguridade social prevista em orçamento
exclusivo, como determina a Constituição Federal. Com o tempo, a noção de separação
da seguridade social vai-se desvanecer. As políticas sociais da saúde, assistência social e
previdência terão que disputar recursos e enfrentar pressões no âmbito do orçamento
fiscal, com os governadores e prefeitos, pois a base tributária será a mesma que é
partilhada com os estados e municípios.”
Dados da ANFIP referentes ao ano de 2007 mostram que o corte de R$ 36 bilhões
em receitas da CPMF (extinta pelo Congresso contra a posição do governo) mais a
subtração de quase R$ 39 bilhões, pelos efeitos da DRU, extrapolam facilmente os R$ 61
bilhões de superávit do Orçamento da Seguridade. Os cinco tributos a serem extintos pela
PEC (CIDE, COFINS, CSLL, PIS, salário-educação/FNDE), deverão alcançar um
montante de R$ 154 bilhões em 2008. Essas receitas são vinculadas exclusivamente a
fundos sociais que financiam as políticas da Seguridade Social, educação e trabalho e
trabalho no Brasil. No contexto da crise do capital que se arrasta desde 2007, essas
tendências regressivas tendem a se ampliar, principalmente por mecanismos como a
11
Evilásio Salvador é hoje uma das principais lideranças do Fórum Brasil de Orçamento e do Movimento em defesa dos
Direitos Ameaçados pela Reforma Tributária no Brasil.
6
renúncia fiscal para estimular os investimentos e sob o argumento de proteger o emprego.
O PAC já pressupunha essa direção, des-financiando a seguridade social, a exemplo da
alíquota 0% de COFINS para o setor de tv digital, dentre outros expedientes. Esse tem
sido o caminho: desoneração dos automóveis, do material de construção, etc.
Portanto, trata-se de uma opção econômica que não realiza qualquer trânsito para
uma perspectiva redistributiva, de fortalecimento da autonomia e de diminuição efetiva da
desigualdade social. Pelo contrário, há uma espécie de gestão da pobreza coexistindo
com o deleite do capital que rende juros, segmento mais beneficiado por essa política
global. Vejamos os impactos para a política social.
2 – E a Política Social?
A política econômica do governo Lula tem como contra face uma política social de
caráter focalista e reducionista, da qual é representante central o Programa Bolsa Família.
Neste sentido, as políticas sociais no governo Lula – assim como nos governos
precedentes
de
Fernando
Henrique
Cardoso
–
sofrem
sucessivos
ataques,
fundamentalmente a Seguridade Social que por meio de contra-reformas, tem sido alvo
de cortes orçamentários que traduzem-se na focalização das ações e na baixa efetividade
das políticas e programas para a grande maioria da população dependente da provisão
do Estado.
Neste contexto, de um lado, prevalece programas e políticas pobres para pobres,
cada vez mais voltadas à população mais pauperizada, e de outro, políticas ofertadas no
mercado para quem pode financiar sua reprodução. A exemplo disso, temos a previdência
privada, via fundos de pensão, bem como, no âmbito da saúde o crescimento dos planos
de saúde; ampliação das universidades privadas, incentivadas pelo Prouni 12, dentre
outras políticas.
Na prática, um expediente eficaz de contra-reformar a Seguridade Social, como se
viu antes, é a DRU que repassa bilhões de recursos subtraídos das políticas sociais para
alimentar o chamado rentismo por meio da formação de superávits primários. Tal
mecanismo possibilitou o repasse de bilhões de reais das políticas sociais para o grande
capital e, por isso, a classificamos como um tipo de programa de transferência de renda
para os rentistas (Antunes e Gimenez, 2007) já que transfere recursos das políticas
12
O amplo processo de privatização das políticas sociais no governo Lula envolve desde as Fundações Estatais de Direito
Privado (Cf. Granemann, 2007) até o Reuni, ambos formas de direcionar o fundo público para atenção às necessidades de
acumulação do capital.
7
sociais destinadas à classe trabalhadora para o pagamento de juros da dívida. O fundo
público passa a ser canalizado de forma direta para alimentar o mercado financeiro.
O orçamento da Seguridade Social, quando deflacionado, apresenta crescimento
vegetativo ao longo de toda uma década (de 1997 a 2007), na qual a previdência e saúde
mostram-se estagnadas, do ponto de vista orçamentário. A tabela a seguir mostra o baixo
crescimento do financiamento da Seguridade, que se acompanhado de acordo com o
crescimento populacional denotará um pífio desempenho.
Orçamento da Seguridade Social entre
1997 e 2007 – R$ Bilhões
LOA
BGU
1997
1999
2001
2004
2007
283.4
247.9
289.6
257.9
263.4
262.1
296.1
269.7
365.8
328.7
Fontes: LOA e BGU dos Exercícios citados
Valores Deflacionados – IGP-DI
A despeito deste processo, tem-se um aumento crescente da alocação de
recursos na função assistência social, com grande destaque para o Programa Bolsa
Familia, que mesmo em meio à crise atual não sofreu cortes em 2009, enquanto a
educação, por exemplo, sofreu contingenciamento de 10,6% dos recursos previstos
(equivalente a 1,3 bilhões de reais)13. Assim, o PBF, “menina dos olhos” do atual governo,
foge à regra da maioria das políticas sociais do atual governo, as quais sofrem constantes
contingenciamentos e incertezas quanto a alocação de recursos.
Observa-se então uma ligação direta e estreita entre a política econômica que
privilegia o pagamento de juros e o Programa Bolsa Família. A política do governo Lula
agrava ainda mais a já gigantesca dívida pública que drena cada vez mais recursos do
Estado, e considerando o já dito sobre a relação entre trabalhadores e carga tribbutária.
Por isso ganham enorme espaço os programas de transferência de renda focalizados já
que são políticas estratégicas, de grande poder ideo-político e relativamente “baratas” em
seu custeio em relação ao investimento em políticas sociais universais, além do seu
caráter transitório porque não inscrito na Constituição: ou seja, não se configura como um
directo asegurado. Os programas de transferência de renda, segundo Gonçalves e
Filgueiras (2007) são a contra face das políticas econômicas baseadas no superávit fiscal
primário. Com “a falta de recursos devida aos exorbitantes gastos com juros, consegue-se
13
Dados divulgados em O Globo do dia 31 de março de 2009.
8
um pequeno montante de recursos públicos para prover uma pequena bolsa para a
população mais pobre” (Antunes e Gimenez, 2007, p.67).
Os recursos cada vez maiores destinados ao pagamento da dívida pública são
subtraídos das políticas sociais, fundamentalmente, da Seguridade Social por meio da
DRU e “sobra” aos governos – para combaterem o agravamento da questão social e
possíveis tensões que culminem em insubordinação da parcela da população que vive
nas condições mais precárias – operar com programas focalizados, de baixíssimo alcance
e valores pífios.
Tais políticas têm efeitos muito limitados, pois pagam um montante mensal muito
abaixo do salário mínimo - também este já muito baixo - e não “resolvem” ou enfrentam o
problema da concentração de renda – dada a regressiva carga tributária – e da
transferência de renda em valores que dignifiquem e não simplesmente reproduzam o
lugar da miséria.
Assim, como forma de garantir a rentabilidade do capital, opera-se em dois
sentidos: com a diminuição dos custos do trabalho, liberando um contingente crescente
de trabalhadores, ao mesmo tempo em que os direitos sociais são duramente atacados.
Logo, os efeitos para as classes subalternas são os mais danosos possíveis, tanto
econômicos quanto políticos.
A política econômica do governo Lula imprime uma política social na contramão do
que define a Constituição Federal e denota o caminho seguido por um governo que está
longe dos interesses da classe trabalhadora. O giro à esquerda tão esperado, portanto,
não se configurou.
9
Bibliografía
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Brasil - Notas sobre os Juros Altos e o Bolsa-Família. Carta Social e do Trabalho
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POCHMANN, Márcio. Gasto Social, o Nível de Emprego e a Desigualdade da Renda do
Trabalho no Brasil IN: SICSÚ, João (Org.) Arrecadação de onde vem? Gastos Públicos
para onde vão? Rio de Janeiro, Boitempo, 2007.
Trabalhos publicados pelo Grupo de Estudos e Pesquisas do Orçamento Público e da
Seguridade Social, da Faculdade de Serviço Social da UERJ, resultados da Pesquisa
Fundo Público e Seguridade Social em desenvolvimento desde 2006
10
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