PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO JOSÉ FUNDAÇÃO EDUCACIONAL DE SÃO JOSÉ CENTRO UNIVERSITÁRIO MUNICIPAL DE SÃO JOSÉ CURSO DE PEDAGOGIA ROBERTA ROECKER REGISTRO E DOCUMENTAÇÃO PEDAGÓGICA: Refletindo as Práticas São José 2011 PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO JOSÉ FUNDAÇÃO EDUCACIONAL DE SÃO JOSÉ CENTRO UNIVERSITÁRIO MUNICIPAL DE SÃO JOSÉ CURSO DE PEDAGOGIA ROBERTA ROECKER REGISTRO E DOCUMENTAÇÃO PEDAGÓGICA: Refletindo as Práticas Trabalho elaborado para a disciplina de Conclusão de Curso (TCCII) do Curso de Pedagogia, como requisito parcial para curso de graduação em Pedagogia do Centro Universitário Municipal de São José- USJ. Orientadora: Profa. MSc. Arlete de Costa Pereira São José 2011 ROBERTA ROECKER REGISTRO E DOCUMENTAÇÃO PEDAGÓGICA: Refletindo As Práticas Trabalho de Conclusão de Curso elaborado como requisito parcial para obtenção do grau de licenciado em Pedagogia do Centro Universitário Municipal de São José – USJ avaliado pela seguinte banca examinadora: BANCA EXAMINADORA ________________________________________________________ Profª. Msc. Arlete de Costa Pereira Orientadora- USJ _________________________________________________________ Profª. Msc. Moema Helena Koche de Albuquerque Kiehn Examinadora –FAED/ UDESC ____________________________________________________ Profª. Msc. Roberta Schnorr Buehring Membro Examinador - USJ São José, 21 de novembro de 2011 Dedico este trabalho ao meu marido Daniel e ao meu filho Arthur pelo apoio e dedicação incondicional que me deram durante este percurso. AGRADECIMENTOS A Deus, por ter me concedido o potencial de concretizar esse trabalho. Aos meus pais, Fredolino Roecker e Dilza Rogéria Brüggemann Roecker, meus primeiros educadores e grandes incentivadores na vida. Está conquista é, também, de vocês. As minhas irmãs, Rejane, Renata, Rafaela e Roseana Roecker pelo apoio e auxílio durante todo o percurso da graduação. Ao meu esposo Daniel e ao meu filho Arthur por serem constante alegria em minha vida. As amigas Fernanda Gesser, Jennifer Tâmara Linhague, Juliana Campos Calazans Ribeiro e Vanderleia Pandini. Ao amigo Eduardo Tasca, pelo convívio quase diário. A vocês agradeço a amizade e parceria reafirmada a cada passo. A minha orientadora, Arlete de Costa Pereira, professora e amiga por compartilhar os desafios e conquistas durante esta pesquisa. As professoras e Instituições por colaborarem para que esta pesquisa fosse realizada. As professoras Moema Helena Koche de Albuquerque Kiehn e Roberta Schnorr Buehring por aceitarem o convite em participar da banca examinadora. Escrever deixa marca, registra pensamento, sonho, desejo de morte e vida. Escrever dá muito trabalho, porque organiza e articula pensamento na busca de conhecer o outro, a si, o mundo. Madalena Freire RESUMO O presente trabalho refere-se a uma pesquisa de campo junto às professoras que atuam na Educação Infantil da Rede Municipal de São José e buscou investigar a existência ou não das práticas de registro e documentação pedagógica e se estas práticas são utilizadas como instrumentos de reflexão e replanejamento na atuação docente. A coleta dos dados foi realizada a partir de questionários respondidos pelas professoras participantes da pesquisa. Com base nesses dados buscou-se compreender a relação que estas professoras têm com a documentação pedagógica e o registro. Com os resultados obtidos por meio da análise do conteúdo ancorados nas teorias dos autores: Freire (1996), Ostetto (2001; 2008), Dahlberg, Moss e Pence (2003), Gandini e Goldhaber (2002), Kinney e Wharton (2009), pode-se identificar as categorias centrais: a documentação pedagógica na educação infantil, a observação e o registro como dimensões reflexivas da prática, o registro do vivido e as formas de registro e documentação. Concluindo-se que a prática do registro e da documentação pedagógica são ferramentas relevantes na reflexão da prática docente e a aceitação dessas ações incentiva mudanças na atuação docente. Palavras-Chave: Professoras. Educação Infantil. Registro. Documentação Pedagógica. LISTAS DE ILUSTRAÇÕES GRÁFICOS Gráfico 1 – Faixa Etária das Professoras Participantes da Pesquisa......................... Gráfico 2 – Tempo de Formação das Professoras Participantes da Pesquisa........... Gráfico 3 – Tempo de atuação na Educação.............................................................. Gráfico 4 – Presença de registro e documentação pedagógica nas práticas das professoras.................................................................................................................. Gráfico 5 – Participação das professoras pesquisadas em formação continuada..... Gráfico 6 – Temáticas abordadas com mais frequência em formação continuada.... Gráfico 7 – Experiência com registro e documentação pedagógica durante a formação..................................................................................................................... Gráfico 8 – Entendimento sobre registro e documentação pedagógica..................... Gráfico 9 – Forma de utilização do registro pelas professoras pesquisadas.............. Gráfico 10 – A prática do registro auxilia no trabalho docente................................... Gráfico 11 – Forma que o registro auxilia no trabalho docente.................................. Gráfico 12 – Frequência que os registros são realizados........................................... Gráfico 13 – Local e horário de realização do registro............................................... 28 28 29 29 31 31 32 32 34 36 37 39 40 QUADROS Quadro 1 – CEIs Pesquisados................................................................................ 18 LISTAS DE ABREVIATURAS USJ – Centro Universitário Municipal de São José CEI – Centro de Educação Infantil NDI – Núcleo de Desenvolvimento Infantil SUMARIO 1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 10 2 CENTROS DE EDUCAÇÃO INFANTIL DA REDE MUNICIPAL DE SÃO JOSÉ . 14 3 PERCURSO METODOLÓGICO: OS DESAFIOS DA PESQUISA ....................... 16 4 REFERENCIAL TEÓRICO: A DOCUMENTAÇÃO PEDAGÓGICA NA EDUCAÇÃO INFANTIL ............................................................................................ 20 4.1 A OBSERVAÇÃO E O REGISTRO COMO DIMENSÕES REFLEXIVAS DA PRÁTICA ................................................................................................................... 27 4.2 O REGISTRO DO VIVIDO....................................................................................35 4.3 AS FORMAS DE REGISTRO E DOCUMENTAÇÃO ............................................ 38 5 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES ............................................................................. 43 REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 45 APÊNDICE 1 – TABULAÇÃO DOS DADOS ............................................................ 47 APÊNDICE 2 - QUESTIONÁRIO .............................................................................. 50 10 1 INTRODUÇÃO Neste documento apresenta-se o Trabalho de Conclusão de Curso (TCCII) do Curso de Pedagogia do Centro Universitário Municipal de São José- USJ. O estudo teve, como principal objetivo, a investigação da existência ou não de práticas de registro e documentação pedagógica e se estas práticas são utilizadas como instrumentos de reflexão e replanejamento na atuação docente, das professoras de Educação Infantil da Rede Municipal de São José. A pesquisa foi realizada a partir de um levantamento de dados com as professoras de Educação Infantil da Rede Municipal de ensino de São José, por meio de questionários com as mesmas e posteriormente a análise dos dados com base no referencial teórico existente sobre o assunto. Este trabalho trouxe como base teórica os estudos de Freire (1996), Ostetto (2001; 2008), Dahlberg, Moss e Pence (2003), Gandini e Goldhaber (2002), Kinney e Wharton (2009). E ainda a Tese de Doutorado de Amanda Cristina Teagno Lopes de Marques (2010) da Universidade de São Paulo e a Dissertação de Rejane Tereza Marcus Bodnar (2006) da Universidade Federal de Santa Catarina. O interesse pelo tema surgiu a partir da 6ª fase do curso de Pedagogia, quando foi ministrada a disciplina de Cotidiano e Prática Pedagógica na Educação Infantil onde foram realizadas leituras e discussões sobre autores que abordam a documentação pedagógica como subsídio para a formação e a prática docente. A partir destas leituras, foi possível experimentar um pouco a utilização dos registros e formas de documentação, durante as vivências em campo de estágio realizado na disciplina de Estágio Curricular em Educação Infantil1, que aconteceu em uma instituição de educação infantil, localizada no município de São José. Durante as observações e registros diários, e principalmente no período do exercício da docência, a documentação do estágio por meio de variadas formas de registro em todo o processo, foi fundamental para a análise da etapa de formação e construção do documento final, o Relatório de Estágio, e com isso foi possível perceber a relevância da documentação pedagógica para a prática docente. A partir desta vivência, foi possível inferir que a utilização da documentação 1 O Estágio Curricular na Educação Infantil ocorreu durante o segundo semestre de 2010, no período compreendido entre os meses de julho a dezembro em parceria com a colega de turma Juliana Campos Calazans Ribeiro. 11 pedagógica permite registrar o que acontece durante a prática docente tornando o trabalho diário concreto, palpável, o que possibilita o exercício da reflexão das práticas. Após esta etapa de formação e encantamento com o aprendizado do registro e documentação, houve uma motivação e uma inquietação para a pesquisa que, impulsionada pela descoberta desta importante ferramenta de trabalho, desencadeou o desejo de saber se ela é ou não utilizada pelas professoras de Educação Infantil da rede Municipal de São José no seu cotidiano. Levando isto em conta, esta pesquisa teve como principal objetivo investigar a existência (ou não) de práticas de registro e documentação pedagógica, como instrumentos de reflexão, formação e planejamento, na atuação docente de professoras da Rede Municipal de São José. Seus objetivos específicos constituíram em realizar um levantamento junto às professoras para saber se elas fazem registros e documentação das suas práticas cotidianas; analisar como as professoras que realizam a documentação pedagógica compreendem esta prática; perceber se a documentação pedagógica tem contribuído para reflexão da prática docente e de qual maneira. As discussões acerca do registro das práticas em Educação Infantil têm sido ampliadas mais intensamente no início da última década. Presentes em documentos como o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (MEC, 1996) e com experiências desenvolvidas tanto em escolas públicas como privadas, a introdução da prática da documentação no campo da Educação Infantil aparece quebrando paradigmas em relação à compreensão da prática pedagógica. O conceito de documentação pedagógica surgiu a partir das abordagens italianas para a Educação Infantil e, especialmente à produção do pedagogo Loris Magaluzzi, que tem como foco principal a sistematização de percursos, elaboração da experiência e comunicação. A inserção, em nosso meio, de produções acerca da experiência italiana para a Educação Infantil, principalmente a desenvolvida na cidade de Reggio Emilia, certamente constituiu um impulso à ideia de “documentação pedagógica”, percebida como elemento intrínseco à proposta pedagógica para a Educação Infantil (MAGALUZZI, 1999). Os italianos trouxeram o conceito, mas Madalena Freire vem discutindo a necessidade dos registros desde os anos 90. O termo “registro das práticas” 12 derivado de seus estudos em seu livro Observação, Registro e Reflexão (1996), apresenta o registro como instrumento metodológico do “planejamento, observação e registro”. Para a autora, registrar a prática constitui em estudar a aula, refletir sobre o trabalho diário, e abrir-se ao processo de formação. Nesta direção, Ostetto, Oliveira e Messina (1998), apresentam no livro Deixando Marcas o resultado da pesquisa realizada no Núcleo de Desenvolvimento Infantil2 (NDI), onde o registro é tratado como instrumento reflexivo para a prática educativa. Passados mais de dez anos discutindo sobre a importância desses instrumentos para a reflexão da prática pedagógica ficam alguns questionamentos: Será que as professoras de Educação Infantil já incorporaram essa prática? E se já incorporaram, conseguem perceber a importância? Tais discussões acerca do registro e da documentação provocaram uma questão que norteou a pesquisa - O registro e a documentação pedagógica estão presentes no cotidiano das professoras da Rede Municipal de São José, e se estão presentes, contribuem para a reflexão e replanejamento das práticas cotidianas? A pesquisa mostra como a documentação pedagógica é relevante, principalmente para refletir a prática das professoras de Educação Infantil da Rede Municipal de São José, pois possibilita as professoras concretizarem seus pensamentos, tornando-o um material tangível e capaz de interpretação. Deste modo os registros de observação e a documentação são um espaço de produção de história de quem ensina e dos que aprendem, porquanto promove condições para o pensar e o repensar do próprio fazer, tendo como subsídio a teoria. Para Steier (apud DAHLBERG; MOSS E PENCE, 2003, p. 200), A documentação pedagógica pode contribuir para uma auto-reflexidade aprofundada e nos dizer algo sobre a maneira como temos nos constituídos como pedagogos, pois nos ajuda a “contar a nós mesmos uma história sobre nós mesmos. . A partir dessas questões apresento os resultados e as análises inseridas no capítulo: A Documentação Pedagógica na Educação Infantil e nos subcapítulos: A Observação e o Registro como Dimensões Reflexivas da Prática, O Registro do Vivido e As Formas de Registro e Documentação e ao final faço algumas 2 O Núcleo de desenvolvimento Infantil é um a Instituição de Educação Infantil ligada ao Centro de Ciências da educação da Universidade Federal de Santa Catarina. 13 considerações sobre os dados coletados durante a pesquisa. 14 2 CENTROS DE EDUCAÇÃO INFANTIL DA REDE MUNICIPAL DE SÃO JOSÉ A pesquisa abrangeu professoras de Educação Infantil de vinte e quatro Centros de Educação Infantil (CEI) da Rede Municipal de São José. Os CEI’s pesquisados foram: CEI APAM, CEI Bom Jesus de Iguape, CEI Flor de Nápolis, CEI Jardim Pinheiros, CEI José Nitro, CEI Los Angeles, CEI Manoel Cunha, CEI Maria de Lourdes Bott Philippi, CEI Morar bem, CEI Nossa Senhora Aparecida, CEI Nossa Senhora das Graças, CEI Nossa Senhora de Fátima, CEI Professora Ana Sperandio Battisti, CEI Professora Zenir Kretzer Borges, CEI Santa Inês, CEI Santo Antônio, CEI São Francisco de Assis, CEI São José I, São José II, CEI São Judas Tadeu, CEI São Luiz, CEI Vida Nova, CEI Vila Formosa e CEI Regina Bastos. O trabalho educacional das Instituições de Educação Infantil pesquisadas está alicerçado na Proposta Curricular da Rede Municipal de São José (2000), que descreve as Instituições como espaços onde as crianças passam grande parte da sua infância e estes espaços necessitam estar em constante processo de reflexão, avaliação, discussão e reestruturação do seu fazer pedagógico. De acordo com o documento citado: [...] a criança é vista como ser social, cultural e histórico e se constitui como tal nas relações que estabelece com o mundo, desde que nasce. É um ser que aprende e, porque aprende, se desenvolve. É um ser que deseja e , porque deseja, age relacionando-se com a realidade na busca de compreendê-la. Nesse processo, crianças e adultos vão se apropriando e produzindo cultura, tecendo histórias, significando e resignificando o mundo no qual estão inseridos. (p.182). A Instituição de Educação Infantil torna-se um lugar privilegiado de interações, mediações, interlocuções em torno da apropriação da cultura tanto pelas crianças como pelos professores. Como descreve o documento: [...] procurando assim, observar o movimento do grupo, suas preferências, suas dificuldades, suas alegrias, suas brincadeiras, e a forma como ocupam os mais diferentes espaços, como se organizam, se conseguem organizarse sozinhos ou se é necessária a intervenção do adulto ou de outro parceiro, como resolvem os conflitos, por que os conflitos aparecem: enfim, observar e incluir-se como membro deste grupo, interagindo, aprendendo, desenvolvendo-se mediando e propondo experiências que ampliem o repertório vivencial das crianças. (ibidem, p.183-184) Neste documento o Centro de Educação Infantil é considerado como um 15 espaço para as vivências das crianças, que necessita ser comprometido com a redefinição dos tempos, dos espaços, das práticas, tendo a criança como ponto de partida para delinear o cotidiano. 16 3 PERCURSO METODOLÓGICO: OS DESAFIOS DA PESQUISA Ao iniciar a pesquisa, havia apontado como procedimento metodológico um estudo de caso com algumas professoras da Rede Municipal de São José, mas segundo Pais (2003, p. 33), “[...] como o caminho se faz ao andar, o método que nos deve orientar é esse mesmo: o de trotar a realidade, passear por ela em deambulações vadias, indiciando-a de uma forma bisbilhoteira [...]” o estudo de caso acabou se transformando em um estudo de campo com todas as professoras da mesma Rede Municipal. A pesquisa foi realizada apenas com as professoras regentes de sala, das Instituições e, mesmo compreendendo que as auxiliares de sala ou professoras auxiliares também exercem a docência em conjunto com as professoras, não foi possível incluí-las nesta pesquisa, por falta de tempo em analisar o grande número de dados que seria gerado, o que poderá se concretizar em uma futura pesquisa de mestrado. Com o desenvolvimento da pesquisa e a análise do referencial teórico percebi que este era o caminho para responder as inquietações que esta investigação gerou. Apresentar a realidade e experiências de todos (ou quase todos) os CEIs do Município, talvez possibilitasse um melhor entendimento sobre o assunto e permitisse uma maior fonte de dados para a análise. De acordo com Marconi e Lakatos (1996), a pesquisa de campo é a fase realizada após o estudo bibliográfico, para que o pesquisador tenha um maior conhecimento sobre o assunto. Nesta etapa ele vai definir as hipóteses, o meio de coleta de dados, o tamanho da amostra e como os dados serão tabulados e analisados posteriormente. Esta pesquisa de campo é do tipo qualitativa, segundo Bogdan e Biklen (1982) a pesquisa qualitativa tem como fonte direta de dados, o ambiente natural e o pesquisador como seu principal instrumento. Neste caso o objetivo principal foi o de investigar a existência (ou não) de práticas de registro e documentação pedagógica, como instrumentos de reflexão, formação e planejamento, na atuação docente de professoras da Rede Municipal de São José. Para realizar a pesquisa, primeiramente fui a Secretaria da Educação do Município, onde fui bem recebida, tive orientações de que eu poderia visitar as 17 Instituições, esclarecer, propor e convidá-las a participarem da pesquisa caso elas aceitassem, então poderia iniciar a minha pesquisa de campo. Estava com expectativas que iria dar tudo certo, e ansiosa para iniciar a pesquisa. Na primeira semana do mês de setembro, visitei algumas instituições de Educação Infantil do Município de São José com o intuito de esclarecer sobre o que se tratava a pesquisa e deixar os questionários para as professoras responderem. Os questionários , de acordo com Vergara (2009), constituem um método de coleta de dados em campo composto por uma série de questões com variáveis que o pesquisador deseja averiguar. São úteis quando o pesquisador quer fazer o levantamento de dados com um grande número de respondestes. Para a autora, a utilização dos questionários apresenta algumas limitações, uma delas é a obtenção de respostas, geralmente é baixa a devolução, além disso, mesmo devolvido poderá haver questões sem resposta e para diminuir esta possibilidade, deve-se entrar em contato telefônico mais de uma vez, se necessário, com a pessoa que se propôs a entregar e recolher os questionários. Tudo isto foi vivido intensamente durante a pesquisa: um grande número de respondentes, muitas idas e vindas, baixa devolução dos questionários por parte das professoras. Durante o percurso da pesquisa senti algumas dificuldades, como a resistência de alguns CEIs em participar da pesquisa, muitas vezes, por já estarem saturados de estagiárias. Fiquei desanimada e cheguei a pensar que deveria mudar a temática da minha pesquisa. Porém, nas Instituições que visitei na sequência, percebi que as professoras estavam dispostas a ajudar, o que me deixou mais animada para dar continuidade ao percurso e superar os obstáculos iniciais. Desta forma visitei os outros CEIs deixando os questionários e combinando um dia para buscá-los, geralmente ficava combinado para a semana seguinte, para que as professoras tivessem tempo de responder e eu telefonava antes para confirmar se estavam prontos. Quando retornei às Instituições para buscar os questionários, fiquei um pouco decepcionada pelo número de questionários respondidos, a maioria das professoras não o respondeu. Mesmo as Instituições que foram acolhedoras e receptivas com a minha visita deram pouco retorno, o que não era esperado por mim. Percebi o quanto é difícil o campo do pesquisador, que conta com a colaboração dos participantes da pesquisa e nem sempre é correspondido como espera. Se, para a 18 pesquisadora, neste momento, o mais importante, o auge de seu trabalho é a pesquisa, para aquelas profissionais que estão lá na ponta, isto é só mais uma das inúmeras tarefas a realizar. Talvez a escolha das prioridades que devem ser realizadas no dia a dia ou a falta de tempo tenha sido o empecilho para alguma das professoras não responderem ao questionário da minha pesquisa ou até mesmo por não compreenderem a sua importância. No quadro abaixo estão relacionados os CEIs pesquisados, o número de professoras e os questionários respondidos: Nome das Instituições 1. Centro de Educação Infantil Apam 2. Centro de Educação Infantil Bom Jesus de Iguape 3. Centro de Educação Infantil Flor de Nápolis 4. Centro de Educação Infantil Jardim Pinheiros 5. Centro de Educação Infantil José Nitro 6. Centro de Educação Infantil Los Angeles 7. Centro de Educação Infantil Manoel Cunha 8. Centro de Educação Infantil Maria de Lourdes Bott Philippi 9. Centro de Educação Infantil Morar Bem 10. Centro de Educação Infantil Nossa Senhora Aparecida 11. Centro de Educação Infantil Nossa Senhora das Graças 12. Centro de Educação Infantil Nossa Senhora de Fátima 13. Centro de Educação Infantil Professora Ana Sperandio Battisti 14. Centro de Educação Infantil Professora Zenir Kretzer Borges 15. Centro de Educação Infantil Santa Inês 16. Centro de Educação Infantil Número de Professoras 06 Número de questionários respondidos 0 14 06 10 05 12 01 06 02 10 02 18 02 20 04 12 03 07 02 04 01 20 11 24 06 06 05 12 08 20 07 19 Santo Antônio 17. Centro de Educação Infantil São Francisco de Assis 18. Centro de Educação Infantil São José I 19. Centro de Educação Infantil São José II 20. Centro de Educação Infantil São Judas Tadeu 21. Centro de Educação Infantil São Luiz 22. Centro de Educação Infantil Vida Nova 23. Centro de Educação Vila Formosa 24. Centro de Educação Infantil Regina Bastos TOTAL 04 04 12 02 20 03 31 01 06 06 20 08 09 02 16 14 319 107 Quadro1: CEIs pesquisados Fonte: Elaborado pela autora, 2011. É possível perceber esta dificuldade de retorno dos questionários ao olhar para os números e ver que somente um terço das professoras respondeu e devolveu o material solicitado. Isto significa que os resultados obtidos com este trabalho de campo não revelam a realidade de uma maioria, mas de apenas um terço das professoras que estão atuando na Educação Infantil hoje. Após o levantamento dos dados feitos através dos questionários recolhidos nas Instituições, estes foram analisados e organizados, tendo por fundamento os autores Freire (1996), Ostetto (2001; 2008), Dahlberg, Moss e Pence (2003), Gandini e Goldhaber (2002), Kinney e Wharton (2009) e os objetivos que nortearam a pesquisa. Os dados gerados foram diversificados e numerosos o que favoreceu uma compreensão da realidade das professoras e dos CEIs e suas particularidades. 20 4 REFERENCIAL TEÓRICO: EDUCAÇÃO INFANTIL A DOCUMENTAÇÃO PEDAGÓGICA NA A terminação registro pedagógico aparece nas obras sobre Educação Infantil desde meados da década de 60, como na obra de Fostes e Headley (1967) denominada “Jardim de Infância”. Conforme Kramer apud Bonnar (2006), nesta época, na Europa e nos Estados Unidos a educação pré-escolar era baseada na privação cultural. A publicação citada documentava as informações sociais, econômicas e culturais das famílias e também registrava o desenvolvimento físico intelectual das crianças. De acordo com os autores Fostes e Headley (1967), o registro ajuda os professores e pais a compreenderem as crianças e servir como orientação para a idealização dos currículos e prover informações para pesquisa. Outro fator em evidência nesta produção é o registro cumulativo que de acordo com os autores tem a função de resumir a vida pré-escolar da criança preenchendo a lacuna existente entre a pré-escola e a 1ª série. Na década de 80, a Educação Infantil foi reconhecida legalmente como um direito e fundamentava-se basicamente nas contribuições da psicologia do desenvolvimento. Nicolau (1988, p. 290) menciona a observação como “o melhor instrumento para orientar, acompanhar e avaliar o desempenho infantil”, deste modo o relatório sobre a criança tornou-se uma abertura para o diálogo com as famílias. Ao final desta mesma década, Kramer se refere ao registro como uma estratégia para avaliação que além de ser um modo de observar as crianças, auxilia na elaboração do planejamento. De acordo com a autora, Diariamente, cada professor observa três a cinco crianças, fazendo anotações nos “relatórios de avaliação” individuais, de forma que avaliar se torne de fato um processo construído, não se prendendo somente aos momentos da entrega de cópia desses relatórios aos pais. Cada relatório é preenchido pela professora da turma e discutido com a supervisora. (KRAMER, 1989, p .97). Durante a década de 90 uma nova função para o registro é estabelecida. Como descreve a autora Warschauer (1993, p. 62), O registro ajuda a guardar na memória fatos, acontecimentos ou reflexões, mas também possibilita a consulta quando nos esquecemos. Este “ter presente” o já acontecido é de especial importância na transformação do agir, pois oferece o conhecimento de situações arquivadas na memória, 21 capacitando o sujeito a uma resposta mais profunda, mais integradora e mais amadurecida, porque menos ingênua e mais experiente, de quem já aprendeu com a experiência. Refletir sobre o passado (e sobre o presente) é avaliar nas próprias ações, o que auxilia na construção do novo. E o novo é a indicação do futuro. É o planejamento. Warschauer baseou-se na obra Madalena Freire “A paixão de conhecer o mundo” (1983). Nesta obra, Madalena, relata sua experiência como professora de educação infantil nos anos de 1978 a 1981 mediante os registros do cotidiano realizado pelas crianças e por ela. Abramowicz e Wajkop (1995) mencionam o diário e os relatórios como instrumentos pedagógicos do professor de Educação Infantil. Para as autoras, esses instrumentos permitem o registro do trabalho, e contribuem para a elaboração do planejamento e acompanhamento das crianças: “O registro escrito diariamente ajuda a organização e a reflexão constante do trabalho” (ABRAMOWICZ; WAJKOP, 1995, p. 22) e ajudam também para o registro individual e do grupo. Para elas, o relatório individual “é um relato-síntese do processo de crescimento da criança, das características apresentadas, de suas conquistas e dificuldades [...] e o relatório do grupo é uma síntese do trabalho coletivo realizado” (ABRAMOWICZ; WAJKOP, 1995, p. 23). Ostetto et al em 1998, apresentam o livro “Deixando Marcas”, como decorrência da pesquisa realizada no Núcleo de Desenvolvimento Infantil, no qual o registro é considerado um instrumento para a reflexão do professor. Aplicando os conceitos dos registros de Madalena (1995), Magalhães et al (1995), Kramer (1993) e Warschauer (1995), segundo as autoras, Como instrumento de trabalho, o registro vem associado ao planejamento e à avaliação. Assim, os rituais do planejamento, registro e avaliação compõem o fazer educativo do profissional que quer construir sua competência e qualidade no trabalho que desenvolve junto aos grupos de crianças. (OSTETTO et al, 2002, p. 23-24). Na bibliografia brasileira, o termo o registro é inclusive citado em documentos oficiais como o Referencial Curricular para Educação Infantil (MEC, 1996). Entretanto, cabe diferenciar registro e documentação. De acordo com o documento, o registro que o professor faz do seu trabalho pode fazer parte da documentação, entendida como um procedimento mais abrangente de sistematização e construção de memória sobre uma criança, um grupo ou uma escola. 22 No Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (MEC, 1998), o registro é apresentado interligado a observação e à avaliação formativa, nos 3 volumes do documento. Deste modo mostra que a observação e o registro são instrumentos que contribuem para a prática pedagógica e para o acompanhamento do desenvolvimento das crianças. Conforme o documento: Por meio deles o professor pode registrar, contextualmente, os processos de aprendizagem das crianças; a qualidade das interações estabelecidas com outras crianças, funcionários e acompanhar os processos de desenvolvimento obtendo informações sobre as experiências das crianças na instituição. Esta observação e seu registro fornecem aos professores uma visão integral das crianças ao mesmo tempo que revelam suas particularidades (BRASIL, 1998, v. 1, p. 58-59). Neste sentido, é importante ressaltar que a documentação pode estar a serviço do educador (como instrumento de reflexão da prática, avaliação da aprendizagem e do planejamento contribuindo com o processo de formação), das crianças (quando elaboram a memória do seu percurso junto ao educador), e dos pais (como acesso ao trabalho pedagógico e a trajetória da criança na escola). Mas o registro das práticas existiu em outras épocas nas escolas, antes mesmo do desenvolvimento de pesquisas ou de publicações dos referenciais curriculares, por meio de iniciativas individuais das professoras que os realizavam ou do coletivo e das instituições. Os Boletins dos Parques Infantis, por exemplo, possuía relatos das educadoras dos Parques que de acordo com Lopes (2009), continham indicações de como preencher fichas de observação das crianças. As nomenclaturas utilizadas: registro (MADALENA FREIRE, 1996), diário de aula (ZABALZA, 1996, 2004), portfólio (SÁ-CHAVES, 2004), documentação (MELLO, 2002, 2005) indicam concepções e maneiras de organização diferentes, mas não opostas. A ideia de registro remete as produções de Madalena Freire, se refere a ação de escrever, narrar e refletir sobre a atuação docente. Tem como foco o educador e a sua prática tornando a ideia autoavaliação mais próxima. Madalena Freire (1996) traz em seus textos a denominação do registro como instrumento metodológico do trabalho docente ao lado do planejamento, observação e reflexão. Os quatro elementos agregam-se a prática pedagógica, já que o registro possibilita a observação e a reflexão sobre a ação docente, que fornecem subsídios para o planejamento, e este sugere pontos para observação, registro e reflexão. 23 Para a autora o registro tem uma tarefa, “Tarefa que formaliza, dá forma, comunica o que pensa, para assim refletir rever, revisar, aprofundar, construir o que ainda não conhece: o que necessita aprender.” (MADALENA FREIRE, 1996, p.41) Enfim, para Madalena Freire, registrar a prática constitui em estudar a aula, refletir sobre o trabalho e abrir-se ao processo de formação. A documentação por sua vez, empregada mais especificamente na bibliografia italiana, tem como objetivo sistematizar o trabalho pedagógico, ou seja produzir memória sobre o percurso de desenvolvimento e aprendizagem da criança e do professor por meio da organização de diversos registros. De acordo com Mello (2002), a documentação beneficia o alcance de diversos objetivos: promove o trabalho alcançado pela instituição; dá visibilidade ao projeto educacional; fornece informações para os envolvidos no trabalho educativo como: professores, alunos e por outros; concretiza o experimentado e vivido por meio da memória das mediações e elaborações. Para a autora,[...] começamos a procurar as explicações teóricas para entender a prática e começamos a planejar a prática experimentando a teoria... se registramos esse processo, ao final teremos um aprendizado consciente. (Mello, 2005, p.3) A documentação envolve os registros dos fatos ocorridos, das situações vividas, das tarefas realizadas, das vozes manifestadas no dia a dia da sala de aula, mas também, abrange reflexões fundamentais para a compreensão do que foi realizado, bem como ao esboço do que está por ser feito. O registro é uma parte da documentação. Integra-a, mas não a constitui. Sua importância se confirma quando, [...] o educador [o] faz com intenção de aprender com ela [com sua prática],... não é registro para a burocracia da escola, não é observação das crianças com o objetivo de avaliar seu desenvolvimento, mas tem como objetivo o estabelecimento de uma relação cada vez mais consciente do educador com sua própria prática e com a teoria que orienta sua prática. (MELLO, 2005, p.1). Já o portfólio pode ser entendido como uma modalidade de documentação. Segundo Sá Chaves (2004), no livro “Portfolios Reflexivos: estratégias de formação e de supervisão” descreve que a construção do portfólio na formação inicial pode auxiliar na reflexão e a construção de uma profissionalização docente, favorecendo a compreensão do processo de aprendizagem dos estudantes. Cabe aqui destacar que a utilização dos portfólios não se restringe apenas a formação docente; existem 24 referências da utilização desse instrumento na Educação Infantil e no Ensino Fundamental como forma de tornar visível da trajetória de aprendizagem das crianças. A autora define o portfólio reflexivo como: (...) trata-se de uma estrutura dinâmica definida em função de um objetivo explícito; integra no processo descrição-narração-reflexão-(meta)reflexão as experiências práticas e as teorias que a sustentam; recorre a fonte múltiplas de evidências (relatos, fotografias, observações, instrumentos de pesquisa, textos de apoio, auto-reflexões, cassetes e/ou vídeogravações...); constitui um documento autêntico (existe uma ligação direta entre os fatos experiências e os seus relatos, tidos como parte da evidência); captura o crescimento e a mudança no conhecimento do formando ao longo do tempo; é uma peça única. (SÁ-CHAVES, 2004, p.22-23.) O portfólio portanto, uma oportunidade para contribuir com o processo de desenvolvimento pessoal e profissional, pois possibilita a reflexão, o enriquecimento conceitual, estímulo a criatividade, a construção do conhecimento e a autoavaliação. Deste modo, o portfólio pode constituir uma estratégia de formação, avaliação e investigação. Os diários de aula aproximam-se da ideia de registro das práticas. Miguel Zabalza (2004), considera os diários de aula como instrumentos para o desenvolvimento profissional e pesquisa. Escreve que a atividade profissional é para ele uma maneira de conscientizar-se, distanciando-se e refletindo sobre a aprendizagem, elementos que considera essenciais a formação continuada. Para o autor “O bom de um diário, o que se torna um importante documento para o desenvolvimento pessoal, é que nele se possa contrastar tanto o objetivo-descrito como o reflexivo-pessoal.” (ZABALZA, 2004, p.16). O autor sugere a utilização do diário além da formação inicial, que seja utilizado também na formação permanente dos professores e professoras. Ele conceitua os diários como “[...] documentos em que os professores e professoras anotam suas impressões sobre o que vai acontecendo em suas aulas.” (ZABALZA, 2004, p.13). Logo, os diários podem ser alterados de acordo com o conteúdo, periodicidade e função que desempenham. Para o autor os impactos formativos dos diários são: • Entrar no mundo do professor: capacidade de percepção de teorias e crenças pessoais, de reflexão sobre vivência e reconstrução do vivido; 25 • Solução para explicar os próprios dilemas da atuação profissional; • Acesso à avaliação e a reajuste de processos didáticos; • Meio para o desenvolvimento profissional permanente. Segundo o autor, os diários trazem ainda outras possibilidades, como o saber: habituam os professores a refletir e a escrever; beneficiam o feedback imediato e permanente; promovem o compartilhamento de experiências e são compatíveis a outros processos de formação continuada. O passado quando registrado, documentado e refletido elucida o presente e aponta referencias para pensar e planejar o futuro. Gandini e Goldhaber (2002) expressam em sua concepção de documentação pedagógica, em parte, o que antes afirmara Warschauer (1993, p.63) acerca do registro, com ênfase especial à importância da valorização e compreensão da linha temporal. [...] vejamos a historicidade do processo de construção dos conhecimentos, porque ilumina a história vivida e auxilia a criação do novo a partir do velho. Oferece segurança porque relembra as dificuldades anteriores e a sua superação, dando coragem para enfrentar novos desafios e dificuldades, que, como as anteriores, poderão ser superadas. A documentação é mais que reunir textos, tarefas, instruções, fotos, filmes entre outros. A junção dos elementos componentes é um momento essencial para que a documentação cumpra a sua função de afirmar o trabalho docente e evidenciar a qualidade do desenvolvimento e da aprendizagem alcançados por cada criança. Em Reggio Emilia3, província localizada na Itália, existe um programa para primeira infância que ficou conhecido como uma das melhores propostas para a educação de crianças pequenas. Esta abordagem italiana tem como objetivo atender a diversidade e necessidades das crianças e suas famílias. Essas experiências valorizam a infância, pois as crianças são reconhecidas como sujeitos sociais autônomos (GALARDINI, 1996) que tem direito a cidadania e políticas pensadas para elas que são garantidas de forma concreta. Um importante destaque é a formação dos educadores em serviço nas instituições italianas. Lá, realizam projetos de formação ligados à prática educativa, 3 Região no norte da Itália, cujas Instituições de Educação Infantil tornaram-se visíveis aos olhos de todo o mundo quando, em 1991, a Newsweek escreveu um longo artigo destacando a sua escola voltada a crianças pequenas como sendo a melhor do mundo. 26 proporcionando aos professores conhecimentos, repertórios metodológicos, equilíbrio e motivação para sustentar a carga emocional exigida pelo trabalho com as crianças pequenas. Formação esta centrada na observação, reflexão, na documentação e na mudança, elementos essenciais na constituição de um educador. Galardini (1996) considera que esse conjunto tenha beneficiado o crescimento da documentação das experiências, da prática de registro exercida no cotidiano. Para Malaguzzi (1999), a documentação é uma forma de dar visibilidade ao trabalho desenvolvido nas Instituições de Educação Infantil, como maneira de construir uma imagem de “criança competente” – não apenas como objeto da educação, mas pessoa, sujeito de sua história. Na experiência de Reggio Emilia, documentar significa apropriar-se das experiências e refletir sobre elas no processo de construção de um projeto educacional. No processo de qualificação e construção de uma proposta pedagógica, formação continuada, reflexão e documentação tornam-se indispensáveis. A documentação é entendida também com uma forma de atribuir visibilidade a criança enquanto pessoa e ser pensante. Dahlberg, Moss e Pence (2003), avaliam a documentação pedagógica como um procedimento para encorajar uma prática reflexiva e democrática, permitindo a construção de novos significados. Deste modo “a documentação pedagógica pode funcionar como instrumento para abrir uma prática critica e reflexiva que desafie os discursos dominantes e construa contra discursos.” (DAHLBERG, MOSS, PENCE, 2003, p.199). A vinculação da experiência italiana para a Educação Infantil brasileira parece ter sido influente, nas pesquisas, nos debates e nas práticas cotidianas dos professores de Educação Infantil. Com um cenário teórico inovador, o registro é considerado por eles como parte integrante da documentação pedagógica, composta pelos professores, crianças e instituição. Segundo Dahlberg et al (1999, p.148) “A “documentação” como conteúdo é o material que registra o que as crianças estão dizendo, fazendo e produzindo e como o pedagogo se relaciona com as crianças e seu trabalho.” O apontamento das diferenças nas abordagens, parece haver como ponto principal e fundamental a ideia da reflexão da prática docente. É a necessidade da reflexão, seja sobre o trabalho, as crianças ou sobre si, que justifica a produção dos 27 registros, o que entrelaça a concepção de escrita com a organização do pensamento 4.1 A OBSERVAÇÃO E O REGISTRO COMO DIMENSÕES REFLEXIVAS DA PRÁTICA Observar requer da professora um direcionamento a partir dos seus objetivos, um olhar atento as situações vividas pelas crianças e que são relevantes para serem registradas. A observação deve estar presente na sala de aula e dela devem resultar informações que irão constituir a documentação pedagógica. Ao observar a professora precisa saber o que quer constatar, como pretender coletar aquelas informações e quais as suas intenções ao coletá-las. Quando observa, a professora tem seus olhos direcionados por um referencial teórico que muitas vezes é imperceptível para si. De acordo com Gandini e Goldhaber (2002, p.151), [...] a documentação pedagógica não é considerada aqui como uma mera coleta de dados realizada de maneira distante, objetiva e descompromissada. Pelo contrário, ela é vista como uma observação aguçada e uma escuta atenta, registrada através de uma variedade de formas pelos educadores que estão contribuindo conscientemente com sua perspectiva pessoal. O registro, no contexto da documentação pedagógica, não é produzido apenas para relembrar fatos, diálogos, situações, choros e risos. Ele é realizado para favorecer uma reflexão da prática, para permitir as professoras ajustes com as apropriações objetivadas pelo grupo. Por meio das análises dos gráficos gerados a partir da pesquisa, articulados aos estudos teóricos acerca dos registros e documentação pedagógica, exponho um pouco a realidade das professoras participantes da pesquisa, para situar a origem das informações utilizadas. Entre as professoras que participaram da pesquisa cerca de 1,87% entre 18 e 25 anos, 17,76% tem entre 26 e 30 anos, 40,19% possuem entre 31 e 40 anos, 36,45% possuem entre 41 e 50 anos e 3,74% acima de 50 anos. 28 Gráfico1: Faixa etária das professoras participantes da pesquisa Fonte: Elaborado pela autora, 2011. Quanto ao tempo de formação, 16% estão formadas até 2 anos, 36% estão formadas entre 3 a 5 anos, 21% estão formadas entre 6 e 10 anos e 28% estão formadas a mais de 11 anos. Gráfico 2: Tempo de formação das professoras participantes da pesquisa Fonte: Elaborado pela autora, 2011. As professoras participantes da pesquisa, 6% atuam até 2 anos na Educação, 18% entre 3 e 5 anos, 27% entre 6 e 10 anos e 50% a mais de 11 anos. Como mostra o gráfico a seguir. 29 Gráfico 3: Tempo de atuação na educação Fonte: Elaborado pela autora, 2011. De acordo com o gráfico que segue 97% das professoras relataram que o registro e a documentação pedagógica estão presentes em suas práticas e 3% que os mesmo não se fazem presentes em suas práticas. Gráfico 4: Presença de registro e documentação pedagógica nas práticas das professoras Fonte: Elaborado pela autora, 2011. 30 Para essas professoras que confirmaram a presença dos registros em suas práticas, as razões são as mais diversas, entre elas, as mais recorrentes são: “A documentação auxilia para ver o que foi realizado com as crianças e para que possamos refletir sobre a nossa prática.” “Através dos registros observamos se os objetivos foram alcançados, contribuindo também para novas mudanças.” “A partir dos registros faço anotações dos principais acontecimentos do dia e, principalmente, sobre a evolução de cada criança.” “A documentação é indispensável para realizarmos um planejamento de acordo com os interesses das crianças.” “A documentação auxilia na produção dos portfólios das crianças para apresentar para as famílias como elas evoluíram.” Todas as professoras participam de formação continuada, que na sua maioria são as oferecidas pela Rede Municipal. Entre as temáticas mais citadas estão a Semana da Educação, Dimensões do Desenvolvimento Infantil, Inclusão, Brincadeiras e Documentação Pedagógica. Estas informações são ilustradas nos gráficos que seguem. 31 Gráfico 5: Participação das professoras pesquisadas em formação continuada Fonte: Elaborado pela autora, 2011. Gráfico 6: Temáticas abordadas com mais freqüência em formação continuada Fonte: Elaborado pela autora, 2011. Na sua formação inicial como professoras, 67% tiveram experiência com o registro e a documentação pedagógica e 21% não tiveram experiência alguma. 32 Gráfico 7: Experiência com registro e documentação pedagógica durante a formação Fonte: Elaborado pela autora, 2011. Dentre estas professoras que participaram da pesquisa, conforme o gráfico a seguir, 30% entendem que a documentação pedagógica é o registro das produções das crianças, 21% acham que é o registro do cotidiano da Instituição e 31% acreditam a documentação refere-se ao registro da sua prática. Gráfico 8: Entendimento sobre registro e documentação pedagógica Fonte: Elaborado pela autora, 2011. Conforme afirmado por elas: 33 “Acredito que o registro demonstra o caminho traçado, bem como o rumo que se deve tomar, as dificuldades, os avanços e também aponta novas possibilidades.” “Através da documentação tem-se uma reflexão das experiências vivenciadas no dia a dia do CEI.” “A documentação e o registro envolvem a prática pedagógica desde o planejamento diário até a produção dos portfólios das crianças.” “A documentação é o registro das produções das crianças, bem como suas dificuldades e superações ao longo do ano.” “O registro é uma ferramenta importante para a reflexão da nossa prática pedagógica, procuro revisitá-lo sempre que necessário.” Nesta mesma perspectiva, Ostetto (2008, p.13) afirma: Por meio do registro travamos um diálogo com nossa prática, entremeando perguntas, percebendo idas e vindas, buscando respostas que vão sendo elaboradas no encadeamento da escrita, na medida em que o vivido vai se tornando explícito, traduzido e, portanto passível de reflexão. O registro é um modo de articular a própria prática, em que o agir permanente e a sua sistematização permitem a interlocução sobre o que se registra e o que é concretizado. Para 26% das professoras os registros são utilizados para rever a sua prática, 35% para acompanhar a evolução do grupo de crianças, 22% são utilizados para realizar o planejamento das atividades com as crianças ao longo do dia, como está exposto no gráfico que segue. 34 Gráfico 9: Forma de utilização do registro pelas professoras pesquisadas Fonte: Elaborado pela autora, 2011. De acordo com as mesmas: “Os registros servem para descrever as atividades em sala e para observar o desenvolvimento das crianças.” “O registro auxilia no meu trabalho como professora, pois com ele repenso a minha prática e como devo prosseguir com as crianças.” “Observo os pontos positivos e negativos do que registrei, o que contribui para melhorar o desempenho das propostas dentro do planejamento.” “Registro no meu caderno de plano de aula. Utilizo-os para relembrar as estratégias e atividades que foram bem aceitas pelas crianças.” “O registro é algo necessário para tornar a prática significativa.” “Ao registrar consigo perceber os avanços, superações e 35 dificuldades de cada criança no processo de aprendizado”. Segundo Madalena Freire (1996), por meio dos registros, armazenam-se informações do objeto de estudo, para ser capaz de refletir sobre ele, pensá-lo e só assim apreendê-lo, para depois transformá-lo construindo um conhecimento antes ignorado. Por este motivo o escrito amplia a memória e deixa registrado o processo com seus momentos e movimentos da produção do grupo. Desencadeando um processo reflexivo sobre a compreensão da prática, levando a melhorar o que é preciso junto com as crianças. O registro do percurso diário da prática docente permite, em sua leitura, tomar certo distanciamento do que foi realizado, revê-lo e dar novas direções ao trabalho, permitindo a construção de um instrumento reflexivo. Com a prática do registro, é possível ler a realidade, aprender a ouvir o grupo e refletir sobre o que é necessário melhorar no dia a dia juntamente com as crianças. Sobre essa questão, Messina, Oliveira e Ostetto (2001, p. 21) afirmam que, “O registro é esse convite a ver o que de bom já sabemos fazer e o que ainda não sabemos e precisamos aprender. É um convite a desmontar o jogo do “tudo ou nada” através da revelação de nossa inteireza: cabeça e coração.” 4.2 O REGISTRO DO VIVIDO A documentação é um recurso que permite uma melhor compreensão do que as crianças querem nos mostrar. Ao registrarem as experiências vivenciadas, as crianças deixam as marcas da sua passagem, a forma como pensam e como se sentiram naquele momento. A documentação, interpretada e reinterpreta junto com outros educadores e crianças, oferece a opção de esboçar roteiros de ação que não são construídos arbitrariamente, mas que respeitam e levam em consideração todas as pessoas envolvidas. O processo de documentar é capaz de ampliar a compreensão dos conceitos e das teorias sobre as crianças com a convicção de que, tanto para as crianças quanto para os adultos, a documentação serve de apoio aos seus esforços para entender e para se fazer entender. (GANDINI; GOLDHABER, 2002, p.150). Na medida em que se registra, qualificam-se os fatos do cotidiano educativo e 36 percebe-se o valor de cada ação. Não é apenas contar o que aconteceu no dia, mas estabelecer relações com a continuidade do trabalho, tentar compreender o passado e assim aprender com a experiência. Para Warschauer (1993, p. 62 apud Ostetto, 2008, p. 20), O registro ajuda a guardar na memória fatos, acontecimentos ou reflexões, mas também possibilita a consulta quando nos esquecemos. Este “ter presente” o já acontecido é de especial importância na transformação do agir, pois oferece o conhecimento de situações arquivadas na memória, capacitando o sujeito a uma resposta mais profunda, mais integradora e mais amadurecida, porque menos ingênua e mais experiente, de quem já aprendeu com a experiência. Quase todas das professoras, 99% como mostra o gráfico a seguir, compreendem que a prática do registro auxilia no seu trabalho docente, enquanto apenas 1% não percebe essa importância do registro no seu trabalho pedagógico. Gráfico 10: A prática do registro auxilia no trabalho docente Fonte: Elaborado pela autora, 2011. Cerca de 10% das professoras defendem que o registro auxilia no planejamento diário, 35% na avaliação das crianças e 44% que o registro auxilia na reflexão da prática. 37 Gráfico 11: Forma que o registro auxilia no trabalho docente Fonte: Elaborado pela autora, 2011. As professoras descreveram: “O registro ajuda no ato de refletir sobre as atividades em sala, para relembrar acontecimentos no trabalho com as crianças.” “O registro é a base para eu desempenhar e dar continuidade no meu trabalho junto às crianças.” “Com o registro tenho suporte para conhecer o grupo de crianças e para a proposição dos conteúdos.” “Através do registro podemos ter um outro olhar sobre a nossa prática pedagógica.” “É importante para avaliar as crianças em vários aspectos, para saber como elas realizam as brincadeiras, as atividades...” “O registro e a documentação pedagógica relatam as informações e particularidades do grupo e das crianças individualmente no decorrer das propostas, suas percepções, inseguranças, desafios e conquistas”. De acordo com Malaguzzi (1999), a documentação possibilita às crianças e 38 aos professores a construção de memória que permite revisitar falas e ações construindo novos significados. Documentar implica reconhecer o valor do trabalho, levar a sério as produções e fala das crianças. O processo de documentação instiga os esforços das crianças em se fazer entender permitindo-lhes reformular suas indagações e seus pensamentos, aprendendo a escutar as outras, enquanto constroem em conjunto seus significados e relacionamentos. Para os adultos, o processo de documentação amplia o nosso entendimento sobre os conceitos que as crianças estão elaborando, sobre as teorias que elas estão construindo e sobre os questionamentos que elas propõem. O processo de documentação nos une como comunidade de aprendizagem e nos desafia a expressar os nossos pensamentos, articulada e publicamente, e a aceitar a responsabilidade, como sugere Carla Rinaldi (1998), de escutar atentamente a fim de compreender o ponto de vista dos outros. (GANDINI; GOLDHABER, 2002, p. 161). Registrar é um ato fundamental, pois de acordo com Ostetto (2008, p. 22), “O ato de registrar poderá ajudar no exercício de “desabituar-se”. Escrevendo, poderemos limpar os olhos, clarear a visão, para melhor percebermos as crianças que estão em nosso grupo, assim como as relações que vamos construindo”. Ao registrar, percebemos os fatos do dia a dia e aprendemos a ver cada criança em particular e os acontecimentos em grupo, que às vezes, passam despercebidos na correria habitual. E que cada criança está em busca de tempo para viver a sua infância, tempo este que nem sempre cabe no planejamento diário do professor. A documentação é uma forma de relacionamento do professor com o aluno, pois ele elabora junto com as crianças a memória pessoal, que lhes deixa reconstruir por si sós a experiência adquirindo a consciência das mudanças. O professor intervém para dar estímulo à produção e a organização de marcas representativas das experiências vividas, de maneira que possibilite a percepção do percurso, favorecendo o processo de reconstrução da história. 4.3 AS FORMAS DE REGISTRO E DOCUMENTAÇÃO O registro e a documentação podem ser produzidos de várias maneiras, por exemplo, podem ser observações manuscritas, registros de áudio ou vídeo, 39 fotografias ou por meio do próprio trabalho realizado pelas crianças, ou seja, das produções infantis. São instrumentos que se tornam uma fonte importante de dados, informações e materiais que podem auxiliar as professoras a refletir diariamente sobre as experiências vividas e permitem construir teorias que são baseadas no conhecimento adquirido através desta prática. Permitem também analisar a maneira como a relação do professor com ele mesmo e com a criança está sendo construída. Para Dalhberg, Moss e Pence (2003, p. 194) a Documentação Pedagógica é: [...] como conteúdo, é o material que registra o que as crianças estão dizendo e fazendo, é o trabalho das crianças e a maneira com que o pedagogo se relaciona com elas e com o seu trabalho. Tal material pode ser produzido de muitas maneiras e assumir muitas formas – por exemplo, observações manuscritas do que é dito e feito, registros em áudio e vídeo, fotografias, gráficos de computador, o próprio trabalho das crianças, incluindo, por exemplo, arte realizada no atelier com o atelierista. Este material torna o trabalho pedagógico concreto e visível (ou audível) e, como tal, é um ingrediente importante para o processo da documentação pedagógica. Quanto à frequência dos registros, de acordo com o gráfico abaixo, 12% das professoras os realizam diariamente e/ou semanalmente, 6% quinzenalmente, 48% semanalmente e 35% diariamente. Gráfico 12: Frequência que os registros são realizados Fonte: Elaborado pela autora,2011. Ao serem questionadas sobre o local e horário em que realizam os registros, 40 as professoras responderam, conforme gráfico abaixo que 14% os realizam durante as aulas, 17% durante os intervalos das aulas, 28% no fim do dia e 31% realizam os registros em casa. Ou seja, elas encontram lugares e espaços para registrar, seja durante o descanso das crianças, no horário da educação física, ao final do dia quando parte já foi embora, mas a maioria realiza os registros em casa. Gráfico 13: Local e horário de realização do registro Fonte: Elaborado pela autora,2011. As professoras expuseram como fazem seus registros e suas maiores dificuldades: “Utilizo muito as fotos no meu registro, gosto da documentação fotográfica para relembrar o acontecido”. “Geralmente realizo os meus registros, em casa no final do dia, o que falta é tempo.” “Faço os registros no término da tarde, quando as crianças vão embora. A dificuldade é não conseguir registrar tudo que considero importante devido à correria do dia a dia.” “Em momentos organizados pela coordenação do CEI, onde 41 disponibilizam momentos para as professoras estarem juntas relatando as suas dificuldades.” “Na sala, nos momentos de atividades externas, como o parque ou a aula de educação física. Tenho mais dificuldades e registrar quando estou sozinha com as crianças.” “Durante a jornada, faço pequenos bilhetes e ao final do dia junto todos em um texto.” De acordo Freire (1996), uma das maiores dificuldades das professoras é tornar essa prática uma tarefa indispensável. O registro reflexivo é um instrumento de aperfeiçoamento do pensar e é necessário reservar tempo, para realizá-lo. O registro dos fatos, situações e acontecimentos que envolvem o dia-a-dia da sala de aula, torna-se um importante instrumento para o professor que comprometido, busca constantemente aprimorar sua prática junto à turma de crianças. Segundo Ostetto, Oliveira e Messina (2002, p. 24), “Registrar é responsabilizar-se por seus desígnios, seus projetos. É lançar-se para frente. Ver-se e rever-se. É envolver-se com o resgate do seu processo criativo que envolve, necessariamente o resgate da sua palavra.” Dalhberg; Moss, Pence (2003, p.194), dizem que a documentação pedagógica precisa ser “interpretada e reinterpretada junto com outros educadores e crianças”. Mas, para que tanto os registros escritos, como os fotográficos ou fílmicos sejam considerados instrumentos importantes para conhecer as crianças, de acordo com Gandini e Goldhaber (2002, p. 152) [...] é necessário que registremos o que vemos e ouvimos, elaborando registros significativos das nossas observações. Podemos fazer anotações rápidas que posteriormente reescreveremos de maneira extensa, gravar em fitas cassete as vozes e as palavras das crianças ao interagirem entre si e conosco. Também podemos tirar fotografias e slides, ou até mesmo gravar fitas de vídeo que mostrem as crianças e os professores em atividade. O próprio trabalho das crianças e as fotografias desse trabalho devem ser considerados essenciais. Documentar implica reconhecer o valor do trabalho, levar a sério as produções e fala das crianças. Edwards, Gandini e Forman (1999), atribuem 42 diversas finalidades para prática de documentar os processos pedagógicos: • Mostrar para os pais, do quanto, do que e do como os seus filhos estão aprendendo e se desenvolvendo; • Deixar a criança revisitar as suas experiências, olhando o que fizeram e ouvindo o que disseram; • Garantir que o grupo pode crianças e cada criança individualmente, possa se observar de um ponto de vista exterior enquanto está aprendendo, de modo a perceberem o quanto suas realizações são significativas; • Permitir que os educadores se tornem pesquisadores de suas práticas desvelando-as, de maneira que possam reconstruir-se em seus reconstituir e reinterpretar suas aprendizagens enquanto acompanham a caminhada do aprendizado de seus alunos. Por meio da documentação os professores escutam e observam as crianças, possibilitando conhecê-las melhor para respeitá-las. É uma forma cooperativa de leitura das experiências e reflexão sobre elas, que envolve a coleta de informações, a seleção de dados e a sua interpretação (GANDINI, GOLDHABER, 2002). A documentação permite entender como as crianças constroem e exploram a sua leitura de mundo, e como ocorrem seus processos de aprendizagem. 43 5 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES Chegar ao final da pesquisa implica em retomar o problema e os objetivos a fim organizar as conclusões tecidas ao longo da investigação, e descrever os avanços em termos de produção do conhecimento. Após realizar o levantamento bibliográfico, vivenciar na pesquisa de campo a realidade das professoras de Educação Infantil na Rede Municipal de Ensino de São José, acredito ter respondido, ainda que de maneira provisória, a pergunta da pesquisa: O registro e a documentação pedagógica estão presentes no cotidiano das professoras da Rede Municipal de São José, e se estão presentes, contribuem para a reflexão e replanejamento das práticas cotidianas? Pude confirmar a inserção do registro das práticas e documentação pedagógica nas Instituições, entretanto, em cada contexto a documentação foi/está sendo constituída de modo particular, à luz das necessidades e do percurso de cada grupo. Trata-se de um instrumento em construção, por isso não existe uma forma de documentar, mas inúmeras, tantas quanto forem às necessidades e realidades. Nesse processo, o registro e a documentação pedagógica foram sendo compreendidos nas seguintes categorias que surgiram das análises das respostas das professoras: A Documentação Pedagógica na Educação Infantil, A Observação e o Registro como Dimensões Reflexivas da Prática, O Registro do Vivido e as Formas de Registro e Documentação. O registro implica na produção de marcas sobre uma experiência, e está ligado a observação e ao planejamento. É com base nas várias formas de registro que são produzidas as documentações, entendidas como a organização de dados com vista a comunicação de experiências. A documentação - produzida não somente pelas professoras, mas também pelas crianças, possibilita a apropriação do conhecimento, a tomada de consciência de seu percurso na construção da sua identidade. Possibilita às famílias a oportunidade de conhecer os trabalhos desenvolvidos pelo grupo e as conquistas das crianças. Favorece também, o reconhecimento da Instituição de Educação Infantil como espaço de aprendizagem, de desenvolvimento, de produção de saberes e da criança como produtora de cultura. O tempo e lugar são fatores de relevância na produção dos registros e da documentação pedagógica e que deve ser oferecido para que as professoras 44 possam realizar os seus registros e sistematizá-los ao planejamento, de maneira que nos espaços de formação em serviço, esses olhares sejam partilhados com o outro e mediados pela teoria. Com a utilização da documentação pedagógica é necessário ter ações intencionais, que visam considerar as aprendizagens constituídas pelas crianças bem como a meditação sobre elas, para alcançar os fins considerados fundamentais orientados por uma prática reflexiva que repense os caminhos traçados para as formas de ensinar as crianças. Desta forma, esta pesquisa leva a considerar que o registro e a documentação pedagógica são ferramentas que fazem parte da atividade docente das professoras de Educação Infantil da Rede Municipal de São José e contribuem significativamente para a formação das mesmas, a partir do momento que são interpretadas e discutidas dentro e fora de sala por meio dos relatos e das experiências vividas ao longo do caminho percorrido. 45 REFERÊNCIAS ABRAMOWICZ, A; WAJSKOP, G. Creches atividades para crianças de zero a seis anos. São Paulo: Moderna, 1995. BODNAR, Rejane. A Observação e o Registro Pedagógico na Formação em Serviço: um estudo sobre as relações teórico práticas com professoras da educação infantil. 2006, dissertação (Mestrado em Educação), UFSC. BOGDAN, R. e BIKLEN, S.K. Qualitative Research for Education. Boston, Allyn and Bacon, inc., 1982. BRASIL. MEC. Referenciais Curriculares para Educação Infantil. Brasília: MEC, SEB, 1996. _______.MEC. 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Porto Alegre: Artmed, 2004. 47 APÊNDICE 1 – TABULAÇÃO DOS DADOS Idade 18-25 anos 26-30 anos 31-40 anos 41-50 anos Acima de 50 anos Total Ocorrência Percentual 2 1,87% 19 17,76% 43 40,19% 39 36,45% 4 3,74% 107 100,00% Tempo de atuação Até 2 anos 3-5 anos 6-10 anos Acima de 11 anos Total Ocorrência Percentual 6 5,61% 19 17,76% 29 27,10% 53 49,53% 107 100,00% Tempo que está formada Até 2 anos 3-5 anos 6-10 anos Acima de 11 anos Total Ocorrência Percentual 17 15,89% 38 35,51% 22 20,56% 30 28,04% 107 100,00% Participa de formação continuada Sim Não Total Ocorrência Percentual 107 100,00% 0 0,00% 107 100,00% Últimos cursos que participou Inclusão Semana da Educação Brincadeiras Dimensões Documentação Pedagógica Outros Total Ocorrência Percentual 20 18,69% 30 28,04% 13 12,15% 22 20,56% 9 8,41% 13 12,15% 107 100,00% 48 Entendimento sobre o registro e documentação pedagógica Ocorrência Percentual É o registro de produções das crianças 32 29,91% É o registro do cotidiano do CEI 23 21,50% É o registro da prática pedagógica 33 30,84% Outros 18 16,82% Não sabe/ Não conhece 1 0,93% Total 107 100,00% Experiência com registro e documentação pedagógica em sua formação inicial Ocorrência Percentual Sim 72 67,29% Não 22 20,56% Não respondeu 13 12,15% Total 107 100,00% Realiza registro das práticas cotidianas Sim Não Total Ocorrência Percentual 104 97,20% 3 2,80% 107 100,00% Frequência de registros das práticas cotidianas Ocorrência Percentual Diários 36 34,62% Semanais 50 48,08% Quinzenais 6 5,77% Diários e Semanais 12 11,54% Total 104 100,00% Momento que produz os registros Durante as aulas Durante os intervalos das aulas No fim do dia Em casa Outros Total Os registros são utilizados para Ocorrência Percentual 15 14,02% 18 16,82% 30 28,04% 33 30,84% 11 10,28% 107 100,00% 49 Rever a prática Acompanhar o a evolução do grupo Realizar planejamento das atividades Outros Não respondeu Total Ocorrência Percentual 28 26,17% 37 34,58% 24 15 3 107 22,43% 14,02% 2,80% 100,00% Acredita que o registro auxilia no trabalho docente Ocorrência Percentual Sim 106 99,07% Não 1 0,93% Total 107 100,00% Como o registro auxilia no trabalho docente Ocorrência Percentual Reflexão das práticas 47 43,93% Avaliação das crianças 37 34,58% Planejamento diário 11 10,28% Outros 7 6,54% Não responderou 5 4,67% Total 107 100,00% Tabulação dos Dados Fonte: elaborada pelo autor, 2011. 50 APÊNDICE 2 - QUESTIONÁRIO 1. Qual a sua idade? ( ) entre 18 e 25; ( ) 26 e 30; ( ) 31 e 40; ( ) 41 e 50; ( ) acima de 50 anos. 2. Tempo de atuação na área: ( ) até 2 anos; ( ) 3 a 5 anos; ( ) 6 a 10 anos; ( ) acima de 11 anos. 3. Há quanto tempo está formada? .................................................................................................................................. 4. Participa de formação continuada? Quais os últimos cursos que participou? .............................................................................................................................................. ...................................................................................................................... 5. O que entende por registro e documentação pedagógica? .............................................................................................................................................. ...................................................................................................................... 6. Teve alguma experiência com a documentação e o registro na sua formação inicial como professora? Qual? .............................................................................................................................................. ...................................................................................................................... 7. Realiza o registro e documentação das práticas cotidianas? Se realiza, com qual frequência: ( ) diários; ( ) semanais; ( ) quinzenais 8. Em que momento os produz? Quais as dificuldades? .............................................................................................................................................. ...................................................................................................................... 9. O que faz com os registros? Como os utiliza? .............................................................................................................................................. ...................................................................................................................... 10. Você acredita que o registro auxilia no seu trabalho como professora ou não? Por quê? ..............................................................................................................................................