4 | PORTO ALEGRE, SÁBADO, 9/04/2005 REPORTAGEM ESPECIAL ZERO HORA Os fiéis no funeral “Foi o maior santo de todos os 2 mil anos da Igreja. O maior papa que já tivemos.” Daniel Ange, religioso francês, 72 anos O FUNERAL A despedida PIER PAOLO CITO, AP/ZH RODRIGO LOPES ◆ Enviado Especial/Vaticano Para quem já estava com um nó na garganta desde o início da manhã, foi a gota d’água. Passava das 13h30min (8h30min em Brasília). Cardeais da Igreja oriental prestavam com incenso a última homenagem ao corpo do papa João Paulo II, no altar de frente para a Praça de São Pedro. O sol se escondeu entre as nuvens no Vaticano. O vento soprou mais forte. Doze funcionários da Santa Sé se aproximaram do caixão e se ajoelharam. A multidão pressentiu que chegara a hora. Cerca de 600 mil pessoas começaram a aplaudir. Passaram-se um, dois, cinco minutos, e os aplausos eram cada vez mais fortes, como que prendendo o Papa ao seu povo, adiando a despedida. estidos de preto, com luvas brancas, os funcionários ergueram o caixão. Os sinos da Basílica de São Pedro irromperam no coração do Vaticano. O caixão avançava pela última vez em direção à basílica, enquanto fiéis, órfãos do Papa que marcou uma geração, choravam. Não eram apenas peregrinos que lamentavam o adeus. Funcionários da Defesa Civil e policiais que durante quase uma semana garantiram a segurança na via-crúcis do velório se permitiram ontem um minuto de oração. Um dos apresentadores da rede de TV italiana RAI chorou no ar. Na multidão, o estudante brasileiro José Artur, 22 anos, acompanhava os aplausos. – Giovanni Paolo – gritava, acompanhando as palmas ritmadas. Os funcionários viraram o caixão. O Papa dava adeus à praça. Mineiro de Belo Horizonte, Artur prendeu a respiração e acenou. Foram mais de duas horas e meia de orações e demonstrações de fé durante a missa de corpo presente do Papa. Fechada ao tráfego de veículos particulares desde as 2h, Roma amanheceu em silêncio. O único barulho era o de batedores da polícia que escoltavam as mais de 200 autoridades mundiais. A pé, a maioria dos fiéis chegou à Praça de São Pedro antes das 7h, a três horas do início da missa. Muitos peregrinos, principalmente poloneses que chegaram de madrugada, nem dormiram, na esperança de chegar mais perto do conterrâneo ilustre. Às 10h03min, o caixão com o corpo do Papa saiu da Basílica sob aplausos. V Procissão: pela última vez, João Paulo II foi colocado diante da multidão de fiéis na Praça de São Pedro Foi uma das missas mais difíceis para o sisudo cardeal Joseph Ratzinger, que presidiu a celebração ao lado dos demais cardeais. Amigo e assessor de João Paulo II, o religioso foi interrompido 13 vezes por aplausos durante sua homilia. – O Papa nos vê e nos abençoa. Agora, está diante da janela da casa do Senhor. Não esqueceremos nunca o último domingo de Páscoa de sua vida, em que o Papa marcado pelo sofrimento apareceu na janela do palácio apostólico e deu pela última vez a bênção “urbi et orbi” (à cidade e ao mundo) – afirmou. Minutos antes, João Paulo II – proclamado santo pela multidão – teria feito o seu segundo milagre: pessoas de todos os cantos do mundo, crianças, adultos de diferentes credos e raças, se abraçavam e se beijavam durante a Oração da Paz. O primeiro milagre teria sido reunir no mesmo altar inimigos históricos como Lech Walesa, chefe histórico do sindicato polonês Solidariedade, e o presidente polonês ex-comunista Aleksander Kwasniewski, ou o presidente de Israel, Moshe Katsav, e o líder iraniano Mohamed Khatami. Ao som de cantos gregorianos, o caixão simples, de cipreste claro, com uma cruz e a letra “M” gravados, em sinal da devoção à Virgem Maria, foi colocado sobre um tapete oriental, diante do altar. Sobre o esquife, um livro com os santos evangelhos, cujas páginas viravam ao vento. O Papa foi enterrado na cripta, diretamente ao nível do solo, sob uma lápide simples de mármore branco, em uma cerimônia fechada. O sol ainda reapareceu, mas, no final da tarde, choveu pela primeira vez em Roma desde a morte de João Paulo II, há uma semana. Os números O funeral do papa João Paulo II reuniu dezenas de líderes mundiais: 57 17 17 chefes de Estado chefes de governo monarcas, rainhas e príncipes reinantes 3 príncipes herdeiros 13 representantes de organizações internacionais 12 chanceleres 13 outros ministros 4 presidentes de parlamento 24 embaixadores 142 líderes religiosos não-católicos 600 mil fiéis apenas na Praça de São Pedro e na Rua da Conciliação 27 telões espalhados pela capital 8 mil policiais espalhados pela cidade