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PN 2095.03-51; Ap.: Tc. Oliveira de Azemeis, 2º J. (364-C/99);
Ap.e: MP;
Ap.os: Ribalta, Sapatarias Carlos, Lda2,
Calzados Evori, SA3.
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Acordam no Tribunal da Relação do Porto
O Digno Magistrado do Ministério Público interpõe a presente Apelação por
ter sido rejeitada a reclamação de créditos da Fazenda Pública em execução
que Calzado Evori, SA, move contra Ribalta..., Lda.
É esta a matéria de facto assente:
(1)Na execução sumária em que a presente reclamação de créditos corre por
apenso, Ribalta... foi executada para o pagamento da quantia de Pte 2 513
292$00 e juros...;
(2)Na execução em causa foram penhorados, 00.05.10, vários bens móveis
pertença da executada;
(3)Esta é devedora à Fazenda Nacional do montante de € 11 677,59, a título
de IVA (P.100945.1/00), e pelos juros, € 4 227,59;
(4)E da mesma sorte, pela quantia de € 7 270, 59, a título de IRC
(P.10005.5/00), e pelos juros, € 1 145,75;
(5)Entretanto a executada tinha solicitado ao Director Geral de Finanças o
pagamento, que lhe foi deferido em 36 prestações mensais relativamente aos
créditos referentes a IRC, o mesmo sucedendo quanto ao IVA, o montante
deste com possibilidade de pagamentos por conta nos termos do art. 264
CPPT.
Sob esta matéria argumentou a decisão recorrida:
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Vistos: Des. Paiva Gonçalves (1468); Des. Marques Peixoto (1487).
Ad.: Dra. Fátima Zenão, Vila Real.
3
Adv.: Dr. Ângelo Valente.
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(a) A reclamada alegou, e foi dado como provado, que as dívidas em causa
foram objecto de deferimento, pela Administração Fiscal, do seu pagamento
fraccionado quer no âmbito do chamado Plano Mateus, quer ao abrigo do
art. 264 CPPT;
(b)E é legalmente inadmissível a reclamação em acção executiva comum
instaurada nos tribunais judiciais de créditos de impostos abrangidos pela
autorização do Estado, por ele não revogada, de pagamento fraccionado4.
Contudo, nas conclusões do recurso sustenta o MP:
(1) A presente reclamação foi rejeitada por se entender que ao abrigo da Lei
Mateus é a mesma legalmente inadmissível;
(2) Ora, os créditos reclamados não se encontram a ser pagos ao abrigo
daquele sistema normativos, pelo que as suas disposições específicas lhe não
são aplicáveis;
(3) A autorização de pagamento fraccionado das dívidas fiscais e o seu
pagamento por conta, ao abrigo do art. 264 CPPT, não impede a reclamação
destas dívidas em sede de execução cível;
(4) Na verdade, os créditos não vencidos não podem ser objecto de execução
própria, mas podem ser objecto de reclamação, art. 865/3 CPC;
(5) Contudo, ainda as dívidas estivessem abrangidas pelo Plano Mateus,
mesmo assim seria admissível a sua reclamação;
4
Citou em abono Ac. STJ, 01.03.27, CJ (STJ) I/184, referente ao domínio de aplicação do DL 124/96,
10.08; Ac. STJ, 99.11.11, BMJ 491/214: existindo um acordo celebrado entre o Estado (Administração
Fiscal) e um particular, ao abrigo do Plano Mateus, para pagamento em prestações de dívidas de
imposto sobre o rendimento das pessoas singulares e respectivos juros, não pode aquele mesmo Estado, e
enquanto aquele acordo estiver ser pontualmente cumprido, exigir pela reclamação de créditos, seja em
que processo for (fiscal, cível ou outro) o pagamento integral do seu crédito, sob pena de se reconhecer
que está exercendo o direito de crédito que possui sobre os contribuintes de um modo manifestamente
excessivo, face aos limites impostos pela boa fé e os bons costumes, art. 334 CC; é que o Estado, ao agir
deste modo, ou seja, ao permitir que o pagamento da dívida de impostos se fizessem fraccionadamente ou
mais precisamente no regime de prestações mensais e, posteriormente, ao exigir através da reclamação
de créditos o pagamento da mesma dívida de uma só vez, está a agir de uma forma contraditória e pouco
consentânea com o conceito de pessoa de bem (que se lhe deve reconhecer), e num claro e frontal venire
contra factum proprium, que constitui indubitavelmente abuso de direito; Ac. RP, 99.11.09, CJ (1999),
V/184: tendo a executada aderido ao Plano Mateus quanto às garantias devidas pelo importo a título de
IVa, e estando a cumprir o aí estabelecido, é de indeferir liminarmente a reclamação pelo Estado do
crédito desse imposto ainda em dívida; Ac. RL, 99.04.14, CJ (1999), II/163.
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(6) De facto, caducando com a venda dos bens penhorados as garantias reais,
a falta de reclamação do credor com garantia real implica a caducidade dessa
garantia;
(7) Assim, a não admissão da reclamação faz com que se fruste na prática a
possibilidade de cobrança coerciva dos créditos fiscais;
(8) Deve ser revogada a sentença recorrida, substituída então por outra que
determine a admissibilidade da reclamação de créditos apresentada.
Não houve contra-alegações.
Cumpre apreciar e decidir, nos termos do art. 705 CPC.
Perante o claríssimo inciso legal citado pelo recorrente apenas cumpre desfazer o
equívoco de a reclamada ter sido beneficiária de deferimento ao abrigo do Plano
Mateus. Na verdade assim não aconteceu, tratando-se aqui de um mero deferimento
comum do pagamento em prestações da dívida fiscal.
Ora se no contexto do Plano Mateus faz sentido todo o travejamento, convocando a boa
fé, do acórdão do STJ citado em abono pela sentença recorrida5 (tratava-se de uma
medida contratualizada com os particulares, visando o relançamento da economia ou tal
como instrumento interventor que pressupunha justamente pôr entre parêntesis um
exigência imediata, em quaisquer circunstâncias, dos débitos fiscais) já não é assim na
quotidianidade da aplicação do CPPT (aqui já aquele perfil excepcional deixou o
horizonte de aplicação da lei).
Deste modo, visto o art. 865/3 CPC, que enquadra com rigor o ponto de vista do
recorrente e lhe confere razão, vai a sentença recorrida revogada, para que seja admitida
a reclamação de créditos (nos estritos limites do pedido corrigido6).
Custas precípuas.
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Vd. nota antecedente.
Vd. fls. 29 e 30, fls. 44.
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