ESTRATÉGIA APRENDIZACIONAL
Paulo Cesar de Araujo Barcellos
PEP/COPPE/UFRJ - Centro de Tecnologia, sala F-108, Rio de Janeiro, RJ
CEP.:21945-970 - E-mail: [email protected]
This paper presents a new strategy concept demanded by the organizations in the current
paradigm of the knowledge, promoting the development of strategies through learning and for
learning.
Área: Estratégia e Organizações
Key-words: strategy, planning, learning
1- Introdução
Nossa intenção com este trabalho é aproveitar o Encontro Nacional de Engenharia de
Produção, que tem como tema “a engenharia de produção e o futuro do trabalho”, para
apresentar este novo conceito de estratégia que estamos desenvolvendo como proposta de tese
de doutorado no Programa de Engenharia de Produção da COPPE/UFRJ.
Portanto, vale ressaltar que não trata-se de um novo neologismo criado para despertar uma
nova onda e/ou moda no mundo das organizações, mas uma tentativa de melhor expressar a
efetiva função da estratégia, que precisa estar, cada dia mais, associada à aprendizagem,
revitalizando-se e retroalimentando-se, mantendo seu dinamismo, sua flexibilidade, sua
criatividade, sua inovatividade, sua adaptabilidade, sua praxis etc..
Com o passar dos tempos temos aprendido uma série de expressões associadas ao conceito de
estratégia, como: estratégia organizacional, estratégia de manufatura, estratégia corporativa,
estratégia institucional, estratégia competitiva e muitos outros. Mais do que organizar,
manufaturar, corporativizar, institucionalizar, competir etc., a principal função da estratégia é
aprender. Aprender a definir-se em conformidade com sua visão de futuro, aprender a buscar as
melhores alternativas possíveis para chegar lá, aprender a agrupar e distribuir da melhor forma
os recursos, aprender a operacionalizar-se e implementar-se. Enfim, aprender a aprender ser
uma estratégia efetiva e contemporânea. Daí, vem a idéia de não chamá-la, por exemplo, de
estratégia (organizacional) de aprendizagem, pois além de uma estratégia voltada para o
aprendizado, a estratégia aprendizacional tem como função, não menos importante, esta autoaprendizagem necessária a contunuidade e evolução do conceito.
Assim, esta proposta possibilita a criação de um círculo virtuoso, no qual a aprendizagem é a
base e o veículo para o contínuo desenvolvimento da estratégia, que por sua vez estará, cada
vez mais voltada para a promoção da aprendizagem.
Este casamento entre estratégia e aprendizagem, no qual o desenvolvimento de uma das partes
é alimentado pela outra, aparece como o elo perdido do processo de transformação da
estratégia ( de seu planejamento ) em ações ( implementação ).
Bethlem ( 1998 ) chama a atenção para esta questão do processo de aprendizagem e mais
especificamente para o processo de aprendizagem de estratégia, já no início de seu livro - uma
das mais atuais e completas publicações brasileiras sobre estratégia empresarial - com um
capítulo sobre aprendizagem e estratégia, no qual afirma que o que se executa,
voluntariamente, é antes aprendido e cooptado. Para executar algo, o ser humano precisa ter
conhecimentos, habilidades e atitudes necessárias e suficientes. No linguajar de hoje, significa
aprender, ou seja, internalizar e saber utilizar conceitos, constructos, técnicas, processos etc.,
pertinentes à ação que se vai realizar.
Assim, segundo o autor, o conceito de estratégia e as ações relativas a ele - planejamento,
elaboração, execução, implantação, acompanhamento, controle, avaliação etc. - têm que ser
ensinados aos atores e serem não só aprendidos, como também adotados por eles como válidos
e úteis.
Levy ( 1992 ) afirma que o processo de aprendizagem que caracteriza a análise estratégica é o
que permite determinar o efeito atual das decisões do passado e o efeito no futuro das decisões
atuais.(...) É o ingresso do futuro na forma como hoje raciocinamos. Em seguida, o autor faz
algumas colocações sobre a importância da aprendizagem para a estratégia, como veremos
a seguir:
• É também o que torna a estratégia flexível. Consiste na revisão permanente de suas
suposições básicas, através da crítica permanente de cada suposição empregada, desde as
surgidas de cálculos quantitativos até as da imaginação criativa.
• O processo de aprendizagem permite que a estratégia faça suposições sobre o futuro de um
meio em rápida mudança, onde o ciclo vital dos produtos vai se encurtando a uma
velocidade crescente, enquanto aumentam os tempos empregados em Pesquisa e
Desenvolvimento, e os investimentos. A fertilização tecnológica produz, também, impactos
em cada vez mais indústrias, fazendo com que seus meios imediatos se sobreponham e se
tornem cada vez mais vulneráveis ao cenário geral.
• O processo de aprendizagem permite antecipar e inventar melhores e mais eficientes
métodos e programas de ação. A nosso ver, a empresa é um sistema aberto, dinâmico e
complexo, econômico-técnico-social, onde a estratégia dirige o intercâmbio com o meio
para que seja eficiente, eficaz, viável e coerente.
• A empresa deverá aprender cada vez mais rapidamente, e com maior intensidade, a adaptar
seus processos de raciocínio e de ação à pressão do meio.
• O conceito de aprendizagem pode ser entendido como a possibilidade de compreender sinais
e símbolos do meio antes e melhor. Está incluído no conceito de "flexibilidade", já que dele
depende a possibilidade de inovação
• Está incluído no conceito de "estabilidade", pois é encontrar, frente a desequilíbrios no meio,
os produtos que consigam melhor relação entre a criação de valor e a exposição ao risco.
Na realidade, o conceito de desenvolvimento equivale ao de aprendizagem, em que a
empresa busca configurações de recursos para "antecipar-se" aos impactos das
transformações do meio. É a rotina de antecipar-se flexivelmente à ruptura.
Se, no passado, finaliza o autor, a empresa se comportava rigidamente, ou no melhor dos
casos, adaptativamente, ajustando sua conduta às mudanças no meio e logo ajustando sua
capacidade à sua conduta, a estratégia deve ser aplicada para inverter essa seqüência. Deverá
ser empregada para projetar sistemas estratégicos; não para substituir a inovação criativa, mas
para sustentá-la com maior análise e interpretação de informação.
2- Demanda por uma nova proposta de estratégia
Vivemos em um ambiente de intenso dinamismo tecnológico, decorrente fundamentalmente da
evolução da (micro)informática e das (tele)comunicações, que muitos têm chamado “era do
conhecimento” ou “era da informação”, na qual a aprendizagem necessária a importação e
transformação das informações em conhecimentos, e sua posterior gestão passa a ser fator
básico para o sucesso das organizações.
Inicialmente, aproveitamos para esclarecer uma confusão conceitual que não raramente
costuma aparecer em diversas publicações, artigos, trabalhos acadêmicos etc., que é a distinção
entre informação e conhecimento. Informação não é conhecimento. A informação precisa ser
selecionada, processada, trabalhada, apreendida, criticada etc., para poder transformar-se em
conhecimento. O conhecimento sim, é que passa a ser tido como principal fator de produção,
sobrepondo-se aos clássicos: terra, capital e trabalho, que embora sobreexistam, deixaram de
ser decisivos, conforme é bem ilustrado por Moreira Neto ( 1995 ), a seguir :
No que toca a terra, os exemplos da pequena Suíça, com o maior per capta da atualidade, e do
Japão, que se tornou a segunda potência econômica, sem grandes espaços aráveis e sem
riquezas minerais expressivas, bem mostram que seu valor reduziu-se de muito na fórmula do
progresso. No que se refere ao trabalho, a criação de empregos sem qualificação não traz
melhoria qualitativa para a economia; é a educação dos jovens para trabalhos que exijam
conhecimentos que proporciona o salto qualitativo. Também no que diz respeito ao fator
capital, tão enfatizado no passado recente, tudo indica que continuará a ser necessário, mas o
capitalismo sobreviverá ... sem os capitalistas.
Stewart ( 1998 ) pergunta: O que há de novo? Simplesmente o fato de a gerência de ativos
intelectuais ter se tornado a tarefa mais importante dos negócios, porque o conhecimento
tornou-se o fator mais importante da produção.
Organizações de negócios no estilo antigo não gerenciam bem o conhecimento - não foram
projetadas para tal. Hoje, as empresas precisam aprender a gerenciar o conhecimento.
3- Demanda por uma estratégia aprendizacional
Isto passa a exigir um amplo processo de mudança que precisa necessariamente ser direcionado
por uma também nova proposta estratégica a ele associada. De nada adiantaria iniciar um
processo de mudança sem que este esteja associado a uma estratégia aprendizacional, que
garanta o contínuo desenvolvimento da estratégia e promova a aprendizagem necessária.
Como afirmam McGill & Slocum Jr ( 1995 ), as organizações precisam aprender processoschave que as capacitem a fazer a diferença, e não apenas realizar mudanças. As organizações
precisam se tornar mais inteligentes. As organizações têm que aprender. O fator crítico com
que a maioria das organizações se depara não é o que mudar, mas o que e como aprender.
Diante desta demanda, vemos as empresas com a missão de transformarem-se em organizações
de aprendizado - Learning Organizations, pois a capacidade de aprender tem sido
reiteradamente apontada por especialistas em management como a mais importante fonte de
vantagem competitiva sustentável para as empresas, capacidade esta que precisa ocorrer de
forma coletiva e não fragmentada. Esta capacidade de aprendizagem coletiva passa a ser o
principal veículo para a criação de um futuro de sucesso para as organizações.
Segundo Thurbin ( 1995 ) learning organization, também chamada de organização aprendiz, é
aquela que aperfeiçoa seus conhecimentos e entendimento de si mesma e do ambiente com o
passar do tempo, facilitando e utilizando o aprendizado dos membros que a compõe.
Senge ( 1990 ) vê as organizações aprendizes como entidades nas quais as pessoas podem e
realmente expandem suas capacidades de criar os resultados que verdadeiramente desejam. O
pensamento novo e expansivo é encorajado e os indivíduos aprendem juntos. Várias
ferramentas derivaram das noções de criatividade e inovação como surgimento e desafio de
modelos mentais, construindo uma visão compartilhada e criando os processos onde possa
existir o diálogo aberto e livre dos riscos.
4- Planejamento ( participativo ) aprendizacional
Analisando estas demandas até aqui apresentadas pode-se perceber facilmente que estas não se
coadunam com visão estratégica e/ou com o modelo de planejamento estratégico tradicional,
no qual ocorre a distinção entre o planejador e o executor.
Conforme crítica de Matus ( 1996 ), o planejamento tradicional, inicialmente uma simples
técnica de projeções econômicas, que gradualmente se transformou em planejamento do
desenvolvimento econômico e social, se inclui no campo do determinismo positivista simples,
sem rigor científico, restringindo-se ao econômico, ignorando o mundo da política e das
relações e subjetividades. (...) Nada é menos rigoroso do que ignorar as subjetividades que a
realidade reconhece e toda explicação contém, para refugiar-se na falsa assepsia do diagnóstico.
Desta forma, apresentamos o planejamento ( participativo ) aprendizacional como alternativa
democrática a este diagnóstico autoritário feito pelo “planejador tradicional”. Apenas através
da participação democrática dos atores envolvidos, podemos diminuir esta utilização da
subjetividade. Não podemos mais pensar em uma administração associada a modelos
decadentes nos quais a participação é substituída por mecanismos autoritários de controle e
manutenção do “poder”, muitas vezes encobertos por um discurso participativo.
A fase do administrador “heróico” que carrega nos ombros o peso das responsabilidades já
passou. Bradford e Cohen (1985) falam de um modelo “pós-heróico”, baseado na co-gestão da
responsabilidade, maior participação do grupo nas decisões, na criação de equipes coesas com
um tônus generalista para que cada membro enxergue além do limite estreito de sua área
especializada. Só assim é possível estimular a interação profissional e humana, de forma que
todos possam se sentir comprometidos com os objetivos por eles divisados.
Até que ponto os empresários pedem participação, mas o que querem na verdade limita-se a
colaboração dos empregados no alcance de seus interesses? Até que ponto os empresários
estão dispostos a correr o risco de perder um pouco de seu “poder”, distribuindo-o com seus
empregados?
Visualiza-se melhor o “poder” quando se o entende como uma comunicação entre as pessoas,
na busca de horizontes comuns, tomando decisões compartilhadas para seguir um determinado
caminho. Segundo nosso entendimento, a comunicação, a interação de pessoas e grupos e as
decisões compartilhadas, ou tomadas coletivamente, são as únicas maneiras de legitimar o
poder, tanto para mantê-lo quanto para criá-lo no seio da prática social.
Na primeira acepção - de mandar e obedecer - o poder se disfarça, não raras vezes, em
manipulação, persuasão e cooperação. E nas suas formas mais drásticas de expressão ele
aparece com a roupagem de força, punição e violência. Os subordinados (e seguidores)
suspendem seu próprio julgamento, discernimento e vontade e seguem o que lhes é dito. O que
lhes é ditado pelo líder, pelo chefe, pelo superior. Não é só na raiz da palavra, mas é igualmente
aí que se pode encontrar a raiz da ditadura.
Esta proposta de planejamento aprendizacional, em conformidade com o conceito de estratégia
aprendizacional, precisa necessariamente ser participativo. Para melhor entendimento da
proposta, é necessário primeiramente o aprendizado do conceito de participação ao qual
estamos nos referindo.
Segundo Gandin (1988 ), temos 3 níveis de participação:
• Ao primeiro nível damos o nome de COLABORAÇÃO. É a participação em seu primeiro
estágio. As pessoas são convocadas a colaborar na execução de um “projeto”, de uma idéia,
de uma decisão definida por uma pessoa.
• O segundo nível de participação é o que podemos chamar de DELEGAÇÃO DE PODER.
Temos aí um nível mais avançado de participação. Quem detém o poder divide um pouco de
seu poder com outra pessoa.
Embora seja um nível maior de participação, a estrutura básica de poder permanece
intacta.(...). O poder é distribuído como concessão ou benesse.(...) Continua havendo o que
pensa e o que executa. Nesse nível ainda é comum a mentalidade do “tarefeiro”, o
cumpridor de tarefas, que executa o que os outros decidiram. Ou manda fazer o que os
outros mandaram que ele mandasse.
• O terceiro nível de participação é o da CONSTRUÇÃO CONJUNTA. Esse princípio
exige, para a sua vivência, que se coloque em prática [ como diz o próprio nome ] a
construção conjunta. Esse nível quebra a dicotomia planejador x executor.
Assim percebemos que através da construção conjunta, o trabalho resgata sua dimensão
totalizante. Como poderia haver uma efetiva motivação do trabalhador se este era excluído da
construção de seu trabalho e relegado a realizar um trabalho repetitivo e especificado por
terceiros?
A motivação, como sabemos, é intrínseca ao trabalhador, não havendo portanto motivação
externa, nem mesmo motivação prévia, antes da prática ou fora dela. Como afirma Freire (
1986 ), é como se, primeiro, se devesse estar motivado para, depois, entrar em ação! Essa é
uma forma muito antidialética de entender a motivação. A motivação faz parte da ação. É um
momento da própria ação. Isto é, você se motiva à medida que está atuando, e não antes de
atuar.
Em síntese, a participação é inerente à natureza social do homem, tendo acompanhado sua
evolução desde a tribo e o clã dos tempos primitivos, até as associações, empresas e partidos
políticos de hoje. Neste sentido, a frustração da necessidade de participar constitui uma
mutilação do homem social. Tudo indica que o homem só desenvolverá seu potencial pleno
numa sociedade que permita e facilite a participação de todos. O futuro ideal do homem só se
dará numa sociedade participativa. ( Bordenave, 1983 )
Portanto, percebemos que esta proposta participativa inerente ao planejamento estratégico
aprendizacional, possibilita um efetivo ambiente de aprendizagem coletiva, garantindo o
comprometimento de todos na fase de implementação das estratégias
Associado a este conceito participativo, desenvolvemos também uma proposta metodológica
voltada para sua utilização, contida no conceito de planejamento estratégico ( participativo )
aprendizacional, como alternativa às ditas “modernas” e/ou tradicionais propostas de
planejamento estratégico.
Devido ao fato de tratar-se uma proposta em desenvolvimento, até porque, sendo baseada na
aprendizagem autônoma e contínua, é dinâmica e constantemente sujeita a novos aprendizados,
assim como, à limitação de oito páginas de tamanho para cada trabalho, deixamos a
apresentação de seu planejamento, metodologia etc. para uma outra oportunidade, na qual
possamos realizar um debate aberto e também dinâmico.
5- Bibliografia
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organizacional. Ed. Campus. RJ.
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GANDIN, D. (1988) Escola e transformação social. Vozes, Petrópolis, In: Cruz, C.H.C.
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THURBIN, P.J. ( 1995 ) Implementando a organização aprendiz. IMAM.SP.
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