Desafios para a Indústria Eletroeletrônica 95 O texto aponta as características das áreas da indústria eletroeletrônica no país e os desafios que este setor tem enfrentado ao longo das últimas décadas. Apesar de ainda haver grande dependência de insumos importados, o setor eletroeletrônico tem obtido resultados positivos com expectativas de crescimento significativo e geração de emprego. F undada em 1963, a Abinee - Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica - representa o setor eletroeletrônico brasileiro, tendo por missão assegurar o seu desen- volvimento competitivo, a defesa de seus legítimos interesses e sua integração à comunidade. Hoje, mais de 600 indústrias nacionais e internacionais, dos mais diversos portes e segmentos, estão associadas à Abinee e seu faturamento representa cerca de 4,8% do PIB brasileiro. Em função da grande diversidade de linhas de produto, as indústrias estão distribuídas em dez áreas de negócio: Automação Industrial; Componentes Elétricos e Eletrônicos; Equipamentos Industriais; Geração, Transmissão e Distribuição de Energia Elétrica; Informática; Material Elétrico de Instalação; Telecomunicações; Serviço de Manufatura em Eletrônica; Sistemas Eletroeletrônicos Prediais e Utilidades Domésticas. Entre os produtos fabricados por essas indústrias estão os aparelhos telefônicos (celulares e fixos), compressores herméticos, computadores, componentes elétricos e eletrônicos, motores elétricos, auto-rádios, 97 transformadores, equipamentos para automação comercial e industrial, disjuntores, plugues, tomadas, alarmes, câmeras de segurança etc. Para melhor compreensão, as áreas da indústria eletroeletrônica podem ser segmentadas em dois grupos, tendo como referência o nível tecnológico dos produtos, os processos de produção e a capacidade competitiva. No primeiro grupo estão os bens da área elétrica, como Equipamentos Industriais; Geração Transmissão e Distribuição de Energia Elétrica; Material Elétrico de Instalação e bens de consumo elétricos (linha branca e eletrodomésticos portáteis), que são produtos considerados de tecnologia madura. O segundo grupo refere-se aos bens da área eletrônica, caracterizada por rápido desenvolvimento tecnológico, sistemático lançamento de novos produtos e constante inovação. Neste caso, enquadram-se as áreas de Automação Industrial; Componentes Eletrônicos; Informática; Manufatura em Eletrônica; Sistemas Eletroeletrônicos Prediais; Telecomunicações e bens de consumo eletrônicos. A tecnologia dos produtos da área elétrica é acessível e as mudanças são relativamente lentas. Neste caso, as condições de competitividade estão diretamente atreladas à capacidade de gerenciamento de custos e à competitividade do próprio País. Assim, esses setores industriais são especialmente afetados pelo chamado ‘custo Brasil’, representado pelos impostos e taxas, que ainda representam um fator limitativo para o seu desempenho. A partir da abertura da economia, no início da década de 90, as dificuldades competitivas das indústrias motivaram investimentos prioritariamente na gestão das empresas, ficando para segundo plano a ampliação e implantação de novos projetos industriais. As demandas por novos produtos foram atendidas, em grande parte, por importações muitas vezes realizadas pelas próprias indústrias. 98 Placa de computador A partir de 1999, essa indústria foi particularmente beneficiada pela desvalorização cambial que acabou contribuindo para ganhos de competitividade, tanto no mercado interno como no mercado internacional, porém, permaneceram os demais entraves relativos à carga tributária, que ainda oneram os produtos. Para o aumento da competitividade desse setor, a escala de produção também é indispensável para a redução de custos. Portanto, a ampliação do mercado interno é um importante estímulo para o seu desenvolvimento, o que reforça a necessidade de solução das questões referentes à ineficiência do País para motivar novos investimentos. Na área eletrônica, a partir de 1991, os bens fabricados no Brasil passaram por um processo de desnacionalização. O Processo Produtivo Básico - PPB - foi instituído em substituição aos índices de nacionalização, que até então eram exigidos na fabricação de bens finais incentivados ou protegidos por políticas setoriais ou regionais, o que contribuiu para a redução do valor agregado nacional. Foram criadas, também, condições especiais para importação de componentes eletrônicos pelas empresas estabelecidas na Zona Franca de Manaus, com o redutor de 88% nas alíquotas de imposto de importação, gerando desequilíbrio ao fabricante local de componentes partes e peças, diferentemente do que ocorre na maior parte dos países. 99 Esses procedimentos colocaram as indústrias de componentes em desvantagem no mercado, pois possibilitaram aos fabricantes de bens finais importar produtos prontos na forma de CKD (kits de aparelhos completamente desmontados) ou SKD (kits de aparelhos semi-desmontados), inviabilizando o fornecimento das empresas locais, mesmo com preço, qualidade e prazo de entrega competitivos. As conseqüências destes fatos foram: o fechamento de importantes fornecedores do parque eletrônico brasileiro; a dispensa de pessoal altamente especializado e o afastamento da indústria de componentes do processo de desenvolvimento dos produtos. Sabemos que a tecnologia do hardware está, cada vez mais, concentrada nos componentes. Isso significa que o custo do produto final se aproxima da soma do custo dos componentes que o integram. Placa de computador 100 Portanto, sem uma indústria local, que produza uma lista abrangente de componentes em volumes suficientes para atender ao mercado interno e assegure divisas de exportação, não será possível manter indústrias de bens finais competitivas. Por outro lado, a indústria eletrônica vem sendo significativamente prejudicada pelas importações ilegais e pelo chamado mercado cinza, que hoje absorve grande parcela do mercado dos produtos de informática, por exemplo. No caso dos PCs, essa parcela chega a aproximadamente 65% do mercado total. Destaque-se, também, que a disseminação da tecnologia eletrônica tem substituído os produtos de tecnologia madura por outros de tecnologia de ponta, provocando o aumento das importações em detrimento da produção local. Como vimos, o setor eletroeletrônico tem hoje uma grande dependência de insumos importados, especialmente dos componentes eletrônicos, que representam mais da metade das importações do setor. Em 2005, segundo dados preliminares da Abinee, as compras no exterior de produtos atingiram US$ 14,8 bilhões e as exportações ficaram em US$ 7,6 bilhões, gerando um déficit comercial de US$ 7,2 bilhões. Só de componentes elétricos e eletrônicos, foram importados US$ 9,5 bilhões, sendo US$ 2,9 bilhões de semicondutores. Para fazer frente a essa situação, a Abinee tem proposto a implantação efetiva de uma Política Industrial que garanta o fortalecimento e a competitividade da indústria local de componentes e, ainda, seja capaz de atrair para o Brasil fabricantes internacionais de semicondutores e de outros componentes ativos. Também são importantes bandeiras de luta da Abinee a desvalorização do Real, que tem dificultado a competitividade dos produtos fabricados no país, a queda das taxas de juros, hoje ainda em um patamar astronômico, e a complementação da reforma tributária. No nosso 101 setor, essa carga tributária chega, para alguns produtos, a superar 40% do preço ao consumidor, o que desestimula o consumo e a restringe a base de consumidores. Desde o final de 2003, há um ambiente favorável no país, motivado pelo crescimento econômico que está gerando investimentos industriais. Porém, ainda permanece a insegurança para a continuidade desses investimentos em decorrência da crise política e da demora na implementação de programas governamentais, como a própria Política Industrial. Apesar de todas as dificuldades, em 2005, o setor eletroeletrônico registrou faturamento de R$ 94 bilhões, que representou um crescimento nominal de 15% (real de 8%) em relação ao faturamento de 2004. O resultado foi alavancado pelo crescimento nominal de 30% da área de Telecomunicações, em função do excelente desempenho da telefonia celular, tanto no mercado interno como no externo. O setor deverá encerrar o ano empregando 133,6 mil trabalhadores, nível pouco superior a dezembro de 2004. Recente levantamento da Abinee apontou que a expectativa de crescimento nominal do setor para 2006 é, também, de 15%, com o faturamento atingindo cerca de R$ 108 bilhões. O crescimento real, já descontado o efeito da inflação, deverá ser da ordem de 9%. A forte valorização cambial, embora não tenha afetado de forma clara as exportações, estimulou as importações, acirrando a concorrência com os produtos locais. Entre os setores mais afetados, está o de Componentes, cujas importações cresceram 22% em relação a 2004. O crescimento do setor está sendo sustentado, principalmente, pelo desempenho das áreas de Telecomunicações; Informática e Automação Industrial. 102 Estação de Tanguá – Embratel - Itaborai - RJ 103 Também estão contribuindo a consolidação do programa PC para Todos, a ampliação do combate à pirataria e ao mercado cinza, e a continuidade no aumento das exportações. Por conta do elevado déficit da balança comercial de produtos do setor eletroeletrônico, a Abinee tem reiterado seus pleitos junto ao Governo brasileiro no sentido de estimular o desenvolvimento tecnológico, o crescimento da produção, a geração de empregos, a expansão das exportações e a substituição competitiva das importações, pois o Brasil não poderá continuar financiando indefinidamente os crescentes déficits na balança comercial de produtos do setor. Entre os pleitos está a iminente implantação do sistema de TV digital. No nosso entender, independentemente do sistema a ser escolhido, deveria considerar, como contrapartida, a instalação no País de empresas fabricantes de componentes, partes e peças voltados para esta a área, visando o atender a demanda interna e a exportação. A atração e desenvolvimento da indústria de componentes, além de ser estratégico para o futuro do complexo eletroeletrônico brasileiro, permitirá reverter a tendência crescente das importações. É sempre oportuno reafirmar, também, que não se trata de substituir importações a qualquer preço. Trata-se de atender aos parâmetros de preços, qualidade e prazos de entrega de um mercado globalizado. Propomos, também, o aperfeiçoamento dos critérios para fixação dos Processos Produtivos Básicos - PPB -, da Lei de Informática e da Zona Franca de Manaus, com o objetivo de elevar o valor agregado da produção nacional. Defendemos que se estimulem, cada vez mais, os investimentos em pesquisa, desenvolvimento e inovação tecnológica, estabelecendo prioridades compatíveis com as necessidades de mercado. 104 Indústrias - Zona Franca de Manaus Outro pleito importante da Abinee é para que haja uma ação firme dos órgão públicos de fiscalização no combate à importação e comercialização de produtos falsificados e demais práticas desleais de comércio. Por fim, continuamos lutando por uma política industrial abrangente que dê respaldo às empresas aqui instaladas, que atraia novos investimentos e que permita o desenvolvimento sustentado do País. Reafirmamos, assim, nossa opção pelas indústrias que acreditam e investem no Brasil, que melhoram a qualidade de sua produção, que agregam valor aos seus produtos e que geram emprego e renda. Ruy de Salles Cunha Presidente da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (ABINEE) www.abinee.org.br 105