TRANSFERÊNCIAS MUSCULARES NAS PARALISIAS NERVOSAS Ronaldo Santos Carneiro1, Fernando Carvalho Ventin2, Fabrício Verlindo Brinco3 INTRODUÇÃO O presente e o passado das transferências va. Vamos relembrar alguns princípios básicos e tendinosas são muito diferentes. Transferências analisar as transposições que temos a disposição. musculares são menos frequentes nos dias de Os pré-requisitos para um bom resultado hoje do que nas décadas de 60, 70 e 80, quando no pós operatório em transferências tendinosas pacientes se apresentavam no consultório com são: motivação do paciente, expectativas razo- paralisias dos nervos periféricos do membro áveis e que o mesmo entenda o procedimento superior e a única solução era a realização de que será realizado. transferências tendinosas para melhorar a função da mão. Hoje em dia ainda há necessidade PRINCÍPIOS DAS TRANSFÊRENCIAS de transposições de tempos em tempos, mas as TENDÍNEAS novas técnicas de reparação nervosa melhora- Existem basicamente 2 tipos de transferên- ram os resultados de uma maneira significati- 1 Diretor Médico do Carneiro Institute for Hand Surgery - Naples, Florida, EUA. 2 Sócio fundador do Instituto de Cirurgia de Mão e Microcirurgia do Estado do Espírito Santo (IMÃO) – Vitória, Espírito Santo. 3 Instrutor do grupo de Cirurgia da Mão do serviço de Residência Médica do HU-Canoas – Canoas, Rio Grande do Sul 1 cias: Transferências para obter posição das ar- Se não for possível faze-lo com terapia, devemos ticulações maiores (punho e cotovelo) e trans- pensar em capsulotomias, artrodeses etc. ferências para obter função da mão: flexores, extensores e intrínsecos Abaixo discutiremos alguns princípios que são necessários para o planejamento e execução das transferências tendíneas. Sinergismo funcional Músculos sinérgicos exercem de alguma maneira a mesma função ou uma estabilização de uma articulação importante para obter a ação Força adequada desejada. A transferência de músculos funcionalmente sinérgicos favorece a adaptação O tendão escolhido como doador tem que do paciente à transferência realizada. Flexores ser suficientemente forte para executar sua do punho e extensores dos dedos são sinérgi- nova função na posição alterada. É contraindi- cos, assim como são os extensores do punho cado o uso de músculos previamente desnerva- e flexores dos dedos. O pronador redondo é dos exceto quando não há outra opção. funcionalmente sinérgico aos extensores do punho, já que a maioria das ações que realiza- Ausência de contraturas articulares É muito mais fácil prevenir uma contratura do que trata-la. Todo potencial candidato a uma transferência tendinosa merece o acompanhamento com um serviço de reabilitação para manter moveis (de forma passiva) as articulações afetadas com as paralisias. Nos pacientes com lesões mos com o antebraço pronado é feita como o punho em extensão. O extensor do indicador é sinérgico aos oponentes do polegar porque ao fazer oposição para pegar um objeto grande o indicador vai fazer extensão na articulação metacarpofalangeana. Para pinça delicada, este estabiliza a articulação metacarpofalangeana. crônicas, se faz necessário reposicionar as articulações com contraturas antes das transferências. Amplitude de movimento 2 As excursões dos tendões flexões e extenso- transferência de flexores do punho para lesão res do punho e dos dedos foram avaliadas em de nervo radial, por exemplo, é desejável man- estudos anatômicos. De modo geral os flexo- ter o Flexor Radial do carpo em sua função e res e extensores do punho possuem menos da utilizar o Flexor ulnar do carpo e o palmar lon- metade da excursão dos flexores dos dedos. O go para as transferências. O FCR é claramente extensor longo do polegar e o extensor comum capaz de flexão adequada do punho. Por isto, dos dedos possuem excursão intermediária. o autor sênior (RSC) condena o uso do fle- Em uma transferência de um dos flexores do xor radial do carpo inteiro para substituição da punho para extensor comum dos dedos, apesar base do polegar como alguns autores aconse- da diferença de excursão entre os músculos, o lham. A perda da função para que um tendão efeito tenodese (flexão do punho – extensão tão importante funcione como enchimento é dos dedos) favorece a extensão completa dos funcionalmente inaceitável. dedos com a flexão ativa do punho. Tensão Um tendão – uma função Uma das perguntas mais frequentes duran- Se um músculo é inserido em dois tendões tes estas cirurgias de transferência é o quanto de com diferentes funções, a forca e amplitude tensão se deve colocar na suturas dos dois ten- do tendão doador será dissipada. Dessa forma, dões (doador e receptor). A resposta é sempre a recomenda-se que cada músculo seja direcio- mesma: muita! A sutura deve ser sempre mais nado para apenas um tendão. tensa do que o necessário para simplesmente manter a posição e atitude requerida. Sempre Doador prescindível há um relaxamento muscular e o tendão transferido cede um pouco. Há muitas transposi- A remoção de um tendão não pode resul- ções que se podem testar com tenodese duran- tar em uma perda irreparável de função. Na te a cirurgia. Mas sem duvida, sempre deve-se 3 manter a sutura mais tensa que o normal. déficit sensitivo do nervo mediano. Quanto Rota mais grave seja esse déficit, menos provável que Existem técnicas que advogam as transferências tendinosas por técnicas internas (pela membrana interóssea, principalmente). Nós preferimos as técnicas subcutâneas por o paciente possa se beneficiar de uma transferência tendinosa. Esse déficit, no entanto, não deve contraindicar as transferências e, nestes casos, a recuperação pós operatória deve se concentrar na utilização da visão como subs- três razões principais: evitar aderências, me- tituta do tato. A missão da terapeuta se torna lhor deslizamento, facilidade de re-operação. ainda mais complicada. Uma transferência pela membrana interóssea A lesão do nervo mediano pode ser classifi- não tem possiblidade alguma de não criar uma cada como baixa ou alta quando ocorre distal severa aderência por pura falta de espaço. Re- ou proximal a origem do nervo interósseo an- -operações para falta de função por causa des- terior no antebraço. Nas lesões baixas, há uma sas aderências serão muito mais difíceis. paralisia da porção da musculatura tenar da mão que é predominantemente inervada pelo Nota nervo mediano: abdutor curto e oponente do polegar e a porção superficial do flexor curto Como os autores se concentraram nas técnicas que são as mais favoráveis, os capítulos de trans- do polegar. Nas lesões altas, além dos músculos tenares citados, estão paralisados os pronadores posições tendinosas não serão uma recapitulação (redondo e quadrado), flexor radial do carpo, de todas as técnicas disponíveis, mas se concen- flexor superficial dos dedos, flexor longo do trarão nas usadas pelo autor sênior (RSC). polegar e profundo do indicador e dedo médio, além do palmar longo. Esse conhecimento TRANSFERÊNCIAS TENDINOSAS anatômico é importante no planejamento do NAS LESÕES DO NERVO MEDIANO tratamento. É importante uma atenção especial para o Para todas as lesões do nervo mediano o 4 principal objetivo nas transferências tendino- mente descrito como a associação de abdução, sas é a recuperação da oponência do polegar. flexão e pronação da articulação trapézio-me- Para as lesões altas, também é importante a re- tacarpiana. Algumas técnicas de transferências cuperação da função do flexor longo do pole- tendinosas foram descritas para essa finalidade: gar e do flexor profundo do indicador. »»Transferência do extensor próprio do indicador Objetivo: Recuperação da oponência (oponentoplastia) Em alguns casos, a abdução e a oponência do polegar estão conservadas após lesão isolada do nervo mediano. Isso se deve a presença frequente de anastomoses de Riche-Cannieu entre ramos motores do nervo ulnar e mediano. Fouther e colaboradores publicaram que apenas 6,6% dos pacientes com síndrome do túnel do carpo severos cursavam com oponência inadequada do polegar. Se a lesão do nervo é unilateral, principalmente na mão não dominante, a perda de função pode ser insuficiente para indicar alguma transferência tendinosa. A eletroneuromiografia pode ser importante na identificação de anastomoses entre os nervos mediano e ulnar. A oponência é um movimento classica- Popularizada por Burkhalter, essa técnica consiste em retirar o extensor próprio do indicador (EPI) ao nível da articulação metacarpofalangeana e sutura-lo na inserção do abdutor curto do polegar com uma forte ancoragem no extensor longo do polegar (ELP), para maior segurança e também para simular a inserção do abdutor curto do polegar no ELP. Uma incisão é feita na borda dorso ulnar do punho para puxar o tendão proximalmente ao retináculo dos extensores e passa-lo por túnel subcutâneo até a região metacarpofalangeana do polegar. Durante essa passagem, deve-se ter o cuidado de passar o EPI distal ao pisiforme. Desta forma, a borda lateral do antebraço serve como polia para a transferência. É a técnica preferida pelos autores por ser de fácil execução, não necessita a construção de polias e por não provocar fraqueza, rigidez ou deformidades no dedo do5 ador, como as técnicas que usam o flexor superficial. Além disso há uma sinergia funcional envolvida, uma vez que já estamos condicionados a manter o extensor atuante nos movimentos delicados de pinça. »»Transferência do abdutor do dedo mínimo É a segunda opção para os autores. Consiste em transferir o músculo abdutor do dedo mínimo para a região metacarpofalangeana do polegar. Para realiza-la, liberamos esse abdutor dos demais músculos hipotenares e o dissecamos do pisiforme, tomando cuidado com o seu feixe neurovascular que se insere proximalmente. Quando necessário é feita sua desinserção do pisiforme, mas sempre mantendo uma inserção tendinosa no flexor ulnar do carpo. Um túnel subcutâneo leva o músculo até sua nova inserção no abdutor curto do polegar. São vantagens desta técnica o acesso fácil ao músculo com tendão, a cobertura que oferece ao nervo lesado (quando for o caso), além de levar a um bom resultado estético, já que aumenta o volume na região tenar atrofiada. Fig.1 – Oponentoplastia pela transferência do extensor próprio do indicador (EIP). A: EIP seccionado ao nível da MF e puxado proximalmente ao retináculo dos extensores; B: Confecção de túnel subcutâneo distal ao psiforme; C: Postura da mão “armada” em oponência logo após a tenorrafia Fig.2 - Oponentoplastia pela transferência do abdutor do dedo mínimo. A: Passagem do músculo pelo túnel subcutâneo; B: Mão em posição de oponência no intra operatório 6 Um ponto negativo é a diminuição da força de abdução do dedo mínimo. Para avaliação do resultado das oponentoplastias, Sundararaj e Mani criaram uma classificação baseada na função. Em um resultado »»Transferência do flexor superficial de um dedo tido como excelente, há a oponência do polegar com o quarto e quinto dedos, mantendo a Essa técnica foi popularizada por Royle Thompson e por Bunnell e trata-se da transferência do flexor superficial de um dedo para recuperação da oponência. Inicialmente utilizava-se o flexor do dedo anular, mas observou-se que a perda da força de preensão era muito prejudicial. Para realização da mesma o tendão articulação interfalangeana estendida. Para um bom resultado, há oponência com o segundo e terceiro dedos. Um desfecho é considerado regular quando a oponência só ocorre com a flexão da interfalangeana do polegar, enquanto que o resultado é considerado pobre quando não houve restauração da oponência. doador é seccionado do dedo alguns centímetros proximal a sua inserção e transferido para a inserção do abdutor curto do polegar pas- Lesão alta do nervo mediano sando-o por uma polia que pode ser formada A lesão alta pura do nervo mediano é muito pela borda ulnar da aponeurose palmar ou por rara, porque geralmente dois ou mais nervos uma alça criada na inserção do flexor ulnar do são lesionados neste nível. As transferências carpo. Em nossa opinião, essa técnica é a me- nestes casos, portanto, são feitas com “o que nos interessante porque além da perda de força sobrou”. Se o nervo ulnar ainda está funcio- causada ao dedo doador, frequentemente estão nando, as anastomoses lado a lado dos flexores associadas outras complicações como deformi- dos dedos são muito uteis. Não havendo fun- dade em hiperextensão ou déficit de extensão ção do nervo ulnar, somente os músculos iner- da articulação interfalangeana proximal. vados pelo nervo radial estarão disponíveis. O braquiorradial é um músculo usado nestas situações, apesar de suas limitações de músculo 7 de posicionamento, em vez de ser um músculo de dade da técnica e pelo fato de que a regeneração função. O extensor radial longo do carpo é um ou- do nervo radial quando lesado proximalmente tro músculo que pode ser usado nestas situações. é difícil - principalmente quando associada a fraturas do úmero e calos ósseos exuberantes. TRANSFERÊNCIAS TENDINOSAS A vantagem da “órtese interna” é a de que o NAS LESÕES DO NERVO RADIAL paciente não precisa esperar pela reinervação para começar a usar sua mão, deixando de utilizar órteses externas que ocupam lugar e não Objetivos: permitem os movimentos de tenodese para ex- Extensão do punho e extensão dos dedos tensão dos dedos. Existem inúmeras possibilidades de transferências tendinosas para os casos de lesão do nervo radial, utilizando músculos inervados pelos nervos mediano e ulnar. Discutiremos abaixo as possibilidades mais utilizadas pelo autor sênior (RSC). PRINCIPAIS TRANSFERÊNCIAS TENDINOSAS Extensão do punho »»Pronador redondo para extensor radial curto do carpo Como já foi dito anteriormente, é indispensável a presença de um bom arco de movimento passivo no pré-operatório. Existem alguns pontos importantes de técnica que facilitam esta cirurgia: a) Incisão em ziguezague no bordo dor- »»Órtese interna - Burkhalter so-radial do antebraço, começando 5 dedos proximal ao estiloide radial. Assim, o campo A transferência precoce do pronador redon- cirúrgico pode ser aumentado para proximal do para o extensor radial curto do carpo tor- ou distal, dependendo das variações anatômi- nou-se popular devido a facilidade e confiabili- cas da inserção do pronador redondo. 8 b) A inserção deste músculo é única porque que a segunda serve para definir os extensores. não há um tendão bem definido, mas uma ex- Como o músculo do FUC tem inserção tensão músculo-tendínea que se insere sutil- distal, temos que prestar muita atenção ao tú- mente no periósteo do rádio por uma extensão nel subcutaneo: tem que ser mais largo que o variável. músculo para haver espaço suficiente para seu c) A maneira mais fácil de dissecar esta in- deslizamento. Uma vez transplantado o mús- serção é uma incisão retangular no periósteo culo, deve-se examinar a entrada do conjunto 3 cm distal à ultima fibra tendinosa da inser- tendão-músculo no túnel subcutâneo ventral. ção óssea e o levantamento inteiro do periós- Atenção especial para os seguintes detalhes: teo proximalmente junto com o tendão. Desta além da abertura ser de tamanho suficiente forma, aumenta-se o tamanho do tendão dis- para dar uma folga para o músculo, não pode ponível para a sutura. haver uma curva tão fechada que o músculo não possa exercer sua função – no máximo 30 Extensão dos dedos a 45 graus de inclinação em relação à ulna. Tudo isto tem que ser feito antes da anastomo- »»Flexor ulnar do carpo para extensor comum dos dedos O flexor ulnar do carpo (FUC) é o tendão de preferencia para ganho de extensão dos dedos. se tendinosa dorsal. Voltar para ventral e tentar mudar o angulo do músculo ou o tamanho do túnel seria impossível. Outro detalhe de técnica é a tensão muscu- Para realizar esta transferência, são feitas 2 lar da sutura. Deve ser tensa, como explicamos incisões longitudinais – uma seguindo o FUC anteriormente. Testar o efeito tenodese é uma do Pisiforme até o fim do terço distal do ante- obrigação do cirurgião, mas como vamos fazer braço e a outra no dorso do antebraço, proxi- uma anastomose sinuosa entre os 6 extensores malmente ao retináculo extensor. A primeira dos dedos, sempre será uma manobra compli- completa toda a dissecção do FUC, enquanto cada e temos que ter um auxiliar mantendo a 9 tensão que escolhemos e utilizar suturas preli- músculo de função dispensável para obter uma minares para não colocarmos tensões variáveis função importante, portanto uma transposi- em diferentes tendões. ção natural. O que temos que decidir no pré-operatório é qual tipo de extensão queremos dar para o paciente: extensão interfalangeana e metacarpofalangeana pura ou misturada com um desvio palmar. A técnica para ganho de extensão interfalangeana e metacarpofalangeana pura deve ser feita apenas nos casos em que há a certeza de que o nervo não irá regenerar, como nos casos antigos ou casos de nervo não reparado. Este cuidado ocorre porque utilizamos o retináculo do primeiro espaço dorsal como polia, e para isso removemos os tendões do abdutor longo e extensor curto de dentro do primeiro espaço dorsal. A seguir, passamos o tendão do exten- Fig.3 – Caso de paciente com lesão de nervo radial. A: Incisões volares para tenotomia e transferência dos tendões utilizados; B: Tensionamento do extensor longo do polegar durante a transferência; C: Pós operatório tardio das transferências. O prognóstico nestes casos é muito bom sor longo do polegar por dentro da polia, para depois sutura-lo no palmar longo proximalmente à polia. A segunda opção de técnica confere exten- Extensão do polegar »»Palmar longo para extensor longo do polegar são interfalangeana e metacarpofalangeana misturada com um desvio palmar. É um procedimento mais simples, em que é criado uma Esta transposição é ótima porque utiliza um anastomose subcutânea, utilizando uma “liga10 ção direta” entre os 2 tendões na parte ventral Clinicamente apresentam garra ulnar, que é do antebraço, onde vai haver mais deslizamen- a flexão do quarto e quinto dedos, atrofia da to. O inconveniente é que o movimento de ex- musculatura interóssea e hipotenar, além de tensão perde sua “pureza”, introduzindo algum perda da sensibilidade da face ulnar da mão. desvio palmar. Funcionalmente esta técnica Há basicamente 2 tipos de transferências e não causa muitos problemas numa pessoa com suas indicações dependem da demanda do pa- atividades de preensão em lugares não muito ciente: apertados, mas pode trazer problemas para um mecânico, por exemplo (figura 3). Na ausência congênita do palmar longo, a • Transferências para obtenção de força (trabalhadores braçais, pessoas que necessitam de força manual para seu lazer, por exemplo); transposição é feita com um dos flexores su- • Transferências para uma função mais de- perficiais, sempre pela rota subcutânea. Como licada da mão, que não demande tanta força uma das principais funções dos flexores super- (pessoas com trabalhos mais leves), e que soli- ficiais é a estabilização da articulação interfa- citem uma correção funcional e estética. langeana proximal durante a extensão, geralmente o resultado desta transferência é pobre. Por este motivo, só utilizamos os flexores superficiais em ultimo recurso. Objetivos: Correção da garra ulnar »»Transferência para força: extensor radial longo do carpo (ERLC) + enxerto de tendão (Brand) TRANSFERÊNCIAS TENDINOSAS NAS LESÕES DO NERVO ULNAR Os pacientes com lesão do nervo ulnar apresentam considerável perda da função da mão. O objetivo desta técnica é aumentar a força de flexão do punho cerrado, melhorando a flexão metacarpofalangeana e extensão da interfalangeana proximal. 11 Utilizamos uma incisão cutânea dorsal na nico muito importante, senão se criará mais base do segundo metacarpo e realizamos uma um extensor metacarpofalangeano). Passam tenotomia da inserção do ERLC. Como este então através do canal dos lumbricais para se- tendão termina no dorso do punho, temos que rem suturados na bandeleta lateral radial do alongá-lo com o usos de enxertos tendinosos. segundo, terceiro quarto e quinto dedos. Se o objetivo é reconstruir somente o quarto e Existem outras formas de inserir o enxerto quinto dedos, o palmar longo dividido em dois na falange proximal dos dedos. Podemos sutu- fascículos poderá ser utilizado. Entretanto, se rar o tendão na bandeleta lateral e no extensor formos reconstruir os 4 dedos, temos que suple- a nível da falange proximal, no próprio osso da menta-lo com outro tendão: o plantar delgado falange proximal (através de um túnel ósseo e ou um tendão não funcionante do antebraço pull out ou com âncoras) ou também em um (em paralisias altas). Confecciona-se então um túnel feito na polia A-2. enxerto do palmar longo + o segundo tendão com 4 fascículos que serão suturados ao ERLC. »»Transferência cosmética: cirurgia de Zancolli: lasso, lazo ou laço (flexor superficial dos dedos (FDS) para tenodese dinâmica) Fig4 – Caso de paralisia baixa com atrofia de intrínsecos. Neste caso foi utilizado o flexor ulnar do carpo + enxerto para correção da garra com ganho de força. Normalmente utilizamos o ELRC. A: Enxerto direcionado para os quatro dedos; B: Resultado no pós operatório tardio Esta cirurgia é um triunfo da inventividade do seu autor. O ganho de força é mais limitado que na transferência anterior, mas a correção da garra melhora muito a função e a cosmética As porções separadas do enxerto deverão seguir no sentido de dorsal para volar, por baixo do ligamento intermetacarpiano (detalhe téc- da mão com incisões ocultas e sutis. O principal objetivo desta técnica é corrigir a hiperextensão das metacarpofalangeanas e, dessa forma, melhorar a função dos dedos. 12 Essa técnica deve ser indicada em pacientes que apresentam deformidade flexível. As incisões descritas por Zancolli são transversas na mão, seguindo a prega palmar. Quando houver dificuldades para se expor a polia A2 através delas, pode-se utilizar uma incisão longitudinal complementar até a base de cada dedo, como se fosse uma incisão de Skoog para ressecção de Dupuytren, melhorando muito a visualização das polias. Realiza-se a tenotomia do flexor su- »»Tenodese intrínseca para lesões altas com dedo em botoeira Burkhalter e Carneiro publicaram em 1979 uma cirurgia para corrigir o que Burkhalter chamava de boutonniere por atenuação do tendão central. Esta atenuação ocorre em lesões crônicas quando há hiperextensão da articulação metacarpofalangeana, associada a uma hiperflexão da interfalangeana proximal. perficial na base da falage média do 4 e 5 dedos. Em geral, pacientes que levam muito tempo O tendão será suturado nele próprio, após fazer para procurar ajuda são difíceis em termos de re- uma volta sobre o intervalo entre as polias A1 e cuperação e uma cirurgia mais simples pode que A2. Isto vai exercer uma força de flexão na articu- ser utilizada. Realizamos então a simples tenodese lação metacarpofalangeana e a transmissão desta entre os 2 tendões das bandeletas laterais por cima força dorsalmente através das bandeletas laterais do tendão central, provocando uma flexão da me- irá facilitar a extensão interfalangeana proximal. tacarpofalangeana com extensão da interfalangeana proximal. Como efeito, ocorre também uma hiperextensão da interfalangeana distal, que deve ser tratada através de tenotomia do tendão terminal, provocando um dedo em martelo e melhorando a flexão da parte distal do dedo. Fixamos a interfalangiana proximal com um fio de Kirschner por 3 semanas. É uma cirurgia de aplicação rara, Fig.5 - Técnica do laço de Zancolli. Tendão flexor superficial sendo suturado nele mesmo após passagem entre as polias A1 e A2. O nervo foi explorado no punho e enxertado no mesmo procedimento mas efetiva e fácil de execução e também pouco complicada em termos de reabilitação. 13 radial curto do carpo (ERCC). Realiza-se a tenotomia do tendão na sua inserção e mediante enxerto, alonga-se a transferência, que será dirigida de dorsal para volar através do 3 e 4 metacarpiano para ser inserida na aponeurose do primeiro adutor. A preferência do autor sênior (RSC) é a Fig.6 – Tenodese intrínseca para lesões altas com dedo em botoeira. Ilustrações do artigo original utilização do extensor próprio do indicador ao invés do ERCC, através do intervalo entre o segundo e terceiro metacarpos. O problema desta transposição é a dificuldade técnica e a possibilidade real de se provocar uma lesão no ramo motor do nervo mediano. Sendo assim, não recomendamos o seu uso indiscriminado. Existem outras transferências descritas na lite- Fig.7 – A: PO tardio da técnica de tenodese intrínseca ratura, como a utilização do flexor superficial dos dedos e do palmar longo. Na atrofia do adutor, a falta de adução do CORREÇÃO DA ADUÇÃO DO POLEGAR polegar está associada a diminuição de força flexora interfalangeana por perda da estabilidade da extensão da articulação interfalangeana Nas lesões com perda da adução e atrofia do polegar. Isso corre pela falta de tensão na importante do adutor do polegar, há vária ma- aponeurose do adutor e torna o sinal de Fro- neiras de se reforçar a adução. Uma das técni- ment positivo. cas mais utilizadas é usar o tendão do extensor Devemos lembrar que o extensor longo do 14 polegar tem também uma função de adução e o flexor longo do polegar é um tendão forte, mas dissipa sua força fletindo a interfalangeana sem ajuda do adutor. Os autores preferem então utilizar estas forças para corrigir a adução e acrescentar vigor à pinça. A melhor solução para alcançar este objetivo é realizando uma artrodese da articulação interfalangeana do polegar. É uma manobra fácil que aproveita as forças ocultas do extensor e do flexor do polegar para corrigir o Froment e melhorar em muito a função. Pode-se dizer que a artrodese da IF do polegar, realiza indiretamente, uma transposição dupla com uma técnica simples. Preferimos a posição neutra do polegar de maneira a utilizar os tendões mais efetivamente. 15 BIBLIOGRAFIA 1. Anderson GA, Lee V, Sundararaj GD: Opponensplasty by extensor indicis and flexor digitorum superficialis tendon transfer. J Hand Surg [Br] 1992; 17:611-614. 2. Brand P: Tendon grafting: illustrated by a new operation for intrinsic paralysis of the fingers. J Bone Joint Surg Br 1961; 43:444-453. 3. Burkhalter W, Christensen RC, Brown P. Extensor indicis proprius opponensplasty. J Bone Joint Surg Am. 1973 Jun;55(4):725-32. 4. Burkhalter WE, Carneiro RS. Correction of the attritional boutonnière deformity in high ulnar-nerve paralysis. J Bone Joint Surg Am. 1979 Jan;61(1):131-4. 5. Burkhalter WE. Early tendon transfer in upper extremity peripheral nerve injury. Clin Orthop Relat Res. 1974 Oct;(104):68-79. 6. Hastings 2nd H, McCollam SM: Flexor digitorum superficialis lasso tendon transfer in isolated ulnar nerve palsy: a functional evaluation. J Hand Surg [Am] 1994; 19:275-280. 7. Kettelkamp D, Alexander H: Clinical review of radial nerve injury. J Trauma 1967; 7:424-432. 8. Raskin K, Wilgis EFS: Flexor carpi ulnaris transfer for radial nerve palsy: functional testing of long-term results. J Hand Surg [Am] 1995; 20:737-742. 9. Riordan D: Tendon transfers for median, ulnar or radial palsy. Hand 1969; 1:42-46. 10. Yzkan T, Ozer K, Gulgonen A: Three tendon transfer methods in reconstruction of ulnar nerve palsy. J Hand Surg [Am] 2003; 28:35-43. 16