Marinha do Brasil Escola de Guerra Naval Curso de Política e Estratégia Marítimas Curso de Estado-Maior para Oficiais Superiores II Seminário de Geopolítica do Petróleo e Direito Internacional: “aspectos geopolíticos contemporâneos, determinantes jurídicos e perspectivas brasileiras”. Prof. João Eduardo de A. Pereira [email protected] Petróleo e Gás Natural: aspectos geopolíticos contemporâneos e perspectivas brasileiras. INTRODUÇÃO. • 1. Quando se fala em energia nesta primeira década do século XXI, as referências obrigatórias continuam a ser o petróleo e o gás natural, pois montam a cerca de 60% da matriz mundial. E, desde o final dos anos 1990, essa indústria verdadeiramente global vêm mostrando uma forte instabilidade em seus preços. Em 1999, por exemplo, o barril de WTI (NYMEX) foi de Us$ 12 a Us$ 27,00, ou seja, mais de 100 %. Em 2006, já superavam os Us$ 60,00. As cotações chegaram a US$ 140,00 em 2008. Caíram para cerca de US$ 40,00 ao longo dos primeiros meses de 2009. Em 2010, já se encontram novamente em patamares superiores aos US$ 70,00. • 2. A formação dos preços do barril petróleo e do m3 de gás não decorre do jogo do livre-mercado, em razão da influência da geografia e da política. Petróleo e gás natural são recursos territoriais, sendo que as maiores reservas não estão localizadas nas economias centrais e dependentes do abastecimento regular de energia, e sim em nações periféricas, que podem, pelo menos em tese, exercer forte poder de controle da oferta em nível internacional. Diplomacia e pressão militar fazem parte da história dessa indústria. • Obs: questões sobre marcos regulatórios não são objeto desta apresentação. Petróleo e Gás Natural: aspectos geopolíticos contemporâneos e perspectivas brasileiras. 3. A estrutura da indústria do petróleo e do gás natural demonstra, desde os tempos do apogeu da Standard Oil, elevado grau de integração vertical, e norteia-se pela busca de economias de escalas. Em termos espaciais, trata-se de uma indústria que faz inversões gigantescas em infra-estrutura (dutos, portos, refinarias), provoca externalidades negativas que não se limitam aos seus entornos, e depende do livre fluxo pelos oceanos e mares. O gigantismo dessa indústria conduz à concentração do poder econômico e a práticas lesivas à livre-concorrência. O Estado tende, com isso, a intervir. 4. Se há Estado, há geopolítica. Não há como traçar cenários para a evolução próxima dos mercados de energia, sem a análise de cenários estratégicos. 5. Para o Brasil, a capacidade de atração de investimentos no setor de produção de petróleo e de gás natural, dados os custos elevados de prospecção em alto mar, passa por sua valorização estratégica, em virtude do baixo risco geopolítico, pelo menos até a presente conjuntura, em relação a outras importantes regiões produtoras mundiais. 6. A Sociedade brasileira, sendo o Estado um de seus compartimentos, em consequência, deve se preparar para ocupar uma posição de maior destaque na geopolítica energética continental e mundial, em que pese a crescente relevãncia estratégica do Atlântico Sul para a segurança do abastecimento de energia, em especial dos EUA, num futuro próximo? Petróleo e Gás Natural: aspectos geopolíticos contemporâneos e perspectivas brasileiras. ASPECTOS GEOPOLÍTICOS CONTEMPORÂNEOS. 7. A propósito, poderia o Estado ficar alheio a uma indústria que tem uma cadeia produtiva bastante diversificada e uma grande capacidade de geração de empregos e impostos? Em países como os do Golfo Pérsico, a propósito, o setor de energia responde por mais de 80% dos seus PIB’s. Mesmo nas desenvolvidas economias dos EUA e da UE, essa participação se aproxima dos 20 %. No Brasil, é de cerca de 5%, mas deverá atingir a níveis semelhantes até 2020. Mas, qual deve ser o grau de intervenção do Estado no setor de energia? E na indústria de petróleo e de gás natural mais precisamente? 8. Uma rápida visualização do consumo energético mundial nos mostra mais uma vez o significado estratégico da indústria do petróleo e do gás natural para as diversas nações. • Obs: As proporções presentes nos dados para 1999 não se alteraram desde então de modo significativo. Petróleo e Gás Natural: aspectos geopolíticos contemporâneos e perspectivas brasileiras. • Consumo Energético Mundial (1999): • 400 quads (quad = um quadrilhão de unidades termais / Inglaterra ou BTU’s) • ou 200 milhões de barris/dia • • • • • • Petróleo – 40 % (ou 75 milhões de barris/dia) Gás Natural – 22 % Carvão Mineral - 24 % Geração Nuclear – 6 % Hidreletricidade e Outras Fontes (Renov.) – 8 % Adaptado de ECONOMIDES, M. e OLIGNEY R.. “The Color of OIL”. 2000: Katy, Texas. Round Oak Publishing, Inc., p. 06. Petróleo e Gás Natural: aspectos geopolíticos contemporâneos e perspectivas brasileiras. 9. Em 2020, a previsão do DOE/EUA é de um consumo energético de 612 quads, o que corresponde a 300 milhões de barris/dia. 10. Já na década de 2010, o consumo de petróleo superará os 90 milhões de barris/dia. Mas há uma taxa de exaustão de 10 % a.a.. Isto significa ter de ativar ou de reativar 100 milhões de novos barris/dia. Especialistas entendem que os investimentos necessários somaram somente na última década cerca de Us$ 1 trilhão. A questão é saber como o mercado financeiro internacional proporcionará tais recursos (e a que custo?) no ambiente da crise que se impôs a partir de 2008. 11. Em termos de consumo de petróleo, teremos uma taxa de crescimento de 1,8 % a.a. até 2020. Cresceu a 2,0 % a.a. nos anos 1990, apesar da “Crise Asiática” em 1997. Na crise decorrente do mercado “sub-prime”, a demanda caiu 2,47 milhões de bbl por dia. Num cenário de recuperação da economia global, não parece ser difícil que a demanda volte a consumir o saldo atual. 12. Em termos de gás natural, 3,3 % a.a. até 2020. Crescimento das taxas de utilização do gás natural, em virtude de novas tecnologias de liquefação e transporte, além do seu potencial emprego como matériaprima para obtenção do hidrogênio. Petróleo e Gás Natural: aspectos geopolíticos contemporâneos e perspectivas brasileiras. • 13. Às incertezas quanto à capacidade de elevar a produção em taxas anuais que garantam uma situação de maior segurança às principais economias do mundo, somamse os outros aspectos importantes da atualidade, de caráter claramente geopolítico: Petróleo e Gás Natural: aspectos geopolíticos contemporâneos e perspectivas brasileiras. • transformação do mercado de petróleo e gás natural num mercado de “commodities”, acompanhando uma tendência do mercado de energia como um todo, após a Crise dos Anos 1970. À medida em que esses mercados passaram a ser parte de mercados de futuros, a instabilidade inerente aos mercados financeiros passou a estar presente no setor de petróleo e de gás natural. • b. desvalorização do dólar norte-americano frente ao euro. • c. introdução de novas tecnologias, inclusive em setores de informação, tanto no “up” quanto no “down stream”, incorporando novos atores a esse mercado. • d. perspectiva de elevação nos próximos anos da importância relativa da produção da OPEP, em virtude dos campos de petróleo das novas regiões produtoras dos anos 1980, a exemplo do Mar do Norte, estarem próximos do seu ápice ou mesmo já terem ultrapassado esse ponto. Petróleo e Gás Natural: aspectos geopolíticos contemporâneos e perspectivas brasileiras. • e. Crescimento de tensões políticas internas em países da OPEP que podem desestabilizar o mercado, a exemplo da Arábia Saudita (25% das reservas mundiais de petróleo), aonde setores da população começaram a questionar a aliança desse país com os EUA, após a “Guerra do Golfo”, em 1991. O futuro da teocracia iraniana (8,6% das reservas de óleo) e os desdobramentos da República Bolivariana de Hugo Chávez (7,4%) são outros exemplos relevantes. • f. Falência do processo de paz entre palestinos e israelenses, difusão ampla no mundo islâmico de concepções fundamentalistas acompanhadas por um sentimento antiocidental (senão, anti-americano). • g. Aumento da instabilidade política internacional após os atentados de 11 de Setembro de 2001, a campanha do Afeganistão e os efeitos ainda presentes do unilateralismo de Bush na ocupação do Iraque. Será que Obama mudará de fato a política externa americana? Ficará na retórica? Petróleo e Gás Natural: aspectos geopolíticos contemporâneos e perspectivas brasileiras. PERSPECTIVAS BRASILEIRAS. 14.Um cenário de efetivo desenvolvimento da economia do petróleo e do gás natural no Brasil se relaciona à visão do Atlântico Sul como crescente fornecedor ao “Ocidente”, tendo em vista descobertas de mega-campos em águas profundas de ao longo da última década, tanto no litoral sul-americano quanto sul-africano. 15. O acesso a essa nova produção é importante para os EUA alcançarem objetivos estratégicos, em relação ao Mundo Islâmico; e, mesmo em relação aos seus aliados europeus e japoneses. A super-potência vencedora da Guerra Fria, numa perspectiva realista, procura controlar aspirantes à condição de potência mundial em sua autonomia estratégica, reduzindo o potencial de que venham a ser capazes, num prazo não muito dilatado, de rivalizar com o poderio do Estado norte-americano. 16. Isso fica patente no chamado “novo grande jogo”. A presença militar norteamericana no “heartland”, isto é, no interior da massa eurasiática, após o 11 de Setembro, e a sua permanência no Oriente Médio e no Golfo Pérsico permitem àquela super-potência controlar o acesso da União Européia, da China, da Índia, do Japão ao abastecimento regular de petróleo e gás natural, além de isolar a Rússia. Os norte-americanos também patrulham as águas internacionais por onde passam petroleiros que abastecem mercados e sociedades em todo o mundo. Assumem os custos financeiros, diplomáticos e militares da segurança energética das demais potências mundiais... E cobram por isso! Petróleo e Gás Natural: aspectos geopolíticos contemporâneos e perspectivas brasileiras. CONCLUSÕES: . A indústria do petróleo e do gás natural continuará a ser uma das principais no século XXI. . A perspectiva de elevação da demanda mundial, conjugada às dificuldades de crescimento da produção, parece estar gerando um incremento das tensões entre Estados e uma elevação do nível de risco para as empresas e as economias como um todo. . O Brasil tornou-se um “player” no cenário geopolítico do petróleo e do gás natural a partir da flexibilização do monopólio estatal e do potencial das reservas do pré-sal (há estimativas de produção superiores a 4 milhões bbl em 2020). Os riscos geopolíticos em outras regiões produtoras são talvez mais elevados do que os que o país apresenta na atualidade. Isso valoriza o Brasil, mas traz desafios aos formuladores das políticas externa e de defesa, entre os quais: como conciliar princípios constitucionais de cooperação e defesa da paz internacional com uma relevante presença num mercado caracterizado por monopólios, cartéis, deslealdades e externalidades negativas em escala global, sem contar inúmeras guerras, conflitos (com aspectos de choques civilizacionais) e por pressões diplomáticas e militares das potências do Ocidente. Petróleo e Gás Natural: aspectos geopolíticos contemporâneos e perspectivas brasileiras. Ásia: o novo grande jogo. Fonte: capturado do sítio do jornal” Le Monde Diplomatique”.