PAULO ROBERTO COSTA SUBSIDIOS PARA A DISCUSSÃO DE PARADIGMAS REFERENTES AO HOMICIDIO NA CONDUÇÃO DE VEÍCULO AUTOMOTOR Belo Horizonte 2008 PAULO ROBERTO COSTA SUBSIDIOS PARA A DISCUSSÃO DE PARADIGMAS REFERENTES AO HOMICIDIO NA CONDUÇÃO DE VEÍCULO AUTOMOTOR Monografia apresentada ao curso de Especialização em Transportes e Trânsito do Programa de Pós-Graduação Lato Sensu do Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais – CEFET/MG, como requisito parcial à obtenção do título de Especialista Orientador: Professor Juracy Ventura Belo Horizonte 2008 FOLHA DE APROVAÇÃO Na data de ______ de _______ foi realizada a sessão de avaliação final da Monografia. A questão do Homicídio na Condução do Veículo Automotor – análise dos institutos jurídicos do homicídio na condução do veículo automotor, visando traçar diretrizes que facilitem a identificação de elementos que possam prevenir e combater o número assustador de homicídios no trânsito brasileiro, vigente do aluno Paulo Roberto Costa. Componentes da Banca: Professor(a) (nome e assinatura) Professor(a) (nome e assinatura) Orientador: Professor Juracy Ventura DEDICATÓRIA (á Maria José Faria Costa) Você que viveu de maneira tão intensa cada minuto de minha luta, nessa minha jornada acadêmica. Você, mãe, amiga, embora invisível aos meus olhos, não se fez ausente ......... Sua presença a todo instante me inspirou, me ensinou, me ouve e até em certo momento me consola pela nossa separação. Seu exemplo de vida, suas lutas, suas conquistas, suas vitórias, seu sorriso permanente e seu permanente bom-humor, hão de sempre me acompanhar em minha jornada e sempre me servido de lição de vida. A sua maneira peculiar de saborear a vida trouxe para mim a exata convicção de que nossa missão é a de viver com intensidade cada segundo, atribuindo a ele o valor do presente dado por Deus. A saudade que sinto de você não e vazia: é repleta de amor e gratidão por toda sua dedicação – e que ainda com toda certeza, me dedica, pois para o amor, não existe distância e nem perda. Só com sua partida consegui entender que, para aqueles que verdadeiramente amam, como te amo e como você me ama, não existe adeus, mas até logo. Até um dia, mãe Maria. Seja feliz ........ AGRADECIMENTO O primeiro agradecimento é feito a meus pais Raimundo Liberato Costa (in memorian), Maria José Faria Costa (in memorian) pela oportunidade de vida e pelos ensinamentos ministrados. O meu segundo agradecimento vai para minha família que soube compreender as dificuldades que passei para conseguir atingir este objetivo. Também, e com muita satisfação que encontro nestas poucas linhas a oportunidade de agradecer aos meus professores da Faculdade de Direito, cujo apoio foi fundamental para adquirir confiança nos momentos em que não sentia absolutamente seguro de manifestar publicamente a minha idéias e comentários. De modo especial aos grandes amigos Professor Marco Antônio Badaró Bianchini, Professor João Batista, Professor Paolo Mazucato e Professor Humberto Macedo. Não poderia esquecer da Diretoria do DER/MG na pessoa do Dr. Fernando Janotti, Dr. Eugênio Botinha, Dr. Mário Campos e Dr. Milton Teixeira Carneiro, pela confiança neste estudo sério voltado para colaborar na melhoria da prestação do serviço público ao cidadão. E por fim, agradecer a todos os colegas em especial a Jackeline, Betânia, Valéria, Geralda, Davdson e Levi, que de forma direta e indireta colaboram na consecução da meta traçada. EPÍGRAFE “Os analfabetos do século XXI não serão os que não souberem ler e escrever, mas os que não souberem aprender, desaprender e reaprender”. Alvim Toffler RESUMO Este estudo objetivou analisar a Legislação Penal vigente, buscando contextualizar a adequação típica do homicídio na condução de veiculo automotor, como forma de fornecer amparo técnico e teórico aos estudantes e operadores do direito que atuam na área do direito penal. Inicialmente fez-se uma análise teórica sobre os conceitos relevantes ao tema em estudo, dissecando-se os diferentes tipos de dolo e culpa, relacionando-os aos entendimentos de prestigiados autores da doutrina pátria. Em um segundo momento foi abordado se a nossa legislação vigente está adequada nos perfis de prevenir e reduzir o grande número de homicídios praticados na condução do veiculo automotor. Os demais capítulos seguintes são dedicados ao estudo pormenorizado da jurisprudência correlacionada à teoria, e se a adequação típica dos homicídios praticados na condução do veículo automotor é suficiente dentro dos princípios da prevenção geral e especial da pena. SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO.................................................................................................. 01 2 DO CRIME DOLOSO..........................................................................................03 3. DO CRIME CULPOSO..................................................................................... 08 4. DA CULPABILIDADE........................................................................................ 11 4.1 DO ACTIO LIBERA IN CAUSA .......................................................................13 4.2 DA EMBRIAGUEZ ...........................................................................................13 4.3 DA LEI 11.705/2008..........................................................................................22 5. DO HOMICIDIO DOLOSO..................................................................................29 6. DO ART. 302 DO CTB........................................................................................31 7. DA JURISPRUDÊNCIA......................................................................................34 8. CONCLUSÃO.....................................................................................................44 9. BIBLIOGRAFIA................ ..................................................................................47 10. ANEXOS...........................................................................................................49 1 INTRODUÇÃO O tema central deste estudo versa acerca do crime de homicídio na condução de veículo automotor, verificando qual o tratamento vem sendo dispensado nesta circunstância. O objetivo geral do estudo é analisar a Legislação Penal vigente, buscando contextualizar a adequação típica do homicídio praticado na condução do veículo automotor O objetivo específico se delimita em analisar se a legislação vigente referente ao assunto estar adequada e se encontra suficientemente munida de recursos para prevenir e reduzir o grande número de homicídios praticados na condução de veículo automotor, e se vem recebendo enquadramento em dolo eventual ou da culpa consciente. O problema levantado: Qual o enquadramento típico dispensado ao homicídio praticado na condução de veículo automotor e será este, dentro de um caráter de prevenção geral e especial da pena, suficiente para conter essa modalidade delituosa? A hipótese do nosso trabalho vai ao encontro da dolosidade eventual, por considerarmos que essa adequação típica é a mais eficiente para conter o grande número de homicídios praticados na condução do veículo automotor. Para tanto, faremos uma analise da jurisprudência pátria, verificando qual o tratamento vem sendo aplicado nos homicídios na condução do veículo automotor nos dias de hoje. A metodologia teve como base a dogmática, analisando a legislação penal no que se refere ao CP, CTB E LEI 11.705/2008 (Lei Seca), bem como a jurisprudência afeta ao assunto. A razão da escolha do tema vincula-se à pretensão de dilatar os conhecimentos acadêmicos do autor e desenvolver percepções e contexto jurídico um tanto quanto novo no cenário atual. Além disso, ter-se-á a condição de mesclar o Direito Penal e de Trânsito, buscando esclarecer todas as mudanças ocorridas na legislação acima descrita, com intuito de efetiva contribuição para futuras discussões diretamente ligadas ao trabalho, sobre os debates que estão surgindo sobre o dolo em crimes de trânsito, bem como a interpretação dos novos dispositivos legais, previstos no Código Penal e Trânsito. 2. DO CRIME DOLOSO Segundo Rui Stoco (2001, p. 98), o Direito pátrio adotou a Teoria da Vontade para definir o dolo como sendo a intenção mais ou menos perfeita de praticar um fato que se conhece contrário à lei. Tanto no dolo como na culpa há ato voluntário do agente, mas no primeiro caso a conduta já nasce ilícita. No dolo o agente quer a ação e o resultado, ou, pelo menos, assume o risco de tal resultado, ao passo que na culpa ele quer a ação, vindo a atingir o resultado por desvio acidental de conduta proveniente da falta de dever objetivo de cuidado. As espécies de dolo são: • Direto (ou determinado): quando o agente visa certo e determinado resultado; • Indireto (ou indeterminado): o agente não se dirige a certo e determinado resultado; possui duas formas: alternativo – a intenção do agente se dirige a um ou outro resultado, como, por ex., quando efetua golpes na vítima com intenção de feri-la ou matá-la; e, eventual – é quando o agente assume o risco de produzir o resultado; consiste na produção de um resultado danoso diante do qual o agente não se detém, embora não o deseje, aceitando-o, porém, como decorrência provável de sua ação. César Dario Mariano da Silva (2006, p. 8) ressalta o fato de que o crime de homicídio pode ser praticado de forma direta ou indireta: No meio direto, como o próprio nome já diz, o sujeito age diretamente sobre o corpo da vítima. Exemplo: facadas, tiros, estrangulamento etc. Já no meio indireto, o sujeito embora não aja diretamente sobre o corpo da vítima, propicia sua morte de outra forma. Exemplo: abandonar a vítima no meio de um deserto ou de uma floresta isolada (César Dario Mariano da Silva, 2006, p. 8). No que concerne ao homicídio praticado com dolo eventual, o sujeito ativo assume o risco de produzir o resultado morte ou ao menos tolera, mesmo que não exista a intenção de matar. A14 divisão do dolo, na tipologia subjetiva é classificada da seguinte forma: • Na Teoria Clássica ou Tradicional: dolo geral e dolo específico (elemento subjetivo do injusto) • Na Teoria Finalista: dolo e elemento subjetivo do tipo Pode-se dizer que o crime doloso, traduz por excelência, um grande desvalor social, vez que demonstra que o agente deliberadamente focava a lesão ao bem jurídico. Assim, conclui-se que dolo é à vontade do agente em realizar o tipo penal, com a intenção de diminuir em valor social relevante, de um bem jurídico penalmente tutelado. Os elementos objetivos do tipo são aqueles destinados à descrição da conduta, sendo esta, juridicamente relevante. Afirma Rogério Greco que “os elementos objetivos do tipo, conforme Jescheck, têm a finalidade de descrever a ação, o objeto da ação e, em sendo o caso, o resultado, as circunstâncias externas do fato e a pessoa do autor! (Rogério Greco, 2003, p. 188)”. Os elementos objetivos podem ser descritivos e normativos. Para Francisco de Assis Toledo, “são objetivos todos aqueles elementos que devem ser alcançados pelo dolo do agente. Dividem-se em descritivos e normativos” (Francisco de Assis Toledo, 1994, p. 153-154). Segundo Rogério Greco, os elementos descritivos e normativos são assim definidos: Elementos descritivos são aqueles que têm a finalidade de traduzir o tipo penal, isto é, de evidenciar aquilo que pode, com simplicidade, ser percebido pelo intérprete, e normativos são aqueles criados e traduzidos por uma norma de que, para sua 14 Stoco Rui. Tratado da Responsabilidade Civil, 2001, p. 98 – Silva César Dario Mariano, 2006, Manual de Direito Penal, p.8 – Greco, Rogério. Curso de Direito Penal, 2003, p. 188, Toledo, Francisco de Assis. Princípios Básicos de Direito Penal,1994, p. 153-154 – Santoro Filho Antônio Carlos. Fundamentos do Direito Penal,2003, p. 40. efetiva compreensão, necessitam de uma valoração por parte do intérprete (Rogério Greco, 2003, p. 188). Destarte, pode-se afirmar que os elementos objetivos descritivos, visam com que o agente conheça todos os dados imprescindíveis à distinção da infração penal. Os elementos normativos, por sua vez: São os constituídos por termos ou expressões que só adquirem sentido quando completados por um juízo de valor, preexistente em outras normas jurídicas ou ético-social (exemplo: ‘coisa alheia’, ‘propriedade’, ‘funcionário público’, ‘mulher honesta’ etc.) ou emitido pelo próprio intérprete (exemplo: ‘dignidade’, ‘decoro’, ‘reputação’ etc.) (Francisco de Assis Toledo, 1994, p. 154). Os elementos descritivos do tipo se diferenciam dos normativos do tipo, uma vez que estes necessitam, para a sua compreensão, de um maior aprofundamento no juízo de valoração jurídico-penal. Para Antonio Carlos Santoro Filho: A pura descrição do fato ou da ação é função reservada aos elementos objetivos do tipo. Os elementos normativos são aqueles que atribuem um sentido, um valor à ação, aos sujeitos do delito, ou às circunstâncias de tempo, lugar, modo e meio de execução (SANTORO FILHO, 2003, p. 40). Destarte, pode-se afirmar que os elementos normativos do tipo, vão além do que dispõe a pura e simples descrição objetiva das condutas, é necessário que haja uma maior valoração daquele, através de normas sociais, morais e mesmo legal, para uma melhor compreensão da figura típica. 2.1 Dolo Eventual No dolo eventual, o agente sabe que o resultado lesivo pode vir a ocorrer, mas age com indiferença, aceitando-o e assumindo o risco de sua produção. Note-se que pa15ra que subsista o dolo eventual é essencial que o agente anteveja a possibilidade do evento danoso (previsibilidade do resultado) e que, ainda assim, demonstre-se indiferente à sua possível produção, como já foi explicado na teoria do assentimento (teorias do dolo). Algumas decisões judiciais identificam o dolo eventual em situações em que não existe o aspecto volitivo de “aceitação” do dano. Estas decisões tentam amparar-se nas teorias da representação ou da probabilidade, que não foram recepcionadas no nosso Código Penal. O professor Bitencourt narra de forma extremamente didática as diferenças entre as teorias da probabilidade e da vontade: Para a primeira, diante da dificuldade de demonstrar o elemento volitivo, o querer o resultado, admite a existência do dolo eventual quando o agente representa o resultado como de muito provável execução e, apesar disso, atua, admitindo ou não a sua produção. No entanto, se a produção do resultado for menos provável, isto é, pouco provável, haverá culpa consciente. Para a segunda é insuficiente que o agente represente o resultado como de provável ocorrência, sendo necessário que a probabilidade da produção do resultado seja incapaz de remover a vontade de agir. Haveria culpa consciente se, ao contrário, desistisse da ação, estando convencido, calcula mal e age, produzindo o resultado. Como se constata, a teoria da probabilidade desconhece o elemento volitivo, que é fundamental na distinção entre dolo eventual e culpa consciente, e que, por isso mesmo, é mais bem delimitado pela teoria do consentimento. Damásio de Jesus assevera que o dolo eventual caracteriza-se pela presença de duas características elementares, a saber: a previsibilidade objetiva, que é a possibilidade do agente antever que a conduta a ser percorrida poderá produzir um resultado danoso (devendo esta previsibilidade se nortear pelo discernimento que um cidadão comum teria na mesma situação); e a anuência do autor para com este possível resultado (indiferença). O ilustre promotor Sznick defende entendimento um pouco diferente. Segundo ele, no dolo eventual, o agente efetivamente quer a produção do resultado, pois, ao antever a possibilidade de sua ocorrência e, ainda assim insistir na conduta demonstra desejo pela produção do resultado. Em suas próprias palavras, No dolo eventual, o agente quer o evento, mesmo que este não seja o objetivo principal de sua conduta, mas o é secundariamente querido, porque consentido. (...) 15 Jesus Damásio, 2001, Direito Penal: parte geral, p. 288 No dolo eventual o resultado é previsto pelo agente não como fim, mas como objetivo secundário, que pode resultar da ação criminal e, inobstante isso, não deixa de realizar a ação. (...) O dolo não é eventual; eventual é o resultado, na sua ocorrência; isto porque o agente ao prever e admitir o resultado, implicitamente o quis. 2.2 Dolo Direto Dolo direto é o dolo propriamente dito. Caracteriza-se pela vontade livre e consciente de um indivíduo de praticar uma conduta tipificada na legislação penal. Com efeito, aquele que desfere um tiro de revólver em outrem, com o intuito de matar essa pessoa, pratica, com dolo direto, um homicídio. 2.1.3. Dolo Indireto Dolo indireto Art. 18, I, 2ª parte do CP - No dolo indireto, o agente não quer diretamente o resultado, porém assume o risco de produzi-lo. A vontade é dirigida à conduta e não ao resultado. O agente prevê o resultado como possível ou provável e, mesmo assim, resolve agir de qualquer forma. A previsão da probabilidade do resultado não demove o agente de atuar, de forma que, assim procedendo, passa a aceitar a sua eventual ocorrência: a superveniência do resultado se lhe torna indiferente. No dolo eventual, portanto, o agente conta seriamente com a possibilidade de produzir o resultado típico, porém, apesar disso, quer agir para alcançar o fim perseguido e se resigna com a eventual produção do resultado. Exemplos: roleta russa, racha, etc. Tratamento penal aos crimes cometidos através de dolo direto e dolo eventual - O Código Penal equipara o dolo direto ao dolo eventual. A doutrina e a jurisprudência entendem, no entanto, que há maior reprovação no crime cometido através de dolo direto, o que poderá ser levado em conta pelo juiz na dosagem da pena. Nem todo crime doloso admite a sua prática através do dolo eventual – Em regra, os crimes dolosos admitem a sua prática através do dolo direto ou do dolo eventual. Excepcionalmente, entretanto, alguns crimes exigem a certeza sobre determinado elemento constitutivo do tipo, afastando o dolo eventual. Exemplo: o crime de receptação dolosa (art. 180, caput) exige que o agente saiba que a coisa adquirida seja produto de crime. 3. DO CRIME CULPOSO Negligência, também conhecida como desatenção ou falta de cuidado ao exercer certo ato, consiste na ausência de necessária diligência, implicando em omissão ou inobservância de dever, ou seja, aquele de agir de forma diligente, prudente, agir com o devido cuidado exigido pela situação em tese. Já a imprudência, ou melhor, imprevidência, tem a ver com algo mais que mera falta de atenção, mas ato que pode revelar-se de má-fé, ou seja, com conhecimento do mal e a intenção de praticá-lo; a ação imprudente é aquela revestida de dolo – a má-fé concretizada -, e portanto, embora não querida pelo agente também não revestida de absoluta ausência de intenção. Melhor explicando, age de forma imprudente aquele que sabedor do grau de risco envolvido, mesmo assim acredita que seja possível a realização do ato sem prejuízo para qualquer um; age, assim, além da justa medida de prudência que o momento requer, excede os limites do bom senso e da justeza dos seus próprios atos. Com relação à imperícia, requer-se do agente a falta de técnica ou de conhecimento, de outra forma, tem-se uma omissão daquilo que o agente não deveria desprezar, pois consiste em sua função, seu ofício exigindo dele perícia – uso de técnica que lhe é própria ou exigível até mesmo pelo seu mister. Referese, por fim, a uma falta involuntária, mas também eivada de certa dose de má-fé com pleno conhecimento de que seus atos poderão vir a resultar em dano para outrem. Assim reunidos temos as ações cometidas pelo indivíduo que podem resultar em dano, não havendo que se falar em boa-fé, nem mesmo de leve relance, posto que a atitude – ou melhor, a intenção – do agente caracterizou-se e enquadrouse dentro de um dos três tipos aqui descritos. 16 16 Nesta mesma condição estudada até aqui, temos que o indivíduo agiu com a intenção, com a vontade livre e consciente de consecução do fim colimado, sem considerar a possibilidade de que sua ação, ou omissão, possa, de qualquer forma e sob qualquer pretexto vir a resultar em dano a outrem, seu semelhante, mesmo que esse outro indivíduo possa de qualquer maneira ter contribuído para tal intento. Ao Estado cabe o interesse de ver mantido os seus interesses que são, via de conseqüência, mas não necessariamente aqueles do interesse coletivo qualquer custo, tendendo de forma mais que exigível a manutenção do equilíbrio do poder, cujo principal e, por que não dizer, indispensável instrumento seja o ordenamento jurídico dentro do qual encontrem-se previstas todas as possibilidades que sejam capazes de gerar efeitos indesejáveis à manutenção deste equilíbrio. A resultante que se delineia aqui é aquela descrita pelo próprio ordenamento jurídico, ou seja, toda a vez que o equilíbrio é perturbado por ato que resulte em dano, deve ser imediatamente restituído, tomando o Estado para si à tutela jurisdicional com o intuito de preservar não apenas o equilíbrio, mas também sua manutenção de forma positiva. O dano, aqui encarado como resultante indesejável e muito menos querida por todos, deve ser reparado sob as formas previstas pela lei sistema positivo seja sob a forma de indenização, seja sob a forma de punição, seja por ambas as formas. 3.1 CULPA CONSCIENTE Culpa Consciente ou Culpa com Previsão De acordo com Bitencourt, na culpa consciente o agente prevê a possibilidade da produção do resultado ilícito, todavia, acredita sinceramente que este não venha a ocorrer. Note-se que não bastará apenas a previsibilidade do resultado para que se configure a culpa consciente, será também forçoso que o agente não o deseje e se esforce para que este não ocorra. A previsão cobrada do agente é a chamada de objetiva, ou seja, a que se seria de esperar de um cidadão de raciocínio mediano que se encontrasse nas mesmas condições que ele. Em sua obra explica que A previsibilidade objetiva se determina mediante um juízo levado a cabo, colocandose o observador (por exemplo, o juiz) na posição do autor no momento do começo da ação, e levando em consideração as circunstâncias do caso concreto cognocíveis por uma pessoa inteligente, mais as conhecidas pelo autor e a experiência comum da época sobre os cursos causais. Damásio E. de Jesus exemplifica com a hipótese do caçador que avista sua caça próxima a um confrade e percebe que, atirando no animal poderá acertar em seu companheiro. Confiando em sua pontaria e acreditando que não o atingirá, dispara sua arma, matando-o. Perceba-se que o agente não assumiu a possibilidade da produção do resultado porque acreditava que sua habilidade seria suficiente para afastá-lo. Sintetizando, Jesus relata que, para que se configure a culpa consciente devem estar presentes: 1º) vontade dirigida a um comportamento que nada tem com a produção do resultado ocorrido (...); 2º) crença sincera de que o evento não ocorra em face de sua habilidade ou interferência de circunstância impeditiva, ou excesso de confiança (...); 3º) erro de execução. Ressalva ainda que a culpa consciente é equiparada à inconsciente, sendo a pena in abstract igual para as duas espécies, pois, “tanto vale não ter consciência da anormalidade da própria conduta, quanto estar consciente dela, mas confiando, sinceramente, em que o resultado lesivo não sobrevirá”. 4. DA CULPABILIDADE Segundo Fernando Capez (2000) relata que, para Conforme o autor, não se trata de elemento do crime, mas pressuposto para imposição de pena, porque, sendo um juízo de valor sobre o autor de uma infração penal, não se concebe possa, ao mesmo tempo, estar dentro do crime, como seu elemento, e fora, como juízo externo de valor do agente. Para censurar quem cometeu um crime, a culpabilidade deve estar necessariamente fora dele. Artur de Brito Gueiros Souza (2004) afirma que a culpabilidade é o juízo de valor negativo ou reprovação do autor pela realização não justificada de um fato típico, fundado no poder agir de outro modo. Para a Doutrina Majoritária a culpabilidade é sempre o fundamento (pois, liga-se à noção de retributividade prevista no artigo 59, in fine do CP) e limite de pena (prende-se ao princípio da culpabilidade), sendo possível sua gradação. A culpabilidade é apenas limite da pena, em função da prevenção geral e especial, não sendo o fundamento da pena. A culpabilidade seria apenas uma das condições necessárias para a imposição da pena, ao lado da necessidade preventiva da sanção penal. A culpabilidade deve recair sobre o fato individual e não sobre uma conduta de vida individual (culpabilidade de caráter ou de autor). De acordo com Fernando Capez (2000), as causas que excluem a imputabilidade são quatro: • doença mental;17 • desenvolvimento mental incompleto; • desenvolvimento mental retardado; • embriaguez completa proveniente de caso fortuito ou força maior. O caso fortuito e a força maior afastam a culpabilidade, pois o caso fortuito caracteriza-se pela imprevisibilidade do dano, embora evitável, enquanto a força maior caracteriza-se pela inevitabilidade do dano, embora previsível. Apenas o caso fortuito excluiria a culpabilidade, pois a força maior excluiria a própria ação humana, assim como a coação física irresistível. 17 Fernando Capez. 2000 Curso de Direito Penal. V. 1. Parte Geral – Artur de Brito Gueiros de Souza. 2004 Revista Brasileira de Ciências Criminais. N. 49, jul/ago. p. 9-38. Artur de Brito Gueiros Souza (2004) afirma que o fundamento material do conceito de culpabilidade é a reprovabilidade, que está baseada na capacidade de livre decisão do sujeito (que, segundo alguns autores, nada mais é do que a tradução jurídica do conceito teológico do “livre arbítrio”). Entretanto, segundo o autor, ocorre que a tese da liberdade de “agir de outro modo” própria do conceito de culpa é indemonstrável, na prática. Se “pena” pressupõe “culpa” e a reprovação própria da culpabilidade assenta num fundamento indemonstrável, então a culpabilidade não poderia, cientificamente, servir de fundamento da pena – esta conclusão acarretou naquilo que os autores contemporâneos chamam de “crise” do conceito de culpabilidade, demandando a busca de um outro fundamento (científico) para a reprovabilidade do autor do injusto típico. Artur de Brito Gueiros Souza (2004) apresenta como elementos da culpabilidade a imputabilidade, o conhecimento da ilicitude do fato e a exigibilidade de comportamento diverso. A imputabilidade é a capacidade de livre autodeterminação, ou seja, o conjunto de condições pessoais que dão ao agente a faculdade de escolha (de atuar de modo distinto de como atuou), permitindo, assim, que lhe seja juridicamente imputada à prática de um fato punível. A capacidade geral de culpabilidade engloba a compreensão do injusto e a determinação da vontade conforme o direito. De acordo com Artur de Brito Gueiros Souza (2004), sem a imputabilidade, entendese que o sujeito carece de liberdade de escolha e, conseqüentemente, de faculdade para comportar de outro modo, com o que não é capaz de culpabilidade, sendo, portanto, inculpável (ou exculpável). No que diz respeito ao conhecimento da ilicitude do fato, para que um fato contrário ao direito possa ser reprovado ao autor, será necessário que conheça ou possa conhecer as circunstâncias que pertencem ao tipo e à ilicitude. Ao conhecimento da realização do tipo (dolo ou culpa) deve-se acrescentar o conhecimento (real ou possível) da antijuridicidade do fato. 4.1 DO ACTIO LIBERA IN CAUSA Como já abordado anteriormente, para que se caracterize o dolo indireto será necessário identificar que o autor do fato tinha condições de prever o evento desastroso e, mesmo assim, prosseguiu de forma indiferente. As opiniões sobre a incidência do dolo eventual aos crimes de trânsito gerados em virtude de condutores embriagados são antagonicamente diferentes. Parte dos doutrinadores sustenta que, mesmo que o condutor esteja totalmente entorpecido — “fora de si” — no momento do sinistro, responderá pela produção do resultado a título de dolo, eis que ao começar a consumir bebida alcoólica sabia que poderia perder a consciência sobre seus atos. Sustentam ainda que os malefícios da ingestão de bebidas alcoólicas são regularmente alvo de campanhas educativas institucionais, e já são de conhecimento público, não podendo o autor escusar-se de sua conduta por alegar desconhecimento dos efeitos nocivos da bebida. Ademais, o Código Penal adotou a teoria da actio libera in causa, que preceitua que não deixa de ser imputável quem se pôs em situação de inconsciência ou de incapacidade de autocontrole, dolosa ou culposamente, e nessa situação comete crime. Todavia, para um melhor discernimento sobre o assunto, é necessário o entendimento sobre as diferenciações doutrinárias existentes 4.2 DA EMBRIAGUEZ O ato de conduzir veículo automotor sob a influência de álcool (ou outra substância entorpecente de efeitos análogos) constitui não só uma infração administrativa de trânsito (art. 164 da Lei 9.503/97, com nova redação dada pela Lei 11.275/06), como também crime autônomo (neste caso existe a necessidade materializar-se o “perigo de dano”), conforme o art. 306 da Lei 9.503/97. Enquanto a infração de trânsito do art. 164 é reprimida com pena de multa pecuniária e suspensão do direito de dirigir, o crime do art. 306 é punido com pena de detenção, de seis meses a três anos. Todavia, assim como nos casos anteriormente analisados, o foco deste estudo não é a infração administrativa, tão pouco o crime autônomo. A condução de veículo automotor sobre efeito de bebida alcoólica será analisada aqui tão somente como fator desencadeador para crimes de trânsito, constituindose, neste caso, em agravante para os crimes de homicídio culposo e de lesão corporal culposa (arts. 302, § único, V; e art. 303, § único c/c art. 302, § único, V, todos da Lei 9.503/97). O ato de conduzir veículo automotor embriagado é, tal qual o ato de dirigir o veículo em excesso de velocidade, uma conduta que isoladamente, não acarreta per si na incidência de dolo eventual em caso de sinistro. É lógico concluir que se houver ingestão de bebida alcoólica por parte do condutor, e este não apresentar nenhuma alteração em seu estado de consciência, continuando a guiar seu veículo com destreza e cautela, não há que se falar em culpa ou dolo direto ou indireto, eis que, neste caso, será um elemento irrelevante em caso de acidente. A ingestão de bebida alcoólica apenas passa a ter relevância para o estudo da responsabilização penal quando provoca alterações no estado de consciência e/ou atenção do usuário. Neste sentido, havendo alteração do estado de consciência e atenção do indivíduo, fatalmente haverá um comprometimento de sua habilidade, que via de regra culminará na prática de ações imprudentes e/ou negligentes à direção e, ocorrendo um sinistro, certamente este se dará não apenas em virtude da mera embriaguez, como já explicado, mas cumulado a outras ações imprudentes, tais como a condução do veículo com excesso de velocidade, ultrapassagem forçada, transitar pelo acostamento, pela contramão de direção, etc. Até mesmo o crime autônomo previsto no art. 306 só subsistirá se a conduta externada pelo condutor gerar perigo de dano concreto, fato que se cristalizará através de condutas imprudentes ou negligentes. Neste mesmo sentido posicionou-se o Des. Nilton M. Machado, ao afirmar que A embriaguez do motorista envolvido em acidente, sendo caracterizadora do crime previsto no art. 306, do CTB, não resulta, por si só, em presunção de culpa em relação a eventual lesão corporal ou morte advinda do evento. Para reconhecimento da culpa do motorista embriagado há que se demonstrar, objetivamente, por elemento concreto e visível, tenha agido com imprudência, imperícia ou negligência (.TJ/SC, Apelação Criminal no 1998.018158-5, julg. em 24/03/99.18). 4.2.1 .EMBRIAGUEZ VOLUNTÁRIA SIMPLES A embriaguez voluntária simples, nada mais é do que a gerada em virtude do consumo excessivo de álcool por livre disposição do agente. É o caso típico do indivíduo que vai a uma confraternização entre amigos, uma festa e se embebeda. Muitas vezes este indivíduo não tem antecedentes criminais ou histórico de violência, mas ao beber demais e retornar à sua residência dirigindo, patrocina um crime de trânsito (atropelamento de pedestres sobre o passeio ou colide frontalmente com outro veículo ao efetuar uma manobra arriscada). Este tipo de embriaguez será causa de aumento da pena em caso de homicídio culposo ou lesão corporal culposa praticados na direção de veículo (art. 302, § único, V, lei 9.503/97), contudo, não aumentará ou atenuará a pena caso o fato criminoso tenha previsão no Código Penal. Também não será causa de exclusão da punibilidade do agente, pois o próprio Código Penal preceitua em seu art. 28, II que “não excluem a imputabilidade penal a embriaguez, voluntária ou culposa, pelo álcool ou substância de efeitos análogos”. Como dito anteriormente, existe corrente que defende que o indivíduo envolvido em crime, nestas circunstâncias, deve responder pela modalidade dolosa do crime, eis que, embora não tivesse o animus necandi, quando iniciou sua bebedeira tinha pleno domínio de suas faculdades e a previsibilidade de que, se bebesse, poderia perder seu autocontrole e realizar uma barbaridade. Desta mesma forma manifestou-se o professor de medicina legal Dr. Rinaldo Pellegrini ao afirmar que: 18 TJ/SC, Apelação Criminal no 1998.018158-5, julg. em 24/03/99. O ébrio, que cometeu crime, é punível porque era livre na sua atuação relativamente ao fato inicial, isto é, ao primeiro anel da cadeia que constituiu, a seguir, o nexo de causalidade entre a embriaguez e o crime; a sucessiva atividade criminosa do agente, ainda que alheada ao controle deste, foi, portanto, provocada por uma ação ‘voluntária’ (o abuso inconsiderado do álcool), que resultou na embriaguez e à qual pode ser referido o evento. Na defesa desta mesma corrente pronunciou-se o desembargador Souza Varella: Motorista que em rodovia de grande movimento, dirige seu veículo em alta velocidade e embriagado, vindo a atropelar ciclista. "Urge sejam considerados dolosos (dolo eventual), levando-se em conta que o motorista, na fase inicial e parte do processo de ingestão de bebida alcoólica, permaneça lúcido e consciente, portanto, em condições de avaliar que, se continuar a beber e vier a assumir a direção de veículo motorizado, poderá causar resultados danosos, mas mesmo assim não renuncia à ação, ao contrário, anui à possibilidade de produzir um evento antijurídico" (Neuton Dezoti - Professor em Botucatu - Univ. Est. Paulista - in RT vol. 623/407). Em contraposição a esta perspectiva, existe corrente doutrinária que sustenta que os crimes (incluindo-se os de circulação), praticados por cidadãos em estado de embriaguez voluntária simples, só poderão ser penalizados a título de culpa, eis que um dos requisitos necessários para a caracterização do dolo (ainda que eventual) é 19 a previsibilidade do evento, não sendo razoável esperar que o indivíduo que vai a confraternização beber com amigos detenha a previsibilidade de que horas mais tarde poderá vir a atropelar e matar alguém em decorrência daquela conduta. O agente não queria cometer o ato e nem tão pouco era indiferente à sua produção quando iniciou a ingerir álcool. Por não haver assentimento e, tão pouco, previsibilidade, não haveria que se falar em crime doloso, apenas culposo (se houver previsão legal). 19 PELLEGRINI, Rinaldo apud CAMARGO,Marcelo Ferreira de. Embriaguez e responsabilidade penal. Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 344, 16 jun. 2004. Disponível em:<http://jus2.uol.com.br/doutrina /texto.asp 5342>.Acesso em:31out.2006. 16:00 h. TJ/SC, Apelação Criminal n o 2002.008110-3, julg. em 25/06/02. GRECO, opus citatum, p. 224. Nesta esteira manifesta-se Rogério Greco: (...) Não se pode partir do princípio de que todos aqueles que dirigem embriagados e com velocidade excessiva não se importem em causar a morte ou mesmo lesões em outras pessoas. O dolo eventual, como visto, reside no fato de não se importar o agente com a ocorrência do resultado por ele antecipado mentalmente, ao contrário da culpa consciente, onde este mesmo agente, tendo a previsão do que poderia acontecer, acredita, sinceramente, que o resultado lesivo não venha a ocorrer. No dolo eventual, o agente não se preocupa com a ocorrência do resultado por ele previsto porque o aceita. Para ele, tanto faz. Na culpa consciente, ao contrário, o agente não quer e nem assume o risco de produzir o resultado porque se importa com a sua ocorrência. O agente confia que, mesmo atuando, o resultado previsto será evitado (...) Com isso queremos salientar que nem todos os casos em que houver a fórmula embriaguez + velocidade excessiva haverá dolo eventual. Também não estamos afirmando que não há possibilidade de ocorrer tal hipótese. Só a estamos rejeitando como uma fórmula matemática, absoluta. (...) Imagine o exemplo daquele que, durante a comemoração de suas bodas de prata, bebe excessivamente e, com isso, se embriaga. Encerrada a festividade, o agente, juntamente com a sua esposa e três filhos, resolve voltar rapidamente para a sua residência, pois que queria assistir a uma partida de futebol que seria transmitida pela televisão. Completamente embriagado, dirige em velocidade excessiva, a fim de chegar a tempo para assistir ao início do jogo. Em razão do seu estado de embriaguez, conjugado com a velocidade excessiva que imprimia em seu veículo, colide o seu automóvel com um outro e com isso causa a morte de toda a sua família. Pergunta-se: Será que o agente, embora dirigindo embriagado e em velocidade excessiva, não se importava com a ocorrência dos resultados? É claro que se importava. Também existe corrente que defende que o momento em que o indivíduo começa a ingerir bebida alcoólica não se configura a execução do crime propriamente dito, mas mero ato preparatório, eis que, sendo interrompido, não restará nada a punir, nem mesmo a título de culpa. Desta forma, falta ao agente o elemento subjetivo em relação a um crime certo e determinado, uma vez que, no momento em que se embriaga, não tem sequer a previsão de que irá cometer um delito. O elemento subjetivo existe somente em relação à embriaguez (o ato de embriagarse é livre), porém, esta não é causa do delito. Desvinculando-se o consumo da bebida alcoólica da conduta que gerou o acidente, não haverá respaldo para acusação com fulcro em dolo indireto, sendo obrigatória à qualificação com fulcro na culpa, modalidade imprudência ou negligência. 4.2.2 EMBRIAGUEZ VOLUNTÁRIA PREORDENADA Ocorre quando o indivíduo se entorpece voluntariamente para “criar coragem”, livrarse dos freios morais e éticos impostos pela sociedade, para então cometer um crime que, se estivesse sóbrio, possivelmente não teria coragem para fazer a efeito. Esta hipótese se coaduna perfeitamente com a teoria da actio libera in causa, eis que neste caso, o agente literalmente “se pôs” em situação de embriaguez, devendo responder por seu ato. Há previsibilidade e consentimento no evento, eis que sua execução é premeditada e que o agente realmente deseja a produção do resultado. Ademais, a embriaguez preordenada qualifica o crime, majorando sua pena (caso o fato delituoso esteja previsto no Código Penal), uma vez que o próprio Código Penal determina expressamente em seu art. 61, II, l que “são circunstâncias que sempre agravam a pena, quando não constituem ou qualificam o crime ter o agente cometido o crime em estado de embriaguez preordenada”. Tratando-se de homicídio ou lesão corporal culposas praticadas na direção de veículo, será aplicada apenas a qualificadora do art. 302, § único, V, não se aplicando o dispositivo do Código Penal por aplicação do princípio da especificidade (princípio adotado na solução de conflitos aparente de normas). 4.2.3 EMBRIAGUEZ CULPOSA Ocorre quando o indivíduo, fazendo uso de substância alcoólica, não tendo a intenção de se entorpecer, perde o controle e se embriaga. O fato da embriaguez não ser desejada é irrelevante para o direito penal, pois o que terá relevância será se a embriaguez se deu em virtude da livre disposição de vontade, ou se foi imposta coercitivamente por outrem. Neste caso, o agente responderá pela embriaguez voluntária. 4.2.4 EMBRIAGUEZ FORTUITA Ocorre quando o indivíduo é levado ao estágio de embriaguez involuntariamente por fazer uso de uma substância entorpecente sem o conhecimento do potencial entorpecente e despersonalizante da substância. Ocorre em trotes de faculdades, quando são misturadas substâncias alcoólicas a refrigerantes e dadas aos calouros sem o conhecimento destes, provocando-lhes estado de embriaguez. Se a embriaguez é total, a punibilidade do agente é excluída, por expressa determinação do Código Penal (art. 28, §1o), o qual preceitua que É isento de pena o agente que, por embriaguez completa, proveniente de caso fortuito ou força maior, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. Todavia, se a embriaguez é parcial, será apenas causa de redução da pena (art. 28, §2o do Código Penal), eis que A pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente, por embriaguez, proveniente de caso fortuito ou força maior, não possuía, ao tempo da ação ou da omissão, a plena capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de determinarse de acordo com esse entendimento. 4.2.5 EMBRIAGUEZ POR FORÇA MAIOR OU “FORÇOSA” Ocorre quando uma força externa obriga o agente ao consumo de substancia entorpecente. É o caso do cidadão que é obrigado a ingerir aguardente durante cárcere privado, para contar suas senhas bancárias aos seus algozes. O indivíduo que é acometido de embriaguez por força maior é protegido pelos mesmos dispositivos legais estudados no item anterior, pois a situação, juridicamente, se equivale à embriaguez fortuita. 4.2.6 EMBRIAGUEZ PATOLÓGICA A embriaguez patológica é reconhecida como doença pela Organização Mundial da Saúde. Trata-se de uma disfunção cerebral que ocasiona transtorno da consciência, também conhecido no ramo da psicopatologia por “estado crepuscular”. Diferenciase da embriaguez normal pelo fato de que, neste caso, a ingestão de pequenas quantidades de álcool ocasionam um estado de excitação exagerada e descargas comportamentais agressivas. Também são quatro as espécies de embriaguez apontadas por Capez (2000): • embriaguez não acidental, que se subdivide em: voluntária, dolosa ou intencional (completa ou incompleta); culposa (completa ou incompleta); • embriaguez acidental: pode decorrer de caso fortuito ou força maior (completa ou incompleta); • patológica; • preordenada. De acordo com o autor, a embriaguez não acidental jamais exclui a imputabilidade do agente, seja voluntária, culposa, completa ou incompleta. Isso porque ele, no momento em que ingeria a substância, era livre para decidir se devia ou não o fazer. A conduta, mesmo quando praticada em estado de embriaguez completa, originouse de um ato de livre-arbítrio do sujeito, que optou por ingerir a substância quando tinha possibilidade de não o fazer. A ação foi livre na sua causa, devendo o agente, por essa razão, ser responsabilizado. Trata-se da teoria da actio libera in causa (ações livres na causa). Fernando Capez (2000) afirma que se considera, portanto, o momento da ingestão da substância e não o da prática delituosa. Essa teoria ainda configura resquício da responsabilidade objetiva em nosso sistema penal, sendo admitida excepcionalmente quando for absolutamente necessário para não deixar o bem jurídico sem proteção. O art.28, II do CP trata da embriaguez, voluntária ou culposa, pelo álcool ou substância de efeitos análogos, prescrevendo que estas espécies de embriaguez não excluem a imputabilidade. No que diz respeito à embriaguez por caso fortuito (beber sem querer, por exemplo) ou força maior (ser obrigado a beber, por exemplo) tratadas no art. 28,§ 1º e § 2º do CP excluirá a imputabilidade se for completa, determinando que o agente, no momento da ação ou omissão, torne-se inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. A embriaguez por caso fortuito ou força maior importará redução de pena se for incompleta, determinando que o agente, no momento da omissão, não possuía a plena capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou determinar-se de acordo com esse entendimento. Não exclui a imputabilidade. A embriaguez, que é um distúrbio físico-mental que decorre da intoxicação por álcool ou substância análoga, pode ser: • incompleta – fase da excitação (a partir de 0,8 g/ml de sangue); • completa – fase de depressão (cerca de 3 g/ml de sangue); • comatosa – fase de letargia (cerca de 4 a 5 g/ml de sangue). Equipara-se à completa. A embriaguez por caso fortuito ou força maior também é chamada de acidental. Já a embriaguez voluntária ou culposa é chamada de não acidental. • voluntária: dolosa, querida. Se preordenada, constitui circunstância agravante (art. 61, II, l do CP). • culposa: o estado de embriaguez é previsível. 4.3 DA LEI 11.705/2008 A referida lei, como se sabe, instituiu entre nós a “tolerância zero” de álcool para os condutores de veículos automotores. Para tanto, além da proibição de comércio de bebidas “na faixa de rodovia federal ou em terrenos contíguos à faixa de domínio com acesso direto à rodovia”, foram redefinidas a infração administrativa e criminal para os que estiverem a dirigir sob influência de álcool. Além disso, foram retiradas as medidas despenalizadoras em caso de crime de embriaguez no volante, alterada a ação penal do crime de lesão corporal culposa na direção de veículo automotor, que passou a ser pública incondicionada (alterações decorrentes da nova redação do artigo 291), quando o causador do acidente estiver embriagado, participando de racha, ou em velocidade excessiva. Por fim, foram retiradas as causas de aumento decorrente da embriaguez nos crimes de homicídio culposo e lesão corporal culposa na direção de veículo automotor (revogação do inc. V, par. único, art. 302, CTB). Deixando de lado os debates sobre a correção e rigor das medidas implementadas, o fato é que a alteração no Código de Trânsito é uma realidade e vem causando, como não poderia deixar de ser, caloroso debate sobre seu alcance. Inicialmente, a referida lei antes de ser promulgada e publicada merecia maior reflexão, a fim de evitar ou pelo menos diminuir as discussões judiciais que serão, por fim, inevitáveis. Neste sentido, não entendemos o motivo pelo qual foi suprimido o período de vacatio legis, intervalo de tempo entre a publicação e a vigência da lei para conhecimento de seu teor pela sociedade. No caso, a Lei n. 11.705/08 teve vigência imediata a partir de sua publicação (art.8º). Observe-se que a Lei Complementar nº 95/98 que “dispõe sobre a elaboração, redação, alteração e consolidação das leis” determina em seu artigo 8º: “A vigência da lei será indicada de forma expressa e de modo em contemplar prazo razoável para que dela se tenha amplo conhecimento, reservada a cláusula ‘entra em vigor na data de sua publicação’ para as leis de pequena repercussão”. Em que pese à relatividade do conceito “pequena repercussão”, crê que a matéria tratada pela Lei n. 11.705/08, até pela discussão que ensejou, não pode ser assim considerada. Diversas questões controvertidas emergem do texto legal. Inicialmente, causa estranheza à penalidade fixa imposta pelo art. 165 que, em todo e qualquer caso de embriaguez estabelece multa (multiplicada cinco vezes) e suspensão por 12 (doze) meses da habilitação. Deste modo, seja a pessoa surpreendida conduzindo normalmente seu veículo após ter tomado uma taça de vinho no almoço, ou dirigindo em ziguezague completamente embriagada após sair de uma boate, a punição (administrativa) será rigorosamente idêntica, o que em última análise fere o princípio da proporcionalidade e até o bom senso. Antes da nova lei, o artigo 261 do CTB, complementado pela resolução nº 182/05 do CONTRAN, estabelecia a forma de aplicação da penalidade. Era considerada a gravidade do fato, as circunstâncias em que foi cometida a infração e os antecedentes do motorista para se determinar o prazo da suspensão (art. 16, Res. 182/05 - CONTRAN). A penalidade variava de acordo com a gravidade da infração e os antecedentes do motorista, sendo que, se primário, o motorista embriagado ficava sujeito à pena de suspensão de 4 (quatro) a 12 (doze) meses. Se reincidente, a suspensão era a máxima prevista, 12 (doze) meses. Com a penalidade fixa determinada pela nova lei, resta derrogado o artigo 261 do CTB e a citada resolução (em relação à infração da embriaguez). No que se refere à medida administrativa de “recolhimento da habilitação” decorrente da infração, considerando o disposto no artigo 269, § 1º (“A ordem, o consentimento, a fiscalização, as medidas administrativas e coercitivas adotadas pelas autoridades de trânsito e seus agentes terão por objetivo prioritário a proteção à vida e à incolumidade física da pessoa”), acreditamos que deve ser momentânea e decorrente de um juízo de cautelaridade para impedir que o motorista embriagado possa dirigir novamente. Por isso, acreditamos que o recolhimento deverá perdurar até o motorista se restabelecer da embriaguez. O recolhimento definitivo imediato acarretaria punição antecipada, violando princípios constitucionais básicos (devido processo legal e ampla defesa, por exemplo) e o próprio procedimento previsto no Código de Trânsito. Com efeito, o art. 265 do CTB estipula: “As penalidades de suspensão do direito de dirigir e de cassação do documento de habilitação serão aplicadas por decisão fundamentada da autoridade de trânsito competente, em processo administrativo, assegurado ao infrator amplo direito de defesa”. Assim, O recolhimento imediato (sem devolução) só é autorizado para os casos excepcionais de habilitação vencida há mais de 30 (trinta) dias (art. 162, V), ou em casos em que haja suspeita sobre sua autenticidade (art.272). Outra determinação controversa e para nós claramente inconstitucional é a determinação expressa no art. 277, parágrafo 3º, que estabelece aplicação das penalidades e medidas administrativas referentes à embriaguez, caso motorista se recuse a se submeter “aos testes de alcoolemia, exames clínicos, perícia ou outro exame que, por meios técnicos ou científicos, em aparelhos homologados pelo CONTRAN, permitam certificar seu estado”. Esse comando contraria uma gama de garantias fundamentais como presunção da inocência, proibição de autoincriminação, decorrente do direito do silêncio, dignidade da pessoa humana. Ainda quando for evidente a embriaguez, sem a concordância do motorista nenhuma prova pode ser realizada, sob pena de ser considerada ilícita. É, como se diz, o preço de viver num Estado democrático de direito. Nessa linha, entendemos que o motorista que se recuse a realizar o teste do bafômetro ou exame de sangue não poderá sofrer qualquer conseqüência por assim agir. Não poderá, por exemplo, ser processado por crime de desobediência (art.330,CP). Além de inconstitucional, o disposto no referido parágrafo é totalmente desnecessário, pois o parágrafo 2º, do mesmo artigo 277 concede autonomia e discricionariedade ao agente de trânsito para constatar a embriaguez por meio de outras provas admitidas em direito. Cabe, portanto, ao agente responsável pela diligência relatar os sinais que, em seu entendimento, indicam a embriaguez (constatação de hálito etílico, dificuldade na deambulação etc.) e, se for o caso, autuar o motorista. Sem prejuízo da infração administrativa, o motorista infrator poderá também responder por crime tipificado no art. 306, desde que surpreendido dirigindo com concentração alcoólica superior a 6 (seis) decigramas de álcool por litro de sangue. Em matéria criminal, importante não esquecer, o princípio da legalidade se sobressai, logo o fato considerado criminoso (fato material) deve ter perfeito ajustamento à conduta descrita na lei, o chamado enquadramento típico (ou juízo de tipicidade). Partindo desta premissa, parece que o legislador dificultou sobremaneira esse enquadramento típico ao vincular a embriaguez criminosa a um determinado nível de concentração alcoólica no sangue. Em suma, ao se exigir para caracterização do crime a condução do veículo com concentração “igual ou superior a 6 (seis) decigramas” de álcool por litro de sangue, apenas os testes e exames periciais (etilômetro ou exame de sangue) passam a servir como prova, na medida em que são os únicos meios de determinar de maneira específica a graduação alcoólica no sangue do motorista. Pensamos que a nova redação do dispositivo é mais benéfica que a anterior, pois acrescentou nova elementar (“concentração igual ou superior a 6 (seis) decigramas por litro de sangue”) inexistente antes, ou seja, trata-se de novatio legis in melius a impor sua aplicação retroativa, na forma do art. 5º, XL da CF/88 e do art. 2º, par. único, do CP. Já houve manifestação neste sentido no TJDF (20080020061592HBC, Relª. Desª. Sandra de Santis. Des. Mario Machado - voto minoritário. Data do Julgamento 03/07/2008 – informativo n. 150 TJDF). Ficou consignado na ementa: “O voto minoritário concedeu a ordem para trancar a ação penal por atipicidade da conduta, sob o fundamento de que deve ser aplicada a nova redação do artigo, nos termos da Lei nº 11.705/2008, por ser mais benéfica ao réu, uma vez que exige para a tipificação penal a comprovação técnica de que o condutor do veículo estava dirigindo com a concentração de álcool por litro de sangue igual ou superior a seis decigramas, sendo insuficiente para tanto o simples exame clínico”. Apesar de essa posição restar vencida (o Tribunal não concedeu a ordem de hábeas corpus), acreditamos ser a melhor interpretação. Outra questão controversa é saber se basta à constatação da concentração de álcool no sangue acima do nível exigido pelo tipo legal, ou se necessário que a ingestão alcoólica influencie a forma de condução do veículo? Em última análise, o crime nessa nova roupagem é de perigo abstrato e de mera conduta, ou ainda de perigo concreto, a exigir a exposição da incolumidade de outrem a perigo como anteriormente. Parece claro, concorde-se ou não, que o legislador pretendeu estabelecer que a simples conduta de dirigir embriagado (na dosagem definida na lei) é crime, independentemente de qualquer situação fática a indicar que alguém sofreu ou poderia sofrer algum risco em decorrência da conduta, ou seja, um crime de perigo abstrato em que a ofensa é presumida pela lei. Porém, enxergam alguns que, ao estabelecer na segunda parte do tipo penal que é criminosa a conduta de conduzir veículo automotor “sob a influência de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência”, tornou-se exigível também a demonstração da “influência” da ingestão de bebida alcoólica na forma de condução. Argumenta-se, ainda, que na infração administrativa (art. 165) exige-se “dirigir sob influência de álcool”, logo, com muito mais razão na infração criminal, a condução do veículo deve ser influenciada pela ingestão de álcool, ou seja, caso o motorista conduza seu veículo de forma regular mesmo após a ingestão de bebida alcoólica em nível considerado criminoso não haverá o crime.. Em sentido oposto, temos a posição do promotor paulista Renato Marcão, para quem o crime é de perigo abstrato: “A Lei nº 11.705, de 19 de junho de 2008 deu nova redação ao caput do art. 306 do Código de Trânsito Brasileiro e deixou de exigir a ocorrência de perigo concreto. O legislador passou a entender que conduzir veículo na via pública nas condições do art. 306, caput, do Código de Trânsito Brasileiro, é conduta que, por si, independentemente de qualquer outro acontecimento, gera perigo suficiente ao bem jurídico tutelado, de molde a justificar a imposição de pena criminal. Não se exige mais um conduzir anormal, manobras perigosas que exponham a dano efetivo a incolumidade de outrem, cabendo neste contexto a jurisprudência definir o alcance do tipo legal”. No que toca à equivalência dos testes de alcoolemia para efeito de caracterização, foi editado o Decreto nº 6.488, de 19 de junho de 2008 que estabeleceu uma tolerância de 2 (dois) decigramas por litro de sangue ou um décimo de miligrama por litro de ar para todos os casos (o que, segundo os entendidos, é quase nada) e definiu que 3 (três) décimos de miligrama por litro de ar expelido dos pulmões equivalem a 6 (seis) decigramas de álcool por litro de sangue. A alteração do art. 291 impede a aplicação dos institutos da composição civil de danos e transação penal para o crime de embriaguez ao volante (art. 74 e 76, Lei 9.099/95). Agora tais institutos são reservados apenas para a lesão corporal culposa na direção de veículo automotor, mas apenas quando o motorista não estiver embriagado, nem participando de racha ou “demonstração de perícia em manobra de veículo automotor”, nem transitando em velocidade superior permitida para a via em 50 km/h (cinqüenta quilômetros por hora). O mesmo artigo tornou inexistente a exigência de representação (art. 88, Lei 9.099/95) para apuração do crime de lesão corporal culposa na direção de veículo automotor quando ocorrer alguma das exceções acima, ou seja, a ação penal para esses casos passa a ser pública incondicionada. Em relação ao crime de embriaguez, por ser um crime sem vítima definida, não houve mudança, pois sempre se entendeu que era inaplicável a representação para apuração desse crime. Há de se destacar que a mudança do referido artigo não trouxe mudanças significativas, pois com a ampliação do conceito de crime de menor potencial ofensivo consagrado pela Lei n. 11.313/06, os crimes de lesão corporal culposa na direção de veículo automotor simples (art. 302, caput, CTB) e racha (art. 308, CTB) passaram à condição de crimes de menor potencial ofensivo, pois não possuem pena superior a 2 (dois) anos. Assim, em resumo, afastou-se a possibilidade de aplicação de tais institutos (composição civil e transação) para o crime de embriaguez (que possui pena máxima de 3 (três) anos de detenção) e para os crimes de lesão corporal quando incidirem as causas de aumento (falta de habilitação, em faixa de pedestre, ausência de socorro pelo motorista, ou no exercício de profissão de transporte de passageiros). Contudo, ao retirar a embriaguez do motorista como causa de aumento (reflexo da revogação do inciso V do parágrafo único do art. 302 pelo art. 9º da Lei n. 11.705/08) criou-se a seguinte situação: caso um motorista embriagado atropele um transeunte vindo a lesioná-lo, sendo a embriaguez a fonte determinante da imprudência e se não ocorrerem àquelas situações de aumento de pena (falta de habilitação regular etc.) poderá ser beneficiado por todos os institutos despenalizadores, pois terá praticado um crime de lesão corporal culposa na direção de veículo automotor simples (art. 302, caput, CTB) que, como dito acima, é crime de menor potencial ofensivo a ser julgado pelos Juizados Especiais Criminais e, por conseqüência, admitindo a composição civil de danos e, em tese, a transação. Ressaltamos, a lesão corporal culposa na direção de veículo automotor simples é crime de menor potencial ofensivo que deve ser julgado na forma da Lei nº 9.099/98 por expressa disposição constitucional (art.98,I,CF/88). Para os casos de lesão corporal culposa na direção de veículo automotor, quando houver os impedimentos decorrentes da embriaguez, racha ou da velocidade excessiva, o parágrafo 2º, do artigo 291 determina que seja “instaurado inquérito policial para investigação criminal”, indicando, a contrario sensu que, não ocorrendo às situações impeditivas, deverá ser obedecido o mesmo rito da Lei n. 9.099/95, com apuração prévia por termo circunstanciado e rito próprio da Lei n. 9.099/95. Sobre a revogação da causa de aumento decorrente da embriaguez do motorista imaginamos que intenção do legislador possa ter sido a “criação” de concurso material entre os crimes de lesão corporal culposa na direção de veículo automotor (e no de homicídio culposo na direção de veículo também) e o de embriaguez ao volante. Entretanto, tal concepção esbarra no entendimento pacífico de que o crime de dano (no caso, a lesão corporal ou homicídio culposo na direção de veículo automotor) absorve o crime de perigo (a embriaguez ao volante). Essa retirada da embriaguez do motorista como causa de aumento na lesão corporal e no homicídio de trânsito também não significa, como têm sido propalado por um sem-número de jornalistas, que com a entrada em vigor nova lei qualquer lesão ou homicídio envolvendo motorista embriagado será considerado doloso. Nessa seara, não houve qualquer alteração e continua a valer a máxima de que, em justiça criminal, “cada caso é um caso”, logo, todas as circunstâncias do acidente devem ser apuradas (velocidade e estado do veículo, comportamento da vítima, local, grau de embriaguez, etc) para classificar o fato como intencional ou não. A alteração do art. 296 foi no sentido de retirar do juiz a faculdade de aplicação da penalidade de suspensão da permissão ou habilitação para dirigir, tornando-a obrigatória quando o réu for reincidente específico em crimes de trânsito. Por fim, cabe louvar o veto governamental à tentativa de alteração da redação do artigo 301 que autorizava a prisão em flagrante do motorista embriagado, que estivesse participando de racha ou que estivesse em velocidade excessiva mesmo quando prestasse socorro à vítima. Ao justificar o veto, foi bem ressaltado “que não há razão para se excepcionar tal regra, porquanto que direcionada para a preservação da vida”. 5. DO HOMICIDIO DOLOSO Desde muito tempo, a humanidade procura proteger o bem mais precioso do ser humano, ou seja, a vida. Em épocas remotas, essa proteção era feita impondo-se sanções ao indivíduo que se sentisse no direito de destruir a vida de outrem. A título de exemplo pode-se citar Regis Prado (2007, p. 57) o qual afirma que: O Direito Penal Canônico, que muito contribuiu para civilizar as práticas brutais germânicas, classificava o homicídio como delicta mixta, já que violava as duas ordens (religiosa e laica). O julgamento incumbia ao tribunal que primeiro tivesse conhecimento de sua prática. Pela igreja, o homicídio era punido com as denominadas poene temporales (Regis Prado, 2007, p. 5720). O autor afirma ainda que: Durante a Idade Média, o homicídio era usualmente punido com pena de morte, sobretudo, quando qualificado (homicidium qualificatum ou deliberatum) - v.g., parricídio, emboscada, envenenamento, latrocínio e assassinato. Com o período humanitário, defende-se o tratamento mais benévolo aos acusados de homicídio comum, ocorrendo à gradativa substituição da pena capital pela prisão celular, cumulando com trabalhos forçados (Regis Prado, 2007, p. 57). Nos dias atuais, essa proteção é assegurada pela nossa Constituição Federal, conforme dispõe o art. 5º, caput, in verbis: Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de 20 Prado Luiz Regis. Curso de Direito Penal, 2007, p. 57-62. qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e estrangeiros residentes no País, a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade. Todo e qualquer indivíduo tem o direito de gozar e desfrutar da vida, sem distinção de qualquer espécie; é o Estado quem tem o dever de proteger, por se tratar de um dos direitos indisponíveis do homem. A tutela por parte do Estado visa não somente a proteção, mas também a preservação do ser humano, uma vez que a vida possui um valor social inestimável. Dá-se a proteção da vida, desde o momento de seu início, com o parto, até a sua extinção, que é caracterizada com a morte. Quando um indivíduo, de alguma forma, destrói a vida humana de outrem, temos, assim, a conduta tipificada como homicídio, a saber, art. 121 do Código Penal, in verbis: Art. 121. Matar alguém: Pena - reclusão, de 6 (seis) a 20 (vinte) anos. O sujeito ativo, no delito acima mencionado, pode ser qualquer ser humano e o sujeito passivo qualquer pessoa viva. No crime de homicídio, a conduta típica consiste em matar alguém. Neste caso, não há necessidade de saber quais motivos levaram o agente a cometer o crime, uma vez que o tipo é objetivo, não exigindo assim, uma finalidade específica do sujeito ativo. Para Regis Prado (2007, p. 62): No delito de homicídio, o conhecimento do dolo compreende a realização dos elementos descritivos e normativos, do nexo causal e do evento (morte), da lesão ao bem jurídico, dos elementos da autoria e da participação, dos objetivos das circunstâncias agravantes, atenuantes e qualificadoras que supõem uma maior ou menor gravidade do injusto (art. 121, § 2º, III e IV do CP) e dos elementos acidentais do tipo objetivo (Regis Prado, 2007, p. 62). O artigo 18 do Código Penal, em seu inciso I, estabelece que o crime é considerado doloso “quando o agente quis o resultado (teoria da vontade) ou assumiu o risco de produzi-lo (teoria do assentimento)”. 6. ARTIGO 302 DO CTB Com efeito, o art. 302 diz respeito a pratica de homicídio culposo na direção de veículo automotor, cuja pena é de detenção, de dois a quatro anos, e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor.21 A culpa é entendida como sendo a ausência do dever de cuidado objetivo, caracterizado pela imprudência, negligência ou imperícia. É o desvio padrão do Homem Médio. Como exemplo, pode-se citar o dito “Homem Médio” procura, ao dirigir um automóvel, não atropelar os pedestres e respeitar os sinais de trânsito. A imprudência é considerada como uma conduta ativa, como, por exemplo, quando se trafega em alta velocidade em uma via pública. Já a negligência é tida como sendo uma conduta passiva, ou seja, quando o motorista não toma cuidados de manutenção com seu veículo. A imperícia diz respeito à falta de habilidade técnica. No caso de qualquer uma dessas situações mencionadas, e havendo vítimas fatais no acidente, o condutor do veículo automotor será acusado de Homicídio Culposo, ou seja, cometeu (realizou, executou, praticou) um ato extremo sem ter a intenção ou vontade de fazê-lo, mas que por ter agido com imprudência, negligência ou imperícia, acabou por praticar tal ato. No parágrafo único deste artigo, estabelece que, no homicídio culposo cometido na direção de veículo automotor, “a pena é aumentada de um terço à metade, se o agente”: I - não possuir Permissão para Dirigir ou Carteira de Habilitação; II - praticá-lo em faixa de pedestres ou na calçada; Jus Navigandi, Teresina, ano 12, n. 1820, 25 jun. 2008. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=11432>. Acesso em: 16 nov. 2008 21 III - deixar de prestar socorro, quando possível fazê-lo sem risco pessoal, à vítima do acidente; IV - no exercício de sua profissão ou atividade, estiver conduzindo veículo de transporte de passageiros; V- Estiver sob a influência de álcool ou substância tóxica ou entorpecentes de efeitos análogos (Incluído pela Lei 11.275/2006). Com relação ao inciso III deste parágrafo, este dispositivo somente é aplicado é aplicado ao condutor do veículo que tenha agido de forma culposa, caso contrário o crime cometido será tipificado no art. 304. Neste caso, o socorro deverá ser possível de ser efetivado sem risco pessoal para o condutor, como, por exemplo, ameaça de agressão, grande movimentação de veículos etc. e quando o agente puder concretizá-lo, tendo meios para tanto. Dessa forma, se o agente não possuir condições de efetuar o socorro ou quando também ficou lesionado no acidente de forma a não poder ajudar a vítima, não terá aplicação o dispositivo. O instituto igualmente não será aplicado se a vítima for, de imediato, socorrida por terceira pessoa. No que diz respeito ao inciso IV deste parágrafo, o instituto será aplicado mesmo que o veículo de transporte de passageiros esteja vazio; quando estiver no trajeto até a empresa após o término da jornada; e, as vítimas não necessitam estar no interior do veículo para que sejam alcançadas pelo presente dispositivo. Também com a entrada em vigor do CTB, a legislação penal, referente às normas quanto ao uso do veículo automotor, aplicável aos crimes e contravenções praticadas no trânsito, era altamente permissiva, deixava de contemplar diversas anti-sociais à segurança do trânsito, bem como favorecia sempre ao infrator. Como exemplo maior deste favorecimento, a extinção da punibilidade pela prescrição da ação penal vinha sendo ao longo dos anos, um dos principais instrumentos de defesa dos responsáveis pelos acidentes. As autoridades, pesquisadores, doutrinadores, profissionais de imprensa e expressivas lideranças já pregavam desde a década de 80 a necessidade de um código contendo tipos penais que abrangessem a todos os crimes de trânsito. Com o advento da Lei 11.275/06, o artigo 302, parágrafo único, do CTB passou a conter, em seu inciso V, mais uma causa de aumento de pena, ou seja, o condutor que se envolvesse em homicídio culposo na direção de veículo automotor teria sua pena aumentada de um terço até metade acaso estivesse sob a influência de álcool ou de substância tóxica ou entorpecente de efeitos análogos. Essa causa de aumento de pena se estendia também ao agente que cometesse lesão corporal culposa na direção de veículo automotor, nos moldes do artigo 303, que, em seu parágrafo único, fazia referência às mesmas causas de aumento de pena previstas no artigo 302. Porém, a lei 11.705, de 19 de junho de 2008, modificou radicalmente tais disciplinas, revogando expressamente o inciso V do parágrafo único do art. 302 do CTB, bem como deu nova redação ao artigo 306 daquele diploma, passando a exigir a concentração de álcool por litro de sangue igual ou superior a 6 (seis) decigramas, para que alguém seja responsabilizado pelo crime ali previsto, permitindo, por outro lado, que esteja apenas sob a influência de qualquer outra substância psicoativa (que não o álcool) e que determine dependência para essa mesma responsabilização administrativa 7. JURISPRUDÊNCIA As decisões judiciais, em regra, reafirmam os mesmos conceitos e princípios já abordados. Todavia, mesmo dominando a base teórica e conceitual que envolve o tema, sua aplicação na prática demonstra-se complexa e exige muita cautela por parte do magistrado quando da análise de sua aplicabilidade. RELATÓRIO: 1. PHS foi denunciado, (...) como incurso no disposto pelo art. 121, caput, do Código Penal e art. 62 da Lei das Contravenções Penais, em face dos fatos (...): (...) o denunciado PHS, dirigindo o caminhão Merdes-Benz(...), embriagado, atropelou conscientemente e matou Arneu Rieger, ocasionando-lhe múltiplas fraturas na cabeça e no tronco com desorganização total da massa encefálica. (...) o denunciado dirigia o veículo Mercedes-Benz em direção a Três Passos, vagarosamente. Repentinamente, o denunciado trocou de pista, ficando na contramão, mas sempre em direção à cidade de Três Passos e, nessa posição, atropelou a vítima, que caminhava junto à sarjeta. JLE, que tudo presenciara, correu ao local, pois o caminhão parara, mas permanecia funcionando. Ao ver a vítima caída, junto ao rodado esquerdo do caminhão, JLE bateu na cabine do caminhão e disse ao denunciado: Pare que tem gente debaixo do caminhão. Dito isto, o denunciado tentou arrancar o veículo e não conseguiu, deixando o caminhão recuar meio metro, aproximadamente. Então, arrancou acelerando fortemente o veículo e passou sobre o corpo da vítima. JLE continuou gritando e correu atrás do caminhão, pedindo que o denunciado parasse, mas não foi atendido. Nessa ocasião, JLE viu a placa do caminhão, que era XB-0534. Ao retornar à sua mão de direção (lado direito da estrada), o denunciado quase atropelou a menina CMS que transitava naquele local. 2. Ao final, foi pronunciado nos termos da pretensão ministerial(...). VOTO DO RELATOR: A prova indica que o réu foi advertido pela testemunha JLE, sobre a presença de uma pessoa sob o caminhão e que, apesar dessa advertência, não tomou nenhuma providência no sentido de evitar o acidente. Ao contrário, deu partida ao veículo. Ora, Sr. Presidente, esse desinteresse pela sorte daquela que viria a ser a vítima é que extrema, que caracteriza a diferença entre dolo eventual e culpa consciente. O réu demonstrou nenhuma importância pelo que poderia ocorrer. Não se trata de ter confiado não ocorresse o resultado, porquanto o que existe nos autos até o momento está a indicar ter havido, realmente, um desinteresse real pela sorte da vítima. E isso é o quantum satis para deixar caracterizado o dolo eventual. Trata-se, a pronúncia, de uma peça de cognição incompleta, cabendo assim, ao Júri, posteriormente, examinar a correção, ou não, da tese acusatória. Meu voto é no sentido da confirmação da decisão de pronúncia. Presidente (Des. Marco Aurélio C. M. Oliveira): Ouvindo o voto de V. Exa., lembrei-me daquela velha lição de Nelson Hungria: Toda vez que o réu age na dúvida, a sua conduta gravita na órbita do dolo eventual. (...) De maneira que quanto a esse fundamento, em relação a esse ponto de vista, acompanho a manifestação do eminente Relator. O Des. Cristovam Daiello Moreira De acordo. Acredito até que ele não agiu na dúvida, agiu indiferente à dúvida. Através de uma análise minimamente atenciosa é possível perceber que se trata de hipótese de ocorrência de dolo eventual pois, ao contrário da maior parte dos casos submetidos ao judiciário, neste é facilmente identificável a indiferença com que a agente agiu com relação à produção do resultado morte da vítima. Mesmo após ter sido alertado por um transeunte da existência de uma pessoa caída próxima às rodas do veículo, o condutor acelerou o veículo, passando por sobre o corpo da vítima, eliminando qualquer possibilidade de sobrevivência, evidenciando assim sua anuência do agente para com o resultado. A previsibilidade do evento também fica comprovada pelo fato do condutor estar embriagado, o que demonstra que, assumiu os riscos de um possível evento, uma vez que os efeitos do álcool sob a coordenação do motorista são notórios. Tese 261 CRIMES DE TRÂNSITO – SUSPENSÃO DA HABILITAÇÃO PARA DIRIGIR – MOTORISTA PROFISSIONAL – POSSIBILIDADE O fato de o réu ser motorista profissional não o isenta de sofrer a imposição da pena de suspensão da habilitação para dirigir, porque sua cominação decorre de expressa previsão legal (artigo 302 do Código de Trânsito Brasileiro), que não faz nenhuma restrição nesse sentido. (D.O.E., 09/05/2007, p. 40) EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DA SEÇÃO CRIMINAL DO EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO TP 228 CRIME DE TRÂNSITO - SUSPENSÃO DA HABILITAÇÃO PARA DIRIGIR MOTORISTA PROFISSIONAL - POSSIBILIDADE. O FATO DE O RÉU SER MOTORISTA PROFISSIONAL NÃO O ISENTA DE SOFRER A IMPOSIÇÃO DA PENA DE SUSPENSÃO DA HABILITAÇÃO PARA DIRIGIR, PORQUE SUA COMINAÇÃO DECORRE DE EXPRESSA PREVISÃO LEGAL (ART 302 DO CTB), QUE NÃO FAZ NENHUMA RESTRIÇÃO NESSE SENTIDO. O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO, nos autos da APELAÇÃO CRIMINAL Nº 798.868.3/7-0000-000, Comarca de Santos, em que é apelante JOSÉ CÍCERO DA SILVA, vem perante Vossa Excelência, com fundamento no artigo 105, III, alíneas “a” e “c”, da Constituição da República, artigo 255, § 2o, do RISTJ, artigo 26 da Lei nº 8.038/90 e artigo 541 e § único do Código de Processo Civil, interpor RECURSO ESPECIAL para o Colendo SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, pelos motivos adiante aduzidos: 1 – A HIPÓTESE EM EXAME JOSÉ CÍCERO DA SILVA foi condenado, por infração ao artigo 302 da Lei nº 9.503/97 (Código Brasileiro de Trânsito) a cumprir pena de 02 (dois) anos e 06 (seis) meses de detenção, em regime aberto, e mais à suspensão da habilitação para dirigir veículo automotor pelo prazo de 01 (um) ano e 06 (seis) meses, substituída a privativa de liberdade por restritivas de direito, consistentes na prestação de serviços à comunidade, na forma a ser estabelecida pelo E. Juízo das Execuções Criminais, e prestação pecuniária, fixada em 04 (quatro) salários-mínimos, revertidos em benefício dos dependentes da vítima (r. sentença de fls. 104/108). Inconformado, o sentenciado interpôs apelação, suscitando preliminar de nulidade processual, decorrente da falta de advogado quando de seu interrogatório judicial e do não deferimento de prova pericial requerida. No mérito, postulou absolvição, ao argumento de insuficiência probatória. (fls. 127/136). Contrariado o reclamo (fls. 138/142), sobreveio o parecer ministerial de fls. 156/159, no sentido do desprovimento. Contudo, a Egrégia 11ª Câmara A do 6º Grupo da Seção Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo proferiu a seguinte decisão (fls. 165): "DERAM PARCIAL PROVIMENTO, PARA EXCLUIR A PENA DE SUSPENSÃO DA HABILITAÇÃO PARA DIRIGIR VEÍCULOS AUTOMOTORES, MANTIDA, NO MAIS, A R. SENTENÇA. V.U.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O julgamento foi presidido pelo(a) Desembargador(a) ANTONIO MANSSUR e teve a participação dos Desembargadores ADALBERTO J.Q. T. CAMARGO ARANHA FILHO, JÚLIO CAIO SALLES São Paulo, 15 de dezembro de 2006 IVO DE ALMEIDA Relator” Eis o voto do eminente Relator (fls. 166/172): “Nos termos da respeitável sentença de fls. 105/108, JOSÉ CICERO DA SILVA foi condenado às penas de dois anos e seis meses de detenção (substituída por prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária) e mais um ano e seis meses de suspensão da habilitação para dirigir veículos automotores, por incurso no artigo 302, caput, do Código de Trânsito Brasileiro. Inconformado, apela (fls. 120). Alega, preliminarmente, nulidade do processo a partir do interrogatório, afirmando que o ato foi realizado sem a presença de Advogado. Prossegue em seu arrazoado, sustentando que nulidade também haveria pela falta de perícia técnica no local do acidente. No mérito, persegue a absolvição, à vista da insuficiência de prova acusatón'a (fls. 127/136). O recurso foi contra-arrazoado (fls. 138/142). A douta Procuradoria Geral de Justiça propõe a manutenção do decisório recorrido, negando-se, por conseqüência, provimento ao apelo. É o relatório. O recurso comporta parcial provimento, nos termos que constarão adiante. Nulidade alguma há a ser proclamada nos autos. Ao tempo do interrogatório judicial do apelante (fls. 70/75), não vigia a Lei 10.792/03, que deu nova conformação ao referido ato processual, cercando-o de maiores garantias ao acusado. Até então, não se via o interrogatório como autêntica prova de defesa, senão como ato privativo do juiz penal, o que dispensava a presença de Advogado. Daí porque, no caso dos autos, não houve irregularidade alguma que pudesse ensejar a nulidade do processo a partir de então. Ademais, a condenação não se acha escorada em qualquer trecho daquele depoimento do apelante. Em segundo lugar, a inexistência de perícia no local do fato também não contamina a prova dos autos. É inegável a utilidade da vistoria pericial no local do evento, como forma de melhor esclarecer os fatos e alcançar a verdade. Lastima-se, por isso, a conduta negligente da autoridade policial, que deixou de requisitar tal perícia, lavrando mero termo circunstanciado, manifestamente incabível, na hipótese do artigo 302 do CTB. Todavia, sua falta não acarreta nulidade alguma. Ao mérito. A respeitável sentença recorrida bem analisou as provas disponíveis e decretou, com acerto, a condenação. Não é de se supor existir qualquer defeito no semáforo, pois caso isso tivesse ocorrido, outros acidentes teriam acontecido no local. Bem de ver, ainda, que a testemunha ADELMAR (fls. 96/99) escapou por pouco de ser atingida pelo caminhão dirigido pelo apelante, que veio, em seguida, a colher a motocicleta pilotada pela vítima fatal. Referida testemunha prestou depoimentos uniformes e detalhados em duas oportunidades, gerando, portanto, forte credibilidade quanto a seu conteúdo. Trata-se, portanto, de depoimento idôneo, apto a dar suporte a uma condenação. Aliás, não é a quantidade de testemunhas que determina a convicção do julgador, mas a qualidade de cada um dos depoimentos. Ainda que seja um único circunstante, seu relato, quando idôneo, poderá ser suficiente para motivar a condenação, É o caso dos autos. Por último, cabe apenas um reparo na pena imposta, ressalvada a convicção do proficiente Magistrado sentenciante. Sendo o apelante motorista profissional, a imposição da pena de suspensão da habilitação para dirigir veículos automotores implicará, na prática, em negar-lhe o direito de trabalhar. Isso comprometeria sua subsistência. Tal entendimento, é sabido, sofre fortes críticas da jurisprudência, que mal-compara tal situação com a imposição da pena privativa de liberdade, na qual o agente também se vê privado de desenvolver tarefas que provejam seu sustento. Todavia, tal analogia não se aplica, neste caso. A um, porque a pena de suspensão da habilitação para dirigir veículos automotores, sendo cumulativa com a privativa de liberdade (no caso do artigo 302 do CTB), não tem a mesma vocação repressiva e emblemática. A dois, porque, na privativa de liberdade, o Estado assegura ou pelo menos deveria fazê-lo - a subsistência do encarcerado e de seus familiares, provendo as necessidades do primeiro e concedendo auxílio reclusão previdenciário aos segundos, Sendo assim, suprime-se tal penalidade, mantendo-se, porém, a privativa de liberdade, substituída, corretamente, por duas restritivas de direito. É o que fica decidido. Posto isso, meu voto dá parcial provimento ao recurso, apenas para excluir a pena de suspensão da habilitação para dirigir veículos automotores, mantendo-se, no mais, a respeitável sentença recorrida.” A causa foi decidida por Tribunal Estadual que julgou Apelação, não se tratando de reexame de prova e, sim, de questão estritamente jurídica. O v. acórdão negou vigência ao art. 302 da Lei nº 9.503/97 (Código Brasileiro de Trânsito) e divergiu de julgado de outro Tribunal, legitimando, destarte, a interposição do presente recurso especial, pelas alíneas “a” e “c” do permissivo constitucional. 2 - NEGATIVA DE VIGÊNCIA AO ART. 302 BRASILEIRO DE TRÂNSITO (lEI Nº 9.503/97) DO CÓDIGO Segundo conhecida lição do saudoso Ministro ALIOMAR BALEEIRO, perfeitamente ajustável à hipótese em exame, “denega-se vigência à lei não só quando se diz que esta não está em vigor, mas também quando se decide em sentido diametralmente oposto ao que nela está expresso” (RTJ 48/788). A Egrégia Corte Paulista, optou por aplicar, à conduta do réu, capitulada no artigo 302 do Código de Trânsito Brasileiro, tão- somente a pena privativa de liberdade, substituída por restritivas de direitos, afastando a imposição da suspensão da habilitação para dirigir veículo automotor, corretamente lançada na r. decisão de primeiro grau, argumentando que “Sendo o apelante motorista profissional, a imposição da pena de suspensão da habilitação para dirigir veículos automotores implicará, na prática, em negar-lhe o direito de trabalhar” . (fls. 170) O artigo 302 da mencionada Lei nº 9.503/97, encontra-se assim redigido: “Praticar homicídio automotor”: culposo na direção de veículo Penas – detenção, de dois a quatro anos, e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor “. (grifo nosso)”. Como se vê, o legislador entendeu conveniente e necessário que a resposta penal à conduta entelada fosse dupla, impondo, de um lado, a pena privativa de liberdade, e, de outro, a suspensão do direito de dirigir, o que se evidencia pela existência da conjunção aditiva “e”. Caso a pretensão fosse ensejar ao aplicador da lei a escolha entre uma ou outra espécie de reprimenda, o tipo legal certamente ostentaria a conjunção alternativa “ou”. Sob outro prisma, o citado preceito legal não excepcionou qualquer categoria de motorista, como consignado no v. acórdão, que entendeu inaplicável a suspensão imposta quando se cuide de motorista profissional. Aliás, é conhecido o brocardo jurídico no sentido de que “onde a lei não distingue, nem o intérprete deve distinguir” (“Ubi lex non distinguist, nec interpress distinguere debet”). Este, inclusive, é o posicionamento adotado pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça, expresso nas seguintes ementas: “RECURSO ESPECIAL. CRIME DE TRÂNSITO. HOMICÍDIO CULPOSO. APLICAÇÃO CONCOMITANTE DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE COM A DE SUSPENSÃO OU PROIBIÇÃO DO DIREITO DE DIRIGIR VEÍCULO. OBRIGATORIEDADE. MOTORISTA PROFISSIONAL. CAUSA DE AUMENTO DE PENA. 1. O art. 302, caput, da Lei nº 9.503/97, por tratar de hipótese evidentemente mais reprovável, além da sanção corporal, impõe concomitantemente a pena de suspensão da habilitação ou proibição de obter a permissão para dirigir veículo automotor. 2. Segundo o disposto no inciso IV, do parágrafo único, do art. 302, o fato de ser o infrator motorista profissional, ao invés de se constituir como uma regalia, afigura-se como causa de aumento de pena, uma vez que, segundo Damásio Evangelista de Jesus, “nessa hipótese é maior o cuidado objetivo necessário, mostrando-se mais grave o seu descumprimento” (in Crimes de Trânsito, 5ª edição, 2002, p. 91). 3. Recurso provido para determinar a aplicação da pena de suspensão ou proibição do direito de dirigir veículo automotor ao réu, bem como a majorante prevista no inciso IV, do parágrafo único, do art. 302, do Código de Trânsito Brasileiro.”(Resp. 685084/RS, 5ª Turma, Rel. Min. LAURITA VAZ, j. 01/03/2005, pub. DJU de 28.03.2005, p. 309). CRIMINAL. RESP. DELITO DE TRÂNSITO. HOMICÍDIO CULPOSO. OITIVA DOS PERITOS E EXAME MÉDICO. INDEFERIMENTO. LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO. SUBSTITUIÇÃO DA PENA CORPORAL POR DUAS RESTRITIVAS DE DIREITO ALÉM DA SUSPENSÃO DA HABILITAÇÃO PARA DIRIGIR. POSSIBILIDADE. SUBSTITUIÇÃO DA LIMITAÇÃO DE FINAIS DE SEMANA POR PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA. IMPOSSIBILIDADE. MOTORISTA PROFISSIONAL. SUSPENSÃO DA HABILITAÇÃO PARA DIRIGIR. POSSIBILIDADE. PRESCRIÇÃO DA PENA DE SUSPENSÃO DA HABILITAÇÃO PARA DIRIGIR. INOCORRÊNCIA. RECURSO DESPROVIDO. I – As provas produzidas têm a finalidade de convencer o juízo da causa, que tem o poder de discernir quais diligências serão relevantes para o deslinde da causa, diante do princípio do livre convencimento motivado. II – Não constitui ilegalidade o indeferimento do pedido de oitiva e acareação dos peritos oficiais e particular, se não evidenciada a necessidade da diligência requerida, ainda mais em se tratando de feito em que a polícia especializada realizou perícia técnica no local dos fatos, logo após o acidente, a qual foi corroborada pelas demais prova dos autos. III – Do mesmo modo, o indeferimento do pedido de exame médico no condutor do ônibus envolvido no acidente não viola a Lei Processual Penal, se a desnecessidade fundamentada. da medida restou devidamente IV - Não afronta o art. 44, § 1º, do Código Penal, a aplicação de duas penas restritivas de direito, substitutivas da pena privativa de liberdade, cumuladas com a pena de suspensão da habilitação para dirigir veículo automotor. V – É incabível a substituição da pena de limitação de finais de semana por prestação pecuniária, se o pleito substitutivo restou fundamentadamente afastado pelo Tribunal a quo, diante da análise das circunstâncias do caso concreto. VI – O fato de o réu ser motorista profissional não o isenta de sofrer a imposição da pena de suspensão da habilitação para dirigir, porque sua cominação decorre de expressa previsão legal (art. 302 do CTB), que não faz nenhuma restrição nesse sentido. VII - De acordo com o artigo 118 do Código Penal, as penas mais leves prescrevem com as mais graves. Assim, a pena de suspensão da habilitação para dirigir veículo automotor imposta cumulativamente com a privativa de liberdade prescreve no prazo desta. VIII – Não decorrido o prazo prescricional das penas mais graves – restritivas de direito aplicadas em substituição à pena privativa de liberdade -, não há que se falar em prescrição da pena mais leve – suspensão da habilitação para dirigir. IX – Recurso desprovido “(Resp. 628730/SP, 5ª Turma, Rel. Min. GILSON DIPP, j. 24/05/2005, pub. DJU de 13.06.2005, p. 333) 8. CONCLUSÃO O tema central deste estudo versou a acerca do crime de homicídio na condução de veículo automotor, verificando qual o tratamento vem sendo dispensado nesta circunstância. Percebe-se que este problema vem atormentando a sociedade brasileira há algumas décadas e desde então, apesar de criarem vários mecanismos eficientes de combate à violência no trânsito, chegou-se ao número expressivo de 700 (setecentas) mudanças no CTB. Ressalte-se, todavia, que nem todas as modificações proporcionadas por nossos legisladores atenderam às expectativas técnico-jurídicas dos profissionais de trânsito que, mais do que ninguém, almejam uma legislação justa, equilibrada e coesa. Nesse contexto, podem-se citar algumas modificações significativas implantadas, quais sejam, uma reclassificação das infrações de trânsito, em que se passou a aplicar sanções mais severas para determinadas condutas, dada a sua gravidade, como forma de desestimular e punir condutas nocivas ao trânsito. Nada menos importante foi abordagem voltada para o cidadão, no qual atribuiu-se a este o direito de peticionar e interferir junto ao Sistema Nacional de Trânsito, propiciando-se a este a participação ativa nas questões problemáticas inerentes ao trânsito, prestigiando-se a previsão constitucional do direito de peticionar junto aos órgãos públicos na defesa de seus interesses e da própria sociedade em que convive. Um dos problemas que vem ganhando proporções na mídia e está atormentando a população brasileira, é a alta incidência de condutores embriagados dirigindo em via pública. A conseqüência disso, são catastróficos acidentes e incontáveis vítimas. Uma rápida análise da legislação nos levaria à falsa premissa de que os crimes de circulação serão culposos por excelência, eis que o nosso CTB não contempla nenhuma hipótese de crime doloso em seu capitulo XIX, destinados ao tratamento dos crimes de trânsito. Entretanto, através da análise sistêmica da legislação penal, utilizando-se dos conceitos do CP, será possível a capitulação do homicídio na condução do veículo automotor, desde que observada a existência de 2 (duas) circunstâncias elementares: a previsibilidade do evento danoso e consentimento, ainda que implícito, do agente na produção do resultado. Restando caracterizada apenas a previsibilidade do evento, não há o que se falar em homicídio doloso na condução de veículo automotor, mas em mera culpa na modalidade consciente, pois a vontade do agente é de suma importância para a classificação do delito. Torna-se também imprescindível saber se o agente agiu com dolo ou culpa, visto que nenhum réu vai confessar a previsão do resultado, a consciência da possibilidade ou da probabilidade de sua causação, bem como a consciência do consentimento, pois para obter a precisão quanto ao tipo subjetivo e certificar se o autor agiu com dolo eventual e culpa consciente, será necessário a apreciação de todos os elementos e circunstâncias do fato concreto. Embora a capitulação com base no homicídio na condução de veículo automotor requeira a existência das citadas circunstâncias, são raras as decisões judiciais que acolhem a hipótese de dolo (ainda que indireto), nas circunstâncias onde não é materializado a previsão do evento e/ou o assentimento do agente. Tivemos ainda, como hipótese de trabalho que a adequação típica do homicídio praticado na condução do veículo automotor, como doloso seria o tratamento mais condizente como forma de prevenir esta modalidade delituosa. No entanto, após análise jurisprudencial sobre o assunto, verificamos que os tribunais têm se posicionado de forma contrária ao nosso entendimento, no sentido que crime somente será doloso se presente os requisitos da previsibilidade. Por fim, embora as punições previstas em lei transpareçam brandura e são aparentemente incompatíveis com a gravidade dos atos praticados pelos que delinqüem, tais decisões, em regra, objetivam a imposição de pena mais pesada ao autor do crime, com respaldo legal e total respeito à doutrina, no entanto, reafirmamos nessa presente, no sentido de que deva ser dispensado um tratamento mais rigoroso ao homicídio na condução do veículo automotor, como forma de previnir e reprimir o grande número de homicídios praticados no trânsito. Esperamos que este trabalho possa contribuir para aqueles que se dedicam ao estudo deste tema, que se apresenta como problema contemporâneo e de grande complexidade. 9. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal. V. 1, Parte Geral. São Paulo: Saraiva, 2000. GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal: parte geral. Rio de Janeiro: Impetus, 2003. GRECO, Rogério opus citatum, p. 224. PRADO, Luiz Regis. Curso de Direito Penal Brasileiro. 6. ed. v. 2. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. SANTORO FILHO, Antônio Carlos. Fundamentos do Direito Penal. São Paulo: Malheiros, 2003. SILVA, César Dario Mariano da. Manual de Direito Penal. 3. ed. v. 2. Rio de Janeiro: Forense, 2006. SOUZA, Artur de Brito Gueiros. Espécies de sanções penais: uma análise comparativa entre os sistemas penais da França e do Brasil. Revista Brasileira de Ciências Criminais. n. 49, jul./ago., 2004, p. 9 – 38. STOCO, Rui. Tratado de Responsabilidade Civil: responsabilidade civil e sua interpretação doutrinária e jurisprudencial. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. TOLEDO, Francisco de Assis Toledo. Princípios Básicos de Direito Penal. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 1994. VIEIRA, João Alfredo Medeiros. Estudo sobre o Homicídio. 2. ed. Santo André-SP: LEDIX, 2005. JESUS, Damásio, 2001, Direito Penal: parte geral, p. 288 PELLEGRINI, Rinaldo apud CAMARGO,Marcelo Ferreira de. Embriaguez e responsabilidade penal. Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 344, 16 jun. 2004. Disponível em:<http://jus2.uol.com.br/doutrina /texto.asp 5342>.Acesso em:31out.2006. 16:00 h. VANILO Vignola: É Sargento da Polícia Militar de Santa Catarina. Bacharel em Direito pela Universidade para o Desenvolvimento do Alto Vale do Itajaí – UNIDAVI. Pós-Graduado “lato sensu”, especialização em “Gestão de Trânsito”, pelo Instituto de Certificação e Estudos de Trânsito e Transportes/SC em convênio com a Universidade Estácio de Sá/SC. Pós-Graduando “lato sensu”, especialização em Direito de Trânsito, pela Faculdade Anita Garibaldi - CESUSC. Lei 9.503/97, com nova redação dada pela Lei 11.275/06 Lei 11.705/2008 (Lei Seca) TJ/SC, Apelação Criminal no 1998.018158-5, julg. em 24/03/99. RESP. 685084/RS, 5ª Turma, Rel. Min. LAURITA VAZ, j. 01/03/2005, pub. DJU de 28.03.2005, p. 309). 10. ANEXOS Presidência da República Casa Civil Subchefia para Assuntos Jurídicos LEI Nº 11.705, DE 19 DE JUNHO DE 2008. Mensagem de Veto Conversão da Medida Provisória nº 415, de 2008 Altera a Lei 9.503, de 23 de setembro de 1997, que ‘institui o Código de Trânsito Brasileiro’, e a Lei . 9.294, de 15 de julho de 1996, que dispõe sobre as restrições ao uso e à propaganda de produtos fumígeros, bebidas alcoólicas, medicamentos, terapias e defensivos agrícolas, nos termos do § 4o do art. 220 da Constituição Federal, para inibir o consumo de bebida alcoólica por condutor de veículo automotor, e dá outras providências. O PRESIDENTE DAREPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei: Art. 1o Esta Lei altera dispositivos da Lei 9.503, de 23 de setembro de 1997, que institui o Código de Trânsito Brasileiro, com a finalidade de estabelecer alcoolemia 0 (zero) e de impor penalidades mais severas para o condutor que dirigir sob a influência do álcool, e da Lei 9.294, de 15 de julho de 1996, que dispõe sobre as restrições ao uso e à propaganda de produtos fumígeros, bebidas alcoólicas, medicamentos, terapias e defensivos agrícolas, nos termos do § 4o do art. 220 da Constituição Federal, para obrigar os estabelecimentos comerciais em que se vendem ou oferecem bebidas alcoólicas a estampar, no recinto, aviso de que constitui crime dirigir sob a influência de álcool. Art. 2o São vedados, na faixa de domínio de rodovia federal ou em terrenos contíguos à faixa de domínio com acesso direto à rodovia, a venda varejista ou o oferecimento de bebidas alcoólicas para consumo no local. § 1o A violação do disposto no caput deste artigo implica multa de R$ 1.500,00 (um mil e quinhentos reais). § 2o Em caso de reincidência, dentro do prazo de 12 (doze) meses, a multa será aplicada em dobro, e suspensa à autorização de acesso à rodovia, pelo prazo de até 1 (um) ano. § 3o Não se aplica o disposto neste artigo em área urbana, de acordo com a delimitação dada pela legislação de cada município ou do Distrito Federal. Art. 3o Ressalvado o disposto no § 3o do art. 2o desta Lei, o estabelecimento comercial situado na faixa de domínio de rodovia federal ou em terreno contíguo à faixa de domínio com acesso direto à rodovia, que inclua entre suas atividades a venda varejista ou o fornecimento de bebidas ou alimentos, deverá afixar, em local de ampla visibilidade, aviso da vedação de que trata o art. 2o desta Lei. Parágrafo único. O descumprimento do disposto no caput deste artigo implica multa de R$ 300,00 (trezentos reais). Art. 4o Competem à Polícia Rodoviária Federal a fiscalização e a aplicação das multas previstas nos arts. 2o e 3o desta Lei. § 1o A União poderá firmar convênios com Estados, Municípios e com o Distrito Federal, a fim de que estes também possam exercer a fiscalização e aplicar as multas de que tratam os arts. 2o e 3o desta Lei. § 2o Configurada a reincidência, a Polícia Rodoviária Federal ou ente conveniado comunicará o fato ao Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transportes - DNIT ou, quando se tratar de rodovia concedida, à Agência Nacional de Transportes Terrestres - ANTT, para a aplicação da penalidade de suspensão da autorização de acesso à rodovia. Art. 5o A Lei . 9.503, de 23 de setembro de 1997, passa a vigorar com as seguintes modificações: I - o art. 10 passa a vigorar acrescido do seguinte inciso XXIII: “Art. 10. ....................................................................... ............................................................................................. XXIII - 1 (um) representante do Ministério da Justiça. ...................................................................................”(NR) II - o caput do art. 165 passa a vigorar com a seguinte redação: “Art. 165. Dirigir sob a influência de álcool ou de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência: Infração - gravíssima; Penalidade - multa (cinco vezes) e suspensão do direito de dirigir por 12 (doze) meses; Medida Administrativa - retenção do veículo até a apresentação de condutor habilitado e recolhimento do documento de habilitação. ...................................................................................”(NR) III - o art. 276 passa a vigorar com a seguinte redação: “Art. 276. Qualquer concentração de álcool por litro de sangue sujeita o condutor às penalidades previstas no art. 165 deste Código. Parágrafo único. Órgão do Poder Executivo federal disciplinará as margens de tolerância para casos específicos.”(NR) IV - o art. 277 passa a vigorar com as seguintes alterações: “Art. 277. ..................................................................... ............................................................................................. § 2o A infração prevista no art. 165 deste Código poderá ser caracterizada pelo agente de trânsito mediante a obtenção de outras provas em direito admitidas, acerca dos notórios sinais de embriaguez, excitação ou torpor apresentados pelo condutor. § 3o Serão aplicadas as penalidades e medidas administrativas estabelecidas no art. 165 deste Código ao condutor que se recusar a se submeter a qualquer dos procedimentos previstos no caput deste artigo.”(NR) V - o art. 291 passa a vigorar com as seguintes alterações: “Art. 291. ..................................................................... § 1o Aplica-se aos crimes de trânsito de lesão corporal culposa o disposto nos arts. 74, 76 e 88 da Lei 9.099, de 26 de setembro de 1995, exceto se o agente estiver: I - sob a influência de álcool ou qualquer outra substância psicoativa que determine dependência; II - participando, em via pública, de corrida, disputa ou competição automobilística, de exibição ou demonstração de perícia em manobra de veículo automotor, não autorizada pela autoridade competente; III - transitando em velocidade superior à máxima permitida para a via em 50 km/h (cinqüenta quilômetros por hora). § 2o Nas hipóteses previstas no § 1o deste artigo, deverá ser instaurado inquérito policial para a investigação da infração penal.”(NR) VI - o art. 296 passa a vigorar com a seguinte redação: “Art. 296. Se o réu for reincidente na prática de crime previsto neste Código, o juiz aplicará a penalidade de suspensão da permissão ou habilitação para dirigir veículo automotor, sem prejuízo das demais sanções penais cabíveis.” (NR) VII - (VETADO) VIII - o art. 306 passa a vigorar com a seguinte alteração: “Art. 306. Conduzir veículo automotor, na via pública, estando com concentração de álcool por litro de sangue igual ou superior a 6 (seis) decigramas, ou sob a influência de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência: ............................................................................................. Parágrafo único. O Poder Executivo federal estipulará a equivalência entre distintos testes de alcoolemia, para efeito de caracterização do crime tipificado neste artigo.”(NR) Art. 6o Consideram-se bebidas alcoólicas, para efeitos desta Lei, as bebidas potáveis que contenham álcool em sua composição, com grau de concentração igual ou superior a meio grau Gay-Lussac. Art. 7o A Lei . 9.294, de 15 de julho de 1996, passa a vigorar acrescida do seguinte art. 4o-A: “Art. 4o-A. Na parte interna dos locais em que se vende bebida alcoólica, deverá ser afixado advertência escrita de forma legível e ostensiva de que é crime dirigir sob a influência de álcool, punível com detenção.” Art. 8o Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. Art. 9o Fica revogado o inciso V do parágrafo único do art. 302 da Lei 9.503, de 23 de setembro de 1997. Brasília, 16 de junho de 2008; 187o da Independência e 120o da República. LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA Tarso Genro Alfredo Nascimento Fernando Haddad José Gomes Temporão Marcio Fortes de Almeida Jorge Armando Felix Déca A CUSTO POR PESSOA ACIDENTES SEM VÍTIMAS = R$ 16.840,00 ACIDENTES COM VÍTIMAS LESIONADAS = R$ 84.200,00 ACIDENTES COM VÍTIMAS FATAIS = R$ 421.000,00 Fonte: IPEA Pr Tax envolve 10 9 Norte Nordeste Taxa por 100 mil 8 Sudeste Sul 7 Centro-Oeste 6 Brasil Ajuste Norte 5 Ajuste Nordeste 4 Ajuste Sudeste Ajuste Sul 3 Ajuste CentroOeste Ajuste Brasil 2 1 0 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 Ano Taxas padron Recife, 45 40 Br asi l F 1. 024 Col et ad M Região S Mortal 20 a 39 anos 0 a 14 anos 1 00% 80% 60% 40% 20% 0% 1 00% 80% 60% 40% 20% b ra n c a p re t a p a rd a ig no ra d a 0% b ra nc a p re ta p a rd a ig no ra d a 60 anos ou mais 1 00% 1 00% P e d e s tre 80% 60% Au to m 4ó0 v% e l Mo to c 2ic0 %le ta 0% Ou tro s 80% Bic ic le ta 60% VT P 40 % Ôn ib u s 2 0% terrestr 1991 Ca m in h o n e te T ric ic lo c 0% b ra nc a p re ta p a rd a ig no ra d a NAT H o m íc id io H o m ic íd o ACI NATUR Acidentes se Acidentes co Acid. com víti TOTAL Ac TRÂNSIT PRINCIPAIS CA NATUR Lesão Corporal