CANDIDO MENDES INSTITUTO A VEZ DO MESTRE PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” AMPLITUDE DOS DIREITOS ASSEGURADOS AO EMPREGADO DOMÉSTICO AUTORA TEREZA CRISTINA MAZZINI VIEIRA DE ALMEIDA ORIENTADOR PROFESSOR CARLOS AFONSO LEITE LEOCADIO RIO DE JANEIRO 2010 2 UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A VEZ DO MESTRE PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” AMPLITUDE DOS DIREITOS ASSEGURADOS AO EMPREGADO DOMÉSTICO Monografia apresentada à Universidade Candido Mendes – Instituto a Vez do Mestre, como requisito parcial para a conclusão do curso de Pós-Graduação “Lato Sensu” em Direito e Processo do Trabalho. Por: Tereza Cristina Mazzini Vieira de Almeida. 3 Agradeço a todos que contribuíram para este trabalho, especialmente o Professor Carlos Eduardo Leite Leocadio, e demais professores e funcionários do campus Downtown/Barra. 4 Dedico este trabalho à minha filha Paola, meu marido Bernardo, minha mãe Elvira, meu pai Paulo (em memória) e a Deus, sem os quais nada seria possível e teria valor. 5 RESUMO A Consolidação das Leis do Trabalho em seu artigo 7º, a, conceituou empregado doméstico, excluindo-o de sua esfera normativa. É a Lei nº 5.859, de 11 de dezembro de 1972, que dispõe sobre a profissão de empregado doméstico, assim o conceituando em seu artigo 1º: “aquele que presta serviços de natureza contínua e de finalidade não lucrativa à pessoa ou à família no âmbito residencial destas”. Do conceito tem-se que o trabalho deve ser prestado em caráter contínuo, ou seja, freqüente, constante e mediante recebimento de salário. A prestação do labor deve no âmbito residencial de uma pessoa ou família, sendo que este conceito comporta uma interpretação mais abrangente no sentido de que o trabalho pode ser externo, mas doméstico, como ocorre em relação aos motoristas particulares. O empregador é pessoa física ou família, não pessoa jurídica. A finalidade do trabalho doméstico para o empregador não pode ser o lucro. A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 7º, parágrafo único, estendeu ao empregado doméstico alguns direitos dos que são assegurados aos empregados urbanos e rurais. Com a promulgação da Lei nº 10.208/01, o empregado doméstico passou a ter direito ao Fundo de Garantia por Tempo de Serviço e seguro-desemprego. Contudo, o empregador não está obrigado a inscrever o empregado doméstico no sistema do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, sendo tal benefício opcional. Mais recentemente, com a publicação da Lei nº 11.324, de 19 de julho de 2006, outros direitos foram assegurados ao empregado doméstico, tais como férias de 30 dias estabilidade gestante. Em que pese os avanços progressivos, seja com a Constituição de 1988, seja com a promulgação das leis aplicáveis aos domésticos, a classe doméstica ainda possui menos direitos se comparados aos trabalhadores urbanos e rurais. 6 METODOLOGIA O presente trabalho constitui-se em uma descrição detalhada da amplitude dos direitos assegurados ao empregado doméstico em comparação aos que são assegurados aos trabalhadores em geral, na realidade brasileira, e do tratamento conferido a cada um deles pelo ordenamento jurídico nacional, sob o ponto de vista específico do direito positivo brasileiro. A partir dessa premissa, é fácil concluir que o estudo que ora se apresenta foi levado a efeito a partir do método da pesquisa bibliográfica, em que se buscou o conhecimento em diversos tipos de publicações, como livros e outros periódicos especializados, além de publicações oficiais da legislação e da jurisprudência. Por outro lado, a pesquisa que resultou nesta monografia também foi empreendida através do método dogmático, porque teve como marco referencial e fundamento exclusivamente a dogmática desenvolvida pelos estudiosos que já se debruçaram sobre o tema anteriormente, e positivista, porque buscou apenas identificar a realidade social em estudo e o tratamento jurídico a ela conferido, sob o ponto de vista específico do direito positivo brasileiro. Adicionalmente, o estudo que resultou neste trabalho identifica-se, também, com o método da pesquisa aplicada, por pretender produzir conhecimento para aplicação prática, assim como com o método da pesquisa qualitativa, porque procurou entender a realidade a partir da interpretação e qualificação dos fenômenos estudados; identifica-se, ainda, com a pesquisa exploratória, porque buscou proporcionar maior conhecimento sobre a questão proposta, além da pesquisa descritiva, porque visou a obtenção de um resultado puramente descritivo, sem a pretensão de uma análise crítica do tema. 7 SUMÁRIO INTRODUÇÃO....................................................................................................... 8 CAPÍTULO I EMPREGADO DOMÉSTICO............................................................................... 10 1.1 – CONCEITO DE EMPREGADO DOMÉSTICO.............................................10 1.2 - INTEGRANTES DA CATEGORIA DOS DOMÉSTICOS............................. 14 CAPÍTULO II EVOLUÇÃO DA REGULAMENTAÇÃO LEGAL DO TRABALHO DOMÉSTICO.........................................................................................................19 CAPÍTULO III DIREITOS ASSEGURADOS OU NÃO AO EMPREGADO DOMÉSTICO........................................................................................................ 22 CONCLUSÃO...................................................................................................... 34 BIBLIOGRAFIA................................................................................................... 37 WEBGRAFIA .......................................................................................................39 8 INTRODUÇÃO O presente trabalho é um estudo sobre a amplitude dos direitos assegurados ao empregado doméstico. Nesse contexto, o trabalho dedica-se primeiramente a conceituar o empregado doméstico; identifica quem está inserido neste conceito, ou seja, os trabalhadores que integram a categoria dos domésticos, a saber, babá, governanta, lavadeira, motorista particular, copeira, jardineiro, arrumadeira, entre outros; dedica-se, ainda, à análise da regulamentação legal aplicável aos domésticos, tais como a Constituição da República Federativa do Brasil, a Consolidação das Leis do Trabalho, a Lei nº 5.859, de 11 de dezembro de 1972, a Lei nº 10.208, de 23 de março de 2001 e Lei nº 11.324, de 19 de julho de 2006. Adicionalmente, o presente estudo versa sobre os direitos já assegurados ao empregado doméstico, e também sobre aqueles que ainda não lhes são conferidos, se comparados aos demais trabalhadores, quer urbanos, quer rurais. O estudo do tema e das questões analisadas em torno do mesmo justifica-se pelo fato de que nem todos os direitos conferidos aos trabalhadores urbanos e rurais são assegurados ao empregado doméstico, tendo estes menos direitos. A pesquisa que precedeu esta monografia teve como ponto de partida identificar os direitos assegurados ou não aos domésticos, bem como as características peculiares inerentes ao trabalho doméstico e as perspectivas de alcance de todos os direitos já assegurados aos trabalhadores urbanos e rurais à categoria dos domésticos. Visando um trabalho objetivo, cujo objeto de estudo seja bem delineado e especificado, a presente monografia dedica-se, especificamente, às questões relativas ao direito do trabalho brasileiro e da Justiça do Trabalho brasileira, na atualidade, fazendo uma pequena retrospectiva histórica. 9 A escolha do tema deve-se ao fato de que a Constituição Federal de 1988, embora tenha sido um marco importante na ampliação dos direitos até então assegurados ao empregado doméstico, assim como a promulgação de diplomas legais subsequentes que regem os domésticos, não os igualou em matéria de direitos aos trabalhadores urbanos e rurais. Permanece um tratamento diferenciado em relação ao empregado doméstico, eis que a não equiparação aos trabalhadores urbanos e rurais não lhes assegura alguns direitos que poderiam ser aplicáveis à categoria, como exemplo, a limitação da jornada semanal de trabalho. Esta monografia estuda as peculiaridades atinentes aos empregados domésticos, a evolução normativa na aquisição de direitos trabalhistas, os direitos que lhes assegurados ou não, em resumo, a amplitude dos direitos assegurados à classe dos domésticos. Sob este enfoque, o presente trabalho analisa as perspectivas de alcance pelos empregados domésticos de todos os direitos assegurados aos demais trabalhadores urbanos e rurais, e que não lhes foram estendidos no decorrer do tempo, mesmo após o impacto da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, sem dúvida um marco na ampliação de direitos, bem como da promulgação das Leis nº 10.208, de 23 de março de 2001 e 11.324, de 19 de julho de 2006. 10 CAPÍTULO I EMPREGADO DOMÉSTICO 1.1 – CONCEITO DE EMPREGADO DOMÉSTICO Segundo lição de Vólia Bomfim Cassar a palavra “doméstico” deriva do latim domus, que significa casa. Em função disto decorre o conceito de que o empregado doméstico é aquele que presta serviços na casa do patrão (Cassar, 2007). A Consolidação das Leis do Trabalho conceituou empregado doméstico e o excluiu de sua esfera normativa, salvo quando expressamente determinado em contrário: Artigo 7º Os preceitos constantes da presente Consolidação, salvo quando for, em cada caso, expressamente determinado em contrário, não se aplicam: a) aos empregados domésticos, assim considerados, de um modo geral, os que prestam serviços de natureza não econômica à pessoa ou à família, no âmbito residencial destas. É a Lei n. 5.859, de 11 de dezembro de 1972, regulamentada pelo Decreto nº 71.885, de 9 de março de 1973, que dispõe sobre a profissão de empregado doméstico, conceituando-o: Art.1º Ao empregado doméstico, assim considerado aquele que presta serviços de natureza contínua e de finalidade não lucrativa à pessoa ou à família no âmbito residencial destas, aplica-se o disposto nesta Lei. Da análise do referido citado artigo Alice Monteiro de Barros ensina observa que (BARROS, 2008, p.335): 11 Do conceito de empregado doméstico emergem os seguintes pressupostos: a) o trabalho é realizado por pessoa física; b) em caráter contínuo; c) no âmbito residencial de uma pessoa ou família, pouco importando tratar-se de residência consular, pois a imunidade de jurisdição de que gozam os cônsules restringe-se aos atos de ofício; d) sem destinação lucrativa. Vólia Bomfim Cassar ao conceituar o empregado doméstico como a pessoa física que trabalhando de forma pessoal, com subordinação, de forma contínua, para outra pessoa física ou família que não explore a mão-de-obra doméstica com intuito de lucro, no âmbito residencial, leciona que (CASSAR, 2007, p.353/354): O enquadramento legal (CLT, rural, doméstico ou estatutário) de um trabalhador não deve ser analisado pela atividade que exerce e sim para quem trabalha. Assim, se uma empregada exerce a função de cozinheira, este fato por si só não a enquadra em nenhuma das leis mencionadas, pois será necessário que se pesquise quem é seu empregador. Se o seu empregador for uma pessoa física que não explore a atividade lucrativa, será doméstica; se o seu empregador for um restaurante, um hotel ou uma loja comercial, será urbana; se seu empregador for rural, será rural. É preciso lembrar que para ser doméstico basta trabalhar para empregador doméstico, independentemente da atividade que o empregado doméstico exerça, isto é, tanto faz se o trabalho é intelectual, manual ou especializado. Segundo a autora referida no parágrafo anterior, é imprescindível que o empregador seja pessoa física e que não utilize os serviços do empregado doméstico para auferir lucro. Se a cozinheira além de cozinhar para o empregador e sua família também prepara refeições que são vendidas e geram lucro para o patrão, desfigurou-se a condição de doméstica. Questão de extrema relevância diz respeito ao requisito da continuidade, para a caracterização ou não do empregado como doméstico. A Consolidação das Leis do Trabalho assim conceituou empregado: 12 Art. 3º Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário. A Consolidação das Leis do Trabalho utilizou a expressão “não eventual”, enquanto a Lei nº 5.859/72, no artigo 1º, “natureza contínua”. Segundo ensinamento de Vólia Bomfim Cassar (CASSAR, 2007, p. 355/356) a diferenciação fez surgir interpretações distintas: A primeira corrente entende que é irrelevante a diferença e que os critérios para apreciação do trabalho contínuo são os mesmos para o trabalho não eventual da CLT, isto é, o que importa é a necessidade permanente de mão-de-obra do doméstico, que é demonstrada pela repetição de seu trabalho durante todo o contrato, mesmo que exercida uma só vez por semana, por quinzena ou mês, mas durante muitos meses ou anos. Alguns autores chamam esta corrente de teoria da descontinuidade. Para os defensores desta tese, seria doméstico tanto o empregado que trabalho de segunda a sexta, durante seis anos para uma família, como aquele que trabalha apenas às segundas-feiras para a mesma família durante estes mesmos seis anos. (...) Outra corrente entende que foi proposital a distinção, porque o conceito de trabalho não eventual previsto na CLT (art. 3º da CLT) relaciona-se com a atividade empresarial, com seus fins e necessidades de funcionamento e o empregador doméstico não explora atividade econômica lucrativa, não é empresa. Neste sentido, o trabalho “contínuo” relaciona-se com o seu conceito lingüístico, isto é, vincula-se com o tempo, a repetição, com o trabalho sucessivo, seguido, sem interrupção, como conceitua o Dicionário Aurélio. Segundo a doutrina e a jurisprudência majoritária, a repetição dos trabalhos domésticos deve ser analisada por semana, desprezando o tempo de duração do contrato, de forma que o trabalhador doméstico execute seus serviços três ou mais dias na semana, por mais de quatro horas por dia. Se trabalhar todos os dias, mas por apenas 1 hora, como é o caso do personal treiner, da manicure, do professor particular etc., não será empregado doméstico e sim diarista doméstico sem vínculo de emprego. Há posicionamentos divergentes para menos e para mais, isto é, há quem entenda que a quantidade de dias da semana deve ser ora maior ora menor. 13 Há ainda aqueles que diferenciam o trabalho eventual do intermitente, para concluir que o trabalho executado por dois ou mais dias na semana, durante o contrato, configura o vínculo de emprego doméstico. O empregador que contrata motorista particular para dirigir seu carro, estipulando que a prestação do serviço se dará em duas vezes na semana, com jornada de oito horas, por dia de trabalho, é empregado doméstico. Igualmente se a lavadeira é contratada para trabalhar duas vezes por semana (SUSSEKIND, 1999). O tomador dos serviços do empregado doméstico há de ser necessariamente pessoa física ou família. Nunca poderá ser pessoa jurídica. Não pode a pessoa jurídica ser a tomadora do serviço doméstico. Não são considerados domésticos os empregados em atividades assistenciais, beneficentes, comerciais, industriais. Assim como o profissional liberal não pode ser o tomador do serviço doméstico quando utilizar a mão-de-obra do empregado para sua atividade econômica. Também não podem contratar empregados como domésticos a massa falida e o condomínio. Quando o serviço é prestado à família, esta é o real empregador, contudo, em face da inexistência de personalidade jurídica da família, qualquer um dos membros será o responsável pela assinatura da carteira de trabalho do empregado (CASSAR, 2007). O artigo 1º da Lei nº 5.859/72 dispõe que o trabalho deve ser executado no âmbito residencial da pessoa ou família. Observa-se a utilização do termo “no âmbito residencial”. No dizer de Vólia Bomfim Cassar há um equívoco na redação contida no artigo supramencionado. O trabalho, ainda que exercido externamente, ou seja, fora do âmbito familiar, pode ser caracterizado como doméstico, como exemplos o motorista, o segurança etc. âmbito residencial (CASSAR, 2007, p. 365). Logo, o melhor seria dizer “para” o 14 1.2 – INTEGRANTES DA CATEGORIA DOS DOMÉSTICOS Integram a categoria dos empregados domésticos a cozinheira, a arrumadeira, a copeira, a governanta, a babá, a lavadeira, o mordomo, o jardineiro,o vigia, o motorista particular, o marinheiro particular, o piloto particular, os caseiros e zeladores de casas de campo, de praia ou sítios utilizados para entretenimento e lazer dos donos, os acompanhantes de idosos, os segurança dos familiares do empregador. Se o serviço prestado pelo trabalhador doméstico gera lucro para o empregador, pouco importando se o trabalho ocorreu na residência habitual ou na fazenda, chácara, sítio, casa de praia, casa na serra, o empregado perde a condição de doméstico, será considerado empregado regido pelas normas aplicáveis aos empregados urbanos ou rurais, dependendo do caso concreto (BARROS, 2008). Ressalte-se, por oportuno, a lição de Alice Monteiro de Barros (BARROS, 2008, p.337): Lembre-se, entretanto, que permanecerão como domésticos os que trabalharem apenas na residência da fazenda, arrumando a casa ou cozinhando para os seus proprietários. Não é, portanto, apenas a destinação do empreendimento como um todo, mas também a atividade ali desenvolvida pelo trabalhador que irá caracterizar a natureza da relação jurídica. Equipara-se a doméstico a pessoa que presta serviços contínuos de enfermagem ou acompanhamento no âmbito familiar ou em casa de repouso, em caráter particular, a pessoa idosa ou membro da família doente ou inválido, sem visar lucro. Se os serviços não forem prestados de forma contínua, na há como enquadrar tal empregado como doméstico (BARROS, 2008). O empregado que trabalha no seu próprio domicílio, e que preenche os requisitos do artigo 3º da Consolidação das Leis do trabalho não é doméstico, 15 tendo em vista que o artigo 6º da Consolidação das Leis do Trabalho não faz diferença entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador e o prestado no domicílio do empregado. (BARROS, 2008). Questão de grande relevância, tendo em vista as inúmeras demandas trabalhistas envolvendo o tema, bem como a variedade das posições doutrinárias e jurisprudenciais a respeito, é a distinção entre empregada doméstica e a chamada “diarista”. Segundo lição de Alice Monteiro de Barros, a chamada “diarista” (faxineira, lavadeira, passadeira etc.) não está incluída no artigo 1º da Lei nº 5.859/72, por faltar na relação jurídica o elemento continuidade (BARROS, 2008, p. 342/343): De acordo com o Novo Dicionário Aurélio, o vocábulo “contínuo” significa “em que não há interrupção, seguido, sucessivo”. É necessário, portanto, que o trabalho executado seja seguido, não sofra interrupção. Portanto, um dos pressupostos do conceito de empregado doméstico é a continuidade, inconfundível com a não-eventualidade exigida como elemento da relação jurídica advinda do contrato de emprego firmado entre empregado e empregador, regido pela CLT. Ora, a continuidade pressupõe ausência de interrupção, enquanto a não-eventualidade diz respeito ao serviço que se vincula aos fins normais da atividade da empresa. (...) Logo, se a não-eventualidade é uma característica que não depende do tempo, o mesmo não se pode dizer da continuidade, já que a interrupção tem natureza temporal. Assim, não é doméstica a trabalhadora de residência que lá comparece em alguns dias da semana, por faltar na relação jurídica o elemento continuidade. 16 Similar é o posicionamento de Aloysio Santos (SANTOS, 1989, p. 50): A faxineira, por exemplo, que recebe por dia, trabalhando em várias residências, não é considerada empregada doméstica para os efeitos da Lei n. 5.859/72. Vólia Bomfim Cassar resumindo o tema leciona que (CASSAR, 2007, p. 357): A doutrina e a jurisprudência majoritárias adotaram o princípio de que o trabalho prestado num só dia da semana para tomador doméstico, como, por exemplo, a faxineira, a passadeira, a congeleira etc., não gera vínculo de emprego, por não contínuo o serviço prestado. Para três ou mais dias de trabalho na semana a jurisprudência consagrou como contínuo, logo, acarreta no vínculo. Maurício Godinho Delgado defende que é diarista e não empregado doméstico aquele que presta serviços uma ou duas vezes, seja por semana, por quinzena ou por mês, tendo em vista a eventualidade da relação (DELGADO, 2002). Valentin Carrion manifestou-se no sentido de que (CARRION, 1995, p. 4): O diarista intermitente (lavadeira, arrumadeira, ou passadeira) não está, em princípio, protegido pela lei dos domésticos, mesmo que compareça certo dia por semana, que, de acordo com a Lei n. 5.859/72, se destina apenas ao “serviço de natureza contínua”. As circunstâncias que separam o empreendimento empresarial, de um lado, e a dona de casa, de outro, juntamente com o entendimento que se extrai da expressão “serviço de natureza contínua” e com os ônus impostos pela CONSTITUIÇÃO FEDERAL de 1988 levam a deixar de aplicar por analogia o entendimento que reconhece a relação de emprego aos contratados para prestar serviços em clubes esportivos ou de apostas nos fins de semana; as diferenças existentes entre o meio familiar e o empresarial as rejeitam. Até o recolhimento previdenciário seria impossível, posto que o mínimo permitido é calculado sobre o salário mínimo (Lei n. 8212/91, art. 28, §3º). O diarista esporádico, como mero prestador de serviços e não empregado, deve vincular-se à Previdência Social, como 17 trabalhador autônomo previdenciários. para efetuar os recolhimentos Evaristo de Moraes Filho compartilha do mesmo posicionamento (FILHO, 1976, p 134): Não é considerado empregado doméstico o prestador de serviços a várias famílias, sob a forma de diarista ou de avulso. Esses são considerados autônomos, por conta própria, para todos os efeitos, quer trabalhistas, quer previdenciários. Alice Monteiro de Barros observa que (BARROS, 2008, p. 347): A maioria da jurisprudência tem admitido como descontínuo o trabalho realizado em até dois dias na semana em favor de um mesmo credor do trabalho, com liberdade de o prestador de serviços laborar em outros locais, nos demais dias da semana. Há, todavia, quem divirja dessa orientação, sustentando que mesmo na hipótese de intermitência na prestação de serviços, por não ser ela diária, a continuidade estará presente, por entender que ela se caracteriza quando o trabalho se repete em intervalos regulares. Ainda com relação à análise dos trabalhadores compreendidos ou não no conceito de empregado doméstico, temos a situação da pessoa que trabalha como cabo eleitoral. No entender de Alice Monteiro de Barros, o cabo eleitoral não é empregado doméstico, isto porque (BARROS, 2008, p. 337): (...) a Lei nº 9.504, de 30 de setembro de 1997, no art. 100, dispõe expressamente que “a contratação de pessoal para prestação de serviços nas campanhas eleitorais não gera vínculo empregatício com o candidato ou partido contratantes”. Inobstante o entendimento da autora mencionada no parágrafo anterior, não é questão pacífica que o cabo eleitoral não esteja incluído no 18 conceito de empregado doméstico. Isto porque há pronunciamentos contrários, no sentido de atribuir ao cabo eleitoral a condição de empregado doméstico. 19 CAPÍTULO II EVOLUÇÃO DA REGULAMENTAÇÃO LEGAL DO TRABALHO DOMÉSTICO No Brasil, inicialmente, o trabalho doméstico realizado no âmbito residencial de outrem era disciplinado pelas Ordenações do Reino (Barros, 2008). Mais tarde, surge o Código de Postura Municipal de São Paulo de 1886, que no artigo 263 autorizava a contratação para os serviços domésticos de “pessoa de condição livre” (CASSAR, 2007, p. 352). De 1916, o Código Civil tratou do assunto no capítulo referente à locação de serviços. Em 1941, é editado o Decreto-Lei nº 3.078, disciplinando a locação dos empregados em serviços domésticos. Em 1943, a Consolidação das Leis do Trabalho, no artigo 7º, a, conceitua empregado doméstico, excluindo-o de sua esfera normativa, salvo quando for, em cada caso, expressamente determinado em contrário. A Lei nº 5.859/72, regulamentada pelo Decreto nº 71.885/73, surge então para dispor sobre a profissão do empregado doméstico. A Constituição Federal de 1988 foi outro marco histórico para a categoria dos domésticos. Uma vez que o empregado doméstico foi taxativamente excluído da Consolidação das Leis do Trabalho, a Constituição Federal de 1988, no parágrafo único do artigo 7º, vem para ampliar de forma significativa os direitos assegurados à classe doméstica. 20 Ainda que de forma restritiva, a Constituição de 1988 representou um significativo avanço, tendo em vista que ampliou os direitos assegurados ao empregado doméstico. O empregado doméstico, contudo, não foi equiparado, em direitos, aos trabalhadores urbanos ou rurais, pois aos domésticos não foram conferidos todos os direitos dos trabalhadores em geral, possuindo, portanto, a classe doméstica menos direitos. Questão que merece análise diz respeito à eficácia dos direitos constitucionais assegurados aos empregados domésticos no parágrafo único do artigo 7º da Constituição de 1988. A Carta de 1988 concedeu aos empregados domésticos direitos como o aviso prévio, o repouso semanal remunerado, o salário mínimo. Ocorre é que é a mesma Consolidação das Leis do Trabalho, que excluiu os empregados domésticos da sua abrangência, que nos artigos 487 e seguintes, dispõe sobre o aviso prévio, por exemplo. Se a Constituição de 1988 assegurou aos domésticos, como exemplo, o direito ao aviso prévio, se a Consolidação das Leis do Trabalho excluiu os empregados domésticos de sua esfera normativa, e se é esta mesma Consolidação das Leis do Trabalho que dispõe sobre aviso prévio para os trabalhadores, como dar eficácia ao preceito constitucional, garantindo à classe doméstica os direitos constitucionalmente adquiridos? Segundo a doutrina de Vólia Bomfim Cassar (CASSAR, 2007, p. 367/368): “Assim, quando a Carta garantiu ao doméstico o direito ao aviso prévio, quis dizer que este só é devido nas despedidas imotivadas ocorridas em contratos indeterminados. Este conceito que acabamos de tecer está na CLT, como os conceitos de “despedida motivada” e de “contrato determinado”, já que para se saber o que é um contrato por prazo indeterminado é necessário saber o que um contrato por prazo determinado. Para se saber o que é uma despedida imotivada, devemos recorrer ao que é despedida por justa causa. Quando o legislador concedeu o 21 aviso prévio ao doméstico, também lhe estendeu a regulamentação existente, bem como seus efeitos conexos, tais como: aviso prévio indenizado; possibilidade de desconto pelo falta do aviso pelo notificante, conseqüência pela justa causa praticada no curso do aviso; época do pagamento das parcelas decorrentes da rescisão; contrato determinado (só o de experiência é compatível); despedida por justa causa, as limitações à despedida injusta (suspensão e interrupção do contrato) etc. A autora citada no parágrafo anterior conclui que (CASSAR, 2007, p. 368): (...) a única interpretação possível para se dar efetividade ao comando constitucional que determina a aplicação imediata dos direitos fundamentais é a utilização temporária, até que a lei do doméstico regule de forma diversa, de determinados artigos da CLT ou de outras leis ordinárias, que devem ser utilizadas para dar exeqüibilidade aos direitos constitucionais criados para o empregado doméstico. Enquanto leis não complementem certos dispositivos constitucionais, aplica-se o instituto deferido a outros sujeitos ou situações (CARRION, 1995). Em 2001, através da Lei nº 10.208, foi instituído o beneficio opcional do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, assim como o seguro-desemprego, ao empregado doméstico. A inclusão do empregado doméstico no sistema do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço não é obrigatória para o empregador, contudo, uma vez inscrito, adquire caráter irretratável em relação ao respectivo vínculo de emprego, não gerando, todavia, obrigação para empregadores posteriores que não desejem conceder o benefício. Mais recentemente, com a edição da Lei nº 11.324, de 19 de julho de 2006, o empregado doméstico adquiriu novos direitos, tais como férias de 30 dias, feriados civis e religiosos, estabilidade para as gestantes, proibição de descontos referentes à moradia, à alimentação e ao uso de produtos de higiene pessoal. 22 CAPÍTULO III DIREITOS ASSEGURADOS OU NÃO AO EMPREGADO DOMÉSTICO Os direitos dos empregados domésticos estão previstos quer na Constituição de 1998, no parágrafo único do artigo 7º, quer em Leis como as de nº 5.859/72 e a 11.324/06. A Lei nº 5.859, de 1972, concedia ao empregado doméstico o direito a férias de 20 dias úteis, após 12 meses de serviços prestados, anotação da carteira de trabalho para fins previdenciários, conferindo-lhe a qualidade de segurados obrigatórios da Previdência Social. A Constituição de 1988 ampliou, sobremaneira, os direitos assegurados ao empregado doméstico, concedendo-lhe, além daqueles já obtidos através da Lei nº 5.859/72, tais como, direito a férias de 20 dias úteis, anotação da carteira de trabalho para fins previdenciários, outros direitos, a saber: Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem á melhoria de sua condição social: (...) IV- salário mínimo fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de atender a suas necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo, sendo vedada sua vinculação para qualquer fim; (...) VI- irredutibilidade do salário, salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo; 23 (...) VIII- décimo terceiro salário com base na remuneração integral ou no valor da aposentadoria; (...) XVrepouso semanal preferencialmente aos domingos; remunerado, (...) XVII- gozo de férias anuais remuneradas com, pelo menos, um terço a mais do que o salário normal; XVIII- licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com a duração de cento e vinte dias; XIX-l licença-paternidade, nos termos fixados em lei; (...) XXI- aviso prévio proporcional ao tempo de serviço, sendo no mínimo de trinta dias, nos termos da lei; (...) XXIV- aposentadoria. PARÁGRAFO ÚNICO. São assegurados à categoria dos trabalhadores domésticos os direitos previstos nos incisos IV, VI, VIII, XV, XVII, XVIII, XIX, XXI e XXIV, bem como a sua integração à previdência social. A partir deste ponto este trabalho aborda os direitos previstos na Carta de 1988. O primeiro deles diz respeito ao salário mínimo devido ao empregado doméstico. 24 Quanto ao piso salarial do empregado doméstico Vólia Bomfim Cassar leciona que o piso salarial foi previsto no artigo 7º, V da Constituição de 1988, não sendo o mesmo que salário mínimo porque este é nacionalmente unificado, tendo um só valor em todo Brasil, enquanto aquele deve levar em consideração a complexidade de cada profissão para fixar pisos diferenciados para cada uma. A Lei Complementar nº 103, de 14 de julho de 2000 autorizou Estados e Distrito federal a fixarem pisos salariais superiores aos fixados nacionalmente, autorizando a inclusão dos domésticos. Disso decorre que o empregador, no caso do estado do Rio de Janeiro ou em outro estado que também tenha piso estadual fixado por lei, é obrigado a recolher a contribuição previdenciária com base no salário do estado e não no salário mínimo federal (CASSAR, 2007). Enquanto o salário mínimo federal atualmente é de R$ 510,00 (quinhentos e dez reais), no estado do Rio de Janeiro o piso salarial é de R$ 581,88 (quinhentos e oitenta e um reais e oitenta e oito centavos), valor este mínimo a ser pago ao empregado doméstico e sobre o qual deverá incidir a contribuição previdenciária. Vólia Bomfim Cassar sustenta a constitucionalidade do piso estadual dos domésticos, assim como a jurisprudência também vem se posicionando, ressaltando, entretanto que (CASSAR, 2007, p. 377): Há quem sustente a inconstitucionalidade do § 2º do art. 1º da Lei Complementar 103/00, que determinou a extensão dos pisos salariais aos domésticos, isto porque a Constituição teria sido taxativa quanto aos direitos sociais e não inclui o inciso V do art. 7º, dentre estes direitos. Como a Lei Complementar 103/00 veio para regulamentar o inciso V do art. 7º da Carta, não poderia ter estendido o direito a quem a Constituição não concedeu. Fundamentam na rigidez da Carta que não pode ser alterada por lei. Outros acrescentam que o piso salarial de que cogita o art. 7º, V, da Carta Magma não é regional ou estadual sim profissional Deve ser fixado em proporção à extensão ou complexidade do trabalho. É o chamado salário profissional, que pode ser fixado, por exemplo, para metalúrgicos, bancários, comerciantes etc. e os domésticos não seriam considerados como profissionais. 25 O salário deve ser pago contra-recibo até o quinto dia útil do mês subseqüente ao trabalhado, e todo mês necessariamente deve haver pagamento, com o pagamento de pelo menos 30% em dinheiro. Quanto aos descontos salariais permitidos (CASSAR, 2007, p. 371/372): A Carta simplesmente enumerou, de forma genérica, os direitos estendidos ao doméstico, dentre eles, o salário mínimo, sem, contudo, conceituar ou regular tal direito, deixando margem para o intérprete buscar, nas regras gerais existentes a respeito da matéria, a regulação pertinente para dar efetividade a este direito. Ao relacionar as utilidades a que se destinava o salário mínimo, o constituinte também se referiu, implicitamente, aos percentuais que cada uma destas deve equivaler e às possibilidades de desconto quando concedidas in natura. Por outro lado, ao conceder o salário mínimo também estendeu as proteções a este salário. Da mesma forma, mesmo que por outro fundamento, forçoso é concluir que o salário é cercado de proteção, seja pela sua natureza alimentar, seja pelo princípio da proteção ao trabalhador. Isto porque os princípios trabalhistas são aplicáveis a todos os empregados, inclusive aos domésticos. Dentre estes, o princípio da inalterabilidade contratual in pejus e o da intangibilidade salarial realça. Portanto, é vedado o desconto não autorizado em lei. Desta forma, conclui-se que até a inclusão do art. 2º-A à Lei nº 5.859/72, ao doméstico eram aplicáveis os arts. 81, 82, 458, 462 da CLT, na parte compatível. E até hoje são aplicáveis as leis que fixam o salário mínimo (hora, dia e mês). Após a Lei nº 11.324/06 foram vedados os descontos de algumas utilidades fornecidas pelo empregador. Esta regra só se aplica para o trabalho executado após 20/07/06 (data da publicação da lei). Logo, se o empregador fornecia uma utilidade, poderia efetuar o desconto correspondente (arts. 81 e 82 da CLT) até 20/07/06, após esta data o desconto está proibido para algumas utilidades. 26 A Lei nº 5.859/72, já com o artigo e parágrafos acrescentados pela Lei nº 11.324/06, dispõe que: Artigo 2º-A. É vedado ao empregador doméstico efetuar descontos no salário do empregado por fornecimento de alimentação, vestuário, higiene ou moradia. §1º Poderão ser descontadas as despesas com moradia de que trata o caput deste artigo quando essa se referir a local diverso da residência em que ocorrer a prestação de serviço, e desde que essa possibilidade tenha sido expressamente acordada entre as partes. §2º As despesas referidas no caput deste artigo não têm natureza salarial nem se incorporam à remuneração para quaisquer efeitos. Portanto, o empregador não pode descontar do salário do empregado doméstico qualquer utilidade, apenas as excluídas da Lei nº 11.324/06. As utilidades alimentação, vestuário, higiene ou moradia não tem natureza salarial, não se incorporando à remuneração para quaisquer efeitos. Com relação aos tipos de utilidades, a referente à higiene, como exemplo o sabonete utilizado para higiene pessoal da doméstica, não tem natureza salarial. É um item essencial, necessário, imprescindível para a execução do serviço. Outra questão referente às utilidades diz respeito à doméstica que viaja de férias com a família, como exemplo a babá, que viaja esporadicamente com a família para cuidar de criança durante a viagem. A babá, no caso, não viaja para relaxar, passear, descansar, ou seja, não se constitui num lazer proporcionado à empregada, mas sim com a finalidade única de trabalhar, logo, não há como se atribuir natureza salarial (CASSAR, 2008). A irredutibilidade de salário é um dos direitos do trabalhador doméstico. A proibição se estende inclusive quando o patrão reduz o salário em virtude da redução do trabalho. Se o empregador contratou motorista particular para trabalho de segunda a sábado, por um salário de R$ 1.000,00, não poderá 27 reduzir, depois de um ano, o salário para R$ 500,00, alegando que o empregado trabalhará somente três dias na semana, e, portanto, trabalhando a metade dos dias, receberá a metade do valor inicialmente acordado (CASSAR, 2008). O empregado doméstico faz jus ao décimo terceiro salário, gratificação que deve ser concedida em duas parcelas. A primeira entre fevereiro e novembro de cada ano, no valor de 50% do salário do mês anterior, ou por ocasião das férias, e a segunda até 20 de dezembro, com base no valor do salário de dezembro. A Constituição Federal de 1988 trouxe uma novidade em seu parágrafo único, elencando a licença paternidade como direito do empregado doméstico. Segundo leciona Vólia Bomfim Cassar (CASSAR, 2007, p. 384) “A benesse só se estende ao pai biológico e não ao adotivo e é o empregador quem arca com tal ônus, sem qualquer compensação da previdência.” No tocante à licença maternidade o benefício foi ampliado pela Carta de 1988, passando de 90 para 120 dias – parágrafo único do artigo 7º, que assegurou o direito previsto no inciso XVIII do mesmo artigo “licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com a duração de cento e vinte dias.” Ao conceder o direito à licença-maternidade de 120 dias (art. 7º, XVIII da CRFB), sem prejuízo do salário, a doméstica também passou a ter direito ao descanso em caso de aborto, bem como à licença em caso de adoção. permitido o trabalho durante a licença-maternidade. Não é Contudo, se executado, apesar da proibição, a trabalhadora terá direito não só ao salário-maternidade, como também aos salários do período trabalhado (CASSAR, 2007). No tocante à estabilidade à gestante, a partir de 2006, com a edição da Lei nº 11.324 a doméstica adquiriu tal direito, conforme disposto no artigo 4º-A da Lei nº 5.859/72: É vedada a dispensa arbitrária ou sem justa causa da empregada doméstica gestante desde a confirmação da gravidez até 5 (cinco) meses após o parto. 28 No tocante à estabilidade provisória assim se posicionou Alice Monteiro de Barros (BARROS, 2008, p. 351/352): A relação empregatícia, no caso, gera um conjunto de direitos e obrigações que condiciona, em especial, ao exercício de direitos da personalidade assegurados em preceito constitucional (art. 5º, X). Salvaguardam esses direitos, entre outros, espaços da honra, da intimidade pessoal familiar, da imagem e da vida privada. A violação a esses espaços afeta a confiança entre as partes. Diante desses fatos, não vemos como obrigar uma família a manter uma empregada doméstica em sua residência sob pretexto da estabilidade provisória, pois poderá ocorrer violação à vida privada, invasão de domicílio e contrariedade ao preceito constitucional (art. 5º, X e XI). O ideal seria pagar-lhe os seus efeitos, que se restringirão à reparação pecuniária correspondente. Por tratar-se de estabilidade relativa, a doméstica pode ser demitida sem justa causa. Durante a licença-maternidade só por justa causa (CASSAR, 2007). Se o empregador contratar a doméstica mediante contrato de experiência, mesmo grávida, expirado o prazo de experiência, poderá dispensála, não havendo que se falar em estabilidade. O empregado doméstico faz jus ao aviso prévio de 30 dias. O direito ao aviso prévio é para ambas as partes, tanto para o empregado doméstico como para o empregador, tendo em vista o princípio constitucional de tratar igualmente às partes (CASSAR, 2007). Alice Monteiro de Barros leciona que apesar de ter sido assegurado aos empregados domésticos, por força de preceito constitucional, o aviso prévio, conservando o instituto em questão seu caráter bilateral, alguns doutrinadores consideram desaconselhável no âmbito doméstico, na ruptura do contrato de iniciativa do empregador, temerosos dos danos que o trabalhador pudesse ocasionar, quando pré-avisado. O fato de o doméstico ter assegurado o aviso 29 prévio não faz pressupor que seu contrato deva ser necessariamente indeterminando (BARROS, 2008). O aviso prévio deve apenas do empregado para o patrão e não deste para com aquele, tendo em vista que, pré-avisado, poderá o doméstico, por força mesmo de suas atribuições, realizar estragos durante o cumprimento do aviso (LAMARCA, 1969). Na lição de Amaro Barreto deve-se meditar bem sobre a turbação do ambiente familiar, causada pela insatisfação de uma empregada doméstica préavisada (BARRETO, 1967). Segundo ensinamento de Vólia Bomfim Cassar (CASSAR, 2007, p. ): Para dar eficácia plena ao aviso prévio, como determina o art. 5º, § 1º da CRFB, necessária é a aplicação de alguns artigos da CLT, dentre eles os arts. 487 e seguintes. Para cumprimento da ordem constitucional de que o doméstico tem direito ao aviso prévio, alguns conceitos contidos na CLT (que é a regra geral) são necessários e devem ser aplicados, tais como: . Conceito de despedida injusta e justa, pois só nas dispensas injustas o aviso e devido; . Conceito de contrato indeterminando e determinado, pois só nos contratos indeterminados é devido o pré-aviso; . Conceito de aviso prévio trabalhado e indenizado e demais regras regulamentadoras, para aplicação destas no caso concreto; . Época do pagamento das parcelas da rescisão, já que o fato gerador do aviso prévio é a rescisão contratual; . Limitação da dispensa imotivada em virtude da suspensão e interrupção contratual e, excepcionalmente, da estabilidade à gestante estendida ao doméstico após a Lei nº 11.324/06. 30 (...) o aviso só será devido em contratos indeterminados nas dispensas sem justa causa ou nos pedidos de demissão, pela parte notificante. Aos domésticos não era assegurado o direito aos feriados. Após a edição da Lei nº 11.324/06, adquiriram tal direito. Portanto, após 20 de julho de 2006 os feriados ou dias de repouso semanal trabalhados deverão ser compensados com folga, ou, na ausência destas, com a paga em dobro das horas trabalhadas. Com a edição da Lei nº 11.324, de 19 de julho de 2006, o empregado doméstico teve seus direitos ampliados: aumento das férias de 20 úteis para 30 dias corridos, a estabilidade da gestante, o direito aos feriados civis e religiosos, além da proibição de descontos de moradia, alimentação e produtos de higiene pessoal utilizados no local de trabalho. Através da Lei nº 7.418, de 16 de dezembro de 1985 e regulamentado pelo Decreto nº 95.247, de 17 de novembro de 1987, foi concedido ao empregado doméstico o direito ao vale-transporte, para o deslocamento entre sua residência e seu local de trabalho. O empregado deverá declarar o itinerário residência/trabalho, os valores das tarifas das linhas de transporte que utiliza, levando-se em conta o número de dias trabalhados. Quanto ao desconto permitido a título de vale-transporte, o parágrafo único do artigo 4º da Lei nº 7.418/85 assim dispõe: O empregador participará dos gastos de deslocamento do trabalhador com a ajuda de custo equivalente à parcela que exceder a 6% (seis por cento) de seu salário básico. Apesar da evolução legislativa no sentido de cada vez mais ampliar os direitos assegurados aos empregados domésticos, quando comparados com os trabalhadores em geral, urbanos e rurais, depreende-se que alguns direitos ainda não lhes são conferidos, tais como a fixação da jornada de trabalho, pausas intrajornadas, recebimento de horas extras, a multa prevista no parágrafo 8º do 31 artigo 477 da Consolidação das Leis do Trabalho, o adicional de periculosidade ou insalubridade, adicional noturno, entre outros. O próprio benefício do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, instituído Lei nº 10.208, de 23 de março de 2001, ainda é opcional, dependendo da vontade do empregador em incluir o empregado doméstico no referido regime. Uma vez inscrito o empregado doméstico no regime do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, para aquele empregador que requereu a inclusão adquire caráter obrigatório, não vinculando, contudo, empregadores posteriores que não desejarem fazer a inscrição do empregado doméstico no referido sistema. Também não tem direito à estabilidade provisória em caso de acidente do trabalho, em conformidade com a Lei nº 8.213/91, que exclui o empregado doméstico de sua esfera normativa. O direito ao seguro-desemprego fica atrelado à inscrição do empregado doméstico no regime do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço. Portanto, caso o empregador não decida contemplar o empregado doméstico com as normas do regime mencionado, acarretará, por conseguinte, que o referido empregado também não terá direito ao benefício do seguro-desemprego. Logo, a concessão de tal benefício fica condicionada à inclusão do empregado doméstico no regime do Fundo de Garantia por Tempo de serviço, decisão a cargo exclusivamente do empregador. No tocante ao seguro-desemprego, conforme dispõe a Lei nº 5.859, artigo 6º-A: O empregado doméstico que for dispensado sem justa causa fará jus ao benefício do seguro desemprego, de que trata a Lei nº 7.998, 11 de janeiro de 1990, no valor de um salário mínimo, por um período máximo de três meses, de forma contínua ou alternada. § 1º: “O benefício será concedido ao empregado inscrito no FGTS que tiver trabalhado como doméstico por 32 um período mínimo de quinze meses nos últimos vinte e quatro meses contados da dispensa sem justa causa.” Para se habilitar ao benefício do seguro-desemprego o empregado doméstico deverá dirigir-se às unidades do Ministério do Trabalho, do 7º ao 90º dia subseqüente à data de dispensa, portando a Carteira de Trabalho, Termo de Rescisão, sem a anotação de justa causa, guias de recolhimento das contribuições previdenciárias e do FGTS etc. São situações impeditivas ao recebimento do seguro-desemprego o gozo de qualquer beneficio previdenciário de prestação continuada, excetuandose o auxílio-acidente e pensão por morte, bem como o empregado ter renda própria, seja qual for a natureza. Para adquirir novo seguro-desemprego o empregado doméstico deverá aguardar 16 meses, decorridos da data de dispensa do emprego anterior. No sentido de ampliar os direitos do empregado doméstico, a Comissão de Assuntos Sociais do Senado colocará em votação o projeto de lei (PLS 293/06), de autoria da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa, por sugestão da Associação Tangarense das Empregadas Domésticas, de Tangará da Serra (MT), que regulamenta a profissão de empregado doméstico. Tem por objeto estender à categoria dos empregados domésticos todos os direitos garantidos aos demais trabalhadores. De acordo com o projeto, aos empregados domésticos também seriam estendidos os direitos à fixação da jornada de 44 horas semanais, à garantia ao pagamento de horas extras, ao adicional noturno e a Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, este de caráter não mais opcional. Outro avanço no sentido de beneficiar a classe doméstica foi a possibilidade do empregador poder deduzir no Imposto de Renda Pessoa Física a alíquota de 12% do valor pago a título de contribuição previdenciária ao Instituto Nacional de Seguridade Social referente ao empregado doméstico. Tal dedução tem como base de cálculo o recolhimento referente a um salário mínimo mensal, 33 salário este nacional, e de apenas um doméstico por pessoa física, incluindo-se para efeito de cálculo, o pagamento a título de um terço de férias e décimoterceiro salário. Tal benefício, embora reverta para o empregador, não para o empregado doméstico, configura-se um incentivo à formalização de vínculo de emprego (Trabalho Doméstico - Direitos e Deveres – Ministério do Trabalho e Emprego, 2007), bem como serve como um estímulo para, por exemplo, uma negociação entre empregado doméstico e empregador, visando um aumento salarial, na medida em que é vantajosa uma carga tributária menor para o empregador. Ou seja, é benesse ao empregador que pode favorecer em última a análise o empregado doméstico. 34 CONCLUSÃO A presente monografia empregados domésticos em analisou os direitos comparação aos que assegurados aos são conferidos aos trabalhadores em geral, urbanos e rurais, partindo da seguinte hipótese: perspectivas de alcance de todos os direitos assegurados aos trabalhadores em geral aos empregados domésticos. Tendo em vista que os trabalhadores domésticos possuem menos direitos se comparados aos trabalhadores urbanos e rurais, toda a fundamentação desenvolvida no decorrer dos três capítulos deste trabalho teve por objetivo confirmar ou não a hipótese levantada. Assim sendo, para se verificar a validade da hipótese, qual seja, as perspectivas de alcance de todos os direitos já assegurados aos empregados em geral aos empregados domésticos, a presente pesquisa seguiu os passos a seguir mencionados. Primeiramente conceituou empregado doméstico. A partir do artigo 1º da Lei nº 5.589/72, analisou os pressupostos decorrentes do conceito de empregado doméstico: trabalho realizado por pessoa física; de natureza contínua; prestação do trabalho à pessoa ou à família; não tendo o trabalho o objetivo de lucro para o empregador. Ainda no primeiro capítulo, analisou os trabalhadores compreendidos ou não no conceito de empregado doméstico. Isto porque há casos em que restam dúvidas se o trabalhador é doméstico ou urbano, como exemplo a situação da chamada “diarista”. Da análise da pesquisa no Capítulo I constatou-se que o trabalho doméstico possui peculiaridades, o que o torna único e, portanto, o menor número de direitos assegurados derivaria destas especificidades. Como exemplo, o empregador há de ser necessariamente pessoa física ou família, o trabalho 35 desenvolvido pelo empregado doméstico não pode ter por finalidade o lucro do empregador, ou seja, o trabalho deve atender única e exclusivamente aos interesses do empregador ou de seus familiares, nunca ser utilizada a força de trabalho do empregado doméstico para o patrão auferir lucro. Contudo, estas características peculiares não afastam o trabalhador doméstico de forma absoluta dos trabalhadores urbanos e rurais. No segundo capítulo acompanhou-se a evolução da regulamentação legal do trabalho doméstico. Ainda que de forma um tanto quanto acanhada, a evolução legislativa deu-se no sentido de, ampliando os direitos dos domésticos, equipará-los cada vez mais aos urbanos e rurais, quanto à aquisição de direitos. A Lei nº 5.859/72, surgiu para regulamentar exclusivamente os direitos dos domésticos. A Constituição de 1988 ampliou consideravelmente os direitos dos empregados domésticos, embora estes não tenham sido contemplados com todos os direitos do artigo 7º, só destinados totalmente aos empregados rurais e urbanos. O parágrafo único do referido artigo, de forma seletiva, elencou os direitos previstos à classe doméstica. A Lei nº 10.208/01 estende, ainda que de forma opcional para o empregador, o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço e o seguro-desemprego. Em 2006 a Lei nº 11.324 criou outros direitos para os domésticos, tais como férias de 30 dias e estabilidade gestante. Voltando à hipótese, conclui-se, que de forma progressiva houve um considerável avanço no sentido de ampliar os direitos dos empregados domésticos, diminuindo, cada vez mais, a distância que ainda os separa dos trabalhadores urbanos e rurais. Por fim, este trabalho se ateve ao estudo dos direitos assegurados ou não aos empregados domésticos. Ao longo do tempo, os domésticos foram adquirindo novos direitos, contudo, alguns como a fixação da jornada semanal de 44 horas, o adicional noturno e horas extras, entre outros, ainda não lhes são assegurados. Em que 36 pese não serem em número tão grande assim os direitos que ainda não são assegurados aos empregados domésticos, são de extrema relevância, pela repercussão que podem vir a gerar no aspecto econômico da classe doméstica. Voltando à hipótese levantada, este trabalho concluiu que não resta dúvida de que há perspectivas de alcance de todos os direitos assegurados aos empregados em geral aos empregados domésticos. É inegável reconhecer os avanços já obtidos, com as várias conquistas trabalhistas da classe doméstica ao longo do tempo. 37 BIBLIOGRAFIA BARRETO, Amaro. Tutela Especial do Trabalho. Rio de Janeiro: Edições Trabalhistas, 1967. BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. 4. ed. rev. e ampl. São Paulo: LTr, 2008. CARRION, Valentin. 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