MONITORAMENTO DA NORMA BRASILEIRA DE COMERCIALIZAÇÃO DE ALIMENTOS PARA LACTENTES E CRIANÇAS DE PRIMEIRA INFÂNCIA, BICOS, CHUPETAS E MAMADEIRAS EM DIVERSOS ESTABELECIMENTOS DE TERESINA – PI. Kaluce Gonçalves de Sousa Almondes* – UFPI José de Sousa Lima Neto** – UFPI Heila Dias de Sousa Pinho Aguiar*** – UFPI Thissiane Marla Alves Cavalcante**** – UFPI Maria do Socorro Cordeiro Ferreira*****– UFPI INTRODUÇÃO Mais de 10 milhões de crianças morrem anualmente no mundo. Quase todas as mortes ocorrem nos países pobres e, na maioria das vezes, são decorrentes de causas preveníveis, tais como diarréia e pneumonia. Estima-se que 13% das mortes de crianças abaixo de 5 anos (1,3 milhões de vidas) poderiam ser evitadas se as taxas atuais de amamentação exclusiva alcançassem uma cobertura de 90% da população infantil nos 42 países onde ocorrem quase todas essas mortes2. Tendo em vista a necessidade de melhoramento na questão do aleitamento materno e com base no Código Internacional, o Brasil aprovou em 20 de dezembro de 1988 as Normas para Comercialização de Alimentos para Lactentes revista e aprovada como Norma Brasileira de Comercialização de Alimentos para Lactentes. Sofrendo novo processo de revisão (2000 a 2001) foi publicada através Portaria nº.2051/novembro de 20014 e Resoluções RDC nº 221/025 e 222/026. No evento de abertura da Semana Mundial da Amamentação no Brasil foi assinada a Portaria MS nº. 1449, de 25 de agosto de 20053, republicada em 10 de janeiro de 2006, pelo então Ministro da Saúde, constituindo um grupo de trabalho para elaborar critérios visando à realização do primeiro monitoramento oficial da Norma Brasileira de Comercialização de Alimentos para Lactentes e Crianças na Primeira Infância, Bicos, Mamadeiras e Chupetas (NBCAL). A coordenação e realização desse monitoramento fica sobre responsabilidade da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) por meio da Gerência de Monitoramento e Fiscalização de Propaganda, Publicidade e Promoção de Produtos Sujeitos à Vigilância Sanitária – GPROP e da Gerência Geral de Alimentos – GGALI, que contou com a participação de 19 Instituições de Ensino Superior Brasileiras (IESB), 21 Vigilâncias Sanitárias Estaduais, 1 Vigilância Sanitária Distrital, 1 Vigilância Sanitária Municipal e o Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial (Inmetro). Dentre as IESB figura a UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ (UFPI). Assim, tornou-se possível nossa integração a tão importante Grupo de Trabalho, quando avaliamos a adequação desse Projeto em diferentes estabelecimentos na cidade de Teresina/PI. METODOLOGIA Trata-se de uma pesquisa transversal realizada no período de 02 de maio a 02 de junho de 2006, durante o qual foram monitorados 4 drogarias (rede ou regionais), 4 supermercados (rede ou regional), 2 lojas de produtos infantis e 2 lojas de R$ 1,99 por meio de visitas semanais, onde foram coletados e/ou fotografados quaisquer materiais de propaganda, promoção comercial, publicidade, exposição especial, publicações técnicocientíficas e educativas de produtos abrangidos pela NBCAL, classificados como: alimentos de transição para lactentes ou crianças de primeira infância; alimentos de transição a base de cereais para lactentes e crianças de primeira infância; outros alimentos ou bebidas a base de leite ou não, quando comercializados ou de outra forma apresentados como apropriados para alimentação de lactentes e crianças de primeira infância lactentes; fórmulas infantis para lactentes; fórmula infantil para necessidades dietoterápicas específicas; fórmulas infantis de seguimento para lactentes; fórmula de nutrientes apresentada e/ou indicada para recém nascidos de alto risco; e leites fluidos, leites em pó, leites em pó modificados, leites de diversas espécies animais e produtos de origem vegetal de mesma finalidade. Analisaram-se as peças coletadas por meio de roteiros de inspeção baseados nas RDC nº 221/025 e 222/026, verificando se a peça possuía algum tipo de irregularidade. As peças irregulares eram enviadas a ANVISA e a Vigilância Sanitária do Estado do Piauí (VISA-PI), parceira do projeto, com devidos formulários de verificação de irregularidade e relatório semanal, indicando as infrações cometidas pelos estabelecimentos visitados. Posteriormente, realizou-se palestras educativas sobre a NBCAL aos responsáveis dos estabelecimentos monitorados, para devidas adequações. RESULTADOS A maioria dos estabelecimentos monitorados encontravam-se irregulares frente a NBCAL. Num total de 108 peças de alimentos para lactentes e crianças de primeira infância, monitoradas em supermercados, 78 encontravam-se irregulares. Já em drogarias, das 11 peças coletadas, 10 estavam irregulares (figura 01). Dentre as propagandas referentes à bicos, mamadeiras e chupetas, 45 peças estavam irregulares em drogarias, 17 em supermercados, 12 em lojas de produtos infantis e 20 em lojas de R$ 1,99 (figura 02). A maioria das infrações reportavam-se à ausência de advertências recomendadas pelo Ministério da Saúde, e quando presentes, não apresentavam destaque, como também recomendado. Das 119 peças referentes aos alimentos, 53 eram de panfletos sem a advertência, onde 22 referiam-se à alimentos à base de cereais, 17 a alimentos ou bebidas à base de leite e 14 a leites fluídos ou em pó (figura 03). Outra forma de promoção comercial identificada foi a exposição especial dos alimentos, que é uma das práticas vedada pela legislação vigente para fórmulas infantis para lactentes e de segmento para lactentes, sendo coletadas 2 peças referentes à fórmula infantil para lactentes e 4 de segmento para lactentes em drogarias. Nas mesmas, ainda estavam ausentes a correspondente advertência do Ministério da Saúde (figura 03). Na monitoração de propaganda de bicos, mamadeiras e chupetas observou-se que a maioria dos estabelecimentos estavam irregulares, contendo exposições especiais. Diferente das peças referidas acima (alimentos), estas, foram encontradas também em lojas de 1,99 e de produtos infantis. Porém, a maior quantidade de peças irregulares encontrava-se em drogarias como demonstra a Figura 04. FIGURA 01. QUANTIDADES DE PEÇAS ENCONTRADAS CONTENDO PROPAGANDA DE ALIMENTOS PARA LACTENTES E CRIANÇAS DE PRIMEIRA INFÂNCIA SEGUNDO O LOCAL MONITORADO. TERESINA, 2006. FIGURA 02. QUANTIDADES DE PEÇAS ENCONTRADAS CONTENDO PROPAGANDA DE BICOS, MAMADEIRAS E CHUPETAS SEGUNDO O LOCAL MONITORADO. TERESINA, 2006. FIGURA 03. QUANTIDADE DE PEÇAS ENCONTRADAS SEGUNDO O TIPO DE ALIMENTO E A FORMA DE PROMOÇÃO COMERCIAL. TERESINA, 2006. FIGURA 04. QUANTIDADE DE PEÇAS DE BICOS, MAMADEIRAS E CHUPETAS ENCONTRADAS EM FORMA DE EXPOSIÇÃO ESPECIAL. TERESINA, 2006. DISCUSSÃO A promoção comercial, segundo a RDC n° 222/026, é o conjunto de atividades informativas e de persuasão, procedente de empresas responsáveis pela produção e ou manipulação, distribuição e comercialização, com o objetivo de induzir a aquisição/venda de um determinado produto. A mesma, é uma prática vedada para propaganda de fórmulas infantis para lactentes e de segmento para lactentes, em quaisquer meios de comunicação com divulgações escritas e estratégias promocionais para induzir a venda ao consumidor no varejo, como por exemplo, exposições especiais ou preços abaixo do custo, observadas em algumas drogarias monitoradas. Durante a pesquisa observou-se também a ampla presença de propaganda em panfletos de alimentos de transição a base de cereais para lactentes e crianças de primeira infância, alimentos ou bebidas a base de leite, e de leites fluidos, em pó, ou em pó modificados, sem a devida advertência obrigatória, a qual varia de categoria de acordo com a RDC n° 222/026, ou seja, para alimentos à base de cereais deve ser: “Após os seis meses de idade continue amamentando seu filho e ofereça novos alimentos”; para alimentos ou bebidas a base de leite, e também para alimentos à base de cereais: “Este produto não deve ser usado para crianças menores de 6 meses, salvo sob indicação expressa de médico ou nutricionista” e “O aleitamento materno evita infecções e alergias e é recomendado até os dois anos de idade ou mais”; e para leites fluído, em pó ou em pó modificados: “Este produto não deve ser usado para alimentar crianças menores de um ano, salvo sob indicação expressa de médico ou nutricionista” e “O aleitamento materno evita infecções e alergias e é recomendado até os dois anos de idade ou mais”. As peças coletadas de fórmulas infantis para lactentes e de segmento para lactentes, apresentaram-se irregulares por estarem em exposição especial e na ausência das seguintes advertências: “Este produto só deve ser usado na alimentação de crianças menores de um ano com indicação expressa de médico ou nutricionista” e “O aleitamento materno evita infecções e alergias e fortalece o vínculo mãe e filho”. A RDC n° 222/026 informa que as advertências obrigatórias devam apresentar-se destacadas, ou seja, deverá ter no mínimo, fonte igual ao texto informativo de maior letra, excluindo a marca, em caixa alta e em negrito. Alguns panfletos e exposições especiais, mesmo apresentando a devida advertência, não faziam uso deste destaque. Em relação a bicos, chupetas e mamadeiras todas as peças coletadas encontravam-se irregulares, pois estavam em exposição especial, sendo que a RDC n° 221/025 veda a promoção comercial de chupeta, bico e mamadeira, em quaisquer meios de comunicação, assim como estratégias promocionais para induzir vendas no varejo. O consumismo elevado de leites industrializados e o uso freqüente de bicos, mamadeiras e chupetas tem posto em risco a saúde de crianças por limitar o leite materno exclusivo a menos de 6 meses. Alguns dos malefícios causados por bicos, mamadeiras e chupetas são: deformações odontológicas, alterando todo um padrão genético de crescimento e desenvolvimento, maior incidência de doenças infecciosas, alteração dos padrões de respiração e sucção, ocasionando amigdalites, rinites e sinusites, e exposição a substâncias carcinogênicas7. A interferência do bico artificial na aprendizagem da sucção pode levar a uma preferência por este, abandonando então a amamentação e favorecendo a alimentação artificial. No entanto, essa troca pode levar a sérias conseqüências, pois a alimentação artificial não é tão eficaz quanto o leite materno na proteção contra doenças infecciosas na infância ou doenças crônicas como diabetes, obesidade ou alergias. O risco de morte por diarréia em crianças menores de 1 ano passa de 1 para 11,6 vezes, quando a alimentação passa de apenas leite materno para apenas leite fluido, ou ainda de 1 para 16,3 vezes quando para apenas leite em pó7. Esse fato se dá porque o leite artificial não é estéril estando sujeito a contaminação principalmente por Enterobacter sakazakii ou Salmonela sp1. Uma das causas de alta prevalência de consumo de alimentos artificiais e uso de bicos, mamadeiras e chupetas deve-se principalmente ao fato de desconhecimento por parte das mães dos malefícios que podem ocasionar e da grande quantidade de propaganda desses produtos, cada vez mais difundido por parte de fabricantes e comerciários, com informações inverídicas de benefícios que podem trazer, minimizando a importância do leite materno, além da omissão de advertências do Ministério da Saúde que alerta os consumidores do seu indevido uso. Outro ponto a se observar é a interferência de propagandas, por meio de panfletos informativos de fabricantes direcionados a profissionais de saúde, que difundem os falsos benefícios de seus produtos para a população alvo, que confiante nas suas indicações acabam por abandonar o aleitamento materno. CONCLUSÃO Os estabelecimentos analisados estão em desacordo com as normas que protegem o aleitamento materno, apresentando freqüentes irregularidades frente a NBCAL. Desse modo, percebe-se a necessidade da continuação de monitoramento e da intervenção nesses locais de instituições como a VISA-PI e ANVISA, objetivando instruir e cobrar de seus respectivos proprietários, o cumprimento da legislação, visando a preservação do aleitamento materno exclusivo. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Center for Disease Control and Prevention. Enterobacter sakazakii infections associated with the use of powdered infant formula – Tennessee, 2001. J Trop Med Public Health 1999, 30:770-5. 2. JONES, G. et al. How many child deaths can we prevent this year? The lancet 362: 65-71, 2003. 3. Portaria n° 1449, de agosto de 2005. D.O.U de 10/01/2006, Seção 1, pág. 38. Disponível em: http://www.in.gov.br/imprensa/jsp/jsp/jornaiscompletos/jornaiscompletos_leitura.jsp#, acessado dia 09/11/2006. 4. Portaria n° 2051, de novembro de 2001. Disponível em: legis.anvisa.gov.br/leisref/public/showAct.php?id=14998&word=, acessado dia http://e- 5. RDC nº 221, de 05 de agosto de 2002. Disponível em: http://elegis.anvisa.gov.br/leisref/public/showAct.php?id=1630&word=, acessado dia 09/11/2006. 6. RDC n° 222, de 05 de agosto de 2002. Disponível em: http://elegis.anvisa.gov.br/leisref/public/showAct.php?id=1631&word=#', acessado dia 09/11/2006 7. Victora et al. Use of pacifiers and breastfeeding duration Lancet 341:405, 1993. * Acadêmica de Nutrição da Universidade Federal do Piauí. [email protected] Mestrando em Química na Universidade Federal do Piauí. Bacharel em Farmácia na Universidade Federal do Piauí. [email protected] *** Acadêmica de Nutrição da Universidade Federal do Piauí. [email protected] **** Bacharelada em Comunicação Social pela Universidade Federal do Piauí. [email protected] ***** Orientadora. Professora Mestre do Departamento de Bioquímica e Farmacologia da Universidade Federal do Piauí. [email protected] **