DA UNIÃO ESTÁVEL Prof. Paulo Hermano Que é que vedes quando vedes um homem e uma mulher, reunidos sob o mesmo teto, em torno de um pequenino ser, que é o fruto do seu amor? Vereis uma família. Passou por lá o juiz com a sua lei, ou o padre, com o seu sacramento? Que importa isso? O acidente convencional não tem força para apagar o fato natural. Do Concubinato à União Estável CONCUBINATO PURO: CONCUBINATO IMPURO: 1a. Fase: Da rejeição ao concubinato (CCB/1916) à sua admissão no direito das obrigações DISPOSIÇÕES SOBRE CONCUBINATO NO CC-1916: 183, VII – proibição de casamento do cônjuge adúltero com o seu cúmplice 1.177 – proibição de doação pelo cônjuge adúltero ao seu cúmplice 1.474 – proibição de seguro de vida ao cúmplice do adultério 1.719, III – proibição, ao testador casado, de testar em favor da concubina. Evolução jurisprudencial: 1º- Negava qualquer direito aos concubinos. Fundamento: Ato imoral que não pode ser protegido nem dele decorrer vantagens. Evolução jurisprudencial: 2º- Companheira recebia pagamento por serviços domésticos. Direito à salários. “Embora a mancebia constitua união ilegítima, nada impede reclame qualquer deles, do outro, a retribuição por serviços estranhos à relação concubinária” 2a. Fase: Introdução da proteção ao concubinato no Direito de Família LEIS AVULSAS: CERTOS DIREITOS A COMPANHEIROS Leis previdenciárias e fiscais: dependente Lei 6.015/73: nome do companheiro (art. 57) Lei 8.009/90: Bem de família Lei 8.069/90: adoção por “concubinos” Lei 8.245/91: Sub-rogação na locação Evolução jurisprudencial Possibilidade de a companheira participar do patrimônio adquirido pelo outro companheiro em decorrência do esforço comum. Reconhece-se a sociedade de fato entre companheiros. Súmula 380 do Supremo Tribunal Federal: “Comprovada a existência de sociedade de fato entre os concubinos, é cabível sua dissolução judicial com a partilha do patrimônio adquirido pelo esforço comum”. 3a. Fase: Tutela constitucional da União Estável TEMPOS NOVOS: UNIÃO ESTÁVEL COMO ENTIDADE FAMILIAR CF/88 - 226, § 3o: Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. § 3º - Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento. UNIÕES EXCLUÍDAS: CONCUBINATO UNIÃO HOMOAFETIVA UNIÃO ESTÁVEL – LEGISLAÇÃO Lei n. 8.971, de 29.12.94 Artigo 1º - A companheira comprovada de um homem solteiro, separado judicialmente, divorciado ou viúvo, que com ele viva há mais de cinco anos, ou dele tenha prole, poderá valer-se do disposto na Lei n. 5.478, de 25 de julho de 1968, enquanto não constituir nova união e desde que prove a necessidade. Parágrafo único - Igual direito e nas mesmas condições é reconhecido ao companheiro de mulher solteira, separada judicialmente, divorciada ou viúva. UNIÃO ESTÁVEL – LEGISLAÇÃO Lei n. 9.278, de 10.05.96 Art. 1º É reconhecida como entidade familiar a convivência duradoura, pública e contínua, de um homem e uma mulher, estabelecida com objetivo de constituição de família. Art. 2° São direitos e deveres iguais dos conviventes: I - respeito e consideração mútuos; II - assistência moral e material recíproca; III - guarda, sustento e educação dos filhos comuns. UNIÃO ESTÁVEL – CÓDIGO CIVIL Art. 1.723. É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família. § 1o A união estável não se constituirá se ocorrerem os impedimentos do art. 1.521; não se aplicando a incidência do inciso VI no caso de a pessoa casada se achar separada de fato ou judicialmente. § 2o As causas suspensivas do art. 1.523 não impedirão a caracterização da união estável. Art. 1.724. As relações pessoais entre os companheiros obedecerão aos deveres de lealdade, respeito e assistência, e de guarda, sustento e educação dos filhos. Art. 1.725. Na união estável, salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se às relações patrimoniais, no que couber, o regime da comunhão parcial de bens. Art. 1.726. A união estável poderá converter-se em casamento, mediante pedido dos companheiros ao juiz e assento no Registro Civil. Art. 1.727. As relações não eventuais entre o homem e a mulher, impedidos de casar, constituem concubinato. Atualmente União Estável: denominação atual do Concubinato Puro; Concubinato: só se aplica aos casos de concubinato impuro. CC/02, art. 1.727. As relações não eventuais entre o homem e a mulher, impedidos de casar, constituem concubinato. UNIÃO ESTÁVEL (1.723 a 1.727 do CC) 1. REQUISITOS E IMPEDIMENTOS 2. DIREITOS E DEVERES 3. REGIME DE BENS 4. CONVERSÃO EM CASAMENTO 5. ALIMENTOS, MEAÇÃO E HERANÇA Requisitos 1. Diversidade de sexos (homem e mulher) 2. Convivência pública, contínua e duradoura 3. Estabelecida com o objetivo de constituição de família (art. 1.723) Impedimentos – Não se estabelece união estável nos seguintes casos: 1. Entre ascendentes e descendentes, seja o parentesco natural ou civil; 2. Entre afins em linha reta; 3. Entre o adotante com quem foi cônjuge do adotado e o adotado com quem o foi do adotante; 4. Entre colaterais até o 3º grau; 5. As pessoas casadas e não separadas de fato; 6. Entre o cônjuge sobrevivente com o condenado por homicídio ou tentativa de homicídio contra o seu consorte. (art. 1.723, § 1o A união estável não se constituirá se ocorrerem os impedimentos do art. 1.521; não se aplicando a incidência do inciso VI no caso de a pessoa casada se achar separada de fato ou judicialmente). Causas suspensivas e o regime de bens § 2o As causas suspensivas do art. 1.523 não impedirão a caracterização da união estável. Elas também não impedem o casamento. (CC, art. 1523, “Não devem se casar”). Mas como fica o regime de bens dos companheiros? Separação obrigatória? Direitos: 1. Alimentos (art. 1.694) 2. Meação (art. 1.725) 3. Direitos Sucessórios (art. 1.790) Deveres: 1. Lealdade 2. Respeito e assistência mútuos 3. Sustento e educação dos filhos (art. 1.724) Regimes de bens: Art. 1.725. Na união estável, salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se às relações patrimoniais, no que couber, o regime da comunhão parcial de bens. INCIDÊNCIA DA MEAÇÃO No regime de comunhão parcial, comunicam-se os bens que sobrevierem ao casal, na constância do casamento (art. 1.658): a) os bens adquiridos na constância do casamento por título oneroso, ainda que só em nome de um dos cônjuges; b) os bens adquiridos por fato eventual, com ou sem o concurso de trabalho ou despesa anterior; c) os bens adquiridos por doação, herança ou legado, em favor de ambos os cônjuges; d) as benfeitorias em bens particulares de cada cônjuge; e) os frutos dos bens comuns, ou dos particulares de cada cônjuge, percebidos na constância do casamento, ou pendentes ao tempo de cessar a comunhão. DIREITOS DO COMPANHEIRO, EM COMPARAÇÃO COM O CÔNJUGE alimentos: direitos iguais – art.1.694 e seguintes meação: regime da comunhão parcial, salvo contrato escrito – art. 1.725 herança: diferenças marcantes, com vantagens e desvantagens do companheiro ou do cônjuge – arts. 1.790 x 1.829 e 1.832. DISSOLUÇÃO CONSENSUAL VOLUNTÁRIA – resilição bilateral Distrato escrito; ou simplesmente de fato a) extrajudicial b) judicial DISSOLUÇÃO POR MORTE: resolução DISSOLUÇÃO JUDICIAL DISSOLUÇÃO LITIGIOSA - rescisão: ação de reconhecimento e de dissolução para fins de: a) guarda de filhos e visitas, b)alimentos c) meação - partilha de bens d) herança CONVERSÃO DA UNIÃO ESTÁVEL EM CASAMENTO Art. 1.726: pedido dos companheiros ao juiz e assento no Registro Civil – art. 1.726 a) Complicador em relação à Lei n. 9.278/96 e à CF 88, art. 226, § 3o b) Não intervenção do juiz, salvo se houver dúvida – Protocolado CG 44.825/05 c) Efeitos: ex nunc ou ex tunc? d) Dispensa da celebração “No que couber” Euclides de Oliveira – Significa que apenas as regras do regime, em si, são aplicadas – arts. 1658 a 1666 e não as disposições gerais Interpretação divergente – Aplica-se somente a alguns bens adquiridos a título oneroso (CC, art. 1660, I e III). Não se aplicaria aos bens adquiridos por fato eventual, com ou sem o concurso de trabalho ou despesa anterior (MARIO LUIZ DELGADO). “No que couber” Guilherme Calmon da Gama: não há equiparação entre o regime legal de bens do artigo 1725 ao regime da comunhão parcial de bens. Os bens constantes do artigo 1659 não se comunicam no regime legal de bens do companheirismo, bem como também não entram na comunhão os bens previstos nos incisos II, IV e V do art. 1660” (Questões controvertidas, v. 3, p. 356) “No que couber” Álvaro Villaça – regime idêntico ao da lei 9.278/96 relativo ao condomínio. Francisco Cahali – a forma é mais abrangente que o regime até então vigente de condomínio sobre o patrimônio adquirido a título oneroso. Passam a integrar o acervo comum os bens constantes do artigo 1660 (atualização de SILVIO RODRIGUES) “No que couber” Regina Beatriz Tavares da Silva: “ devem ser consideradas as regras constituídas por disposições especiais (arts. 1658 a 1666) e as disposições gerais (arts. 1639 a 1657), em que se destaca a proibição de alienação de bem imóvel sem o consentimento do consorte, a não ser que seja escolhido o regime da separação absoluta (art. 1647), sob pena de ANULAÇÃO DO ATO”. Érica de Oliveira Canuto É de todo inaceitável que exista sanção de obrigatoriedade de regime de separação de bens em certas situações para o casamento e não tenha a mesma correspondência na união estável (Questões controvertidas, v. 3). Em idêntico sentido: Guilherme Calmon da Gama Francisco Cahali As limitações impostas aos cônjuges não se aplicam aos conviventes (Contrato de convivência na união estável). Mudança do regime É possível e não segue as regras do artigo 1639 do Código Civil. Basta novo contrato escrito entre as partes. Direitos dos concubinos Aplica-se a Súmula 380? Sim, em razão do princípio enriquecimento sem causa. do Não, pois a súmula só era aplicada ao concubinato puro e não ao impuro. DECISÃO DA CORREGEDORIA POSSIBILITANTO A DISPENSA DE INTERVENÇÃO DO JUIZ Protocolado CG 44.825/05, de Mogi-Guaçu – DOE de 19.0606 Procedimento de conversão da união estável em casamento. Tramitação perante o Oficial do Registro Civil. Dispensa de pronunciamento judicial, em casos excepcionais. Admissibilidade, mediante Portaria do Juiz Corregedor. Procedimento similar ao da Habilitação para o casamento. Facilitação determinada pelo art. 226, par. 3., da CF. Edição de Provimento para alterar os itens 87.2. e 87.3 do Cap. XVII das Normas de Serviço da CGJ. STJ Admite o entendimento pretoriano a possibilidade da dissolução de sociedade de fato, ainda que um dos concubinos seja casado, situação, aliás, não impeditiva da aplicabilidade da súmula 380 do Supremo Tribunal Federal que, no entanto, reclama haja o patrimônio, cuja partilha se busca, tenha sido adquirido "pelo esforço comum". (REsp 257.115/RJ, Rel. Ministro FERNANDO GONÇALVES, QUARTA TURMA, julgado em 29.06.2004, DJ 04.10.2004 p. 302) União de pessoas do mesmo sexo “Jamais configurará União Estável, ainda que duradoura, contínua, única e formal.” Guilherme Calmon Gama Nogueira. Constituição Federal/88 – Protege a entidade formada por homem e por mulher. Sílvio Venosa “Enquanto não houver aceitação social majoritária das uniões homoafetivas, que se traduza em possibilidade legislativa, as uniões de pessoas do mesmo sexo devem gerar apenas reflexos patrimoniais relativos às sociedades de fato.” Maria Berenice Dias O resultado não pode ser mais nefasto: a inexistência de legislação desencoraja os julgadores a reconhecer relações sociais que reclamam proteção jurídica. Desse modo, quer o silêncio da lei, quer o medo do Judiciário, fazem uma legião de marginalizados, oprimidos e desvalidos, pelo simples fato de viverem relações não aceitas por alguns como "certas" e "legítimas" e, por isso, carecerem de referendo legal. Corregedoria do TJ/RS A partir da publicação do provimento n°06/04 da Corregedoria Geral da justiça, publicado no Diário de Justiça, edição 28.06, de 03.03.2004, os documentos relativos a união de pessoas do mesmo sexo poderão ser registrados para fins patrimoniais e reconhecimento da união homoafetiva, com os seguintes termos: ESCRITURA PÚBLICA DE UNIÃO ESTÁVEL, ou ESCRITURA DECLARATÓRIA DE UNIÃO HOMOAFETIVA, ou ESCRITURA PÚBLICA DE CONVIVÊNCIA HOMOAFETIVA. TJ/RS - Na Escritura de reconhecimento da união homoafetiva poderá haver escolha do regime: Comunhão ou Separação Total de Bens. - Para casais de outros Estados: Somente poderá registrar sua união o casal que um dos dois tenha residência no Rio Grande do Sul. - O Registro tem reconhecimento nacional. TJ Roraima – Provimento 85/04 PROVIMENTO Nº 085/2004 O Desembargador ALMIRO PADILHA, Corregedor-Geral de Justiça do Tribunal de Justiça do Estado de Roraima, no uso de suas atribuições legais, etc. CONSIDERANDO o pedido feito pela Associação Roraimense pela Diversidade Sexual – Grupo DiveRRsidade, que relata a insegurança, direitos negados e a necessidade do reconhecimento jurídico das relações homoafetivas, para redução, inclusive, das demandas judiciais sobre o assunto; CONSIDERANDO o objetivo de resguardar a dignidade da pessoa humana, a igualdade, a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação; TJ Roraima CONSIDERANDO o teor do parecer de fls. 17/20 do Procedimento Administrativo nº 2.413/04, RESOLVE: Art. 1º. As pessoas plenamente capazes, que vivam uma relação de fato homoafetiva duradoura, ou que pretendam constituir uma relação afetiva, com ou sem compromisso patrimonial, poderão registrar documentos, atinentes a essa relação, junto ao registro de títulos e documentos. Art. 2º. Este Provimento entrará em vigor na data de sua publicação. Art. 3º. Ficam revogadas as disposições em contrário. Boa Vista, 17 de dezembro de 2004. Des. ALMIRO PADILHA STJ COMPETÊNCIA. RELAÇÃO HOMOSSEXUAL. AÇÃO DE DISSOLUÇÃO DE SOCIEDADE DE FATO, CUMULADA COM DIVISÃO DE PATRIMÔNIO. INEXISTÊNCIA DE DISCUSSÃOACERCA DE DIREITOS ORIUNDOS DO DIREITO DE FAMÍLIA. COMPETÊNCIA DAVARA CÍVEL.– Tratando-se de pedido de cunho exclusivamente patrimonial e,portanto, relativo ao direito obrigacional tão-somente, a competência para processá-lo e julgá-lo é de uma das Varas Cíveis.Recurso especial conhecido e provido (Processo RESP 323370 / RS ; RECURSO ESPECIAL 2001/0056835-9 Relator(a) Ministro BARROS MONTEIRO (1089) Órgão Julgador T4 - QUARTA TURMA Data do Julgamento 14/12/2004 Data da Publicação/Fonte DJ 14.03.2005 p. 340) STJ SOCIEDADE DE FATO. HOMOSSEXUAIS. PARTILHA DO BEM COMUM.O PARCEIRO TEM O DIREITO DE RECEBER A METADE DO PATRIMONIOADQUIRIDO PELO ESFORÇO COMUM, RECONHECIDA A EXISTENCIA DESOCIEDADE DE FATO COM OS REQUISITOS NO ART. 1363 DO C. CIVIL. (Processo RESP 148897 / MG ; RECURSO ESPECIAL 1997/0066124-5 Relator(a) Ministro RUY ROSADO DE AGUIAR (1102) Órgão Julgador T4 - QUARTA TURMA Data do Julgamento 10/02/1998 Data da Publicação/Fonte DJ 06.04.1998 p. 132) STJ 1. A primeira condição que se impõe à existência da união estável é a dualidade de sexos. A união entre homossexuais juridicamente não existe nem pelo casamento, nem pela união estável, mas pode configurar sociedade de fato, cuja dissolução assume contornos econômicos, resultantes da divisão do patrimônio comum, com incidência do Direito das Obrigações. 2. A existência de filho de uma das integrantes da sociedade amigavelmente dissolvida, não desloca o eixo do problema para o âmbito do Direito de Família, uma vez que a guarda e responsabilidade pelo menor permanece com a mãe, constante do registro, anotando o termo de acordo apenas que, na sua falta, à outra caberá aquele munus, sem questionamento por parte dos familiares. REsp 502.995/RN, Rel. Ministro FERNANDO GONÇALVES, QUARTA TURMA, julgado em 26.04.2005, DJ 16.05.2005 p. 353). Celso de Mello entende que deve ser reconhecido o direito à diferença e o direito personalíssimo da pessoa. O ministro citou recentes decisões do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul que já deslocou a discussão da união homossexual para o campo do Direito de Família. O relator chega a indicar o instrumento correto para que a questão volte ao Supremo: a ADPF, Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental (Consultor jurídico, 3 de fevereiro de 2006).