UNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA
MICHELE DE OLIVEIRA PEREIRA
POSSIBILIDADE JURÍDICA DE INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA DA LEI
ORGÂNICA DA ASSISTÊNCIA SOCIAL PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO
ASSISTENCIAL
Tubarão
2011
MICHELE DE OLIVEIRA PEREIRA
POSSIBILIDADE JURÍDICA DE INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA DA LEI
ORGÂNICA DA ASSISTÊNCIA SOCIAL PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO
ASSISTENCIAL
Monografia apresentada ao Curso de Direito da
Universidade do Sul de Santa Catarina, como requisito
parcial à obtenção do título de Bacharel em Direito.
Linha de pesquisa: Justiça e sociedade.
Orientadora: Profª. Maria Nilta Ricken Tenfen, Msc.
Tubarão
2011
MICHELE DE OLIVEIRA PEREIRA
POSSIBILIDADE JURÍDICA DE INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA DA LEI
ORGÂNICA DA ASSISTÊNCIA SOCIAL PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO
ASSISTENCIAL
Esta Monografia foi julgada adequada à obtenção
do título de Bacharel em Direito e aprovado em sua
forma final pelo Curso de Direito da Universidade do
Sul de Santa Catarina.
Tubarão, 21 de junho de 2011.
_______________________________________________
Profª. e Orientadora Maria Nilta Ricken Tenfen, Msc.
Universidade do Sul de Santa Catarina
_______________________________________________
Profª. Sandra L. Nunes Ângelo Mendonça Fileti , Esp.
Universidade do Sul de Santa Catarina
________________________________________________
Profª. Keila Comelli Alberton, Esp.
Universidade do Sul de Santa Catarina
Dedico este trabalho à minha família e ao
meu namorado, Maiquel, pelo carinho,
apoio, compreensão e conselhos dados
durante toda a caminhada.
AGRADECIMENTOS
A Deus por estar presente em todos os momentos e por iluminar o meu
caminho para que fosse possível concluir essa etapa de minha vida.
Ao meu namorado, familiares e amigos que me cercaram de carinho,
compreensão e paciência durante toda a caminhada, me ensinando a dar valor às
conquistas.
A todos os professores, que repartiram os seus conhecimentos e
contribuíram para a minha formação.
À minha orientadora, Maria Nilta Ricken Tenfen, pela paciência,
disposição e conhecimentos compartilhados imprescindíveis para a conclusão deste
trabalho.
E a todos aqueles que contribuíram de uma forma ou outra para que eu
chegasse até aqui.
RESUMO
A presente pesquisa teve por objetivo analisar a possibilidade de interpretação
extensiva dos requisitos necessário à concessão do benefício assistencial previstos
na Lei Orgânica da Assistência Social. O desenvolvimento da pesquisa se deu por
meio do método dedutivo. Foi efetuada uma análise geral da Seguridade Social no
Brasil e principalmente da Assistência Social. Posteriormente, foram verificados, na
jurisprudência e na doutrina, os posicionamentos acerca do tema proposto. Utilizouse ainda da pesquisa bibliográfica, em livros e normas que regem a Assistência
Social no Brasil, a fim de aprofundar o conhecimento acerca do benefício
assistencial. Os resultados da pesquisa demonstram que a jurisprudência e a
doutrina divergem claramente dos conceitos previstos na lei e que, com exceção dos
conceitos
de
idoso
e
deficiente,
os
outros
conceitos
são
interpretados
extensivamente, mesmo sem previsão legal. Por meio desses resultados concluiu-se
que é necessário que o Supremo Tribunal Federal confirme a possibilidade de
interpretação extensiva da Lei Orgânica da Assistência Social a fim de conciliá-la
com a realidade brasileira e dessa forma amparar todos aqueles que necessitam dos
serviços da Assistência Social.
Palavras-chave: Seguridade. Assistência Social. Interpretação Jurídica.
ABSTRACT
The present research had for objective to analyze the possibility of extensive
interpretation of the requirements necessary to the concession of the assistance
benefit foreseen in the Organic Law of the Social Assistance. The development of the
research if gave by means of the deductive method. A general analysis of the Social
Security in Brazil and mainly of the Social Assistance was effected. Later, they had
been verified, in the jurisprudence and the doctrine, the positions concerning the
considered subject. It was still used of the bibliographical research, in books and
norms that conduct the Social Assistance in Brazil, in order to deepen the knowledge
concerning the assistance benefit. The results of the research demonstrate that the
jurisprudence and the doctrine disagree clearly of the concepts foreseen in the law
and that, with exception of the concepts of aged and deficient, the other concepts are
interpreted extensively, exactly without legal forecast. By means of these results
one concluded that it is necessary that the Supreme Federal Court confirms
the possibility of extensive interpretation of the Organic Law of the Social
Assistance in order to conciliate it with the Brazilian reality and of this form to
support all those that need the services of the Social Assistance.
Word-key: Security. Social Assistance. Legal interpretation.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 9
1.1 DELIMITAÇÃO DO TEMA E FORMULAÇÃO DO PROBLEMA............................ 9
1.2 JUSTIFICATIVA .................................................................................................. 10
1.3 OBJETIVOS ........................................................................................................ 11
1.3.1 Objetivo geral .................................................................................................. 11
1.3.2 Objetivos específicos ..................................................................................... 11
1.4 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ........................................................... 12
1.5 DESENVOLVIMENTO
DO
TRABALHO:
ESTRUTURAÇÃO
DOS
CAPÍTULOS .............................................................................................................. 12
2 SEGURIDADE SOCIAL ........................................................................................ 13
2.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA SEGURIDADE SOCIAL ..................................... 13
2.2 EVOLUÇÃO E ESTRUTURA ATUAL DO SEGURO SOCIAL NO BRASIL ...... 15
2.3 PREVIDÊNCIA.................................................................................................. 18
2.3.1 Conceito .......................................................................................................... 18
2.3.2 Objetivos ......................................................................................................... 19
2.3.3 Beneficiários ................................................................................................... 20
2.3.3.1 Segurados .................................................................................................... 20
2.3.3.2 Dependentes ................................................................................................ 22
2.3.4 Benefícios ........................................................................................................ 23
2.4 SAÚDE ............................................................................................................. 25
2.4.1 Conceito .......................................................................................................... 26
2.4.2 Diretrizes ......................................................................................................... 26
2.4.3 Serviços ........................................................................................................... 27
3 ASSISTÊNCIA SOCIAL ....................................................................................... 29
3.1 EVOLUÇÃO HISTÓRIA DA ASSISTÊNCIA SOCIAL ......................................... 29
3.2 CONCEITO ......................................................................................................... 30
3.3 OBJETIVOS ...................................................................................................... 30
3.4 PRINCÍPIOS .................................................................................................... 31
3.5 ORGANIZAÇÃO E GESTÃO ............................................................................ 32
3.6 SERVIÇOS ES PROGRAMAS ......................................................................... 34
3.7 BENEFÍCIOS .................................................................................................... 36
3.7.1 Benefício de prestação continuada............................................................... 36
3.7.2 Benefícios eventuais ...................................................................................... 40
4 POSSIBILIDADE DE INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA PARA A CONCESSÃO
DO BENEFÍCIO ASSISTENCIAL ............................................................................. 41
4.1 FONTES NO DIREITO PREVIDENCIÁRIO ........................................................ 41
4.2 APLICAÇÃO DAS NORMAS NO DIREITO PREVIDENCIÁRIO ......................... 42
4.2.1 Critérios de Solução de Antinomias ............................................................. 43
4.2.2 Lacunas do Ordenamento .............................................................................. 44
4.2.3 Efeitos da Interpretação ................................................................................. 45
4.2.3.1 Interpretação declarativa .............................................................................. 45
4.2.3.2 Interpretação restritiva .................................................................................. 45
4.2.3.3 Interpretação extensiva ................................................................................ 46
4.3 POSSIBILIDADE JURÍDICA DE INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA DA LEI
ORGÂNICA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO
ASSISTENCIAL......................................................................................................... 46
5 CONCLUSÃO ....................................................................................................... 53
REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 55
ANEXO ..................................................................................................................... 60
ANEXO A – Jurisprudências utilizadas ................................................................. 61
9
1 INTRODUÇÃO
Neste
trabalho
serão
analisados
aspectos
acerca
do
benefício
assistencial, que é concedido em âmbito previdenciário e está previsto na Lei
Orgânica da Assistência Social.
1.1 DELIMITAÇÃO DO TEMA E FORMULAÇÃO DO PROBLEMA
A preocupação com a proteção social das pessoas carentes é algo que
sempre marcou a história dos países. No Brasil, a primeira constituição já previa a
instituição de socorros públicos para quem necessitasse1.
Introduzido no ordenamento jurídico a partir da Constituição Federal de
19882, o benefício assistencial é aquele devido aos idosos ou deficientes que não
possuem meios de se manter ou serem mantidos pelos familiares.
O benefício assistencial foi instituído em substituição ao extinto benefício
de renda mensal vitalícia e constitui-se de um benefício de prestação continuada, ou
seja, devido mensal e sucessivamente.
A grande discussão do tema ora proposto teve início com o advento da
Lei nº 8.742/933, Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS, que regulamentou o
inciso V, do artigo 203, da Constituição Federal4 e dispôs especificamente da
Assistência Social no Brasil. Diversos juristas entenderam que os requisitos
previstos pela lei eram excessivamente rigorosos, questionando até mesmo acerca
da sua constitucionalidade.
A Assistência Social no Brasil é regida por objetivos primordiais e os
aplicadores do Direito viram-se frente a critérios que muitas vezes não atenderiam a
esses objetivos.
1
TSUTIYA, Augusto Massayuki. Curso de direito da seguridade social. 2. ed. São Paulo: Saraiva,
2008. p.8.
2
BRASIL. Constituição da república Federativa do Brasil de 1988. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao.htm>. Acesso: em 15 set. 2010.
3
Id., Lei n. 8.742, de 7 de dezembro de 1993. Dispõe sobre a organização da Assistência Social e
dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/CCIVIL/leis/L8742.htm>. Acesso
em: 15 set. 2010.
4
BRASIL. Constituição da república Federativa do Brasil de 1988, loc. cit.
10
Objeto do estudo de diversos doutrinadores, a divergência acerca dos
critérios previstos na LOAS não teve fim nem mesmo quando o Supremo Tribunal
Federal – STF julgou a Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 1.2325 e declarou a
constitucionalidade do requisito objetivo de miserabilidade, no julgamento da Ainda
há juízes e doutrinadores que sustentam que a miserabilidade não pode ser
verificada por critérios objetivos.
Assim, ante os diversos entendimentos defendidos pela doutrina e pela
jurisprudência pretende-se com o presente estudo verificar se: a Lei Orgânica da
Assistência Social deve ser interpretada de forma absoluta ou pode ter interpretação
extensiva para alcançar efetivamente os objetivos constitucionais?
1.2 JUSTIFICATIVA
Não é de hoje que os aplicadores do Direito discutem acerca dos critérios
inovados pela Lei n. 8.742/19936.
Essa discussão se assenta na dificuldade que os juristas encontraram ao
buscar conciliar os objetivos da Assistência Social e os requisitos demasiadamente
rígidos instituídos pela lei em questão.
O interesse pelo estudo surgiu durante o desenvolvimento do estágio na
Procuradoria Especializada junto ao Instituto Nacional do Seguro Social, no
acompanhamento das ações visando a concessão do benefício assistencial, e se
consolidou após o contato com ações da mesma natureza durante o estágio na Vara
Previdenciária da Justiça Federal, onde se pôde verificar a divergência entre a
aplicação literal da lei e a interpretação extensiva visando alcançar os objetivos da
assistência social.
A pesquisa sobre este tema permitirá analisar com maior profundidade os
requisitos necessários à concessão do benefício, bem como as interpretações da
5
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 1.232. Relator:
Ministro Ilmar Galvão. Brasília, DF, 01 de junho de 2001. Disponível em:
<http://www.stf.jus.br/portal/peticaoInicial/verPeticaoInicial.asp?base=ADIN&s1=1232&processo=12
32>. Acesso em: 15 set. 2010.
6
BRASIL. 1993, loc. cit.
11
doutrina e jurisprudência majoritárias sobre os dispositivos legais que disciplinam a
matéria.
A relevância desse estudo se sobressai na atual conjuntura nacional, em
que muito se discute sobre as políticas assistenciais e criam-se diversos programas
de proteção social para as pessoas carentes. Fundamental, portanto, a busca pela
eficácia de tal proteção, de modo a amparar somente aqueles que realmente
necessitam, visto que a contrapartida dessa proteção se constitui de um elevado
custo para os cofres públicos.
Considerando que o benefício assistencial é uma garantia constitucional,
é imprescindível que o Poder Judiciário emprenhe-se em assegurar a sua correta
aplicação.
O trabalho visa ainda sanar as principais dúvidas sobre o tema e
esclarecer o leitor sobre a dimensão dessa garantia constitucional.
1.3 OBJETIVOS
1.3.1 Objetivo geral
Analisar se é possível interpretar extensivamente os requisitos previstos
na Lei Orgânica da Assistência Social no momento da concessão do benefício
assistencial.
1.3.2 Objetivos específicos
Verificar a posição do benefício assistencial no ordenamento jurídico.
Compreender quais são os requisitos necessários para a concessão do
benefício assistencial.
Avaliar se há possibilidade de interpretação extensiva da Lei Orgânica da
Assistência Social, no que dispõe sobre o benefício em questão.
12
Analisar a divergência jurisprudencial e doutrinária acerca da concessão
do benefício.
1.4 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
“Para que a pesquisa seja definida como científica, é necessário que se
desenvolva de maneira organizada e sistemática, seguindo um planejamento
previamente estabelecido pelo pesquisador.”7
O presente trabalho será desenvolvido com base no método dedutivo de
abordagem. E com relação ao método de procedimento será adotado o método
monográfico.
Quanto aos tipos de pesquisa serão utilizadas a pesquisa exploratória e a
pesquisa bibliográfica.
1.5 DESENVOLVIMENTO DO TRABALHO: ESTRUTURAÇÃO DOS CAPÍTULOS
O desenvolvimento da monografia foi estruturado em três capítulos.
No primeiro capítulo será analisada a estrutura da seguridade social, sua
evolução histórica e posição no ordenamento atual.
Seguindo a mesma estrutura, no segundo capítulo serão verificados os
aspectos acerca da Assistência Social no Brasil e os requisitos necessários à
concessão do benefício assistencial.
Por fim, será feita uma análise sobre as formas de interpretação e de
aplicação das normas no Direito e ainda análise das divergências doutrinárias e
jurisprudenciais acerca do tema proposto.
7
LEONEL, Vilson; MOTTA, Alexandre de Medeiros. Ciência e Pesquisa. 2. ed. rev. e atual. Palhoça:
Unisul Virtual, 2007. p. 99.
13
2 SEGURIDADE SOCIAL
A seguridade social trata-se de um conjunto de ações, de iniciativa
pública e social, que tem por finalidade “assegurar os direitos relativos à saúde, à
previdência e à assistência.”1
Segundo Almansa Pastor a seguridade deve ser concebida como “um
instrumento protetor, garantindo o bem-estar material, moral e espiritual de todos os
indivíduos da população, abolindo todo o estado de necessidade social em que
possam se encontrar.”2
Assim, a Seguridade Social pode ser compreendida como um conjunto de
princípios e regras que visam estabelecer um sistema de proteção social aos
indivíduos que não possuem condições de prover suas necessidades e de suas
famílias.3
2.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA SEGURIDADE SOCIAL
A assistência aos necessitados é preocupação dos homens desde os
mais primórdios tempos. Há vestígios de sua prestação já na era romana, em que o
pater familias era encarregado do auxílio aos mais necessitados entre os servos e
clientes.4
Em outros países também houve este cuidado. Em 1601, foi publicada na
Inglaterra a Poor Relief Act (Lei de Amparo aos Pobres), que é tida como marco na
criação da Assistência Social.5
Na Alemanha, em 17 de janeiro de 1881, foi apresentado por Otto Von
Bismarck, um projeto de normas, conhecido como Projeto de Seguro Operário, que
1
BRASIL. Constituição da república Federativa do Brasil de 1988. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao.htm>. Acesso: em 12 mar. 2011.
2
ALMANSA PASTOR apud CORREIA, Marcus Orione Gonçalves; CORREIA, Érica Paula Barcha.
Curso de direito da seguridade social. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 16.
3
MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social. 7. ed. São Paulo: Atlas, 1997. p. 22.
4
GONÇALES, Odonel Urbano. Manual de direito previdenciário. 4. ed. São Paulo: Atlas, 1997. p.
21.
5
MARTINS, op.cit., p. 25.
14
assegurava aos trabalhadores o seguro-doença, a aposentadoria e a proteção à
vítimas de acidentes de trabalho.6
Conforme ensinamentos de Martins, “as leis instituídas por Bismarck
tornaram obrigatória a filiação às sociedades seguradoras ou entidades de socorros
mútuos, por parte de todos os trabalhadores que recebessem até 2.000 marcos
anuais".7
É possível citar, ainda, a França que em 1898 aprovou a lei de acidentes
de trabalho e a Inglaterra que regulamentou regras de proteção à velhice, acidentes
de trabalho, concedeu pensões aos maiores de 70 anos independentemente de
contribuição, e ainda estabeleceu o National Insurance Act que determinava um
sistema compulsório de contribuição social.8
O primeiro país a incluir em sua Constituição o seguro social foi o México,
já no ano de 1917.9
Até então existia somente a cobertura de eventos esparsos, para algumas
categorias e com fortes limitações de valor. Segundo Oliveira, a pioneira na
implantação de um sistema com cobertura para grandes eventos e a toda a
população foi a Nova Zelândia, no ano de 1938. 10 Esse novo sistema foi largamente
ampliado e adotado por diversos países.11
Em 1941, Lorde Wiliam Henry Beveridge, foi designado para reexaminar
os sistemas previdenciários da Inglaterra.12
A partir de 1944 tais sistemas foram alterados e foi adotado o chamado
Plano Beveridge, que criava um sistema universal abrangendo a todos os
indivíduos.13
Segundo Castro e Lazari:
A partir daí, nasce o regime beveridgeano, ou de repartição, em que toda a
sociedade contribui para a criação de um fundo previdenciário, do qual são
retiradas as prestações para aqueles que venham a ser atingidos por algum
14
dos eventos previstos na legislação de amparo social.
6
GONÇALES, 1997, p. 21.
MARTINS, 1997, p. 26.
8
MARTINS, loc.cit.
9
GONÇALES, op.cit., p. 22.
10
OLIVEIRA, Moacyr Velloso Cardoso de. Previdência: doutrina e exposição da legislação vigente.
Rio de Janeiro, 1987. p. 14.
11
Ibid., p. 15.
12
CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. 8.
ed. Florianópolis: Conceito, 2007. p. 40.
13
CASTRO; LAZZARI, loc. cit.
14
CASTRO; LAZZARI, loc. cit.
7
15
Dessa época em diante os direitos sociais passam a ser reconhecidos
mundialmente como categoria integrante do rol de direitos fundamentais, sendo
inclusive estabelecidos como tal, em 1948, pela Declaração Universal dos Direitos
Humanos no seu artigo XXV:
Toda pessoa tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e a
sua família saúde e bem estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação,
cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis, e direito à
segurança em caso de desemprego, doença, invalidez, viuvez, velhice ou
15
outros casos de perda dos meios de subsistência fora de seu controle.
Sob impulso das convenções realizadas pela Organização Internacional
do Trabalho (OIT) cada vez mais países foram renovando e ampliando seus
sistemas previdenciários e hoje, cada país, tem o seu próprio modelo de Seguridade
Social, incluindo o Brasil, como se verá a seguir.
2.2
EVOLUÇÃO E ESTRUTURA ATUAL DO SEGURO SOCIAL NO BRASIL
No Brasil, segundo Castro e Lazzari, a formação de um sistema de
proteção social se deu por meio de um lento processo em que o Estado reconheceu
a necessidade de intervenção para suprimento das deficiências causadas por uma
liberdade absoluta.16
As primeiras formas de proteção social no Brasil tinham caráter
beneficente e assistencial.17 Exemplos disto foram a fundação, no século XVI, da
Santa Casa da Misericórdia, pelo Padre José de Anchieta e no século XVII das
Irmandades de Ordens Terceiras.18 Em 1785, foi estabelecido o Plano de
Beneficência dos Órgãos e Viúvas dos Oficiais da Marinha e em 1821, Dom Pedro
de Alcântara, expediu o Decreto que concedia aposentadoria aos mestres e
professores, após 30 anos de serviço, e assegurava um abono de ¼ dos ganhos aos
que continuassem em serviço.19
15
ONU. Declaração Universal dos Direitos Humanos. Assembléia das Nações Unidas,
1948. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/publi_04/COLECAO/DH8.HTM>. Acesso em: 05
mar. 2011.
16
CASTRO; LAZZARI, 2007, p. 57.
17
Ibid., p. 58.
18
COIMBRA, J. R. Feijó. Direito Previdenciário brasileiro. 11. ed. Rio de Janeiro: Edições
Trabalhistas, 2001. p. 32.
19
CASTRO; LAZZARI, loc.cit.
16
A Constituição brasileira de 1824 não inovou, contendo apenas uma
disposição acerca da seguridade social em artigo 179 que dispunha sobre a
instituição dos socorros públicos.20
O Decreto n. 9.912-A, de 26 de março de 1888, fixava a concessão de
aposentadoria aos empregados dos Correios, que trabalhassem 30 anos e tivessem,
no mínimo, 60 anos de idade.21
A Constituição de 1891 introduziu na legislação brasileira a expressão
“aposentadoria”. Conforme Tsutiya “esse benefício era previsto para os servidores
em caso de invalidez a serviço da Nação [...] e não necessitava de contrapartida
pecuniária.”22
Em janeiro de 1923 foi promulgada a chamada Lei Eloy Chaves, que
instituía a previdência social, com a criação de Caixas de Aposentadoria e Pensões
para os ferroviários.23
Tsutiya ensina ainda que “a Lei Eloy Chaves é considerada o marco da
Previdência Social no Brasil, a despeito de favorecer somente uma categoria
profissional: a dos ferroviários. Em sua homenagem, 24 de janeiro comemora-se o
dia do aposentado.”24
Seguindo o modelo da Lei Eloy Chaves, na década de 30, o sistema
previdenciário estruturava-se por categorias profissionais. Em 1933, foi criado o
Instituto de Aposentadorias e Pensões dos Marítimos – IAPM; em 1934 o Instituto de
Aposentadoria e Pensões dos Comerciários – IPC e o Instituto de Aposentadoria e
Pensões dos Bancários – IAPB; em 1936, o Instituto de Aposentadoria e Pensões
dos Industriários – IAPI e o Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Empregados
de Transportes de Cargas – Iapetec. Havia ainda o Iapse e o Iapfesp, institutos
responsáveis pelos servidores públicos.25
A Constituição de 1934 estabeleceu, no Brasil, a contribuição compulsória
na forma de tríplice custeio: ente público, empregador e empregado e criou várias
formas de proteção ao trabalhador, à gestante, ao idoso e ao inválido.26
20
MARTINS, 1997, p. 27.
CASTRO; LAZZARI, 2007, p. 58.
22
TSUTIYA, Augusto Massayuki. Curso de direito da Seguridade Social. 2. ed. São Paulo: Saraiva,
2008. p. 8.
23
MARTINS, op.cit., p. 28.
24
TSUTIYA, op. cit., p. 9.
25
CHAMON, Omar. Introdução ao direito previdenciário. São Paulo: Manole, 2005. p. 17.
26
TSUTIYA, loc. cit.
21
17
Em 1942, surgiu a primeira entidade de Assistência Social pública, a
Legião Brasileira de Assistência – LBA.
Nossa quinta Constituição, em 1946, citou pela primeira vez a expressão
previdência social.
A promulgação da Lei n. 3.807 em 26 de agosto de 1960, Lei Orgânica da
Previdência Social, padronizou o sistema assistencial ampliando os benefícios e
vários auxílios27, o que segundo Martinez, abriu caminho para a unificação da
previdência de todos os institutos.28
Por força do Decreto-lei n. 72/66, os seis institutos então existentes, que
abrangiam trabalhadores de vários setores da economia, foram unificados dando
lugar ao Instituto Nacional de Previdência Social – INPS.
Porém, a positivação deste sistema unificado deu-se somente na
Constituição Federal de 1988, que instituiu em capítulo próprio a Seguridade Social
assegurando a proteção com relação à Previdência Social, Saúde e Assistência
Social.
Por fim, regulamentando o texto constitucional, foram promulgadas as
Leis 8.212/91 e 8.213/91, que dispõem respectivamente sobre a Seguridade Social e
o Plano de Benefícios da Previdência Social no Brasil.
Ao instituir a Seguridade Social no Brasil, o legislador estabeleceu ainda,
que seria organizada com base em sete princípios, que estão elencados no
parágrafo único do artigo 194, da Constituição Federal:
Art. 194. [...]
Parágrafo único. Compete ao Poder Público, nos termos da lei, organizar a
seguridade social, com base nos seguintes objetivos:
I - universalidade da cobertura e do atendimento;
II - uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações
urbanas e rurais;
III - seletividade e distributividade na prestação dos benefícios e serviços;
IV - irredutibilidade do valor dos benefícios;
V - eqüidade na forma de participação no custeio;
VI - diversidade da base de financiamento;
VII - caráter democrático e descentralizado da administração, mediante
gestão quadripartite, com participação dos trabalhadores, dos
29
empregadores, dos aposentados e do Governo nos órgãos colegiados.
Tais princípios têm por objetivo reger a Seguridade de forma que a sua
prestação alcance a todos de forma igual e legal.
27
MARTINS, 1997, p. 31.
MARTINEZ, Wladimir Novaes. A seguridade social na Constituição federal. 2. ed. São Paulo:
LTr, 1992. p. 21.
29
BRASIL. Constituição (1988), loc. cit.
28
18
Conforme ensina Martins, através da Seguridade Social:
O Estado vai atender às necessidades que o ser humano vier a ter nas
adversidades, dando-lhe tranquilidade quanto ao presente e, principalmente
quanto ao futuro, mormente quando o trabalhador tenha perdido a sua
30
remuneração, de modo a possibilitar um nível de vida aceitável.
Portanto, visa à proteção dos segurados quando estes não puderem
prover suas necessidades e as de seus familiares, por seus próprios meios.31
Segundo Martinez:
As três unidades não estão nem devem estar, ou ficar estanques, isoladas,
representando compartimentos distintos das políticas governamentais de
proteção social [...] devem conviver integradas com vistas ao bem-estar do
32
protegido.
Dessa forma os necessitados deverão ser beneficiados pela seguridade
social como um todo e não isoladamente por uma das três formas de proteção.
A Seguridade Social compreende a Previdência Social, a Saúde e a
Assistência Social que serão explanados a seguir.
2.3
PREVIDÊNCIA SOCIAL
A previdência social é hoje encargo do Instituto Nacional do Seguro Social
– INSS, autarquia Federal vinculada ao Ministério da Previdência Social. Tal órgão
foi criado em 1990 pela união do INPS e do Instituto de Administração Financeira da
Previdência Social - IAPAS.33
O art. 201, da Constituição Federal definiu no Brasil a forma de
organização da Previdência Social, que é constituída de regime geral, de filiação
obrigatória e de caráter contributivo.34
Dessa forma, caso o cidadão não seja servidor público estatutário, com
regime próprio, deverá pertencer ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS,
pelo qual estão sujeitos todos os trabalhadores do setor privado.35
30
MARTINS, 1997, p.39
MARTINS, loc.cit.
32
MARTINEZ, 1992, p. 41.
33
CHAMON, 2005, p. 20.
34
TSUTIYA, 2008, p.207.
35
Ibid., p.206.
31
19
2.3.1 Conceito
A palavra previdência é derivada do verbo prever que significa ver
antecipadamente fato ou situação que poderá ocorrer no futuro.36
Estabelecida pelo art. 201 da Constituição Federal, a Previdência Social é
conceituada por Gonçalves como “sistema que tem por finalidade manter a
subsistência da pessoa que trabalha, quando se torne ela, pessoa incapaz para o
trabalho”37
Segundo Martins, “a Previdência Social consiste numa forma de
assegurar ao trabalhador, com base no princípio da solidariedade, benefícios ou
serviços quando seja atingido por uma contingência social.”38
Assim, a previdência social é a forma pela qual os trabalhadores, através
de contribuição, asseguram benefícios para o caso de incapacidade, invalidez, idade
avançada, nascimento, tempo de serviço, prisão ou morte daqueles de quem
dependiam economicamente.
2.3.2 Objetivos
O Artigo 2º, da Lei 8.213/91 complementou os princípios previstos para a
Seguridade Social, no artigo 194 da Constituição Federal, e instituiu oito princípios e
objetivos pelos quais são regidos a Previdência Social.
São eles:
I - universalidade de participação nos planos previdenciários;
II - uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações
urbanas e rurais;
III - seletividade e distributividade na prestação dos benefícios;
IV - cálculo dos benefícios considerando-se os salários-de-contribuição
corrigidos monetariamente;
V - irredutibilidade do valor dos benefícios de forma a preservar-lhes o poder
aquisitivo;
VI - valor da renda mensal dos benefícios substitutos do salário-decontribuição ou do rendimento do trabalho do segurado não inferior ao do
salário mínimo;
36
GONÇALES, 1997, p.43.
GONÇALES, loc.cit.
38
MARTINS, 1997, p.217.
37
20
VII - previdência complementar facultativa, custeada por contribuição
adicional;
VIII - caráter democrático e descentralizado da gestão administrativa, com a
participação do governo e da comunidade, em especial de trabalhadores em
39
atividade, empregadores e aposentados.
Todos os preceitos são observados no dia-a-dia previdenciário, devendo
a Previdência Social segui-los de forma a alcançar o auge da eficiência.
2.3.3 Beneficiários
O artigo 10, da Lei 8.213/9140 classificou os beneficiários do Regime
Geral da Previdência Social em segurados e dependentes.
2.2.3.1 Segurados
Os segurados da previdência Social são classificados em obrigatórios e
facultativos e segundo Fortes e Paulsen:
“São aqueles que se vinculam diretamente ao Regime Geral de Previdência
Social porque exercem atividade que obrigatoriamente os situa nessa
posição ou porque, voluntariamente, vertem contribuições ao sistema para
41
que adquira essa condição.”
É importante ressaltar que podem ser considerados segurados,
obrigatórios ou facultativos, somente as pessoas físicas.
Os segurados obrigatórios estão elencados no art. 11, da Lei 8.213/91 e
são divididos em cinco categorias.
A primeira é a categoria de empregados. Essa categoria compreende os
trabalhadores urbanos e rurais, os trabalhadores temporários, os trabalhadores de
empresas brasileiras no exterior, os trabalhadores em missão diplomática ou
repartição consular, os trabalhadores da União em organismo oficial no exterior, os
39
BRASIL. Lei n. 8.213, de 24 de julho de 1991. Dispõe sobre os Planos de Benefícios da
Previdência Social e dá outras providências. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/L8213compilado.htm>. Acesso em: 11 abr. 2011.
40
BRASIL, 1991, Loc. cit.
41
FORTES, Simone Barbisan; PAULSEN, Leandro. Direito da Seguridade Social: prestações e
custeio da previdência, assistência e saúde. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005. p. 57.
21
trabalhadores de organismos oficiais internacionais no Brasil, os servidores públicos
e os exercentes de mandado eletivo.
A segunda categoria é a de empregados domésticos, que compreende
aqueles que prestam serviço de natureza contínua para pessoa ou família no âmbito
residencial e sem fins lucrativos.
A terceira categoria é a de contribuinte individual. Tal categoria
compreende os empregadores rurais e da atividade de pesca e garimpo, os
ministros de confissão religiosa, os trabalhadores de organismo internacional do qual
o Brasil seja membro efetivo, os empresários, os trabalhadores eventuais e os
trabalhadores autônomos.
A quarta categoria é a dos trabalhadores avulsos, que compreende
aqueles que prestam serviço de natureza urbana ou rural a diversas empresas sem
vínculo empregatício.
A última categoria é a dos segurados especiais. Tal categoria
compreende os produtores, parceiros, meeiros e arrendatários rurais, pescadores
artesanais e assemelhados que exerçam atividades individualmente ou em regime
de economia familiar, ainda com o eventual auxílio de terceiros.42 Compreendem
ainda os cônjuges, companheiros e filhos maiores de 16 anos ou a eles equiparados
que comprovadamente trabalhem com o grupo familiar.
Os segurados facultativos são aqueles desejam contribuir para a
Previdência Social, porém não se enquadram em nenhuma das situações que a lei
considera como segurado obrigatório.
O artigo 13, da Lei 8.213/91 classificou como segurado facultativo o maior
de 14 anos que se filiar ao RGPS mediante contribuição. O Decreto 3.048/99 alterou
de 14 para 16 anos a idade mínima para filiação e fixou em seu artigo 11, §1º que
podem filiar-se facultativamente:
I - a dona-de-casa;
II - o síndico de condomínio, quando não remunerado;
III - o estudante;
IV - o brasileiro que acompanha cônjuge que presta serviço no exterior;
V - aquele que deixou de ser segurado obrigatório da previdência social;
VI - o membro de conselho tutelar de que trata o art. 132 da Lei nº 8.069, de
13 de julho de 1990, quando não esteja vinculado a qualquer regime de
previdência social;
VII - o bolsista e o estagiário que prestam serviços a empresa de acordo
com a Lei nº 6.494, de 1977;
42
FORTES; PAULSEN, 2005, p. 71.
22
VIII - o bolsista que se dedique em tempo integral a pesquisa, curso de
especialização, pós-graduação, mestrado ou doutorado, no Brasil ou no
exterior, desde que não esteja vinculado a qualquer regime de previdência
social;
IX - o presidiário que não exerce atividade remunerada nem esteja
vinculado a qualquer regime de previdência social;
X - o brasileiro residente ou domiciliado no exterior, salvo se filiado a regime
previdenciário de país com o qual o Brasil mantenha acordo internacional; e
XI - o segurado recolhido à prisão sob regime fechado ou semi-aberto, que,
nesta condição, preste serviço, dentro ou fora da unidade penal, a uma ou
mais empresas, com ou sem intermediação da organização carcerária ou
entidade afim, ou que exerce atividade artesanal por conta própria.
Independentemente da forma pela qual estão filiados, os segurados que
contribuem em dia para a Previdência Social, garantem o recebimento dos
benefícios quando preenchidos os requisitos para a sua concessão.
2.2.3.2 Dependentes
Outra classificação dos beneficiários do Regime Geral da Previdência
Social são os dependentes.
Previstos no artigo 16 da Lei 8.213/91, os dependentes são aqueles que
apesar de não filiados à Previdência Social, mantém dependência econômica, total
ou parcial, para com o segurado e nessa condição fazem jus ao recebimento de
determinados benefícios.43
Os dependentes estão divididos em três classes.
Na primeira classe estão incluídos o cônjuge, a(o) companheira(o) e os
filhos não emancipados, menores de 21 anos ou inválidos.44 Os integrantes desta
classe não precisam comprovar a dependência econômica para o recebimento dos
benefício, visto que essa é presumida.45
Os dependentes de 2ª classe são os pais. Estes precisam comprovar a
dependência econômica em face do segurado.
Por fim, na 3ª classe está o irmão não emancipado, menor de 21 anos ou
inválido. Da mesma forma que os dependentes de 2ª classe, também são obrigados
a comprovar a dependência econômica.
43
CASTRO; LAZZARI, 2007, p. 187.
BRASIL, 1991, loc. cit.
45
FORTES; PAULSEN, 2005, p. 77.
44
23
A existência de uma classe antecedente afasta o direito das classes
posteriores.46 Assim, caso haja vários dependentes numa mesma classe, haverá
concorrência entre ele e o benefício será partilhado.
2.3.4 Benefícios
As prestações da Previdência Social são expressas em benefícios, que
são valores pagos em dinheiro com objetivo de substituir o rendimento do
trabalhador.
Para ter direito aos benefícios, é necessário verificar a qualidade de
segurado e o período de carência.
A qualidade de segurado é aferida pelas suas contribuições, ou seja,
antes da concessão do benefício é verificado no Cadastro Nacional de Informações
Sociais – CNIS se o segurado está em dia com as contribuições.47
O CNIS é mantido pela Previdência Social que fiscaliza as empresas para
que estas atualizem os dados no Sistema Informatizado.48
A carência é o número mínimo de contribuições mensais necessárias
para concessão de alguns benefícios. 49
Para a concessão dos benefícios de aposentadoria por idade, a especial
e a por tempo de contribuição o período de carência é de 180 meses. Para
concessão do salário-maternidade são necessários 10 meses e para o auxíliodoença e a aposentadoria por invalidez 12 meses. O restante dos benefícios não
exige período de carência.50
Da mesma forma, a carência não será exigida para os benefícios de
auxílio doença e aposentadoria por invalidez previdenciários quando forem
decorrentes de certas doenças tais como tuberculose, hanseníase, alienação
mental, cegueira e outras.51
46
Ibid., p. 76.
TSUTIYA, 2008, p.233.
48
TSUTIYA, loc.cit.
49
CHAMON, 2005, p. 106.
50
Ibid., p. 107.
51
CHAMON, 2005. p. 106.
47
24
A Lei 8.213/91, em seu artigo 18 previu as prestações devidas aos
segurados e dependentes.
Os benefícios reservados aos segurados são os seguintes:
a) aposentadoria por invalidez;
b) aposentadoria por idade;
c) aposentadoria por tempo de contribuição;
d) aposentadoria especial;
e) auxílio-doença;
f) salário-família;
g) salário-maternidade;
52
h) auxílio-acidente;
Para a concessão dos benefícios é necessário ainda cumprir os requisitos
específicos de cada um.
A aposentadoria por invalidez exige a incapacidade permanente para a
função que o trabalhador desempenhava e insuscetibilidade de reabilitação para
outra atividade que lhe garanta subsistência.53
A aposentadoria por idade é devida aos segurados que completam a
idade mínima exigida, sendo 65 anos para os homens e 60 anos para as mulheres.
Destaca-se que para os trabalhadores rurais, os garimpeiros e os pescadores a
idade é reduzida em 5 anos.54
A aposentadoria por tempo de contribuição exige 35 anos de contribuição
para os homens e 30 anos de contribuição para as mulheres. Esse tempo é reduzido
em 5 anos para os professores de ensino infantil, fundamental e médio.55
Na aposentadoria especial, os empregados, que trabalham em atividades
insalubres, podem requerer a sua concessão após 15, 20 ou 25 anos de
contribuição, conforme o grau de especialidade.56
O benefício de auxílio doença tem como requisito a incapacidade
temporária para a atividade laboral.
O salário-família é devido aos trabalhadores de baixa renda que possuam
filhos até 14 anos de idade ou inválidos.57 É paga, juntamente com o salário,
determinada cota por cada filho, com a finalidade de colaborar com a manutenção
desses pelo segurado empregado ou trabalhador avulso.
52
BRASIL, 1991, loc. cit.
BRASIL, 1991, loc. cit.
54
CHAMON, 2005. p. 116.
55
Ibid., p. 118.
56
CHAMON, op.cit., p. 124.
57
CASTRO; LAZZARI, 2007, p. 538.
53
25
O salário-maternidade é o benefício pago às mães, por 120 dias, por
ocasião do nascimento de um filho ou ainda, quando ocorrer a adoção.
O auxílio-acidente é um benefício de caráter indenizatório que é pago
mensalmente ao segurado acidentado que permaneceu com sequelas das quais
resultem redução da capacidade laborativa.58
Aos dependentes são assegurados dois benefícios, a pensão por morte e
o auxílio-reclusão.
A pensão por morte é devida aos dependentes quando ocorrer a morte do
segurado e o auxílio reclusão é devido aos dependentes do segurado quando este
for recolhido à prisão em regime fechado ou semi-aberto.
O benefício será concedido somente após requerimento administrativo e
análise pelo INSS do cumprimento de todos os requisitos.
2.4
SAÚDE
A saúde, parte integrante da Seguridade Social, foi prevista pelo
constituinte no artigo 196, que dispõe:
é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e
econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e
ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção,
59
proteção e recuperação.
Para
regular
tal
serviço,
foi
promulgada
a
Lei
8.080/90
que
“dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a
organização e o funcionamento dos serviços correspondentes”.60
A referida lei criou no Brasil o Sistema Único de Saúde – SUS, que
compreende o conjunto de todas as ações e serviços prestados pelo ente público no
âmbito da saúde.
A saúde é direito público subjetivo, dessa forma o Estado tem dever de
prestá-lo, independente de contrapartida pelo cidadão.
58
FORTES; PAULSEN, 2005, p. 133.
BRASIL. Constituição (1988), loc. cit.
60
BRASIL. Lei n. 8.080, de 19 de setembro de 1990. Dispõe sobre as condições para a promoção,
proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes
e dá outras providências. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/L8213compilado.htm>. Acesso em: 13 abr. 2011.
59
26
2.4.1 Conceito
Segundo Tsutiya, “a palavra ”saúde” vem do adjetivo latino saulus, que
tem o significado de inteiro, intacto.”61
O conceito de saúde envolve não somente o bem-estar físico individual,
mas também, condicionantes externos como o meio físico, socioeconômico e
cultural.
Assim, a prestação do serviço de saúde não compreende somente o
fornecimento de assistência médica, mas envolve principalmente programas de
medicina preventiva, controle de doenças infecciosas e parasitárias, combate à
desnutrição e melhoria das condições gerais da saúde populacional.
2.4.2 Diretrizes
Por se tratar de ramo da Seguridade Social, a Saúde também é regida
pelos princípios previstos no artigo 194, da Constituição Federal.
Além destes, o constituinte elencou no artigo 198, três diretrizes que
organizam as ações e serviços de saúde, que são:
I - descentralização, com direção única em cada esfera de governo;
II - atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem
prejuízo dos serviços assistenciais;
62
III - participação da comunidade.
Posteriormente, a Lei 8.080/90, previu em seu artigo 7º outros princípios
que complementam o artigo 198 da Constituição Federal:
I - universalidade de acesso aos serviços de saúde em todos os níveis de
assistência;
II - integralidade de assistência, entendida como conjunto articulado e
contínuo das ações e serviços preventivos e curativos, individuais e
coletivos, exigidos para cada caso em todos os níveis de complexidade do
sistema;
III - preservação da autonomia das pessoas na defesa de sua integridade
física e moral;
61
62
TSUTIYA, 2008. p.393.
BRASIL. Constituição (1988), loc. cit.
27
IV - igualdade da assistência à saúde, sem preconceitos ou privilégios de
qualquer espécie;
V - direito à informação, às pessoas assistidas, sobre sua saúde;
VI - divulgação de informações quanto ao potencial dos serviços de saúde e
a sua utilização pelo usuário;
VII - utilização da epidemiologia para o estabelecimento de prioridades, a
alocação de recursos e a orientação programática;
VIII - participação da comunidade;
IX - descentralização político-administrativa, com direção única em cada
esfera de governo:
a) ênfase na descentralização dos serviços para os municípios;
b) regionalização e hierarquização da rede de serviços de saúde;
X - integração em nível executivo das ações de saúde, meio ambiente e
saneamento básico;
XI - conjugação dos recursos financeiros, tecnológicos, materiais e humanos
da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios na prestação
de serviços de assistência à saúde da população;
XII - capacidade de resolução dos serviços em todos os níveis de
assistência; e
XIII - organização dos serviços públicos de modo a evitar duplicidade de
63
meios para fins idênticos.
Todos estes princípios e diretrizes devem orientar as ações e serviços
públicos de saúde e os serviços que integram o SUS.64
2.4.3 Serviços
As competências do SUS têm caráter primordialmente preventivo e seus
principais objetivos são:
I - a execução de ações:
a) de vigilância sanitária;
b) de vigilância epidemiológica;
c) de saúde do trabalhador; e
d) de assistência terapêutica integral, inclusive farmacêutica;
II - a participação na formulação da política e na execução de ações de
saneamento básico;
III - a ordenação da formação de recursos humanos na área de saúde;
IV - a vigilância nutricional e a orientação alimentar;
V - a colaboração na proteção do meio ambiente, nele compreendido o do
trabalho;
VI - a formulação da política de medicamentos, equipamentos,
imunobiológicos e outros insumos de interesse para a saúde e a
participação na sua produção;
VII - o controle e a fiscalização de serviços, produtos e substâncias de
interesse para a saúde;
VIII - a fiscalização e a inspeção de alimentos, água e bebidas para
consumo humano;
63
64
BRASIL, 1990, loc. cit.
FORTES; PAULSEN, 2005, p. 311.
28
IX - a participação no controle e na fiscalização da produção, transporte,
guarda e utilização de substâncias e produtos psicoativos, tóxicos e
radioativos;
X - o incremento, em sua área de atuação, do desenvolvimento científico e
tecnológico;
65
XI - a formulação e execução da política de sangue e seus derivados.
Por meio desses objetivos o SUS busca promover não só a assistência
médica para as doenças, mas principalmente a prevenção destas, com a finalidade
de alcançar melhores condições de saúde para a população.
Por fim, para completar as ações públicas no âmbito da Seguridade
Social, será exposta no próximo capítulo a Assistência Social.
65
BRASIL, 1990, loc. cit.
29
3 ASSISTÊNCIA SOCIAL
Neste capítulo serão verificados todos os aspectos referentes à
Assistência Social no Brasil, tais como objetivos, serviços, organização e benefícios.
Para tanto, faz-se necessário passar, primeiramente, por uma breve análise acerca
da sua evolução histórica.
3.1 EVOLUÇÃO HISTÓRIA DA ASSISTÊNCIA SOCIAL
A Assistência Social é considerada a forma mais antiga de proteção
social. No início, era prestada, principalmente pela Igreja Católica, como forma de
caridade, para aqueles que nada tinham ou viviam em estado de necessidade.1
Ao longo dos anos, foram criados, no Brasil, diversos órgãos que
pretendiam suprir a falta de uma prestação estatal no âmbito assistencial. O mais
conhecido dentre esses órgãos é a Legião Brasileira de Assistência – LBA, que foi
fundada em 1942 e era comandada por Darcy Vargas, esposa de Getúlio Vargas.2
Porém, tais órgãos tinham caráter eminentemente filantrópico e se
desenvolviam por meio de ações assistenciais esparsas, paliativas e emergências,
diferente de uma real política assistencial.3
A Constituição Federal de 1988 definiu o Brasil como Estado Democrático
de Direito e como tal foi incumbido de promover a mudança do estado anterior,
valorizando igualdade e solidariedade assumindo assim um papel transformador da
sociedade.4
A Assistência Social está positivada na Constituição Federal nos artigos
203 e 204 e regulada na Lei n. 8.742/93, Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS.
1
TSUTIYA, Augusto Massayuki. Curso de direito da Seguridade Social. 2. ed. São Paulo: Saraiva,
2008. p.415.
2
Ibid., p.416.
3
TSUTIYA, op. cit., p.416.
4
FORTES, Simone Barbisan; PAULSEN, Leandro. Direito da Seguridade Social: prestações e
custeio da previdência, assistência e saúde. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005. p. 265.
30
3.2
CONCEITO
O artigo 203 da Constituição Federal prevê que “A assistência social será
prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade
social”.5
Conforme descrito, a Assistência é prestada a todos os necessitados,
independentemente de contribuição ou qualquer contraprestação. Como explica
Martinez6 “inexiste prévia admissão do interessado em algum entre protetor para a
outorga de prestações”, ou seja, não há exigência de filiação para a concessão dos
benefícios, “o requerente torna-se assistido e obtém a prestação enquanto atender
os requisitos fixados na lei para o deferimento e a manutenção.”7
A Lei Orgânica da Assistência Social dispõe em seu artigo 1º que:
A assistência social, direito do cidadão e dever do Estado, é Política de
Seguridade Social não contributiva, que provê os mínimos sociais, realizada
através de um conjunto integrado de ações de iniciativa pública e da
8
sociedade, para garantir o atendimento às necessidades básicas.
Para Martins9 a Assistência Social é:
Um conjunto de princípios e regras e de instituições destinado a estabelecer
uma política social aos hipossuficientes, por meio de atividades particulares
e estatais, visando à concessão de pequenos benefícios e serviços,
independente de contribuição por parte do próprio interessado.
Dessa forma, a Assistência Social visa permitir que toda e qualquer
pessoa tenha atendidas as necessidades mínimas para uma sobrevivência digna.
3.3
5
OBJETIVOS
BRASIL. Constituição da república Federativa do Brasil de 1988. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao.htm>. Acesso em: 2 mai. 2011.
6
MARTINEZ, Wladimir Novaes. Curso de direito previdenciário, tomo I: Noções de direito
previdenciário. 2. ed. São Paulo: LTr, 2001. p. 221.
7
MARTINEZ, loc. cit.
8
BRASIL. Lei n. 8.742, de 7 de dezembro de 1993. Dispõe sobre a organização da Assistência
Social e dá outras providências. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/CCIVIL/leis/L8742.htm>. Acesso em: 2 mai. 2011.
9
MARTINS, Sérgio Pinto. Fundamentos de direito da seguridade social. 2. ed. São Paulo: Atlas,
2002. p. 149.
31
A Constituição Federal e a Lei 8.742/93 estabeleceram objetivos que a
Assistência Social deve buscar em sua atuação. São eles:
I - a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à
velhice;
II - o amparo às crianças e adolescentes carentes;
III - a promoção da integração ao mercado de trabalho;
IV - a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a
promoção de sua integração à vida comunitária;
V - a garantia de 1 (um) salário mínimo de benefício mensal à pessoa
portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de
prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.
A proteção e o amparo às famílias, crianças e adolescentes são os
objetivos principais da Assistência Social, que visa assegurar de forma efetiva e
plena a melhoria das condições dessas pessoas na sociedade.
Para a integração ao mercado de trabalho, a habilitação e reabilitação dos
portadores de deficiência foram criados diversos serviços, programas e projetos que
tem essa finalidade.
Já a garantia de 1 (um) salário mínimo mensal à pessoa portadora de
deficiência e ao idoso foi traduzida na concessão do benefício assistencial.
Tendo em vista esses objetivos a Assistência Social visa o enfrentamento
da pobreza, a garantia de um padrão social mínimo, o provimento de condições para
atender contingências sociais e a universalização dos direitos sociais.10
Conforme os ensinamentos de Santos11 a Constituição Federal pretende
que a Assistência Social seja um fator de transformação social, razão pela qual deve
promover a integração e a inclusão do assistido na vida comunitária para que dessa
forma torne-se menos desigual.
3.4
PRINCÍPIOS
Com relação aos princípios, a Assistência Social é regida primordialmente
pelos princípios previstos para o sistema de Seguridade Social, os quais já foram
10
11
MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social. 7. ed. São Paulo: Atlas, 1997. p. 344.
SANTOS, Marisa Ferreira dos. Direito Previdenciário. 5. Ed. Ver. e atual. São Paulo: Saraiva,
2009. p. 225.
32
citados no segundo capítulo, e posteriormente pelos seus princípios específicos, que
estão descritos no artigo 4º, da Lei 8.742/93.
O primeiro dos princípios específicos é a “supremacia do atendimento às
necessidades sociais sobre as exigências de rentabilidade econômica”.12 Tsutiya13
explica que segundo esse princípio o atendimento aos necessitados deverá ser
satisfeito sem importar o custo financeiro a ser despedido pela Seguridade Social,
ou seja, o auxílio aos necessitados deve ser posto em primeiro lugar.
Outro princípio refere-se ao “respeito à dignidade do cidadão, à sua
autonomia e ao seu direito a benefícios e serviços de qualidade, bem como à
convivência familiar e comunitária, vedando-se qualquer comprovação vexatória de
necessidade”.14 Conforme esse princípio a Assistência Social tem o encargo de
ofertar proteção social adequada para que o indivíduo exerça plenamente sua
cidadania.15
Há ainda o princípio que diz respeito “à divulgação ampla dos benefícios,
serviços, programas e projetos assistenciais, bem como dos recursos oferecidos
pelo Poder Público e dos critérios para sua concessão”16. Tal princípio visa levar a
todos informações acerca dos serviços, programas e projetos oferecidos pela
Assistência Social de forma que a sua prestação alcance as camadas menos
instruídas da população.
Outros princípios também foram incluídos no rol do artigo 4º, da Lei n.
8.742/93, como a universalização dos direitos sociais e a igualdade de direitos no
acesso ao atendimento. A universalização dos direitos sociais é facilmente
alcançada por meio do princípio da ampla divulgação e ainda pelo fato de não ser
necessária contraprestação para utilização dos serviços. Porém, o atendimento só
será efetivado àqueles que se enquadrarem no conceito de necessidade, como será
visto adiante.
3.5 ORGANIZAÇÃO E GESTÃO
12
BRASIL, 1993, loc. cit.
TSUTIYA, 2008, p.416.
14
BRASIL, op. cit.
15
FORTES; PAULSEN, 2005, p. 269.
16
BRASIL, op. cit.
13
33
A Assistência Social, a parir da Constituição Federal, passou a ser direito
do cidadão e, para efetivação desse direito, foi necessário criar uma estrutura para
melhor gerir e organizar a assistência no âmbito estatal.
Assim, a Lei Orgânica da Assistência Social previu em seu artigo 6º que:
As ações na área de assistência social são organizadas em sistema
descentralizado e participativo, constituído pelas entidades e organizações
de assistência social abrangidas por esta lei, que articule meios, esforços e
recursos, e por um conjunto de instâncias deliberativas compostas pelos
diversos setores envolvidos na área.
A descentralização define-se pela participação da União, estados,
municípios e Distrito Federal nas ações assistenciais. Segundo o artigo 11 da
referida lei cabe à União a coordenação e as normas gerais e às outras esferas a
coordenação e execução dos programas.
Segundo Tsutiya17 “o modelo descentralizado permite a participação da
população, por meio de organizações representativas, na formulação das políticas e
no controle das ações em todos os meios.”
O sistema descentralizado e participativo da assistência social é
composto por quatro órgãos: o Conselho Nacional de Assistência Social, os
Conselhos Estaduais de Assistência Social, o Conselho de Assistência Social do
Distrito Federal e os Conselhos Municipais de Assistência Social.
O órgão superior de deliberação colegiada é o Conselho Nacional de
Assistência Social (CNAS), cujos membros são escolhidos pelo Presidente da
República e tem mandato de 2 (dois) anos. Tal órgão é vinculado à estrutura da
Administração Pública Federal e é responsável pela coordenação da Política
Nacional de Assistência Social.
O CNAS é composto por 18 membros, sendo 9 (nove) representantes
governamentais e 9 (nove) representantes da sociedade civil.
Entre as diversas competências, previstas no artigo 18 da Lei 8.742/93,
destaca-se que o CNAS deve: aprovar a Política Nacional de Assistência Social;
normatizar as ações e regular a prestação de serviços de natureza pública e privada
no campo da assistência social; zelar pela efetivação do sistema descentralizado e
participativo de assistência social; divulgar, no Diário Oficial da União, todas as suas
17
TSUTIYA, 2008, p.425.
34
decisões, bem como as contas do Fundo Nacional de Assistência Social (FNAS) e
os respectivos pareceres emitidos.
Os outros três órgãos, Conselhos Estaduais de Assistência Social,
Conselho de Assistência Social do Distrito Federal e Conselhos Municipais de
Assistência Social, segundo o §4º do artigo 17 da Lei n. 8.742/93, devem ser
instituídos respectivamente pelos Estados, Distrito Federal e Municípios por meio de
lei específica.
Atualmente, há Conselhos Estaduais em todos os estados e Conselhos
Municipais em todas as capitais e diversos municípios.18
No Distrito Federal, o Conselho de Assistência Social do Distrito Federal CAS/DF foi criado em 1995.19
Os Conselhos Estaduais, conforme o artigo 13, da Lei n. 8.742/93, têm
por finalidades precípuas: a destinação de recursos financeiros aos municípios, o
apoio técnico e financeiro aos serviços, programas e projetos de enfrentamento da
pobreza e o atendimento, juntamente com os municípios, às ações de caráter
emergencial.20
Já os Conselhos do Distrito Federal e dos Municípios, segundo os artigos
14 e 15 da referida lei, destinam recursos e efetuam o pagamento dos auxílios
natalidade e funeral, executam os projetos de enfrentamento da pobreza, atendem
às ações assistenciais de caráter emergencial e prestam os serviços assistenciais.21
3.6
SERVIÇOS E PROGRAMAS
Os serviços prestados pela Assistência Social, conforme estabelecido no
artigo 23, da Lei 8.742/93, são “atividades continuadas que visem à melhoria de vida
18
BRASIL. Conselho Nacional De Assistência Social. Conselhos de Assistência Social. Disponível
em: <http://www.mds.gov.br/cnas/relacao-de-cmas-e-ceas>. Acesso em: 21 maio 2011.
19
Id., Secretaria do Estado de Desenvolvimento Social e Transferência de renda. Conselho de
Assistência do Distrito Federal. Disponível em:
<http://www.sedest.df.gov.br/005/00502001.asp?ttCD_CHAVE=11479>. Acesso em: 21 maio 2011.
20
BRASIL, 1993, loc. cit.
21
Id., 1993.
35
da população e cujas ações, voltadas para as necessidades básicas, observem os
objetivos, princípios e diretrizes previstos para a Assistência.”22
Os serviços prestados têm por objetivo principal o amparo às crianças e
adolescentes em situação de risco pessoal e social e aos que vivem em situação de
rua.
Foram previstos ainda, no artigo 24 da referida lei, os programas
assistenciais que “compreendem ações integradas e complementares com objetivos,
tempo e área de abrangência definidos para qualificar, incentivar e melhorar os
benefícios e os serviços assistenciais”.23 Tais programas visam a inserção
profissional e social de idosos, deficientes e outros necessitados.
Por fim, o artigo 25, da LOAS, instituiu os projetos de enfrentamento da
pobreza, que segundo Fortes e Paulsen24:
Constituem-se em investimento econômico-social nos grupos populares,
buscando subsidiar, financeira e tecnicamente, iniciativas que lhe garantam
meios, capacidade produtiva e de gestão para melhoria das condições
gerais de subsistência, elevação do padrão da qualidade de vida, a
preservação do meio-ambiente e sua organização social.
Esse incentivo baseia-se em mecanismos de participação entre as
diferentes
áreas
governamentais,
em
cooperação
com
organismos
não-
governamentais e da sociedade civil. Como exemplo de projetos é possível citar:
Programa Bolsa Família, Programa Fome Zero, Programa de Atenção Integral à
Família, Programa Dinheiro Direto na Escola e Programa Nacional de Alimentação
Escolar.
O Bolsa Família é um programa integrante do Fome Zero e “é um
programa de transferência direta de renda com condicionalidades, que beneficia
famílias em situação de pobreza e de extrema pobreza.”25
O programa da Fome Zero tem por objetivo “assegurar o direito humano à
alimentação adequada, promovendo a segurança alimentar e nutricional e
contribuindo para a conquista da cidadania pela população mais vulnerável à
fome.”26
22
BRASIL, op. cit.
BRASIL. 1993, loc. cit.
24
FORTES; PAULSEN, 2005, p. 295.
25
BRASIL, Ministério do Desenvolvimento Social. Bolsa Família. Disponível em:
<http://www.mds.gov.br/bolsafamilia>. Acesso em: 21 maio 2011.
26
BRASIL, Bolsa Família, loc. cit.
23
36
O Serviço de Proteção e Atendimento Integral à Família – Paif, “é um
trabalho de caráter continuado que visa a fortalecer a função de proteção das
famílias, prevenindo a ruptura de laços, promovendo o acesso e usufruto de direitos
e contribuindo para a melhoria da qualidade de vida.”27
O Programa Dinheiro Direto na Escola consiste em assistência financeira
destinada às escolas públicas de educação básica e particulares de educação
especial que tem por objetivo “a melhoria da infraestrutura física e pedagógica, o
reforço da autogestão escolar e a elevação dos índices de desempenho da
educação básica.”28
Já o Programa Nacional de Alimentação Escolar tem por objetivo “atender
as necessidades nutricionais dos alunos durante sua permanência em sala de aula,
contribuindo para o crescimento, o desenvolvimento, a aprendizagem e o
rendimento escolar dos estudantes, bem como promover a formação de hábitos
alimentares saudáveis.”29
Por meio desses e outros programas e serviços busca-se a melhoria nas
condições de vida das populações mais necessitadas.
3.7
BENEFÍCIOS
A Lei Orgânica da Assistência Social previu, em seus artigos 20 e 22, a
possibilidade da concessão de benefícios de prestação continuada e eventuais,
como será demonstrado a seguir.
3.7.1 Benefício de prestação continuada
27
BRASIL, Ministério do Desenvolvimento Social. Serviço de Proteção e Atendimento Integral à
Família. Disponível em:
<http://www.mds.gov.br/assistenciasocial/protecaobasica/servicos/protecao-e-atendimento-integrala-familia-paif/servico-de-protecao-e-atendimento-integral-a-familia-paif>. Acesso em: 21 maio 2011.
28
Id., Ministério da Educação. Programa Dinheiro Direto na Escola. Disponível em: <
http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=12320&Itemid=246>.
Acesso em: 21 maio 2011.
29
Id., Ministério da Educação. Programa Nacional de Alimentação Escolar. Disponível em:
<http://www.fnde.gov.br/index.php/programas-alimentacao-escolar>. Acesso em: 21 maio 2011.
37
O benefício de prestação continuada foi estabelecido na Constituição
Federal como um dos objetivos a serem cumpridos pela Assistência Social. Prevê o
artigo 203 em seu inciso V “a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à
pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de
prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família”.30 Diante da
determinação foi criado o Benefício Assistencial.
Conforme estipulou a Constituição, o benefício assistencial poderá ser
concedido em duas ocasiões: ao idoso ou à pessoa portadora de deficiência. Em
ambos os casos será necessário o cumprimento do requisito principal necessidade,
ou seja, não poderá possuir meio de prover a própria subsistência nem de tê-la
provida por sua família.
Para melhor compreender as possibilidades de concessão do referido
benefício, faz-se necessário explicar detalhadamente os conceitos de: idoso,
portador de deficiência, família e necessidade que são adotados pela Lei Orgânica
da Assistência Social.
O conceito de idoso foi alterado ao longo dos anos. Primeiramente, na
promulgação da Lei n. 8.742 em 1993, era considerado idoso, com direito ao
benefício, aqueles que possuíssem mais de 70 anos de idade. A partir de 1998, por
meio da lei n. 9.720/98, essa idade foi reduzida para 67 anos. E essa é a idade que
consta na lei até então. Porém, com a promulgação do Estatuto do Idoso tal situação
foi modificada. O Estatuto do Idoso, Lei n. 10.741/03, determinou, em seu artigo 34,
que teriam direito ao benefício assistencial os idosos a partir dos 65 anos de idade.31
Portanto, para a concessão do benefício é necessário cumprir o requisito
etário e possuir 65 anos no momento do requerimento administrativo.
O segundo conceito a ser esclarecido é o de portador de deficiência,
acerca do qual não há controvérsias.
A deficiência é verificada por meio de perícia médica, após a qual, o
médico atesta ou não a deficiência.
Estabelece ainda, a Lei n. 8.742/93, no parágrafo 2º, do artigo 20 que
para a concessão do benefício é considerada pessoa portadora de deficiência
30
31
BRASIL. Constituição (1988), loc. cit.
SANTOS, 2009, p. 234.
38
aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho.32 É importante
ressaltar que a questão foi objeto de súmula pela Turma Nacional de Uniformização
de Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais que dispôs:
Súmula 29 - Para os efeitos do art. 20, § 2º, da Lei n. 8.742, de 1993,
incapacidade para a vida independente não é só aquela que impede as
atividades mais elementares da pessoa, mas também a impossibilita de
33
prover ao próprio sustento.
Por meio dessa súmula ficou claro que será beneficiado pela assistência
somente os portadores de deficiência que não possuírem capacidade laborativa.
Destaca-se ainda, que com relação aos menores de 16 anos de idade, a
incapacidade laborativa é presumida, sendo que, será verificada apenas a
independência para os atos da vida civil.34
O conceito de família é ainda bastante controverso. A Lei n. 8.742/93
descreve em seu artigo 20, §1º que “entende-se como família o conjunto de pessoas
elencadas no art. 16 da Lei n. 8.213, de 24 de julho de 1991, desde que vivam sob o
mesmo teto”.
Segundo o referido artigo compreende a família:
I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de
qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido;
II - os pais;
III - o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e
um) anos ou inválido.
Já Martins35 explica que se entende “por família a unidade mononuclear,
que vive sob o mesmo teto, cuja economia é mantida pela contribuição de seus
integrantes”.
É considerada, portanto, uma família o pai, a mãe e os filhos apenas, não
incluindo para fins de benefício, qualquer outra pessoa que resida no mesmo local.
O último requisito a ser aferido é o da necessidade, que é verificado pela
renda da família.
Segundo o parágrafo 3º, do artigo 20, da Lei 8.742/93 é considerado
“incapaz de prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa a
32
BRASIL, 1993, loc. cit.
BRASIL. Turma Nacional de Uniformização de Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais.
Súmula n. 29. Brasília, 12 dez. 2005. Disponível em:
<http://aplicaext.cjf.jus.br/phpdoc/juizado/sumulas/SUM029.pdf?PHPSESSID=a93f5a77ffba1884f7c
bc228b23cc618>. Acesso em: 4 mai. 2011.
34
CASTRO; LAZZARI, 2007, p. 550.
35
MARTINS, 2002, p. 153.
33
39
família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário
mínimo.”
Conforme esse critério, a renda do núcleo familiar deve ser somada e
dividida entre o número de membros da família. Assim, em uma família composta
por 4 pessoas, considerando um salário mínimo de R$ 545,00, a renda per capita na
família seria de R$ 136,25. Caso esse valor fosse ultrapassado o requisito
necessidade restaria prejudicado.
Porém, mais uma vez o Estatuto do Idoso36 incluiu no ordenamento
jurídico regra para beneficiar os idosos. O parágrafo único, do artigo 34, do
Estatuto37 previu que “O benefício já concedido a qualquer membro da família nos
termos do caput não será computado para os fins do cálculo da renda familiar per
capita a que se refere a Loas.” Com essa nova regra passou a ser desconsiderado
da renda familiar qualquer benefício recebido por outros membros da família. Assim,
caso um idoso receba o benefício de valor mínimo, tal valor não será computado no
cálculo da renda per capita. Após essa nova regra mais famílias passaram a ser
beneficiadas pela Assistência, pois se tornou possível a concessão do benefício em
um mesmo núcleo.
Por fim, esclarecidos todos os conceitos adotados pela Lei Orgânica da
Assistência Social, é possível compreender melhor como se dá a concessão do
benefício assistencial.
Verifica-se então, que a sua concessão somente ocorrerá quando um
idoso ou portador de deficiência comprovar ter, dentro de seu núcleo familiar, renda
per capita de 1/4 do salário mínimo então vigente, desconsiderados outros
benefícios de valor mínimos recebidos na família.
Cumpridos os requisitos, será concedido o benefício assistencial que terá
seu início a partir da data do requerimento administrativo.
O ato de concessão deverá ser revisto a cada dois anos apurando-se se o
beneficiário continua sob as mesmas condições que deram origem ao benefício.
Conforme artigo 21, § 1º, da Lei 8.742/93, o pagamento do benefício será cessado
quando forem suspensas as condições que deram origem ao benefício ou com a
morte do beneficiário.
36
BRASIL. Lei n. 10.741, de 1º de outubro de 2003. Dispõe sobre o Estatuto do Idoso e dá outras
providências. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/2003/L10.741.htm>. Acesso
em: 10 mai. 2011.
37
BRASIL, 2003, loc. cit.
40
3.7.2 Benefícios eventuais
A concessão de benefícios eventuais está prevista no artigo 22 da Lei
8.742/93. Dispõe o referido artigo acerca da concessão de auxílio por natalidade ou
morte àquelas famílias que possuírem renda per capita inferior a 1/4 (um quarto) do
salário mínimo.
Tais auxílios têm caráter eventual e destinam-se a socorrer famílias de
baixa renda quando do nascimento ou morte de seus membros, ou seja, visa o
atendimento
às
necessidades
advindas
de
situações
de
vulnerabilidade
38
temporária.
O parágrafo 1º, do artigo 22, da Lei 8.742/93, dispôs ainda que a
concessão e o valor dos benefícios eventuais seriam regulamentados “pelos
Conselhos de Assistência Social dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios,
mediante critérios e prazos definidos pelo Conselho Nacional de Assistência Social
(CNAS)”39, porém até o momento não houve qualquer regulamentação por parte
desses órgãos.
Foi previsto também, no parágrafo 2º do referido artigo, a possibilidade de
instituição de outros benefícios eventuais com prioridade para a criança, a família, o
idoso, a pessoa portadora de deficiência, a gestante, a nutriz e nos casos de
calamidade pública.40
Por fim, o artigo 22, parágrafo 3º, prescreve a possibilidade de instituição
de benefícios subsidiários, sendo esses “no valor de até 25% (vinte e cinco por
cento) do salário mínimo para cada criança de até 6 (seis) anos de idade, nos
termos da renda mensal familiar estabelecida no caput.”41
Estudados todos os aspectos com relação à Assistência Social, no
capítulo seguinte faz-se a análise acerca da possibilidade de interpretação extensiva
da Lei Orgânica da Assistência Social para a concessão do benefício assistencial.
38
SANTOS, 2009, p. 242.
BRASIL, 1993, loc. cit.
40
Id., 1993.
41
BRASIL, op. cit.
39
41
4 POSSIBILIDADE DE INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA PARA A CONCESSÃO
DO BENEFÍCIO ASSISTENCIAL
No presente capítulo será verificada a possibilidade de interpretação
extensiva da Lei Orgânica da Assistência Social quando da verificação dos
requisitos necessários à concessão do benefício assistencial aos idosos e
portadores de deficiência.
4.1 FONTES NO DIREITO PREVIDENCIÁRIO
A palavra fonte origina-se na palavra fons que significa o lugar de onde
provém algo.1 No Direito, são consideradas fontes todos os meios normativos pelos
quais o Direito é veiculado.2
O Direito Previdenciário, de acordo com Nunes, é o ramo do Direito que
engloba as normas jurídicas relativas à Seguridade Social, abrangendo, portanto, a
Previdência, a Saúde e a Assistência.3
A principal fonte no Direito Previdenciário, assim como em todos os outros
ramos, é a Constituição Federal. Os princípios e preceitos nela constantes são os de
maior hierarquia e, portanto, todas as normas jurídicas devem submeter-se a eles4.
Outra fonte importante no ramo previdenciário são as leis. Conforme o
artigo 22, inciso XXIII, da Constituição Federal, a União possui competência privativa
para legislar sobre Seguridade Social.5 Até o momento, as principais leis em vigor
são as leis n. 8.212/91, 8.213/91, 8.080/90 e 8.742/93 que tratam respectivamente
da Seguridade Social, da Previdência Social, da Saúde e da Assistência Social.
1
CORREIA, Marcus Orione Gonçalves; CORREIA, Érica Paula Barcha. Curso de direito da
seguridade social. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 46.
2
DIAS, Eduardo Rocha; MACÊDO, José Leandro Monteiro de. Curso de direito previdenciário. São
Paulo: Método, 2008. p. 59
3
NUNES, Rizzatto. Manual de introdução ao estudo do direito. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p.
148.
4
TSUTIYA, Augusto Massayuki. Curso de direito da Seguridade Social. 2. ed. São Paulo: Saraiva,
2008. p.16.
5
BRASIL. Constituição da república Federativa do Brasil de 1988. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao.htm>. Acesso: em 21 maio 2011.
42
As medidas provisórias também são consideradas fontes importantes no
direito previdenciário, porém devem ser utilizadas somente em caso de relevância e
urgência6.
Correia e Correia admitem a edição de medidas provisórias apenas para
assuntos relativos à assistência e à saúde e destacam, ainda, que não devem ser
aceitas medidas provisórias que versem sobre contribuições previdenciárias, uma
vez que estariam ferindo o princípio da noventena previsto no artigo 195, parágrafo
6º, da Constituição Federal.7
As
instruções
normativas
também
são
comumente
utilizadas.
Consideradas normas infralegais, as instruções normativas são atos administrativos
expedidos pelos Ministros de Estado que dispõem formas para melhor execução das
leis, decretos e regulamentos8.
A jurisprudência e a doutrina são classificadas como fontes secundárias
no Direito Previdenciário.
A jurisprudência fica caracterizada quando a aplicação de determinada
norma consolida-se em uma única direção, ou seja, são proferidas reiteradas
decisões num mesmo sentido. Já a doutrina, segundo os ensinamentos de Castro e
Lazzari9, serve unicamente para eliminar dúvidas com relação à integração das
normas.
Essas e outras fontes podem ser utilizadas para aplicação do Direito
Previdenciário, mas todas devem seguir as determinações contidas na Constituição
Federal, sob pena de serem consideradas inconstitucionais.
4.2 APLICAÇÃO DAS NORMAS NO DIREITO PREVIDENCIÁRIO
Para a aplicação do Direito é necessário verificar quais normas poderão
ser utilizadas no caso e interpretá-las para que seja proferida a melhor decisão.
6
TSUTIYA, 2008, p.17.
CORREIA; CORREIA, 2002, p. 48.
8
TSUTIYA, op. cit., p.18.
9
CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. 8.
ed. Florianópolis: Conceito, 2007. p. 85.
7
43
Interpretar “é conhecer o conteúdo e a extensão das normas de
determinado ramo da ciência jurídica.”10 O objetivo da interpretação é estabelecer o
sentido objetivo do texto legal. E para chegar a este sentido, o intérprete poderá se
utilizar de diferentes formas de interpretação, tais como a gramatical, a lógica, a
teleológica, a sistemática e a histórica.
A interpretação gramatical ou literal consiste na pesquisa do significado
das palavras utilizadas pelo legislador, em conexão lógica e sintática11 e na análise
do alcance das palavras empregadas no texto legal.12
A interpretação lógica, segundo Gusmão13 “é a investigação do fim ou da
razão de ser da lei com o objetivo de clarear o seu real sentido”.
A interpretação teleológica “busca o sentido maior da norma, o seu
alcance, finalidade, seu objetivo prático dentro do ordenamento e para a
sociedade”14, assim a interpretação será dada de acordo com o fim pretendido pelo
legislador.
Por meio da interpretação sistemática o intérprete levará em conta a
norma jurídica inserida no contexto maior, no ordenamento ou sistema jurídico.
Há ainda a interpretação histórica pela qual o intérprete investiga o
momento histórico no qual a norma foi editada, ou seja, verifica sob quais condições
a lei foi criada.
4.2.1 Critérios de Solução de Antinomias
A antinomia ocorre quando há no ordenamento jurídico duas normas
contraditórias. Segundo Castro e Lazari para solucionar tal problema deve-se seguir
alguns critérios.15
O primeiro critério é o hierárquico. Comparando as duas normas verificase qual delas é de maior hierarquia e essa será a norma válida.16
10
CORREIA; CORREIA, 2002, p. 49.
GUSMÃO, Paulo Dourado de. Introdução ao estudo do Direito. 38. ed. Rio de Janeiro: Forense,
2006. p. 234.
12
MARTINS, Sergio Pinto. Direito da Seguridade Social. 7. ed. São Paulo: Atlas, 1997. p. 53.
13
GUSMÃO, loc. cit.
14
VENOSA, Silvio de Salvo. Introdução ao Estudo do Direito: primeiras linhas. São Paulo: Atlas,
2004. p. 209.
15
CASTRO; LAZZARI, 2007, p. 88.
11
44
Caso sejam normas de mesma hierarquia passa-se ao segundo critério
que é o cronológico. Segundo este critério deverá prevalecer a norma posterior, que
revogou tacitamente a norma anterior.17
Por fim, utiliza-se o critério da especialidade, segundo o qual a lei
especial, revoga a lei geral.18
4.2.2 Lacunas do Ordenamento
As lacunas no ordenamento jurídico ocorrem quando o caso submetido a
julgamento não está previsto em nenhum texto legal.19
Para solucionar essa omissão no ordenamento o intérprete se vale dos
critérios de integração da norma jurídica.
Tais critérios foram previstos pelo legislador no artigo 4º da Lei de
Introdução às normas do Direito Brasileiro20 que determina que “Quando a lei for
omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios
gerais de direito.”
A primeira forma de integração é a analogia. Ensina Gusmão que a
analogia consiste na “extensão do tratamento jurídico, previsto expressamente na lei
para determinado caso, a um semelhante, não previsto.” É importante destacar que
é necessário que os dois casos apresentem relação de coincidência ou
semelhança.21
Conforme ensinamentos de Nunes, os costumes são normas jurídicas
típicas que não foram escritas.22 O costume se caracteriza quando há o uso
reiterado de uma prática, durante longo prazo de tempo.23
16
CASTRO; LAZZARI, 2007, p. 88.
Ibid., p. 88.
18
CASTRO; LAZZARI, loc. cit..
19
GUSMÃO, 2006, p. 239.
20
BRASIL, Decreto-lei n. 4.657, de 4 de setembro de 1942. Lei de Introdução às normas do Direito
Brasileiro. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/Decreto-Lei/Del4657.htm>. Acesso em:
22 maio 2011.
21
MONTEIRO apud CASTRO; LAZZARI, 2007, p. 89.
22
NUNES, 2008, p. 283
23
VENOSA, 2004, p. 146.
17
45
Caso não encontre no ordenamento jurídico norma reguladora para caso
semelhante, o intérprete poderá se valer dos princípios gerais de direito. Segundo
Nunes os princípios gerais de direito são aqueles “que inspiram e dão embasamento
à criação de toda e qualquer norma, inclusive e especialmente a Constituição, bem
como os valores sociais que afetam o sistema e dirigem sua finalidade.”24 Como
exemplos é possível citar a Justiça, a dignidade do homem e a isonomia.
Vale ressaltar que tais princípios não podem estar expressos no
ordenamento, pois caso contrário não haveria lacuna.
4.2.3 Efeitos da interpretação
Para Venosa a interpretação da norma jurídica pode levar a três
modalidades de compreensão. São elas: a interpretação declarativa, a interpretação
restritiva e a interpretação extensiva.25
4.2.3.1 Interpretação declarativa
Na interpretação declarativa, Nunes explica que o intérprete limita-se a
apenas declarar o sentido da norma sem restringi-lo ou estendê-lo26, ou seja, traduz
em linguagem mais acessível o que foi dito pelo legislador.27
Destaca Venosa, que com esse tipo de interpretação, chega-se “à
conclusão de que as palavras da lei expressam exatamente o que foi desejado pelo
legislador.”28
4.2.3.2 Interpretação restritiva
24
NUNES, 2008, p. 283.
VENOSA, 2004, p. 200.
26
NUNES, op. cit., p. 277.
27
VENOSA, 2004, loc. cit.
28
Ibid., p. 200.
25
46
A interpretação restritiva é aquela pela qual o intérprete “restringe o
sentido e o alcance apresentado pela expressão literal da norma jurídica.”29
Esse tipo de interpretação ocorre quando o legislador disse mais do
deveria, ou se utilizou de expressões de forma equivocada.30
Como exemplo, Venosa utiliza a expressão “servidor público” que por
vezes é confundida com “funcionário público”. Aplicando a norma aos funcionários
públicos e não aos servidores, o intérprete estaria se utilizando da interpretação
restritiva.31
4.2.3.3 Interpretação extensiva
A interpretação extensiva é contrária à restritiva. Nela o intérprete amplia
o sentido literal da norma jurídica.32
Após interpretar a norma jurídica, o intérprete pode concluir que o
legislador disse menos do que deveria, então, torna-se necessário ampliá-la para
que possa se restabelecer a sua correspondência com o sentido da lei.33
Por meio da interpretação extensiva, o intérprete descobre a real intenção
do legislador ao elaborar a norma jurídica e assim abrange hipótese mais ampla do
que a prevista.34
4.3 POSSIBILIDADE JURÍDICA DE INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA DA LEI
ORGÂNICA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO
ASSISTENCIAL
29
NUNES, 2008, p. 278.
NUNES, loc. cit.
31
VENOSA, 2004. p. 200.
32
NUNES, loc cit.
33
GUSMÃO, 2006, p. 235.
34
VENOSA, op. cit., p. 201.
30
47
A Constituição Federal ao instituir a garantia do benefício assistencial,
como objetivo a ser seguido pela Assistência Social, o fez com intuito de promover
transformação social.35 Todos os programas, serviços e projetos da Assistência
Social visam a garantir aos assistidos condições mínimas necessárias para uma vida
digna.
A Assistência Social está prevista no artigo 6º da Constituição e tem
status de direito social.36 Argumenta Silva, que os direitos sociais constituem uma
dimensão dos direitos fundamentais que possibilitam melhores condições de vida
aos mais fracos e realizam a equalização de situações sociais desiguais.37
A assistência “constitui um sistema de proteção da pessoa humana, cujos
benefícios são entregues independentemente de contribuição, objetivando que
ninguém atinja a condição de indignidade ou indigência.”38
Porém, apesar de todos esses objetivos e princípios, ao instituir os
requisitos para a concessão do benefício assistencial, a Lei n. 8.742/93 estabeleceu
um regramento mais restritivo do que a previsão constitucional, reduzindo, por
consequência, o âmbito de abrangência da proteção legal a um número menor de
pessoas.
A Constituição Brasileira apenas previu “a garantia de um salário mínimo
de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem
não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua
família”39, e deixou para a Lei o encargo de estabelecer os conceitos de ‘idoso’,
‘portador de deficiência’, ‘família’ e ‘necessidade’.
Conforme já detalhado no capítulo anterior, o conceito de idoso, após a
promulgação da Lei Orgânica da Assistência Social, foi alterado por duas vezes, de
modo que, atualmente, considera-se idoso, para fins de concessão do benefício, a
pessoa com mais de 65 anos de idade. Tal alteração é visivelmente benéfica visto
que a redução da idade de 70 para 65 anos implica o aumento quantitativo de
pessoas que podem ser favorecidas pela proteção assistencial.
35
SANTOS, 2009, p. 225.
TSUTIYA, 2008, p.421.
37
SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo. 19. ed. São Paulo: Malheiros,
2001. p. 806.
38
FORTES, Simone Barbisan. Conceito aberto de família e seguridade social. in: VAZ, Paulo Afonso
Brum; SAVARIS, José Antonio (Org.). Direito da previdência e assistência social: elementos
para uma compreensão interdisciplinar. Florianópolis: Conceito Editorial, 2009. p. 271.
39
BRASIL. Constituição (1988), loc. cit.
36
48
Por sua vez, com relação ao portador de deficiência, a lei considera
incapaz aquele que não possui condições para a vida independente e para o
trabalho.40
Surge aí a primeira divergência.
Para Santos, o conceito adotado para deficiente pela Lei n. 8.742/93 fere
o próprio sistema da Assistência Social. Segundo a autora não só aqueles sem
condições laborativas e para uma vida independente devem ser beneficiados pela
Assistência, mas sim todos os deficientes que possuem qualquer incapacidade.41
Defende assim, que seja adotado o conceito de deficiente previsto pelo
Decreto n. 3.298/99, que regulamenta a Política Nacional para a Integração da
Pessoa Portadora de Deficiência.42
Segundo o referido decreto considera-se incapaz o deficiente que possui:
Uma redução efetiva e acentuada da capacidade de integração social, com
necessidade de equipamentos, adaptações, meios ou recursos especiais
para que [...] possa receber ou transmitir informações necessárias ao seu
bem-estar pessoal e ao desempenho de função ou atividade a ser
43
exercida.
O entendimento adotado pela doutrinadora seria mais benéfico, porém é
inviável. A própria Constituição estabeleceu que o benefício será devido àqueles que
não possuírem meios de prover a própria subsistência.44 Utilizando esse raciocínio,
caso o deficiente possua condições laborativas, não há motivos para ser deferido o
benefício, uma vez que por meio do trabalho o próprio deficiente estará buscando a
sua dignidade e promovendo a sua inserção na sociedade.
Com relação ao conceito de família adotado pela Lei n. 8.742/93, como já
mencionado no capítulo antecedente, também há bastante divergência.
Para a Assistência Social, são considerados membros da família apenas
os dependentes previdenciários, que vivam sob o mesmo teto e constituam uma
unidade mononuclear.45
40
BRASIL. Lei n. 8.742, de 7 de dezembro de 1993. Dispõe sobre a organização da Assistência
Social e dá outras providências. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/CCIVIL/leis/L8742.htm>. Acesso em: 24 mai. 2011.
41
SANTOS, 2009, p. 225.
42
Ibid., p. 232.
43
o
BRASIL. Decreto n. 3.298, de 20 de dezembro de 1999. Regulamenta a Lei n 7.853, de 24 de
outubro de 1989, dispõe sobre a Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de
Deficiência, consolida as normas de proteção, e dá outras providências. Disponível em: <
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d3298.htm>. Acesso em: 24 maio 2011.
44
BRASIL. Constituição (1988), loc. cit.
45
BRASIL. 1993, loc. cit.
49
Segundo Fortes, essa concepção de família, adotada pela Assistência
Social, mostra-se bastante restritiva e afastada dos modelos efetivamente vividos
pelas famílias populares.46
As famílias de menor renda se agrupam com o intuito de reunir recursos
conjuntos e depender de um único local para habitar e por isso produzem uma
solidariedade que vai além do núcleo familiar.47 Dessa forma:
“não se podem desconsiderar outros parentes [...] e mesmo pessoas não
vinculadas por consangüinidade ou afinidade [...], pois evidentemente
também fazem parte da família, o que promove como consequência que
tanto a renda que eventualmente tiverem deve ser somada à renda familiar,
48
quanto que devem ser considerados como usuários da renda do grupo.“
Neste sentido, explica Picarelli, que o conceito de família adotado pela Lei
n. 8.742/93 é inconstitucional, pois estabelece um conceito restritivo que é
“incompatível com a concepção plural da família presente no Texto Constitucional”49
Por conta dessas divergências, o conceito foi objeto de estudo no Fórum
Nacional Dos Juizados Especiais Federais no qual foi editado o Enunciado n. 45 que
considera que “O art. 20, parágrafo primeiro, da Lei 8742/93 não é exauriente para
delimitar o conceito de unidade familiar.”50
O próprio enunciado deu margem a interpretações extensivas.
Seria oportuno, portanto, adotar o conceito de família estabelecido na Lei
n. 10.836/2004, que dispõe sobre o Programa “Bolsa Família”, a qual considera
família “a unidade nuclear, eventualmente ampliada por outros indivíduos que com
ela possuam laços de parentesco ou de afinidade, que forme um grupo doméstico,
vivendo sob o mesmo teto e que se mantém pela contribuição de seus membros.“51
Essa concepção retrata a realidade de diversas famílias populares e
concretizaria os objetivos da Assistência Social, visto que, claramente, mais famílias
seriam beneficiadas.52
46
FORTES, in: VAZ; SAVARIS, 2009, p. 273
FORTES, in: VAZ; SAVARIS, 2009, p. 273.
48
Ibid., p. 273-274
49
PICARELLI apud FORTES in: VAZ; SAVARIS, 2009. p. 276.
50
BRASIL. Fórum Nacional dos Juizados Especiais Federais. Disponível em:
<http://www.ajufe.org.br/portal/images/stories/pdfs/Enunciados_consolidados.pdf>. Acesso em: 24
maio 2011.
51
BRASIL. Lei n. 10.836, de 9 de janeiro de 2004. Cria o Programa Bolsa Família e dá outras
providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato20042006/2004/lei/l10.836.htm>. Acesso em: 24 maio 2011.
52
FORTES, in: VAZ; SAVARIS, op. cit., p. 277
47
50
Por fim, a Lei n. 8.742/93 estabelece o conceito de necessidade pelo qual
considera incapaz de prover a manutenção, do idoso ou deficiente, a família cuja
renda per capita seja inferior a 1/4 do salário mínimo.53
Esse critério é até hoje objeto de divergência.
Segundo Tsutiya “a doutrina e a jurisprudência posicionaram-se no
sentido da inconstitucionalidade do referido limite, haja vista a discriminação de
pessoas que não tem condições de se manter com dignidade, ferindo assim [...] o
princípio da dignidade da pessoa humana.”54
A constitucionalidade do critério foi, inclusive, motivo de Ação Direta de
Inconstitucionalidade - ADIn, conforme ementa:
CONSTITUCIONAL. IMPUGNA DISPOSITIVO DE LEI FEDERAL QUE
ESTABELECE O CRITÉRIO PARA RECEBER O BENEFÍCIO DO INCISO V
DO ART. 203, DA CF. INEXISTE A RESTRIÇÃO ALEGADA EM FACE AO
PRÓPRIO DISPOSITIVO CONSTITUCIONAL QUE REPORTA À LEI PARA
FIXAR OS CRITÉRIOS DE GARANTIA DO BENEFÍCIO DE SALÁRIO
MÍNIMO À PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA FÍSICA E AO IDOSO.
ESTA LEI TRAZ HIPÓTESE OBJETIVA DE PRESTAÇÃO ASSISTENCIAL
55
DO ESTADO. AÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE.
O julgamento da ADIn n.1232-1/DF foi improcedente, ou seja, o STF
entendeu que o conceito não é inconstitucional, visto que a própria Constituição
estabeleceu que o critério seria disposto na lei.56
Porém, ficou estabelecido no julgamento da ADIn, que o critério é
objetivo, ou seja, constatada a percepção de valor inferior a 1/4 do salário mínimo
por cada um dos membros do grupo familiar, a miserabilidade é presumida.57
A discussão ganhou novo enfoque com a promulgação das Leis n.
9.533/97 e n. 10.689/2003, que estabeleceram como novo critério para verificação
de miserabilidade a renda per capita inferior a 1/2 salário mínimo.58
Esse novo critério, apesar de não revogar expressamente o critério
previsto na Lei 8.742/93, passou a ser utilizado por juízes como forma de aferição do
requisito necessidade, sob o argumento
“de que o § 3º do art. 20 da Lei nº 8.742/93 deve ser interpretado no
conjunto de leis que tratam da assistência social aos necessitados e sob o
53
BRASIL. 1993, loc. cit.
TSUTIYA, 2008, p.438.
55
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 1232-1. Plenário,
Brasília, DF, 1 de junho de 2001. Disponível em: <
http://www.stf.jus.br/portal/peticaoInicial/verPeticaoInicial.asp?base=ADIN&s1=assistencial&process
o=1232>. Acesso em: 25 maio 2011.
56
CASTRO; LAZZARI, 2007, p. 551.
57
Ibid., p. 551
58
CASTRO; LAZZARI, loc. cit.
54
51
pálio da Constituição Federal, pois não haveria razão para tratamento
diferenciado entre o que se considera "miserável" para os fins das Leis nº
59
9.533/97 e n. 10.219/2001 e para a Lei nº 8.742/93.”
Por este motivo, o STF, nos autos do Recurso Extraordinário n. 567.98560,
reconheceu a existência de repercussão geral acerca do tema e, até a presente
data, não decidiu se houve ou não revogação do critério estabelecido na Lei n.
8.742/93.
Analisando os posicionamentos da doutrina e da jurisprudência verifica-se
que tudo o que foi sugerido e vem sendo aplicado, tem por objetivo fazer com que a
Lei Orgânica da Assistência Social atinja suas metas e alcance todos aqueles que
realmente necessitam da proteção estatal.
Como já verificado, para a aplicação do Direito é preciso interpretar a
norma para que seja proferida a melhor decisão ao caso. Assim, é necessário
interpretar a norma assistencial para que essa seja empregada da melhor maneira.
A forma de interpretação mais adequada ao âmbito assistencial é a
aquela que busca a real finalidade da norma, ou seja, aquela que verifica a intenção
do legislador ao criar a lei.
A Assistência Social foi criada com a intenção de fornecer proteção
àqueles que não possuem condições de buscá-la por meios próprios e por esse
motivo na concessão do benefício em pauta o que deve ser verificado é se o
assistido possui ou não tais condições.
Utilizando-se desse tipo de interpretação já foi decidido:
INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL.
REQUISITO
ECONÔMICO.
DESCUMPRIMENTO
OBJETIVO.
VERIFICAÇÃO CONCRETA, POR QUALQUER MEIO DE PROVA, DAS
CONDIÇÕES DE MISERABILIDADE. POSSIBILIDADE. 1. Ultrapassado o
limite de renda per capita objetivamente estabelecido no § 3º do artigo 20 da
Lei 8.742, de 1993, ainda é possível, por outros elementos de prova, a
aferição da condição sócio-econômica concreta do requerente e sua família.
61
2. Recurso conhecido e provido.
59
BRASIL. Tribunal Regional Federal da 4º Região. Agravo Regimental no Agravo de Instrumento
n. 2002.04.01.046195-1, Relator Antonio Albino Ramos de Oliveira, Quinta Turma, 13 de fevereiro
de 2003. Disponível em: <http://www.trf4.jus.br/trf4/jurisjud/citacao.php?doc=TRF400087090>.
Acesso em 26 maio 2011.
60
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário n. 567985. Disponível em:
<http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?incidente=2569060>. Acesso
em: 26 maio 2011.
61
BRASIL. Turma Regional de Uniformização da 4ª Região. Incidente de Uniformização do
Juizado Especial Federal 0004480-78.2008.404.7053. Relatora Luísa Hickel Gamba. Paraná, 20
de maio de 2011. Disponível em:
<http://gedpro.trf4.gov.br/visualizarDocumentosInternet.asp?codigoDocumento=4230871&termosPe
squisados=>. Acesso em: 7 jun. 2011.
52
Como se pode observar, o julgador não se ateve apenas à letra da lei,
mas verificou no caso concreto a condição sócio-econômica do autor utilizando-se
de outros critérios que não os previstos pela Lei n. 8.742/93.
Na mesma linha de pensamento:
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. INCAPACIDADE. CONTEXTO. CONDIÇÕES
PESSOAIS. 1 - A incapacidade, para efeito de benefício assistencial, deve
ser avaliada mediante consideração das condições pessoais do autor, bem
como de seu histórico profissional e do contexto social em que está
inserido. 2 – Verificada a inaptidão para atividades que exijam esforço físico,
há uma incapacidade substancial para prover o sustento por parte de
pessoa com histórico de atividade braçal, sem que o argumento da
incapacidade parcial para o trabalho, existente somente em tese, possa
62
impedir o acesso à assistência social.
Frente a exigência de incapacidade laborativa para a concessão do
benefício ao deficiente, no julgamento acima ficou demonstrado que a incapacidade
mesmo que parcial admite a concessão do benefício. Como defendido pela Relatora
Luciane Merlin, a incapacidade deve ser avaliada de acordo com as condições de
cada autor. A julgadora entendeu que a intenção do legislador também era atingir os
deficientes que possuem incapacidade parcial e não somente incapacidade total.
Os posicionamentos acima expostos demonstram a necessidade de
verificação em cada caso concreto das reais condições do assistido e sua família e a
possibilidade de adequação da lei a cada julgamento.
Verifica-se, portanto, que a possibilidade de interpretação extensiva da lei
deve ser confirmada pelo Judiciário, a fim de que sejam efetivados os objetivos
previstos para a Assistência Social e dessa forma sejam atendidos todos os que
realmente necessitam dessa proteção estatal.
62
BRASIL. Primeira Turma Recursal do Paraná. Recurso de Sentença Cível n. 2008.70.62.0007190. Relatora Luciane Merlin Clève Kravetz. Paraná, 17 de junho de 2010. Disponível em:
<http://jef.jfpr.gov.br/eproc/download_documento.php?cod_usuario=705100000000007&num_proto
colo=700012762719949&seq_documento=1&cod_seg=dfdaf6c902628161881dc4bc6fc88191>.
Acesso em: 07 jun. 2011.
53
5. CONCLUSÃO
A Assistência Social é preocupação muito antiga dos povos e ao longo
dos tempos passou também a ser preocupação dos Estados. No Brasil, a partir da
Constituição de 1988, a Assistência ganhou status de Direito Social e foi classificada
como parte integrante da Seguridade Social, juntamente com a Previdência Social e
a Saúde.
A Constituição Federal estabeleceu que a Assistência fosse prestada
independentemente de contribuição e com o objetivo principal de garantir aos
cidadãos as condições mínimas para uma sobrevivência digna. Com o intuito de dar
efetividade a esse direito, foi instituído o benefício assistencial.
Esse benefício, segundo a Carta Magna, será concedido a idosos e
deficientes sem condições de se manter ou serem mantidos por suas famílias.
Após a previsão constitucional, foi promulgada a Lei n. 8.742/93 com a
finalidade de regular a Assistência e estabelecer os critérios para a concessão do
referido benefício.
Por meio da pesquisa realizada foi possível concluir que diversos
doutrinadores e juristas são contra os requisitos estabelecidos pela Lei n. 8.742/93
para a concessão do benefício assistencial, uma vez que, caso levados em
consideração, apenas uma pequena parte da população brasileira seria atendida.
Concluiu-se também que nem todos os requisitos, como o de idoso e
deficiente, são passíveis de interpretação extensiva.
Em ambos os casos não é possível interpretar extensivamente porque
leva-se em consideração a limitação da capacidade laborativa, ou seja, a
impossibilidade de inserção no mercado de trabalho e a não cobertura pela
Previdência Social.
Já com relação aos outros critérios, a discussão acerca da possibilidade
de interpretação extensiva, ainda é bastante grande.
Apesar do Enunciado 45 adotado no Fórum Nacional Dos Juizados
Especiais Federais, a lei não foi alterada e, portanto, ainda deve ser observada na
concessão do benefício.
Da mesma forma ocorre com o novo requisito implementado pelas leis
9.533/97 e 10.689/2003.
54
Percebe-se que todas as discussões levantadas, com relação aos
requisitos do benefício assistencial, são com o intuito de fazer com que a concessão
do benefício assistencial seja efetivada a todos os necessitados, ou seja, que todos
os que realmente carecem da prestação Estatal sejam atendidos.
A Assistência Social é um direito fundamental garantido a todo cidadão e
deve ser prestado efetivamente. Porém, para que isso ocorra faz-se necessário o
reconhecimento pelo STF da possibilidade de interpretação extensiva dos critérios
aqui discutidos.
55
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59
VENOSA, Silvio de Salvo. Introdução ao Estudo do Direito: primeiras linhas. São
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60
ANEXO
61
ANEXO A – Jurisprudências utilizadas
62
AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 2002.04.01.046195-1/PR
RELATOR
:
AGRAVANTE :
ADVOGADO :
AGRAVADO
:
INTERESSADO :
ADVOGADO :
Juiz FERNANDO QUADROS DA SILVA
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Mariana Gomes de Castilhos
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
UNIAO FEDERAL
Luís Henrique Martins dos Anjos
Publicado
no D.J.U. de
21/01/2004
EMENTA
AGRAVO
DE
INSTRUMENTO.
PROCESSO
CIVIL.
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. LEGITIMIDADE DO
MINISTÉRIO
PÚBLICO.
DIREITOS
INDIVIDUAIS
HOMOGÊNEOS.
SUSPENSÃO CAUTELAR DE ANTERIOR ANTECIPAÇÃO DA TUTELA.
AUSÊNCIA
DE
REFLEXOS
EM
POSTERIOR
ANTECIPAÇÃO.
JULGAMENTO ULTRA PETITA. ARTS. 460 E 294 DO CPC. INEXISTÊNCIA DE
OFENSA. ART. 20, § 3º, DA LEI Nº 8.742/93. INTERPRETAÇÃO NO CONJUNTO
DE LEIS QUE TRATAM DA ASSISTÊNCIA SOCIAL AOS NECESSITADOS E
CONSTITUIÇÃO FEDERAL. ART. 475 DO CPC. LEI Nº 9.494/97. MULTA. ART.
461, §§ 5º E 6º DO CPC.
1. A atual posição do Supremo Tribunal Federal é no sentido de que os
direitos individuais homogêneos, considerados como espécie dos direitos coletivos, na
medida em que se revestirem de relevância social, poderão ser defendidos pelo
Ministério Público por ação coletiva.
2. Desimporta, na presente hipótese de antecipação dos efeitos da tutela,
a existência de decisão monocrática caçando outra antecipação, anteriormente
deferida, porquanto proferida para dar efeito suspensivo a recurso especial interposto
da decisão de outro agravo, anterior, tendo eficácia apenas dentro daqueles limites.
3. Em que pese o fato de o art. 460 do CPC dispor que é proibido ao
magistrado conceder mais do que for pedido, não haverá ofensa ao art. 294 do mesmo
ordenamento se o pedido inicial, inalterado, for provido apenas em parte.
4. É de ser mantida a orientação de que o § 3º do art. 20 da Lei nº
8.742/93 deve ser interpretado no conjunto de leis que tratam da assistência social aos
necessitados e sob o pálio da Constituição Federal, pois não haveria razão para
tratamento diferenciado entre o que se considera "miserável" para os fins das Leis nºs
9.533/97 e 10.219/2001 (que tratam, respectivamente, do programa federal de garantia
de renda mínima - PETI e da "Bolsa Escola") - onde se presume miserável aquele que
tiver renda mensal per capita inferior a ½ do salário mínimo - e para a Lei nº 8.742/93,
onde necessitado (miserável) somente será aquele que detiver renda mensal per capita
inferior a ¼ do salário mínimo. Se, naqueles ordenamentos, se considera miserável
quem tem renda inferior a meio salário mínimo, esse mesmo critério pode e deve ser
aplicado aos aspirantes ao benefício assistencial de que trata a Lei nº 8.742/93. Não há
como se admitir parâmetros diversos para situações idênticas, se, na realidade, importa
mesmo saber quem é miserável, nos termos da lei.
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5. Tratando-se de benefício de assistência social cujo retardo é, por si só,
causador de danos irrecuperáveis, é evidente a ocorrência de periculum in mora, ainda
mais porque esse risco se multiplica, considerando-se o amplo universo de deficientes
que ficam ao desabrigo de qualquer assistência, em virtude do questionado enfoque
administrativo.
6. A irreversibilidade do provimento, meramente econômica, não é óbice
à antecipação da tutela, em matéria previdenciária ou assistencial, sempre que a efetiva
proteção dos direitos à vida, à saúde, à previdência ou à assistência social não puder
ser realizada sem a providência antecipatória.
7. A norma do art. 475, II, do CPC, que institui a remessa oficial das
sentenças contrárias à União, ao Estado e aos Municípios, estendida às autarquias pela
Lei 9.469/97, não é óbice à antecipação da tutela.
8. Se a hipótese não trata de concessão de aumento ou vantagem a
servidor público, não incide a vedação prevista na Lei nº 9.494/97.
9. A multa diária tem natureza processual e punitiva e sua finalidade é
coagir o demandado a cumprir o comando da decisão judicial, sendo cabível sua
aplicação contra a Fazenda Pública. Os §§ 5º e 6º do art. 461 do CPC permitem ao
julgador, inclusive de ofício, alterar o valor da multa cominada, para mais ou para
menos, de acordo com a necessidade do caso. Hipótese em que a multa foi fixada em
montante compatível com a repercussão social da demanda, desencorajando possível
atitude da autarquia, de pagar a multa e não cumprir a determinação judicial.
10. Agravo de instrumento do INSS desprovido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas,
decide a Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade,
negar provimento ao agravo, nos termos do relatório, voto e notas taquigráficas que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 25 de novembro de 2003.
Juiz Federal Fernando Quadros da Silva
Relator
AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 2002.04.01.046195-1/PR
RELATOR
:
AGRAVANTE :
ADVOGADO :
AGRAVADO
:
INTERESSADO :
ADVOGADO :
Juiz FERNANDO QUADROS DA SILVA
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Mariana Gomes de Castilhos
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
UNIAO FEDERAL
Luís Henrique Martins dos Anjos
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RELATÓRIO
1 - Trata-se de agravo de instrumento interposto pelo INSS contra
decisão do MM. Juiz Federal Substituto da 2ª Vara Federal de Londrina, exarada nas
seguintes letras:
"(...)
DISPOSITIVO
Diante do exposto, e tudo o mais que dos autos consta, afastando as preliminares, JULGO
PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido da parte autora, o que faço para determinar às rés, cada
uma na sua área de atuação, que:
a) reconheça o direito ao benefício do art. 203, inciso V da Constituição Federal a todos os
portadores de deficiência e idosos domiciliados na Circunscrição Judiciária de Londrina-PR, que
atendam ao requisito legal de renda mensal 'per capita' inferior a 1/2 (metade) do salário mínimo,
bem como as demais condições legais previstas no art. 20 da Lei 8.742/1993. Ordeno a revisão dos
benefícios indeferidos por motivo de renda familiar desde a data de ajuizamento desta ação, no prazo
de seis meses;
b) fundamente a avaliação da deficiência física ou mental realizada pela autarquia, de modo que os
quesitos para aferição da possibilidade de vida independente e para o trabalho sejam respondidos de
forma clara e precisa, por laudo médico completo e devidamente fundamentado. Na aplicação da
Ordem de Serviço INSS nº 596, de 03 de abril de 1998 e da Instrução Normativa nº 57, de 10 de
outubro de 2001, deverá ser afastado o sistema de pontuação, devendo o profissional fundamentar
tecnicamente, dentro de sua especialidade e área de atuação, porque acolhe, ou não, a existência de
deficiência física ou mental da pessoa submetida à avaliação;
c) implemente administrativamente o comando sentencial, através de regulamentação própria e
dirigida a todas as agências abrangidas pela Circunscrição Judiciária de Londrina-PR, enviando a
cada agência cópia da presente decisão e orientação quanto ao seu integral cumprimento, no prazo
de 30 dias da data da publicação da sentença;
d) promova a publicação de extrato da presente sentença, em jornais de grande circulação, na região
abrangida por esta Circunscrição Judiciária, comunicando, ainda, às associações de proteção a
portadores de deficiência e de idosos, sobre os novos parâmetros que deverão ser seguidos na análise
para a concessão do benefício. Tais providências deverão ser comprovadas em 60 (sessenta) dias da
data da publicação da sentença.
Ainda para a efetivação do comando sentencial, fixo a multa cominatória diária de R$ 1.000,00 (um
mil reais), para cada caso de descumprimento das determinações feitas nas letras 'a' e 'b' 'c' e 'd',
deste 'decisum', sem prejuízo das sanções penais, civis e administrativas cabíveis.
A destinação das multas ora fixadas serão decididas por ocasião de sua eventual execução.
A tutela antecipatória resta deferida nos moldes da fundamentação. (...)."
O agravante alega que foi julgada procedente a medida cautelar nº
2002.04.01.042547-9, outorgando efeito suspensivo ao recurso especial interposto nos
autos do AI nº 2001.04.01.058378-0/PR, anteriormente decidido por este relator, onde
foram antecipados os efeitos da tutela. Aduz que as razões invocadas na medida
cautelar continuam presentes, razão pela qual deve ser atribuído efeito suspensivo a
este agravo.
2 - Defende, preliminarmente:
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a) haver carência de ação, pois ausente a legitimidade ativa do Ministério
Público para a presente demanda, que não poderia ser veiculada através da via
processual eleita e
b) ter havido julgamento extra petita, porquanto a exordial questionava a
constitucionalidade do § 3º do art. 20 da Lei nº 8.742/93, enquanto o agravado, no
curso da ação, modificou os fundamentos do pedido inicial, abordando duas teses
diferentes: 1) a da interpretação conforme a Constituição Federal, defendendo que "a
lei apenas estabelece um patamar (..) abaixo do qual a miserabilidade é presumida,
sendo que, quando a renda for superior ao limite legal, cada caso deveria ser
analisado de acordo com suas peculiaridades" e 2) a da derrogação do art. 20 da Lei
nº 8.742/93 pelo art. 5º, I, da Lei nº 9.533/97, afirmando que "esta última, que trata do
Programa de Erradicação do Trabalho Infantil, teria derrogado aquela,
estabelecendo um novo patamar objetivo para fins de auxílio assistencial pelo Estado,
que teria passado de renda familiar 'per capita' inferior a ¼ do salário mínimo para
inferior a ½ salário mínimo." Afirma que a sentença adotou como fundamento a
segunda tese levantada e requer a anulação da sentença, sob pena de contrariedade a
dispositivo de lei federal (art. 294 do CPC).
3 - No mérito, sustenta, em síntese:
a) que o Plenário do Supremo Tribunal Federal já decidiu o mérito da
questão, pelo julgamento da ADIN nº 1.232-1, com eficácia erga omnes;
b) que a medida liminar contém inegável caráter satisfativo;
c) ser irreversível o provimento antecipatório;
d) ser impossível a antecipação dos efeitos da tutela em virtude do
disposto na Lei nº 9.494/97, art. 475 do CPC e art. 100 da CF/88;
e) que, no caso de ser mantida a decisão agravada, deve ser excluída a
imposição de "multa diária de R$ 1.000,00 (um mil reais) para cada caso de
descumprimento" da ordem judicial ou, então, reduzida.
4 - Nas fls. 159/167 foi indeferido o pedido de efeito suspensivo.
5 - A União Federal interpôs agravo regimental, alegando, em síntese: a)
que a decisão nega vigência à decisão unânime do STF na ADIN nº 1.232-1 e b) "ser
incabível o entendimento extensivo emprestado pela decisão (de primeiro grau)
agravada", pois "outros requisitos estabelecidos em outros diplomas legais, têm como
escopo o deferimento de benefícios diversos, com outras finalidades que não o
benefício assistencial (como a renda mínima e o bolsa escola), o que não autoriza a se
fazer uma interpretação extensiva daqueles critérios, para ampliar a possibilidade de
concessão do benefício assistencial." (fls. 174/179).
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6 - O INSS também apresentou agravo regimental, reprisando, em
síntese, alguns dos argumentos expendidos na exordial do agravo de instrumento, e
postulando, ao final, a reconsideração da decisão guerreada, com a concessão de efeito
suspensivo ao agravo de instrumento ou, caso não seja esse o entendimento, a
submissão do agravo regimental à apreciação da Turma (fls. 181/192).
7 - A União Federal apresentou resposta (fls. 193/202).
8 - Em sessão datada de 13/02/2003, esta Quinta Turma, por
unanimidade, não conheceu do agravo regimental do INSS, por intempestivo, e negou
provimento ao agravo regimental da União Federal (fls. 211/212).
9 - Foram encaminhadas pelo Relator originário, Des. Federal Antônio
Albino Ramos de Oliveira, as informações que foram solicitadas por meio de ofício
oriundo do STF na reclamação nº 2323, reclamante União Federal e reclamados Juiz
Federal da 2ª Vara de Londrina da Seção Judiciária do Paraná e aquele Relator, a qual
é direcionada contra a decisão agravada ao argumento de que tal decisão violou o
decidido na ADIN 1232-1-DF que teve por constitucional esta última norma, e
despacho indeferitório do efeito suspensivo ao presente agravo de instrumento (fls.
226/230).
É o relatório.
Juiz Federal Fernando Quadros da Silva
Relator
AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 2002.04.01.046195-1/PR
RELATOR
:
AGRAVANTE :
ADVOGADO :
AGRAVADO
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Juiz FERNANDO QUADROS DA SILVA
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Mariana Gomes de Castilhos
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
UNIAO FEDERAL
Luís Henrique Martins dos Anjos
VOTO
1 - Inicialmente, quanto a reclamação apresentada no e. STF, ainda
pendente de julgamento, contra a decisão agravada e despacho do Relator originário
que indeferiu o efeito suspensivo no presente agravo de instrumento, cumpre referir
que foram prestadas, em síntese, os seguintes esclarecimentos: a) essa última decisão
não é mais singular e sim do Colegiado porque esta 5ª Turma a manteve quando do
julgamento dos agravos regimentais; b) a suposta violação ao decidido na ADIN 12311/DF não ocorreu, pois as decisões não se fundaram na susposta inconstitucionalidade
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do parágrafo 3º do art. 20 da Lei nº 8742/93, muito embora tenha sido argüida pelo
Ministério Público Federal na inicial da ação civil pública, mas ao contrário, foi
repelida taxativamente pelo ilustre magistrado a quo. O fundamento adotado naquela
decisão foi outro, apoiou-se o magistrado na interpretação evolutiva do parágrafo 3º do
art. 20 da Lei 8.742/93, não havendo que se falar em violação ao decidido na ADIN nº
1232-1-DF, pois a questão se colocou no estrito plano da interpretação da norma
infraconstitucional, que a decisão teve por modificada pela mutação legislativa
superveniente. Por igual, quanto as decisões proferidas neste Regional, adotando, aliás,
a interpretação que vem sendo reiteradamente dada ao § 3º do art. 20 da Lei nº
8742/93 pelo e. STJ (5ª T, RESP 314264/SP, Rel. Min. Felix Fischer, DJ de
18/06/2001, pg. 185). Assim, penso, que referida reclamação, se conhecida, em nada
modificará o decidido neste agravo de instrumento.
2 - Quanto ao mérito do presente agravo de instrumento, o mesmo já foi
enfrentado exaustivamente pelo Relator originário quando da apreciação do pedido de
efeito suspensivo (fls. 159/167), cujos fundamentos abaixo transcritos adoto como
razões de decidir:
"(...)
Passo à análise do pedido de efeito suspensivo.
4 - Inicialmente, cabe apreciar as preliminares argüidas.
5 - ILEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO
A tese da ilegitimidade do Ministério Público para ajuizar ação civil pública na defesa de direitos
individuais homogêneos tem tido trânsito no Egrégio Superior Tribunal de Justiça, como ilustrado nos
precedentes transcritos na petição de agravo. No entanto, ressalto que essa legitimação tem assento
constitucional, e o Egrégio Supremo Tribunal Federal, a quem a Constituição confiou a última
palavra em sua interpretação, vem adotando orientação diversa, ressaltando que os direitos
individuais homogêneos, considerados como espécie dos direitos coletivos, e na medida se revistam
de relevância social, podem ser defendidos pelo Ministério Público por ação coletiva. Exemplo é a
hipótese da cobrança excessiva de mensalidades escolares, examinada pelo Tribunal Pleno no
seguinte precedente:
Ementa
EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO
PÚBLICO PARA PROMOVER AÇÃO CIVIL PÚBLICA EM DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS,
COLETIVOS E HOMOGÊNEOS. MENSALIDADES ESCOLARES: CAPACIDADE POSTULATÓRIA
DO PARQUET PARA DISCUTI-LAS EM JUÍZO. 1. A Constituição Federal confere relevo ao
Ministério Público como instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado,
incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e
individuais indisponíveis (CF, art. 127). 2. Por isso mesmo detém o Ministério Público capacidade
postulatória, não só para a abertura do inquérito civil, da ação penal pública e da ação civil pública
para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente, mas também de outros interesses
difusos e coletivos (CF, art. 129, I e III). 3. Interesses difusos são aqueles que abrangem número
indeterminado de pessoas unidas pelas mesmas circunstâncias de fato e coletivos aqueles
pertencentes a grupos, categorias ou classes de pessoas determináveis, ligadas entre si ou com a
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parte contrária por uma relação jurídica base. 3.1. A indeterminidade é a característica fundamental
dos interesses difusos e a determinidade a daqueles interesses que envolvem os coletivos. 4. Direitos
ou interesses homogêneos são os que têm a mesma origem comum (art. 81, III, da Lei n 8.078, de 11
de setembro de 1990), constituindo-se em subespécie de direitos coletivos. 4.1. Quer se afirme
interesses coletivos ou particularmente interesses homogêneos, stricto sensu, ambos estão cingidos a
uma mesma base jurídica, sendo coletivos, explicitamente dizendo, porque são relativos a grupos,
categorias ou classes de pessoas, que conquanto digam respeito às pessoas isoladamente, não se
classificam como direitos individuais para o fim de ser vedada a sua defesa em ação civil pública,
porque sua concepção finalística destina-se à proteção desses grupos, categorias ou classe de
pessoas. 5. As chamadas mensalidades escolares, quando abusivas ou ilegais, podem ser impugnadas
por via de ação civil pública, a requerimento do Órgão do Ministério Público, pois ainda que sejam
interesses homogêneos de origem comum, são subespécies de interesses coletivos, tutelados pelo
Estado por esse meio processual como dispõe o artigo 129, inciso III, da Constituição Federal. 5.1.
Cuidando-se de tema ligado à educação, amparada constitucionalmente como dever do Estado e
obrigação de todos (CF, art. 205), está o Ministério Público investido da capacidade postulatória,
patente a legitimidade ad causam, quando o bem que se busca resguardar se insere na órbita dos
interesses coletivos, em segmento de extrema delicadeza e de conteúdo social tal que, acima de tudo,
recomenda-se o abrigo estatal. Recurso extraordinário conhecido e provido para, afastada a alegada
ilegitimidade do Ministério Público, com vistas à defesa dos interesses de uma coletividade,
determinar a remessa dos autos ao Tribunal de origem, para prosseguir no julgamento da ação.
(RE 163231 / SP, Relator Min. MAURÍCIO CORRÊA, Tribunal Pleno, unânime, DJ de 29.06.01, pág.
55, e Ementário, vol. 2037-04, pág. 737).
Ao proferir voto no RE nº 213.631-MG (RTJ 173/288-310), o ilustre Ministro Sepúlveda Pertence
ressaltou a raiz constitucional da legitimação do Ministério Público para a defesa dos direitos
individuais homogêneos, observando que essa categoria de direitos, que antes se encontravam
englobados no universo dos interesses metaindividuais, só veio a ser dela destacada com o Código de
Defesa do Consumidor, que é posterior à Constituição de 1988. Isso explica a razão pela qual o
inciso III do art. 129 da Constituição não faz referência aos direitos individuais homogêneos, até
então incluídos no conceito geral de "interesses difusos e coletivos". No entanto, a seu ver não são
quaisquer direitos individuais homogêneos que poderão ser objeto da defesa pelo Ministério Público,
e sim aqueles que sejam identificáveis com interesses sociais constitucionalmente relevantes. Isto
porque o art. 129 da Constituição merece interpretação harmônica com seu art. 127, que, definindo o
Ministério Público como instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, lhe
atribui "a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais
indisponíveis". E, exemplificando, cita "as questões relativas ao custo da educação privada (STF, RE
163.231, Pl. 26-2-97, Corrêa; RE 185.360, 2ª T. 17-11-97, Veloso, DJ 20-2-98; STJ: RESP 70.797,
13-11-95, Rosado, DJ 18-12-95 e precedentes), à seguridade social, à saúde - desde o caso dos
usuários de planos de assistência ao do conjunto de trabalhadores carentes, vítimas de doença
profissional oriunda das condições de trabalho de determinada empresa (STJ, REsp. 58.682, 8-10-96,
Direito, RDA 207/283).
No caso dos autos, está claramente visível o "interesse social segundo a Constituição" a que alude o
ilustre Ministro, já que a lide versa sobre o benefício assistencial instituído pelo inciso V do art. 203
da vigente Carta, benefício que tem inspiração no princípio da dignidade da pessoa humana, erigido
em um dos fundamentos da República Federativa do Brasil (art. 1º, III), e na solidariedade social,
eleita como um de seus objetivos fundamentais (art. 3º, I).
Afasto, portanto, a preliminar.
6 - SUSPENSÃO CAUTELAR DE ANTERIOR ANTECIPAÇÃO DA TUTELA
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Argumenta o agravante que a antecipação da tutela já fora anteriormente concedida por este
Colegiado, no AI 2001.04.01.058378-09/Pr, e foi suspensa pelo E. Desembargador Vice-Presidente
deste Regional, na Medida Cautelar nº 2002.04.01.042547-9-Pr.
Tal decisão monocrática, porém, foi proferida para dar efeito suspensivo ao Recurso Especial
interposto da decisão daquele agravo, e só tem eficácia dentro desses limites. Aquele Recurso
Especial diz respeito à decisão nele atacada, não a esta decisão, que lhe é posterior e diz respeito ao
julgado de primeira instância, também posterior.
7 - JULGAMENTO ULTRA PETITA
De outra banda, não houve julgamento ultra petita. É certo que o magistrado deve se ater ao pedido
inicial, sendo-lhe proibido conceder mais do que for pedido. Essa é a previsão contida no art. 460 do
CPC, que dispõe:
"Art. 460. É defeso ao juiz proferir sentença, a favor do autor, de natureza diversa da pedida, bem
como condenar o réu em quantidade superior ou em objeto diverso do que lhe foi demandado."
Contudo, quem pode o mais, pode o menos. Nas palavras o juiz singular, "a autora requereu que o
critério norteador fosse fixado em um salário mínimo 'per capita', posso conceder menos do que o
pleito, no caso meio salário mínimo, sem que haja ofensa ao art. 282 do CPC, rejeitando a argüição
da União de que houvera alteração intempestiva do pedido inicial."
Não há, portanto, ofensa ao texto do artigo 294 do CPC, pois não houve alteração do pedido inicial,
que, além de tudo, sequer foi integralmente acolhido, como se viu.
Restam afastadas, portanto, todas as preliminares elencadas.
Passo à análise das questões de mérito suscitadas.
8 - É certo que o Supremo Tribunal Federal não acolheu a arguição de inconstitucionalidade do art.
20, § 3º, da Lei 8.742/93. No entanto, isso não basta para que se acolha a interpretação restritiva que
lhe vem dando, sabidamente, a autarquia previdenciária. Se ao Egrégio Supremo Tribunal Federal
compete o exame da constitucionalidade das leis, é ao Egrégio Superior Tribunal de Justiça que cabe,
em última instância, a tarefa de dar à lei federal sua adequada interpretação. No desempenho dessa
tarefa, tem ele entendido que
"o preceito contido no art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93 não é o único critério válido para comprovar a
condição de miserabilidade preceituada no artigo 203, V, da Constituição Federal. A renda familiar
per capita inferior a 1/4 do salário-mínimo deve ser considerada como um limite mínimo, um quantum
objetivamente considerado insuficiente à subsistência do portador de deficiência e do idoso, o que
não impede que o julgador faça uso de outros fatores que tenham o condão de comprovar a condição
de miserabilidade da família do autor" (5ª Turma, RESP 314264/SP, Rel. Min. Felix Fischer, DJ de
18/06/2001, pg. 185).
Desse modo, aquela disposição do parágrafo 3º do art. 20 da Lei 8.742/93 deve ser lida como um
limite abaixo do qual a miserabilidade do grupo familiar é presumida, independendo de provas.
Acima desse limite, a necessidade do benefício deverá ser aferida caso a caso. Nesse sentido, podemse arrolar diversos outros precedentes: Resp 222.764/SP, Rel.Min. Gilson Dipp, DJU de 12/03/2001;
Ag. Reg./Ag. 31..369/SP, Rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, DJU de 05/03/2001; RESP 222.777/SP,
Rel. Min. Jorge Scartezzini, DJU de 07/08/2000; RESP 222.778/SP, Rel. Min. Edson Vidigal, DJU de
29/11/1999). Esse também é o entendimento que vem sendo adotado por este Regional. Mas é notório
não ser o entendimento daquela Autarquia, que tem sistematicamente negado o benefício, sem
maiores indagações, sempre que a renda média familiar do deficiente supera, ainda que por
importância mínima, aquele limite.
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Por outro lado, a orientação adotada pelo magistrado, no sentido de que o § 3º do art. 20 da Lei nº
8.742/93 "deve ser interpretado no conjunto de leis que tratam da assistência social aos necessitados
e sob o pálio da Constituição Federal" não é desarrazoada.
De fato, não haveria razão para tratamento diferenciado entre o que se considera "miserável" para os
fins das Leis nºs 9.533/97 e 10.219/2001 (que tratam, respectivamente, do programa federal de
garantia de renda mínima - PETI e da "Bolsa Escola") - onde se presume miserável aquele que tiver
renda mensal per capita inferior a ½ do salário mínimo - e para a Lei nº 8.742/93, onde necessitado
(miserável) somente será aquele que detiver renda mensal per capita inferior a ¼ do salário mínimo.
Se, naqueles ordenamentos, se considera miserável quem tem renda inferior a meio salário mínimo,
esse mesmo critério pode e deve ser aplicado aos aspirantes ao benefício assistencial de que trata a
Lei nº 8.742/93. Não há como se admitir parâmetros diversos para situações idênticas, se, na
realidade, importa mesmo saber quem é miserável, nos termos da lei.
Nesse tópico, portanto, também não merece reparos a bem lançada decisão.
Assim posta a questão, visualiza-se a verossimilhança das alegações do Ministério Público Federal,
autorizativa da antecipação da tutela.
9 - Quanto ao periculum in mora, é evidente sua ocorrência, já que se trata de benefício
de assistência social cujo retardo é, por si só, causador de danos irrecuperáveis. Esse risco se
multiplica, considerando-se o amplo universo de deficientes que ficam ao desabrigo de qualquer
assistência, em virtude do questionado enfoque administrativo.
10 - A irreversibilidade do provimento, meramente econômica, não é óbice à antecipação da tutela,
em matéria previdenciária ou assistencial, sempre que a efetiva proteção dos direitos à vida, à saúde,
à previdência ou à assistência social não puder ser realizada sem a providência antecipatória.
11 - Quanto ao cabimento da antecipação de tutela contra a Fazenda Pública, inclusive em face da
remessa necessária, segundo o escólio do ilustre processualista Teori Albino Zavaski, nenhuma
disposição específica foi editada para excluir as entidades públicas de sua aplicação e nem mesmo o
reexame obrigatório, pelo Tribunal, das sentenças condenatórias contra elas proferidas constitui
empecilho à antecipação quando esta for cabível (Em Antecipação de Tutela, São Paulo, Ed. Saraiva,
1997, p. 160).
12 - Aduziu o agravante que a Lei nº 9.494/97 veda expressamente a concessão do provimento
antecipatório. Se a discussão não envolve vantagens de servidores públicos, não há incidência desse
diploma legal. Nesse sentido, precedente do Supremo Tribunal Federal:
"Reclamação. A decisão na ADC-4 não se aplica em matéria de natureza previdenciária.
O disposto nos arts. 5º, e seu parágrafo único, e 7º, da Lei nº 4348/1964, e no art. 1º e seu parágrafo
4º da Lei nº 5021, de 9.6.1966, não concernem a benefício previdenciário garantido a segurado, mas,
apenas, a vencimentos e vantagens de servidores públicos.
Relativamente aos arts. 1º, 3º e 4º da Lei nº 8437, de 30.6.1992, que o art. 1º da Lei nº 9494/1997
manda, também, aplicar à tutela antecipada, por igual, não incidem na espécie aforada no Juízo
requerido.
A Lei nº 8437/1992 dispõe sobre a concessão de medidas cautelares contra atos do Poder Público. No
art. 1º, interdita-se deferimento de liminar, no procedimento cautelar ou em quaisquer outras ações
de natureza cautelar ou preventiva, toda vez que providência semelhante não puder ser concedida em
ações de mandado de segurança, em virtude de vedação legal. Ocorrência de evidente remissão às
normas acima aludidas, no que respeita a vencimentos e vantagens de servidores públicos, que
prosseguiram, assim, em vigor.
71
A inteligência desse dispositivo completa-se com o que se contém, na mesma linha, no art. 3º da Lei nº
8437/1992.
Não cabe emprestar ao § 3º do art. 1º do aludido diploma exegese estranha a esse sistema,
conferindo-lhe, em decorrência, autonomia normativa a fazê-lo incidir sobre cautelar ou antecipação
de tutela acerca de qualquer matéria.
Reclamação julgada improcedente."
(RCL 1122/RS, Tribunal Pleno, Rel. Min. Néri da Silveira, DJ de 6/9/2001)
13 - Por outro lado, a multa diária aplicada tem natureza processual e punitiva e sua finalidade é
coagir o demandado a cumprir o comando da decisão judicial, sendo possível sua aplicação contra a
Fazenda Pública, conforme jurisprudência consolidada.
No que tange ao valor imputado para o caso de eventual descumprimento, cabe transcrever a nova
redação conferida aos §§ 5º e 6º do art. 461 do CPC:
"§ 5º Para a efetivação da tutela específica ou a obtenção do resultado prático equivalente, poderá o
juiz, de ofício ou a requerimento, determinar as medidas necessárias, tais como a imposição de multa
por tempo de atraso, busca e apreensão, remoção de pessoas e coisas, desfazimnetos de obras e
impedimento de atividade nociva, se necessário com requisição de força policial."
"§ 6º O juiz poderá, de ofício, modificar o valor ou a periodicidade da multa, caso verifique que se
tornou insuficiente ou excessiva." - (os grifos não pertencem ao original).
Ora, a lei permite ao juiz, inclusive de ofício, alterar o valor da multa cominada, para mais ou para
menos, de acordo com a necessidade do caso. Na hipótese em tela, entendo que ela foi fixada em
montante compatível com a repercussão social da demanda. Creio que, se o valor fosse menor,
haveria o risco de a autarquia não cumprir o comando judicial, pois, dependendo da sanção
(unicamente de cunho monetário), seria menos oneroso, para ela, pagar a multa do que cumprir a
guerreada decisão. Com isso, restaria sem propósito a fixação da multa, que é, como explicitado,
coagir o demandado a cumprir o comando da decisão judicial.
Resta mantida, portanto, a multa diária por descumprimento da obrigação, tal como cominada.
(...)
15 - Em face do exposto, indefiro o pedido de efeito suspensivo.
Intime-se o agravado para, querendo, apresentar resposta.
Dê-se ciência do inteiro teor desta decisão à interessada (União Federal) e ao Juízo a quo,
solicitando-se informações, inclusive acerca do cumprimento do disposto no art. 526 do CPC.
Publique-se."
3 - Ante o exposto, nego provimento ao agravo de instrumento interposto
pelo INSS.
É o voto.
Juiz Federal Fernando Quadros da Silva
Relator
72
INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO JEF Nº 000448078.2008.404.7053/PR
RELATOR
RECORRENTE
ADVOGADO
RECORRIDO
ADVOGADO
:
:
:
:
:
D.E.
Publicado em 26/05/2011
Juiz Federal LUÍSA HICKEL GAMBA
LEONARDO CHOTI SCHOTTS
Jefferson Figueira Cazon e outros
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Procuradoria Regional da PFE-INSS
EMENTA
INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL.
REQUISITO ECONÔMICO. DESCUMPRIMENTO OBJETIVO. VERIFICAÇÃO
CONCRETA, POR QUALQUER MEIO DE PROVA, DAS CONDIÇÕES DE
MISERABILIDADE. POSSIBILIDADE.
1. Ultrapassado o limite de renda per capita objetivamente estabelecido
no § 3º do artigo 20 da Lei 8.742, de 1993, ainda é possível, por outros elementos de
prova, a aferição da condição sócio-econômica concreta do requerente e sua família.
2. Recurso conhecido e provido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas,
decide a Egrégia Turma Regional De Uniformização do Tribunal Regional Federal da
4ª Região, por unanimidade, conhecer e dar provimento ao incidente, nos termos do
relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Florianópolis, 20 de maio de 2011.
Juíza Federal LUÍSA HICKEL GAMBA
Relatora
INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO JEF Nº 0004480-78.2008.404.7053/PR
RELATOR
: Juiz Federal LUÍSA HICKEL GAMBA
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RECORRENTE
ADVOGADO
RECORRIDO
ADVOGADO
:
:
:
:
LEONARDO CHOTI SCHOTTS
Jefferson Figueira Cazon e outros
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Procuradoria Regional da PFE-INSS
RELATÓRIO
Trata-se de incidente de uniformização interposto pela parte autora
contra acórdão da Segunda Turma Recursal do Paraná, que manteve sentença de
improcedência de pedido de concessão de benefício assistencial, uma vez que a
renda per capita do núcleo familiar seria superior ao critério objetivo estabelecido pela
LOAS (1/4 do salário mínimo).
Pretende o recorrente que prevaleça entendimento no sentido de que o
critério econômico objetivo estabelecido na Lei 8.742/93 não exclui outros elementos
de prova para aferição da condição sócio-econômica do requerente e sua família.
Aponta como paradigma acórdão da própria Segunda Turma recursal do Paraná e desta
Turma Regional de Uniformização.
Não foram apresentadas contrarrazões.
A Presidência da Segunda Turma Recursal do Paraná não admitiu o
incidente.
Em pedido de submissão dirigido ao Presidente desta Turma Regional, o
incidente foi admitido.
O Ministério Público Federal opinou pelo provimento parcial do
incidente.
Juíza Federal LUÍSA HICKEL GAMBA
Relatora
INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO JEF Nº 0004480-78.2008.404.7053/PR
RELATOR
RECORRENTE
ADVOGADO
RECORRIDO
:
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Juiz Federal LUÍSA HICKEL GAMBA
LEONARDO CHOTI SCHOTTS
Jefferson Figueira Cazon e outros
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
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ADVOGADO
: Procuradoria Regional da PFE-INSS
VOTO
Admissibilidade
O recurso é admitido, visto que tempestivo e formalmente regular,
restando demonstrada a divergência alegada, como bem referiu a decisão de
admissibilidade da Presidência da Turma Regional de Uniformização. Com efeito,
há identidade entre os casos versados no acórdão recorrido e no paradigma desta
Turma Regional, e divergência na solução das causas, dando-se solução diversa à
mesma questão de direito (o acórdão recorrido aplicou, sem flexibilização, o limite
objetivo de ¼ do salário mínimo, estabelecido no §3º do art. 20 da Lei nº 8.742/93,
enquanto que o acórdão paradigma adotou o entendimento de que o requisito objetivo
de miserabilidade fixado na lei pode ser superado pela avaliação da miserabilidade no
caso concreto, de acordo com as condições sócio-econômicas demonstradas.
Assinalo que os precedentes da própria Turma de que provém o acórdão
recorrido não servem à demonstração da divergência, mas a indicação de paradigma
desta Turma Regional de Uniformização para a caracterização da divergência, por si
só, não afasta a admissibilidade do incidente.
Com efeito, esta Turma Regional já decidiu que "a indicação de
precedente da própria Turma Regional de Uniformização, em princípio, atende a
exigência do artigo 14, §1º, da Lei nº 10.259/01" (TRU4R. IUJEF 2006.70.51.0062160, Relatora Juíza Federal Ivanise Correa Rodrigues Petroni, D.E. 24/03/2010).
Por outro lado, cabe acrescentar que, não sendo nova nesta Regional a
matéria objeto do incidente e já tendo havido uniformização anterior, o incidente, de
qualquer forma, mereceria conhecimento com base na Questão de Ordem nº 01 desta
Regional, com o seguinte teor:
QUESTÃO DE ORDEM Nº 01
Ainda que inadmissíveis os precedentes invocados pelo recorrente e desde que prequestionada a
matéria, admite-se incidente de uniformização quando identificada contrariedade do acórdão
recorrido à atual jurisprudência da TRU e o ponto houver sido especificamente impugnado no pedido
de uniformização. (Aprovada na Sessão Administrativa do dia 13.12.2010)
Com efeito, esta Regional tem atualmente uniformizado o entendimento
de que o critério objetivo estabelecido pela Lei nº 8.742, de 1993 (artigo 20, §3º), não
exclui outros elementos de prova para aferição da condição sócio-econômica do
requerente e sua família (IUJEF 2007.70.54.000779-9, Turma Regional de
Uniformização da 4ª Região, Relatora Flávia da Silva Xavier, D.E. 21/01/2009).
75
Como o acórdão recorrido está em confronto com a uniformização atual,
cabe o incidente também por força da Q.O. nº 01 desta Regional.
Mérito
O objeto do presente incidente é a uniformização da interpretação do § 3º
do artigo 20 da Lei nº 8.742, de 1993, para que prevaleça o entendimento de que o
requisito econômico da renda per capita igual ou inferior a ¼ do salário mínimo,
estabelecido no referido dispositivo legal para a concessão de benefício assistencial,
pode ser flexibilizado mediante a verificação das condições concretas de
miserabilidade.
Dispõe o referido dispositivo legal, com as alterações da Lei nº 9.720, de
1998:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de 1 (um) salário mínimo mensal à pessoa
portadora de deficiência e ao idoso com 70 (setenta) anos ou mais e que comprovem não possuir
meios de provar a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
§ 1º Para os efeitos do disposto no caput, entende-se como família o conjunto de pessoas elencadas no
art. 16 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, desde que vivam sob o mesmo teto.
(...)
§ 3º Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa a
família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.
Cabe registrar que, não obstante o Supremo Tribunal Federal venha
entendendo, sistematicamente, que o requisito da renda per capita inferior a ¼ do
salário mínimo é de natureza objetiva e que qualquer fundamentação que o afaste é
uma afronta direta à decisão proferida na ADI 1.232 (Reclamações STF nºs 2.303,
2.733, 2.298, 2.323, 3.244. 3.191, 3.153, 4.048 e 4.162), sobre o tema foi reconhecida
repercussão geral (RE 567.985/MT, DJe 11/04/2008) precedida de julgados em que o
requisito foi abrandado, mediante descontos ou exclusões no cálculo da renda per
capita.
Por outro lado, esta Turma Regional de Uniformização tem uniformizado
o entendimento de que o requisito objetivo de miserabilidade fixado na lei pode ser
superado pela avaliação da miserabilidade no caso concreto, de acordo com as
condições sócio-econômicas demonstradas:
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL AO IDOSO. RENDA PER CAPITA SUPERIOR A ¼ DO SALÁRIO
MÍNIMO. CRITÉRIO NÃO ABSOLUTO. 1. O critério objetivo estabelecido pela Lei nº 8.742/93
(artigo 20, §3º) não exclui outros elementos de prova para aferição da condição sócio-econômica do
requerente e sua família. 2. Incidente de uniformização de jurisprudência conhecido e provido.
(IUJEF 2007.70.54.000779-9, Turma Regional de Uniformização da 4ª Região, Relatora Flávia da
Silva Xavier, D.E. 21/01/2009)
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA.
DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. REQUISITO SÓCIOECONÔMICOS. 1. Acórdão recorrido que admite a atenuação do critério objetivo de miserabilidade
76
(renda familiar per capita de ¼ do salário mínimo) apenas pelo abatimento de despesas com
medicamento e decisão paradigmática que analisa todo o contexto econômico e social da família para
aferir a situação de risco social. Caracterizada divergência de interpretação de lei federal por
Turmas Recursais distintas. Incidente de uniformização de jurisprudência conhecido. 3. Aplicação do
entendimento já uniformizado no sentido de que o critério objetivo estabelecido pela Lei nº 8.742/93
(artigo 20, §3º) não exclui outros elementos de prova para aferição da condição sócio-econômica do
requerente e sua família (IUJEF 2007.70.54.000779-9, Turma Regional de Uniformização da 4ª
Região, Relatora Flávia da Silva Xavier, D.E. 21/01/2009). 4. Incidente conhecido e provido, com
devolução dos autos à Turma Recursal de origem para adequação. (IUJEF 2007.70.50.014015-4,
Turma Regional de Uniformização da 4ª Região, Relatora p/ Acórdão Luciane Merlin Clève Kravetz,
D.E. 13/04/2010)
Também a Turma Nacional de Uniformização decide que "a renda
familiar per capita de até ¼ do salário mínimo gera presunção absoluta de
miserabilidade, mas não é um critério absoluto. Trata-se de um limite mínimo, motivo
pelo qual a renda superior a este patamar não afasta o direito ao benefício se a
miserabilidade restar comprovada por outros meios" (TNU, PEDILEF nº
2004.43.00.900041-0/TO, Rel. Juiz Fed. Marcos Roberto de Araújo Santos, DJ
22.01.2008; TNU, PEDILEF nº 2007.72.95.000239-3/SC, Rel. Juiz Fed. Leonardo
Safi de Melo, DJ 31.01.2008; TNU, PEDILEF nº 2005.43.00.902053-5/TO, Rel. Juíza
Fed. Maria Divina Vitória, DJ 11.03.2008; TNU, PEDILEF nº 2005.43.00.9048024/TO, Rel. Juiz Fed. Valter Antoniassi Maccarone, DJ 14.03.2008; TNU, PEDILEF nº
2007.70.51.005210-9/PR, Rel. Juíza Fed. Jacqueline Michels Bilhalva, DJ 16.03.2009;
TNU, PEDILEF nº 2007.70.63.000897-5/PR, Rel. Juiz Fed. Sebastião Ogê Muniz, DJ
07.07.2009; TNU, PEDILEF nº 2007.70.54.000813-5/PR, Rel. Juiz Fed. Derivaldo de
F. B. Filho, DJ 05.05.2010; TNU, PEDILEF nº 2007.70.50.014189-4/PR, Rel. Juiz
Fed. Otávio Henrique Martins Port, DJ 13.05.2010).
A uniformização merece ser mantida, enquanto a questão não é
definitivamente julgada pelo Supremo Tribunal Federal.
Como o voto condutor do acórdão recorrido negou o benefício
assistencial apenas porque o requisito econômico da renda per capita de ¼ do salário
mínimo não restou objetivamente cumprido, sem fazer qualquer avaliação das
condições concretas de miserabilidade, impõem-se o provimento do recurso e a
devolução dos autos à Turma Recursal de origem para a devida adequação.
Ante o exposto, voto por CONHECER E DAR PROVIMENTO AO
INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA, para uniformizar o
entendimento de que o critério objetivo estabelecido no § 3º do artigo 20 da Lei nº
8.742, de 1993, não exclui outros elementos de prova para aferição da condição sócioeconômica do requerente de benefício assistencial e sua família.
Juíza Federal LUÍSA HICKEL GAMBA
Relatora
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JUIZADO ESPECIAL (PROCESSO ELETRÔNICO) Nº200870620007190/PR
RELATORA
: Juíza Luciane Merlin Clève Kravetz
RECORRENTE
: ANTÔNIO FRANCISCO LEMOS DE OLIVEIRA
RECORRIDO
: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS
EMENTA
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. INCAPACIDADE. CONTEXTO.
CONDIÇÕES PESSOAIS.
1 - A incapacidade, para efeito de benefício assistencial, deve ser
avaliada mediante consideração das condições pessoais do autor, bem como de seu
histórico profissional e do contexto social em que está inserido.
2 – Verificada a inaptidão para atividades que exijam esforço físico, há
uma incapacidade substancial para prover o sustento por parte de pessoa com histórico
de atividade braçal, sem que o argumento da incapacidade parcial para o trabalho,
existente somente em tese, possa impedir o acesso à assistência social.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos, acordam os Juízes da 1ª TURMA
RECURSAL DOS JEFs do PARANÁ, por unanimidade, em DAR PROVIMENTO
AO RECURSO, nos termos do voto da Relatora.
Além da relatora, participaram do julgamento os Excelentíssimos
Senhores Juízes Federais José Antonio Savaris e Márcia Vogel Vidal de Oliveira.
Luciane Merlin Clève Kravetz
Juíza Federal Relatora
JUIZADO ESPECIAL (PROCESSO ELETRÔNICO) Nº200870620007190/PR
RELATORA
: Juíza Luciane Merlin Clève Kravetz
RECORRENTE
: ANTÔNIO FRANCISCO LEMOS DE OLIVEIRA
RECORRIDO
: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS
VOTO
O autor, nascido em 19/06/1950, pediu a condenação do INSS na
obrigação de lhe pagar benefício assistencial, a partir da DER (28/02/2008). A
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sentença rejeitou o pedido, por considerar existente incapacidade somente parcial para
o trabalho.
Houve recurso, no qual o autor alegou que preenche o requisito da
incapacidade, segundo o enunciado da súmula 29/TNU.
Razões de voto.
De acordo com a CTPS, o autor tem histórico de trabalho braçal, no
ramo da construção civil. Alega estar incapaz de prover a seu sustento pelo trabalho.
O perito judicial afirmou que o autor é portador de neoplasia maligna de
língua. Em função disto, apresenta disfagia (dificuldade para deglutir alimentos),
desde 03 meses antes do tratamento, e que piorou após a cirurgia realizada em final
de setembro de 2007, o que ocasiona fraqueza pela má alimentação; disfonia
(dificuldade para fala); dispnéia (falta de ar) aos médios esforços; dor em ombro
direito e dificuldade para movimentação do membro superior direito que iniciaram
após a cirurgia. Existe, segundo o perito, uma redução permanente da capacidade
laboral, desde setembro de 2007. Isto porque as seqüelas apresentadas incapacitam o
paciente para qualquer atividade que necessite movimento do membro superior direito
ou para atividade que utilize a comunicação verbal freqüente.
O quadro que se apresenta revela uma incapacidade substancial do autor
para prover sua subsistência, levando-se em conta que, pela vida afora, foi trabalhador
braçal, atividade que exige esforço físico de médio a acentuado. Considerem-se os
fatos: (i) dificuldade de fala; (ii) fraqueza pela má alimentação; (iii) falta de ar aos
médios esforços e (iv) limitação de movimento do braço direito. Aliem-se ao quadro a
idade do autor e o contexto em que vive (sozinho), além do grau de escolaridade. Não
há como negar que o autor pode, quando muito e como vem fazendo, trabalhar de
forma precária, sem que possa ser comparado a uma pessoa de mesma idade e
qualificação.
Aplica-se, neste caso, o entendimento já adotado por esta turma recursal
em caso referente a idoso: a renda precária e auferida na medida das possibilidades
físicas do idoso pretendente ao benefício assistencial não pode prejudicar-lhe o
acesso à assistência social (RCI 2008.70.50.009676-5 – Rel. Juiz José Antonio
Savaris). É o que acontece no caso em exame, pois o autor, ainda que incapaz, precisa
usar do mínimo de força que tem para sobreviver e o faz, de maneira precária, sem que
tal fato retire seu direito ao benefício previsto na LOAS.
Assim, condeno o INSS a pagar ao recorrente, desde a DER, quando já
se preenchiam os requisitos necessários, o benefício assistencial.
As prestações vencidas sofrerão atualização monetária, do vencimento,
pelo IGP-DI (de 05/1996 a 03/2006 – Lei 9711/98, art. 10) e pelo INPC (de 04/2006 a
06/2009 – Lei 10.741/03, art. 31), quando haverá incidência de juros moratórios de 1%
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mensais, contados da citação. A partir de 07/2009 e até o pagamento, para fins de
correção monetária e juros de mora, incidirão os índices oficiais de remuneração
básica e juros aplicados à caderneta de poupança (Lei 9494/97, art. 1ºF, com redação
da Lei 11.960/2009).
Ante o exposto, DOU PROVIMENTO AO RECURSO. Não há
condenação em honorários advocatícios.
Luciane Merlin Clève Kravetz
Juíza Federal
Download

Michele de Oliveira Pereira