SITUAÇÕES CLÍNICAS PREVALENTES NAS QUAIS OS ESTUDOS POR IMAGENS PODEM SER UTILIZADOS Dr. Valfredo da Mota Menezes 2° CEFALÉIAS DO ADULTO: RESSONÂNCIA MAGNÉTICA? TOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA? RAIOS-X? OUTROS? NENHUM? 1. INTRODUÇÃO: A cefaléia é um dos mais comuns transtornos humanos. Cefaléia ou cefalalgia é definida como dor difusaou localizada em várias partes da cabeça, sendo que a dor não está confinada a área de distribuição de um nervo1,2.Enquanto um “descritor de assunto”, a BIREME, utiliza a classificação internacional e a define como um “sintoma de dor na região craniana, que pode ser uma ocorrência ou manifestação benigna isolada de uma ampla variedade de ‘Transtornos da Cefaléia’ (‘HeadacheDisorders’), sendo esses classificados em transtornos primários (baseado nas características dos sintomas da cefaléia) e secundários (baseado na etiologia)”. Utilizando ainda a classificação internacional, os transtornos primários da cefaléia são definidos como “afecções em que o sintoma primário é a cefaléia e esta não pode ser atribuída a quaisquer causas conhecidas”. Os transtornos secundários da cefaléia são definidos como “afecções com sintomas de cefaléia que podem ser atribuídas a uma variedade de causas, incluindo transtornos cerebrovasculares, ferimentos, lesões, infecção, uso ou abstinência de drogas”1,3Essas definições e classificações em primárias e secundárias têm fortes implicações clínicas, uma vez que a grande maioria dos casos de cefaléias que buscam apoio médico são formadas por cefaléias primárias benignas e cerca de 90% delas fazem parte de um pequeno grupo que inclui as enxaquecas, a cefaléia histamínica e a cefaléia do tipo tensional4-6.Em pacientes com sintomas de enxaqueca, cefaléia tensional ou com cefaléia crônica, sem sinais neurológicos anormais, que buscaram apoio médico, o percentual de achados de alguma anormalidade séria no exame de imagem variou de zero a 0,5%. Estudos de imagem feitos em pacientes assintomáticos e voluntários mostrou taxa de anormalidade de 0,4%.7 Enquanto a prevalência de pacientes com cefaléia varia de 11% a 48% em crianças e de 6% a 71% em adultos, a frequência de patologias que se apresentam com cefaléia é muito pequena. A incidência de tumor cerebral nos EUA é de 46/100.000 habitantes e a proporção de casos de hemorragia subaracnóidea é de 9/para 100.000 habitantes.8 1.1. Cefaléias primárias. As principais são:(ver anexo) 1.1.1. Transtorno de enxaqueca (migrainedisorders): inclui dois subtipos: a enxaqueca com aura e a enxaqueca sem aura; 1.1.2. Cefaléia Histamínica (Cluster Headache); 1.1.3. Cefaléia do Tipo Tensional (TensionTypeHeadache); 1.1.4. Hemicrania Paroxística ( Paroxysmal Hemicrania) Características das síndromes cefaleicas mais comuns9 Sintomas Enxaqueca Cefaléia do Tipo Cefaléia Histamínica Tensional Bilateral Unilateral, geralmente iniciando Localização Unilateral em 60 a 70%; próximo aos olhos ou têmpora. bi frontal ou global em 30% ou Começa de forma rápida e atinge Características De inicio gradual, Pressão que um ápice em minutos; a dor é crescente, pulsátil de tensão e profunda, contínua, lancinante e moderada a intensa e aumenta com característica explosiva. agravada pelas diminui atividades diárias. Aspecto do Prefere repousar em um Pode Paciente permanece ativo. paciente ambiente escuro e permanecer silencioso. ativo ou necessitar de repouso. Duração De 4 a 72 horas Variável 30 minutos a 3 horas Sintomas Náusea, vômitos, Nenhum Lacrimejamento ipsilateral e associados fotofobia, fonofobia; vermelhidão nos olhos, nariz pode ocorrer aura entupido, coriza, palidez, sudorese, (geralmente visual, mas síndrome de Horner, sintomas pode também envolver neurológicos focais (raros) e outros sentidos ou sensibilidade ao álcool. provocar problemas na fala e motores). 1.2. Cefaléias secundárias: As cefaléias secundárias são as menos frequentes na prática clínica, mas são aquelas que levantam maiores preocupações devido à possibilidade de serem causadas por uma afecção grave. Na prática, a grande dificuldade do médico será diferenciar uma cefaléia primária benigna de uma secundária com risco potencial para o seu paciente. Para essa diferenciação, o médico assistente deverá conhecer as principais características clínicas de cada tipo de cefaléia. Deverá buscar na história aquelas características que possivelmente se relacionam com sérias patologias subjacentes, dentre outras as seguintes devem ser pesquisadas10: 1. Inícioexplosivo e severo 2. Cefaleia sem similaridade no passado 3. Infecçãoconcomitante 4. Status mental alterado 5. Cefaléia com o esforço físico 6. Idade superior a 50 anos Deverá buscar no exame físico: 1. Anormalidadesneurológicas 2. Diminuição do nível de consciencia 3. Meningismo 4. Aparênciatóxica 5. Edema de papila Um dos nossos objetivos neste estudo é o de saber os tipos de cefaléias nos quais as avaliações com o uso de exames de imagens são indicadas. QUESTÕES CLÍNICAS: Para quais pacientes adultos, com cefaléia não-traumática, está indicada a avaliação com uso de neuroimagem? Quando a avaliação com neuroimagem está indicada, qual a modalidade de exame a ser utilizada? Tomografia computadorizada? Ressonância Magnética? Outras? 3. OBJETIVOS: 1. Buscar na literatura as melhores evidências científicas sobre o uso de estudos por imagem (principalmente a ressonância magnética e a tomografia computadorizada) em situações clínicas com maior prevalência no atendimento médico, dentre essas, as cefaléias do adulto. 2. Fornecer ao médico assistente uma ferramenta de referências baseada em evidências científicas (um guia) de fácil consulta, para que, se necessário, possa utilizar como orientação na tomada de decisão sobre qual exame estará mais bem indicado para o diagnóstico ou para o acompanhamento do seu paciente. 4. ESTUDOS INCLUÍDOS: 4.1. “Guideline” do“American College of Emergency Physicians”11 Trata-se de um estudo terciário que analisou situações de cefaléias agudas, não traumáticas em pacientes adultos em atendimento de emergência. Para implementar sua estratégia de busca, esse estudo fez cinco perguntas, dessas, para o objetivo do nosso estudo, apenas a pergunta número dois e a número cinco tem interesses: Pergunta n°2: Quais pacientes com cefaléia atendidos em emergência requerem exame de neuroimagem? Recomendações da pergunta 2: 1. Pacientes em atendimento de emergência com cefaléia e novos achados anormais em um exame neurológico (ex.: déficit focal, status mental alterado, alteração da função cognitiva etc.) devem ser submetidos emergentemente ao exame de tomografia computadorizada não contrastada da cabeça. 2. Pacientes que apresentam cefaléia nova de inicio súbito e severo devem ser submetidos ao exame emergente de tomografia computadorizada da cabeça. 3. Paciente HIV positivo com novo tipo de dor de cabeça deve ser examinado com emergente estudo de neuroimagem. 4. Pacientes com idade superior a 50 anos e que apresentem novo tipo de cefaléia, mas com exame neurológico normal, devem ser considerado para um urgente estudo de neuroimagem (recomendação por consenso). Pergunta n°5: Há necessidade de exames adicionais por imagem no paciente com cefaléia severa de inicio súbito no qual os exames iniciais de tomografia e punção lombar foram negativos? Recomendação da pergunta n° 5: Paciente com uma cefaléia severa de inicio súbito que apresentou exames negativos em uma tomografia de cabeça, achados negativos na análise do liquido cérebro espinhal, assim como pressão normal do líquor, não necessita de angiografia de emergência e pode ter alta com acompanhamento. Comentários: O estudo avalia cefaléias agudas em departamento de emergência. Não estão incluídas as cefaléias não-agudas, como enxaqueca, tensional e outras primarias. Quando indicado, recomenda o uso de Tomografia Computadorizada da cabeça. 4.2. Gudeline do “The American College of Radiology”8 Objetivos: Avaliar a necessidade de exame radiológico inicial para pacientes com dor de cabeça (adultos e crianças) O estudo avalia várias situações que são denominadas como variantes. Previamente, em relação a necessidade ou não de exame por imagem, estabelece uma escala de valores para cada situação com as seguintes pontuações: 1,2,3 = geralmente não apropriado; 4,5,6 = pode ser apropriado; e 7,8,9 =geralmente apropriado. Dá as seguintes recomendações: • Variante 1: cefaléia crônica sem novas características Pode ser apropriada a realização de qualquer desses exames: a) Ressonância magnética (RM) do cérebro com ou sem contraste (escala de valor = 4); b) RM cerebral com contraste (escala de valor = 4); c) tomografia computadorizada (TC) da cabeça sem contraste (escala de valor =4 ); d) tomografia da cabeça sem ou com contraste (escala de valor = 4). • Variante 2.: cefaléia crônica com novas características a)Geralmente está apropriado o uso RM com ou/sem contraste (escala de valor = 8/7) b) Pode ser apropriado o uso da CT sem contraste (escala de valor = 5) • Variante 3. cefaléia severa de inicio súbito ( “a pior dor de cabeça que senti na vida”) a) Deve-se realizar TC sem contraste (escala de valor = 9) b) pode também ser realizada a angiotomografia (TCA) ou angiografia por ressonância magnética (RMA) (escala de valor = 8) com ou sem contraste. Dependendo do resultado da TC, a RM sem contraste pode ser útil. • Variante 4. Cefaléia unilateral de início súbito ou suspeita de dissecção de carótida ou de vertebral ou síndrome de Horneripsolateral Geralmente apropriado o uso de TCA (angiotomografia) de cabeça e pescoço ou o uso de angiografia por ressonância magnética de cabeça e pescoço com ou sem contraste. (escala = 8). • Variante 5. Suspeita de complicações intracraniana de sinusite ou mastoidites a) Geralmente apropriado o uso de ressonância sem ou com contraste (escala = 8). b)Pode-se usar também a tomografia sem contraste (escala=7). • Variante 6. Cefaléia nova em paciente com mais de 60 anos e com VHS superior a 55 (suspeita de arterite temporal) Geralmente apropriado o uso de ressonância sem (escala = 8) ou com contraste (escala = 7) • Variante 7. Cefaléia novaem paciente com HIV Geralmente apropriado o uso de ressonância com ou sem contraste (escala = 8) • Variante 8. Cefaléia nova em paciente grávida Apropriado o uso de ressonância ou de TC sem contraste (escala de valor = 8) • Variante 9. Nova cefaléia e suspeita de meningite ou encefalite Apropriado o uso de ressonância com ou sem contraste ou de TC sem contraste (escala de valor = 8) O mesmo “guideline” sumariza suas orientações com as seguintes recomendações: “Para alguns tipos de cefaléias ou em população sob-risco, os procedimentos tanto de CT quanto de RM, são mais propensos a dar resultados positivos. Um paciente que apresenta uma cefaléia súbita e severa (“a pior dor de cabeça de minha vida”), particularmente se não for uma enxaqueca ou se as características da dor forem diferentes das dores usuais, está sob significante risco de estar apresentando uma hemorragia subaracnóide (SAH), a qual é mais frequentemente aneurismática do que uma mal formação arteriovenosa (AVM)”. “Cefaléia em trovoada (Thunderclapheadaches), cefaléia irradiando para o pescoço, cefaléia temporal em paciente idoso são exemplos de cefaléias nas quais o estudo por imagem pode ser útil. Pacientes com suspeita de meningite, mulheres grávidas, pacientes com câncer, pacientes com imunodeficiência (HIV), devem ser rastreados por exames por imagem quando apresentarem uma dor de cabeça de início novo”8 Comentários:O estudo avalia o uso de exames por imagem em qualquer tipo de cefaléia (crônica ou aguda) e refere que, nos casos das crônicas sem novos achados (aqui incluídas as enxaquecas, tipo tensional e outras), o exame por imagem não é mandatório (“pode ser apropriado”). São consideradas cefaléias “novas” aquelas diferentes das cefaléias habituais já apresentadas pelo paciente. 4.3. US Headache Consortium. Evidence-Based Guidelines in the Primary Care Setting: Neuroimaging in Patients with Nonacute Headache 12 Objetivos do “guideline”:fornecer recomendações para o teste diagnostico em pacientes com cefaléias não agudas(abrangendo todas as síndromes de dor de cabeça que ocorreram por pelo menos quarto semanas durante a vida do paciente) atendidos em unidade de atenção primária. Procuram responder três questões: 1. Existem achados particulares na história e no exame físico que sejam úteis para identificar quais pacientes apresentam significantes anormalidades intracranianas? 2. Em pacientes com cefaléia não-agudas e com exame neurológico normal, qual é a frequência de causas secundárias importantes, detectadas por TC ou RM? 3. Quais evidências existem quanto a capacidade relativa da TC ou RM para detectar lesões intracranianas significativas em pacientes com cefaléias nãoagudas? Resposta da primeira pergunta: a) Exame neurológico: um exame neurológico anormal aumenta a possibilidade de serem encontradas significantes patologias intracranianas em exames de neuroimagem. A ausência de qualquer anormalidade no exame físico diminui essa possibilidade Recomendação: Estudo por imagem deve ser considerado em pacientes com cefaléia não aguda e um inexplicável e anormal achado no exame neurológico. b) Sintomas neurológicos: cefaléia que piora com manobra de Valsalva, cefaléia que acorda o paciente durante o sono, cefaléia nova em população idosa, ou cefaléia com agravamento progressivo, podem indicar uma probabilidade aumentada de se encontrar alguma patologia intracraniana. Recomendação: As evidências são insuficientes para se fazer uma recomendação em relação ao exame por imagem na presença ou ausência de sintomas neurológicos (consenso). Resposta da segunda pergunta: a) Enxaqueca e exame neurológico normal: é pouco provável que um exame de neuroimagem revele alguma anormalidade em paciente com enxaqueca e com exame neurológico normal. Recomendação: Para pacientes com enxaqueca e com exame neurológico normal a avaliação por exame de neuroimagem não está recomendada. b) Cefaléia tipo tensional: em pacientes com cefaléia tensional e exame neurológico normal, não foram mostradas lesões significantes no exame de imagem. Recomendação: Os dados são insuficientes para se fazer uma recomendação baseada em evidências sobro o uso de neuroimagem em pacientes com cefaléia do tipo tensional. Resposta da terceira pergunta: a) Efetividade da tomografia (TC) vs. Ressonância (RM): com base em limitados dados dos estudos, a ressonância parece ter maior sensibilidade que a tomografia para encontrar lesões da matéria branca e de anomalias venosas. Entretanto, parece ter pouca importância clínica na avaliação de pacientes com dor de cabeça não aguda. Recomendação: Os dados são insuficientes para se fazer qualquer recomendação baseada em evidências relativas à sensibilidade da ressonância quando comparada com a tomografia na avaliação da enxaqueca ou de outra cefaléia não aguda(consenso). Comentários:Avalia a necessidade de utilização dos exames por imagem em cefaléias não agudas (aqui incluídas as enxaquecas e a tipo tensional) e concluem pela não necessidade da utilização do exame por imagem caso o paciente não apresente sinais neurológicos anormais no exame físico. Deixam dúvidas quanto à cefaléia tipo tensional, assim como em relação a qual o exame melhor indicado (TC ou RM). 4.4 UpToDate9,10: Classifica os pacientes de baixo risco para patologias secundárias: Pacientes com história de cefaléias anteriores e que se apresentam em departamento de emergência devido a falha em sua terapêutica padrão e que se encaixam nos seguintes critérios podem ser considerados de baixo risco para “cefaléia perigosas”: a) não ocorrência de mudanças substanciais nos padrões de sua cefaléia; b) nenhum dado novo preocupante em sua história (ex. trauma, febre, convulsão); c) nenhum sintoma neurológico focal ou achado anormais no exame físico; d) sem alto risco de comorbidade. Esses pacientes não necessitam de exames de imagem de rotina Recomenda que a história clínica deva buscar sinais e/ou sintomas de perigo: a) Cefaléia de início súbito, ou cefaléia persistente e severa, que chega a máxima intensidade em segundos, pode ser devida a uma hemorragia subaracnóidea; b) A ausência de cefaléia similar no passado. A “primeira” ou a “pior da minha vida” pode ser devido a hemorragia intracraniana ou infecção do sistema nervoso central. c) Sintomas neurológicos focais, diferentes das típicas auras, devem levantar suspeita de tumor, malformação arteriovenosa ou doença vascular do colágeno. d) Cefaléia associada a febre pode ser causada por infecção intracraniana, sistêmica ou local. Infecções de pulmão, paranasal e sinusoidais, podem servir de fonte para o desenvolvimento de meningites ou abscesso intracraniano. e) O inicio rápido de uma cefaléia associada com exercício levanta a possibilidade de uma dissecção de carótida ou hemorragia intracraniana. f) Novo tipo de cefaléia em paciente com câncer sugere metástase. g) Novo tipo de cefaléia em paciente com HIV sugere infecção oportunista ou tumor. h) Cefaléia durante gravidez ou no pós-parto sugere a possibilidade de trombose venosa, dissecção de carótida ou apoplexia pituitária. Todos esses casos necessitam de exame por imagem. Recomenda ainda que: Uma história cuidadosa e um cuidadoso exame físico permanecem sendo as partes mais importantes na avaliação de um paciente com cefaléia. Achados anormais no exame neurológico permanecem sendo o mais simples e melhor preditor clínico de alguma patologia intracraniana. A presença de um ou mais fatores de alto risco em um paciente com cefaléia aguda aumenta a possibilidade de alguma doença subjacente e orienta para a necessidade de uma urgente avaliação com punção lombar, exame de imagem ou ambos. Refere que “os dados são insuficientes para recomendar tomografia ou ressonância quando um exame de neuroimagem for necessário. Uma tomografia de cabeça (com ou sem contraste) é provavelmente suficiente na maioria dos pacientes. Uma ressonância magnética seguida de uma angioressonância (RMA) está indicada quando há suspeita de lesão vascular ou lesão na fossa posterior.” Comentários:Analisam tanto as cefaléias não-agudas quanto as agudas e/ou com novosachados. Recomendam que, para os pacientes com história de cefaléias anteriores que não apresentam alteração do status, não há necessidade da avaliação por exame de imagem. Chama a atenção para a necessidade de uma completa história clínica na busca de achados neurológicos anormais no sentido de diferenciar uma cefaléia primaria (benigna) de uma outra, possivelmente secundária à alguma patologia subjacente. Deixa sem resposta a pergunta sobre qual o exame melhor indicado (TC ou RM), mas diz que “uma tomografia de cabeça (com ou sem contraste) é provavelmente suficiente na maioria dos pacientes” 5. DISCUSSÃO: Nosso objetivo foi o de buscar estudos secundários e/ou terciários que avaliassem o uso dos exames de imagem em pacientes adultos com cefaléia. Estabelecemos duas questões a serem respondidas por esses estudos. A primeira sobre a necessidade de estudos de neuroimagem diante de um quadro de cefaléia e a outra sobre qual o exame a ser executado quando este fosse necessário. Incluímos tanto estudo que avaliou quadros de cefaléias agudas quanto crônicas, em atendimento primário ou em atendimento secundário. Todos os estudos, mesmo outros analisados e não incluídos13, 14, são unânimes em orientar para a necessidade de o médico assistente realizar uma cuidadosa história clínica e um rigoroso exame físico, no sentido de diferenciar uma cefaléia primária de uma secundária. Todos respondem a primeira pergunta deixando claro que, no caso de cefaléias consideradas primárias (aqui incluídas as enxaquecas, as cefaléias tensionais e outras), não há necessidade da avaliação por qualquer exame de imagem, uma vez que nesses casos a incidência de achados patológicos nos exames é quase nula. Todos os estudos chamam também a atenção para a necessidade de o médico assistente buscar na história e no exame físico quaisquer anormalidades neurológicas, tanto subjetivas quanto objetivas, uma vez que na maioria dos casos em que o exame de imagem apresentou algum achado, o paciente tinha associada à sua cefaléia alguma mudança de status, algum sinal neurológico ou ambos.15 Entretanto, em relação a segunda pergunta, os estudos não esclarecem qual o exame de imagem é o melhor indicado para determinada cefaléia e/ou determinado tipo de doença. O Guideline do “The American Collegeof Radiology”8, embora faça mais referências ao uso da ressonância magnética, coloca ambos os exames, ressonância e tomografia, quase com a mesma escala de valores nas diferentes variantes apresentadas. O estudo do “US Headache Consortium” diz que, “com base em limitados dados dos estudos, a ressonância parece ter maior sensibilidade que a tomografia para encontrar lesões da matéria branca e de anomalias venosas”. Entretanto, na recomendação diz que “os dados são insuficientes para se fazer qualquer recomendação baseada em evidências relativas a sensibilidade da ressonância quando comparada com a tomografia na avaliação da enxaqueca ou de outra cefaléia não-aguda12. O mesmo ocorre com as recomendações do UpTodate, que diz que “os dados são insuficientes para recomendar tomografia ou ressonância quando um exame de neuroimagem for necessário. Uma tomografia de cabeça (com ou sem contraste) é provavelmente suficiente na maioria dos pacientes. Uma ressonância magnética, seguida de uma angioressonância (RMA) está indicada quando há suspeita de lesão vascular ou lesão na fossa posterior.”9,10 Muitas das solicitações de exame por imagem para avaliação de casos de cefaléia, tanto em atenção primária quanto em atendimento de emergência, ocorrem, de maneira exagerada e mesmo sem critérios clínicos16,17. O médico assistente tem que ter em mente que a grande maioria dos casos de cefaléias está enquadrada dentro do grupo das cefaléias primárias e sem necessidade de avaliação por neuroimagem. Entretanto, tem que ter também a clareza de que, quando ocorre uma mudança no padrão de uma cefaléia recorrente; quando o paciente queixa-se de uma cefaléia “sem igual no passado” ou de uma cefaléia súbita e severa com irradiação para o pescoço; quando um paciente idoso queixa-se de cefaléia temporal, ou se o exame neurológico do paciente mostrou alguma alteração, a avaliação do paciente por exame de neuro imagem deve ser, nesses casos, mandatória. 6. CONCLUSÕES: 6.1. Avaliação por exame de imagem: 6.1.1. A avaliação por exame de neuroimagem não está recomendada nos pacientes com cefaléia primária e com exame neurológico normal; 6.1.2. A avaliação por exame de neuroimagem está recomendada em quaisquer das seguintes situações: 6.1.2.1. pacientes com cefaléia e com exame neurológico alterado; 6.1.2.2. em cefaléia de início súbito ou cefaléia persistente e severa, que chega à máxima intensidade em segundos (suspeita de hemorragia subaracnóidea); 6.1.2.3. a ausência de cefaléia similar no passado. A “primeira” ou a “pior da minha vida” (suspeita de hemorragia intracraniana ou infecção do sistema nervoso central); 6.1.2.4. sintomas neurológicos focais, diferentes das típicas auras (suspeita de suspeita de tumor, malformação arteriovenosa ou doença vascular do colágeno); 6.1.2.5.novo tipo de cefaléia em paciente com câncer (suspeita de metástase); 6.1.2.6. novo tipo de cefaléia em paciente com HIV (suspeita de infecção oportunista ou tumor); 6.1.2.7. cefaléia durante gravidez ou no pós-parto (suspeita de trombose venosa, dissecção de carótida ou apoplexia pituitária). 6.2. Dentre os exames por imagem qual é o mais recomendado? Ressonância magnética? Tomografia Computadorizada? Outro? 6.2.1. As evidências científicas são insuficientes para se fazer quaisquer recomendações sobre qual o exame que apresenta melhor acurácia para avaliação de pacientes com cefaléia. 7.RECOMENDAÇÕES: 7.1. O médico assistente deve ter clareza que: • a história clínica com o respectivo exame físico é a principal avaliação a ser feita no paciente com cefaléia; • sinais neurológicos anormais em um paciente com cefaléia crônica ou aguda são os principais preditores de doença neurológica subjacente; • diante de um paciente com cefaléia crônica ou aguda que apresenta sinais neurológicos anormais a avaliação por meio de exame por imagem é mandatória; • nos casos de cefaléia não agudas (aqui incluídas as enxaquecas, a cefaléia tipo tensional e outras cefaléias primárias) não há necessidade de solicitação de exames por imagem. 7.2. Considerando que não foram encontradas evidências que dirimissem as dúvidas sobre qual dos exames (TC ou RM) é o melhor para a avaliação de um paciente com cefaléia, recomenda-se que: • em situações de urgência/emergência e, considerando que a tomografia é o exame de maior disponibilidade e o de melhor custo efetividade, sugerimos que o mesmo seja o exame a ser solicitado 9-11; • em situações não-urgentes pode-se solicitar tanto a tomografia computadorizada quanto a ressonância magnética. Caso o médico assistente tenha dúvidas sobre qual deles é a melhor opção para o determinado tipo de situação, sugerimos um contato com o neuroradilogista para discussão do caso. Cuiabá, 26 de março de 2012 Prof. Dr. Valfredo da Mota Menezes REFERENCIAS: 1. The International Classification of Headache Disorders: 2nd edition. Headache Classification Subcommittee of the International Headache Society Cephalalgia. 2004;24 Suppl 1:9. 2. C. Randall Clinch, D.O., Uniformed Services University of the Health Sciences, F. Edward. School of Medicine, Bethesda, Maryland Evaluation of Acute Headaches in Adults. Am Fam Physician.2001;63(4):685-693 3. Biblioteca Virtual em Saúde/DeCS – Terminologia em saude. www.bireme.br 4. Schwartz BS, Stewart WF, Simon D, Lipton RB Epidemiology of tension-type headache. JAMA. 1998;279(5):381-3 5. Bigal ME, Bordini CA, Speciali JG. Etiology and distribution of headaches in two Brazilian primary care units. Headache 2000;40(3):241-7 6. Tepper SJ, Dahlöf CG, Dowson A, Newman L, Mansbach H, Jones M, Pham B, Webster C, Salonen R. Prevalence and diagnosis of migraine in patients consulting their physician with a complaint of headache: data from the Landmark Study. Headache. 2004;44(9):856-64. 7. Sudlow C. US guidelines on neuroimaging in patients with non-acute headache: a commentary. J NeurolNeurosurg Psychiatry. 2002;72 Suppl 2:ii16-ii18. 8. John E. 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Frishberg et al Evidence-Based Guidelines in the Primary Care Setting: Neuroimaging in Patients with Nonacute Headache US Headache Consortium: American Academy of Family Physicians, American Academy of Neurology, American Headache Society, American College of Emergency Physicians, American College of Physicians-American Society of Internal Medicine, American Osteopathic Association National Headache Foundation. Dispinível em: http://www.aan.com/professionals/practice/pdfs/gl0088.pdf. 13. INSTITUTE FOR CLINICALSYSTEMS IMPROVEMENT: Health Care Guideline: Diagnosis and Treatment of Headache. Disponívemem: http://www.icsi.org/headache/headache__diagnosis_and_treatment_of_2609.html 14. Diagnosis and management of headache in adults. A national clinical guideline.Scottish Intercollegiate Guidelines Network (SIGN).Edinburgh (Scotland)2008 Nov. 81 p. (SIGN publication; no. 107).Disponível em: http://www.sign.ac.uk/pdf/sign107.pdf 15. Becker LA, Green LA, Beaufait D, Kirk J, Froom J, Freeman WL Use of CT scans for the investigation of headache: a report from ASPN, Part 1.J FamPract. 1993;37(2):129-34. 16. Couchman GR, Forjuoh SN, Rajab MH, Phillips CD, Yu J Nonclinical factors associated with primary care physicians ordering patterns of magnetic resonance imaging/computed tomography for headache. AcadRadiol. 2004; 11(7):735-40. ANEXO: 1.Principais tipos de cefaléias primárias1,3: 1.2.Transtornos de Enxaqueca (MigraineDisorders) Sinônimos: Enxaqueca Confusional Aguda, Cefaléia Enxaquecosa, Cefaléia Hemicrania, Estado de Mal Enxaquecoso, Síndromes de Enxaqueca, Síndromes Enxaquecosas. Classe de transtornos cefaléicos primários e incapacitantes caracterizados por cefaléias pulsáteis, unilaterais e recorrentes. Os dois subtipos principais são a enxaqueca comum (sem aura) e a clássica (com aura ou sintomas neurológicos) 1.2.1. Enxaqueca com Aura (Migrainewith aura): Sinônimos: Enxaqueca Tipo Basilar, Enxaqueca Clássica, Enxaqueca Complicada, Enxaqueca Familiar Hemiplégica, Enxaqueca Hemiplégica Familiar. “Subtipo de enxaqueca caracterizada por ataques recorrentes de sintomas neurológicos reversíveis (aura) que precedem ou acompanham a cefaléia. A aura também inclui uma combinação de distúrbios sensoriais, como visão embaçada, alucinações, vertigem, adormecimento e dificuldade de concentração e fala. A aura, normalmente é seguida por traços de Enxaqueca Comum, como fotofobia, fonofobia e náusea” 1.2.1. Enxaqueca sem Aura (Migrainewithout Aura): Sinônimos: Enxaqueca Comum “Cefaléias recorrentes unilaterais pulsáteis, não precedidas ou acompanhadas de aura, em episódios que duram de 4-72 horas. São caracterizadas por dor de intensidade moderada a severa, agravadas por atividade física e associadas a náusea e /ou fotofobia ou fonofobia”. 1.2. Cefaléia Histamínica ( Cluster Headache) Sinônimos: Cefalalgia Histamínica, Nevralgia Ciliar, Cefaléia em Cacho, Cefalgia Histamínica, Síndrome de Horton, Enxaqueca Nevrálgica “Transtorno primário de cefaléia caracterizado por forte dor, estritamente unilateral, nas regiões orbital, supra orbital e temporal (ou em qualquer combinação destes) com duração de 15 minutos a 3 horas, ocorrendo uma a 8 vezes ao dia. Os ataques estão associados com um ou mais dos seguintes transtornos (todos ipsilaterais): injeção conjuntival, lacrimação, congestionamento nasal, rinorréia, sudorese facial, edema nas pálpebras e miose”. 1.3. Cefaléia do Tipo Tensional (TensionTypeHeadache) Sinônimos: Cefalalgia do Tipo Tensional, Cefalgia do Tipo Tensional, Cefaléia Tensional Cefalalgia Tensional, Cefalgia Tensional, Cefaléia Psicogênica, Cefaléia por Estresse, Cefaléia Tensional Vascular “Cefaleia primária comum, caracterizada por uma dor contínua, não pulsátil, difusa, tensional de identidade suave a moderada na cabeça, couro cabeludo ou pescoço. Os subtipos são classificados por frequência e severidade dos sintomas. Não há causa clara, apesar de ter sido associada com contração muscular e estresse”. 1.4. Hemicrania Paroxística ( Paroxysmal Hemicrania) Sinônimo : Enxaqueca Paroxística “Transtorno de cefaléia primária semelhante a Cefaleia Histamínica com dor de cabeça unilateral, mas diferencia por ataques severos curtos e múltiplos”. Frequentemente é observada em mulheres e pode ser resposta a fármacos anti-inflamatórios não esteroidais (NSAIDS).