BRINCADEIRAS E JOGOS ― SUA ENTRADA NA EDUCAÇÃO
INFANTIL E NO ENSINO FUNDAMENTAL
GOMES, Cleomar Ferreira – UFMT1
[email protected]
Eixo Temático: Educação da Infância
Agência Financiadora: não contou com financiamento
Resumo
Esse texto que ora se apresenta é o resultado de uma pesquisa de esforço objetivo com
professores de educação física da rede municipal cuiabana, endereçado para professores no
trato da Educação Infantil e do Ensino Fundamental ― primeira, segunda e terceira infâncias.
As contribuições se traduzem em reflexões sobre teorias e práticas educativas com uma
irrigação à formação de professores para essa realidade escolar. Longe deste texto, sob a
minha escrita, está a ambição de que os professores da rede cuiabana de ensino efetive uma
prática inspirada apenas nas teorias que lêem ou daquelas que saem das pesquisas como esta
de esforço coletivo que se encerra com a boa vontade de seus professores. O texto sugere que
no trato escolar os professores incluam a força de suas crenças; os anos de empiria por
intermédio das faculdades sensitivas, no solo da escola e incorporem o quê seus alunos
sugerem como válidos na relação ensino-aprendizagem, que vai se formando na rotina
pedagógica de cada um. Teóricos como Caillois, Piaget, Château, Winnicott, Moyles... nos
inspiram a enxergar o terreno da escola, na aplicação dos jogos e brincadeiras, como um
laboratório perene de formação que não cessa de acontecer, mesmo que cada época tenha seu
desenho particular ou o seu zeitgeist pedagógico. O texto, depois de uma discussão teórica, se
encerra com uma eleição de conteúdos e com sugestões de aulas endereçadas a esse público
em particular, na mais genuína expressão de ter sido fruto de um labor coletivo.
Palavras-chaves. Brincadeiras. Infância. Jogos. Ensino Fundamental.
Introdução: a entrada da brincadeira na vida escolar
O intuito fundamental deste texto é contribuir para as reflexões sobre teorias e práticas
educativas na área da educação física escolar, circunscrita na Educação Infantil e no Ensino
Fundamental. Longe deste texto, sob a minha escrita, está a ambição de que os professores da
rede cuiabana de ensino se espelhem apenas nas teorias que lêem ou daquelas que saem das
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Professor-pesquisador da Faculdade de Educação Física e do Programa de mestrado e doutorado em educação
da Universidade Federal de Mato Grosso.
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pesquisas como esta de esforço coletivo que se encerra com a boa vontade de seus
professores.
Não podemos nos esquecer que o labor pedagógico de todos os professores é suscitado
pelas criações teórico-práticas, sem aquela carga da teoria sobre a prática e vice-versa, mas
como forças inseparáveis de reflexão e ação. Tudo que escrevo aqui sobre brincadeiras e
jogos, se servir, segue como uma sugestão para pensar o trabalho de todos nós no trato da
educação física escolar. Essa decisão se justifica considerando as fases de ensino: Educação
Infantil ou primeira infância ― até os cinco anos; Ensino Fundamental (primeiro ciclo) ou
segunda infância ― dos seis aos nove anos e Ensino fundamental (segundo ciclo) ou terceira
infância ― dos dez aos quatorze anos. Elas não são uma categoria fixa, mas como uma
ferramenta que a própria categorização me concede para expor um ponto de vista. Isso não
pode ser aceito como uma estrutura exata.
É temeroso dizer ao certo quando essas fases acontecem na vida das crianças. Tudo
que os teóricos afirmaram em termos de fases, ciclos ou outra taxionomia foi a partir de
aproximações científicas, sem o atestado exato do nascimento ou do óbito dessas fases. Há
crianças em que os jogos e brincadeiras sensório-motoras perduram e se mistura com a fase
dos jogos simbólicos. Noutras, os jogos de construção ou de acoplagem invadem o tempo dos
jogos com regras, que numa categoria piagetiana só chegaria à fase operacional concreta, isto
é, depois dos sete anos.
Antes mesmo de se pensar nas modalidades que esse conteúdo brincadeira evoca,
pode se acatar a idéia primeva que tem alguns teóricos quando enxergam na brincadeira sua
força propulsora para a criatividade infantil. Como acentua o psicanalista britânico Donald
Winnicott (1975, p. 79) “é no brincar, e talvez apenas no brincar que a criança e ou o adulto
fruem sua liberdade de criação”.
Outros autores de matiz antropológico como Roger Caillois (1990, p. 59) adverte-nos
que a brincadeira não é simplesmente uma atividade de distração individual. É certo que
existem numerosos jogos de destreza em que requerem uma habilidade pessoal, mas mesmo
essas brincadeiras perdem sua força quando praticadas sozinhas. No caso do ioiô, da pipa ou
papagaio e o pião a criança deixa logo de se divertir quando não há nem concorrentes e nem
espectadores. O que o autor sugere é que praticada solitariamente, logo a brincadeira deixa de
ser uma atividade individual e passa a ser coletiva porque exige a presença do outro. É dessa
lição educativa que podemos tirar proveito quando se estiver no campo da Educação Infantil.
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Esse apelo do outro nos remetem a novos desafios. Mais uma vez é esse mesmo autor
que sugere que enxergamos uma fronteira entre as atividades lúdicas, do campo da paidia
(palavra grega que refere-se à criança), e às atividades regradas de ludus (palavra latina que
quer dizer jogo com regras). Desse modo, quando as crianças se envolverem em atividades
como a Amarelinha, Ciranda-cirandinha, Mímicas, parlendas... que têm uma função precípua
de divertir ou de “matar o tempo da vida social” como gosta de frisar o sociólogo francês
Michel Mafessoli (2000), elas são enquadradas como Brincadeiras. Por outro lado quando as
atividades exigirem um apelo emocional, um rigor intelectual e um esforço físico a toda prova
de seus praticantes, a exemplo do Xadrez, da Queimada, do Bete ou Taco e das competitivas
são chamados de Jogos.
Essa diferença semântica é que garante de forma didática a compreensão para lidarmos
no campo da escola com atividades que podemos utilizar a serviço da educação e da formação
dos alunos, não importa o grau que estejam. Se são preferencialmente lúdicas, divertidas e
entretidas devem ser mais adequadas à Educação Infantil, sobretudo aquelas que lidam com
brinquedos e com a fantasia infantil. Esse campo simbólico das crianças constitui uma fase
fértil a explorar.
Se forem atividades que exigem competitividade, aprendizagem de regras sociais e
estímulo a condutas cooperativas, sugerimos que sejam destinadas às crianças mais graúdas –
do Ensino fundamental. Para o Primeiro Ciclo – 1°. ao 5°. Ano, os Jogos que predisponham a
entrada nalgum esporte, mas sem perder “a excelência do brincar”, como insiste a pedagoga
britânica Janet Moyles (2006), são bem-vindos.
Como nascem as brincadeiras?
As Brincadeiras se situam, preferencialmente, no campo do simbólico, como diz Jean
Château (1987) no terreno dos jogos de faz-de-conta. Elas nascem de uma força criativa que
tem o ser humano, as crianças por excelência, para exercer a sua rubrica lúdica, isto é, a sua
capacidade natural de inventar coisas, objetos, fatos e estórias que põem em ação para
preencher o tempo de sua existência subjetiva e social.
Essas atividades devem ter a preocupação primordial de ajudar as crianças a
estimularem-se para sua criatividade, para aprendizagem das regras sociais, para se libertarem
dos “horrores do mundo de gigantes” como prefere o ensaísta alemão Walter Benjamin (1984,
p. 64), porque esse mundo é feito de obrigações pesadas demais para a cultura infantil que
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tem outra realidade para dar conta. É bom lembrar que essa criança a que se refere o autor se
materializaria numa “criança ideal” e não nas “crianças reais” que conhecemos, sobretudo
aquelas dos países mais empobrecidos, onde têm, desde cedo roubado a sua infância.
É bom lembrar que o conceito brincadeira não existe noutra cultura lingüística como
nós o utilizamos por aqui. Muitas vezes se confunde com a palavra ludicidade que não
consegue separar aquilo que dissimula, que simboliza e o que dá prazer. A qualidade que tem
um objeto (brinquedo) ou uma atividade (brincadeira) que faz despertar um estado lúdico, a
espontaneidade, o senso de humor e a alegria. É uma atividade livre, instável, voluntária e,
não sujeita a ordens externas ao seio da própria brincadeira. O professor de crianças deve
saber que é precisamente em tal fato que reside sua liberdade.
Por que brincar é bom para as crianças
A brincadeira consiste em um conjunto de elementos que organiza a vida social de
toda a criança. Ninguém contesta que sua existência é essencial à saúde física, afetiva e
intelectual do ser humano. É muito usado o clichê de que “a brincadeira é coisa séria”. Outros
abusam do aforismo do poeta-filósofo Schiller do século XVIII: “o homem só se completa
quando brinca”. Isto talvez se justifica porque a brincadeira opera numa esfera da seriedade,
sem fraude, o brincador se engaja num movimento voluntário e doador. Quem a ela se entrega
“promete” participar ativamente até o fim.
Pode ser transmitida de forma expressiva de uma geração a outra ou aprendida nos
grupos infantis, na rua, em parques, escolas, igrejas, festas. Alguns autores, de corrente
biológica afirmam que existe uma predisposição genética: basta nascer e já se sabe brincar. O
enigma de Kaspar Hauser pode servir de exemplo. Incorporada pelas crianças de maneira
espontânea varia nas regras e na organização do conteúdo, segundo as convenções da própria
cultura infantil. Pode acontecer de uma brincadeira ter um nome diferente, constituir-se de
número distinto de brincadores, muda a forma, mas mantém o mesmo conteúdo e função. A
bola de gude serve de exemplo que em algumas regiões do Brasil chama-se “birosca”,
“bolita” ou “burquinha”. Em alguns lugares faz um círculo para prender as “bolitas’, noutro
faz-se um triângulo, noutros não faz figura nenhuma. Em alguns lugares o arremesso é
distante das “burquinhas”, em Cuiabá, o arremesso é feito próximo ao círculo.
Desse modo toda brincadeira pode ser identificada a partir de seu conteúdo que
expressa-se em relação aos seus objetivos de envolver os brincadores e fazer chegar até o fim;
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a sua forma que indica a organização da atividade no que se refere aos objetos, tempo, espaço
e número de brincadores e sua função precípua: a de entreter os seus participantes. Quando
essas atividades ou conteúdos, intencionalmente, adquirem status pedagógico para ensinar
alguma coisa aos seus brincadores, eles viram jogos. Isto é, atinge o estágio de Jogo.
Na brincadeira, por redundância da aliteração, o participante aprende a brincar a
brincadeira, descobre os seus mecanismos de execução, se torna um habilidoso, como
manipular um pião, um bilboquê, pular uma corda ou saltar os quadrados da Amarelinha. Esse
movimento é espontâneo e o brincador aprende a operar. A brincadeira pode ser aprendida,
isto é, servir de conteúdo, quando ao mesmo tempo pode servir de ferramenta, fazendo a vez
de método ― uma maneira global de expressão, comunicação e exploração do mundo infantil
que envolve todos os domínios de sua natureza.
Nos jogos, há uma intenção anunciada, quando se aprende alguma coisa com o quê se
joga. Alguma coisa externa à própria dinâmica do jogo, exemplo, quando o jogador aprende a
cooperar (literalmente a operar com o outro), a perder, a vencer, a conhecer as regras do Jogo:
aprende sobre operações matemáticas e regras da gramática. As mnemônias (técnicas para
desenvolver a memória e memorizar coisas, que utiliza exercícios e ensina artifícios, como
associação de idéias ou fatos difíceis de reter, a fazer combinações e arranjos de elementos
numéricos) são um bom exemplo para guardar datas, valores, e identificar famílias das
espécies.
Brincadeiras e Jogos ― Semelhanças e diferenças para vocações semânticas distintas
Foi o historiador e filósofo holandês Johan Huizinga em sua obra clássica “Homo
ludens” (1990) que nos alertou para a heterogeneidade e a instabilidade das designações da
função lúdica que em grego o termo continha. O latim enquanto uma língua objetiva logo
tratou de encontrar uma única palavra que cobrisse todo o terreno do jogo. Essa palavra é
ludus para marcar, sobretudo o caráter não-sério, a simulação, a ilusão e o faz-de-conta que
carrega a ludicidade. Para o inglês game, para francês jeu, para o espanhol juego, em italiano
jioco, para o alemão spiel querem dizer brincadeira e jogo ao mesmo tempo.
Na cultura brasileira nós separamos o termo Brincadeira como atividade frágil e sem
importância ao mundo trabalho. Frívola e não-séria, diferente de Jogo que indica
necessariamente uma atividade regrada com objetivos em resultados rentáveis, seja no campo
pedagógico, no espaço da moral, seja até mesmo no campo financeiro com as loterias e todos
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os jogos de azar. Portanto, brinca-se para entreter e passar o tempo e, joga-se para ganhar
alguma coisa: prêmio, status, dinheiro, prestígio. Os bingos em festas religiosas são bons
exemplos para esses tipos de jogos. Essa é uma diferença fundamental: brinca-se para
entreter-se, joga-se para ganhar.
Quadro sugestivo de como se estrutura as Brincadeiras e os Jogos: diferenças e semelhanças
BRINCADEIRAS
JOGOS
Praticantes
Crianças e pré-adolescentes
Pré-adolescentes, jovens e adultos
prioritários:
brincadores
e
jogadores
Espaços de realização
Escolas, ruas, praças, espaços sociais
Escolas, ruas
Quadras, campos
Objetos preferenciais
Bonecas bolas, carrinhos, arcos, Bolas, loterias, tabuleiros, pistas
pipas, pião, cordas, sucatas...
Função precípua
Entreter, matar o tempo, divertir, Ganhar algo, testar a própria força, vencer
prazer
desafios
Público alvo
Trocinhas, turmas mistas
Às vezes separa por gênero, jogos para
meninos, jogos para meninas
Ação dos sujeitos
Físicas, mentais, motoras, sociais
Físicas, intelectuais, emocionais, morais
A entrada dos jogos na vida escolar
Na educação Física clássica eles são reconhecidos como os Jogos Pré-desportivos
porque fazem a entrada da criança no mundo dos esportes pela via didática do Jogo. Com eles
aprendemos os fundamentos dos esportes, o gesto mecânico e estereotipado dos esportes de
quadra, a fadiga renitente dos esportes de pistas.
Para o Ensino Fundamental do segundo ciclo – 6°. ao 9°. Ano, os jogos podem ser
substituídos pelos esportes. O pré-adolescente de onze anos já tem uma estrutura psicológica,
física, intelectual e social para lavorar com essas práticas que requerem um esforço físicomotor, uma carga emocional quando chegarem às perdas e os ganhos, e uma inteligência
refinada para decifrar a engenharia técnico-tática dos Jogos e uma educação social para
traduzir as aprendizagens derivadas do uso das regras, da disciplina de repetições e de
pequenos treinamentos e do modo gentil que deve escoar ao fair-play social de seu cotidiano.
Como se define e como nascem os jogos?
Quem primeiro ousou a sua definição foi o historiador Johan Huizinga (1990) que
tratou de considerá-lo como um elemento da cultura humana. Para tanto definiu o jogo da
seguinte maneira:
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sob o ponto de vista da forma, pode resumidamente definir-se como uma ação livre,
vivida como fictícia e situada para além da vida corrente, capaz, contudo, de
absorver completamente o jogador; uma ação destituída de todo e qualquer interesse
material e de toda e qualquer utilidade; que se realiza num tempo e num espaço
expressamente circunscritos, decorrendo ordenadamente e segundo regras dadas e
suscitando relações grupais que ora se rodeiam propositadamente de mistério ora
acentuam, pela simulação, a sua estranheza em relação ao mundo habitual.
(CAILLOIS, 1990, p. 23-24)
Os Jogos provêm de um vocábulo que abriga vários significados. Por possuir uma
riqueza polissêmica será tratado aqui, diferente de outros autores, como sendo um segundo
degrau da brincadeira. A brincadeira no primeiro piso, o jogo no segundo plano e o esporte no
terceiro andar desse edifício imaginário pode nos ajudar a separar, didaticamente, uma
atividade como as brincadeiras voltadas para as crianças menores e, os jogos e os esportes
endereçados aos pré-adolescentes.
Como alguns teóricos se serviram dos Jogos?
Jean Piaget (1978, p. 188-192) em sua tese sobre os jogos dissociados das atividades
não-lúdicas tomando o trabalho por excelência, descobre alguns critérios com quais pensa em
melhor descrevê-los: a) autotélico: desinteressado por um lado, mas altamente interessado
porque o jogador se preocupa com o resultado de sua atividade;
b) espontâneo: tal como as pesquisas intelectuais primitivas das crianças como da ciência
pura são também espontâneas; c) prazer: os jogos de um modo em geral se exercitam em
busca de prazer. Prazer de ganhar, de bater seus recordes, de saltar mais longe, de resolver
uma equação matemática, de ver seu colega em cheque mate no jogo de Xadrez; d)
organização: há uma relativa falta de organização como acontece com os jogos simbólicos,
eles ocorrem de modo aleatório; e) libertação dos conflitos: o jogo ignora os conflitos. O
tormento da infância passa pelo conflito da obediência e da liberdade individual. Por isso o
uso de penalidades (advertência e/ou expulsão do jogo) para resolver logo esses conflitos; f)
supramotivação: varrer um soalho não é um jogo, mas varrer descrevendo uma figura
assume um caráter lúdico. Poder-se-ia dizer também que os jogos são competições esportivas
de várias modalidades que se realizam geralmente com intervalo fixo de tempo, em que se
distribuem medalhas aos vencedores, mas essa vocação eu endereço aos esportes.
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Características dos Jogos enquanto atividades lúdicas
Todo autor a partir de sua teoria se sente à vontade para eleger como descrever sobre
o assunto Jogo. Autores da seara histórico-filosófica preferem discorrer sobre o discurso que o
próprio termo invoca como uma palavra polissêmica que abriga vários significados. Outro
grupo, em especial os de vertente psicopedagógica, prefere tomá-lo a partir dos aspectos
metodológicos, enxergando nos jogos uma vocação conteudista, aplicável no terreno da
educação escolar. Um terceiro grupo de autores, de matiz antropológico, apreende dos jogos
os motes para entender a importância dos rituais na personalidade humana.
O sociólogo e antropólogo francês Roger Caillois (1913-1978) em seu livro “Os
jogos e os homens” (1990) descobre, a partir da leitura que faz de “Homo ludens” de Johan
Huizinga (1872-1945), os aspectos fundamentais que fazem do jogo uma atividade
essencialmente humana. A essas características correspondem: livre: se o jogador fosse
obrigado a jogar, o jogo perderia de imediato sua natureza de diversão atraente e alegre;
delimitada: circunscrita a limites de espaço e de tempo, rigorosa e previamente estabelecidos;
incerta: seu desenrolar não pode prever o resultado previamente, já que deixa à vontade do
jogador uma certa liberdade de inventar; improdutiva: não gera bens, nem riqueza, nem
novos elementos de espécie alguma, e, salvo alteração de propriedade no interior do círculo
dos jogadores, conduz a uma situação idêntica à do inicio da partida; regulamentada: sujeito
a convenções que suspendem as leis normais e que instauram momentaneamente uma
legislação nova, a única que conta; fictícia: acompanhada de uma consciência específica de
uma realidade outra ou de franca irrealidade em relação à vida normal.
Brincadeiras e jogos na Primeira Infância: sugestões de atividades para crianças até 5
anos
As crianças que pertencem a esse grupo costumam a repetir todo o tipo de movimento
que lhes dão prazer. Mas como os movimentos são feitos de modo sincrético essas atividades
aparecem como os primeiros exercícios sensoriais simples ou combinações de ações sem
finalidade aparente. Puxar um carrinho, fazer rodar um arco, tentar fazer sair um som, bater
um tantã, arremessar um objeto... são gestos que se prolongam até a vida adulta, mas nessa
fase implicam em poucas aquisições novas porque não requerem aquela complexidade, por
isso eles tendem a abandonar rapidamente e diminuir a intensidade porque não faze chegar ao
seu fim.
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A recomendação é para que nessa fase envolvemos as crianças em brincadeiras ou
atividades lúdicas leves e moderadas, que dispensem a aceleração e a precisão dos
movimentos. Como não domina uma precisa coordenação motora, tendem a se debaterem e a
se machucarem nesses eventos. As brincadeiras cantadas, as brincadeiras de roda, a
manipulação de brinquedos simples e as estórias fabulosas exercitam a fantasia, que
divulguem o simulacro e o faz-de-conta são muito bem-vindas.
Nas brincadeiras simbólicas as crianças aprendem a fazer imitações, a brincar de fazde-conta, a incorporar o “Era uma vez...” a representar o pai, a mãe, o seu professor, sujeitos
importantes em processo de sublimação. Os eventos imaginários envolvem em situações
distintas do mundo dos adultos, como no caso da boneca que faz as meninas a articular
personagens, acessórios e condutas desse mundo. Nas brincadeiras de construção ou de
acoplagem as crianças vão aprender a ordenamentos lógicos. É quando os objetos se juntam
para formar um carro, um barco, uma casa. As partes formarão o todo. Uma outra etapa desta
fase, que começa mais ou menos aos quatro anos de idade, mas ainda de modo confuso são as
atividades lúdicas com regras simples que vão se complexando até os sete anos.
Brincadeiras e jogos na Segunda Infância: sugestões de atividades para crianças de 6 a 10
anos
As crianças que pertencem a essa fase estão próximas daquilo que Piaget chamou de
“jogos com regras” ou fase operacional. Já dominam o universo simbólico, já mantém uma
estrutura física capaz de suportar brincadeiras com movimentos rápidos e são capazes de
entender uma seqüência lógica. Sustentado por objetos e acessórios definidos essas
brincadeiras com regras tomarão nos adolescente uma forma mais elaborada, porque
precisarão de raciocínio rápido e de combinações puramente lógicos, hipóteses, estratégias e
deduções. É a chegada a hora do Jogo de Xadrez, dos jogos de tabuleiros, dos pré-desportivos
que envolvem manipulação e domínio de objetos e da entrada dos esportes mais complexos.
Brincadeiras e jogos na Terceira Infância: sugestões de atividades para crianças 11 a14
anos.
A essa terceira fase sugerimos jogos de regras complexas, compreendendo que as
crianças são pré-adolescentes capazes de pôr em ação as diversas formas lúdicas já vividas.
Estas habilidades serão indispensáveis à expressão da conduta cognitiva para a compreensão e
aplicação das regras; do vigor físico emprestado às provas de força muscular; do domínio das
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expressões afetivo-emocionais como as perdas, as vitórias e certa educação moral para
entender que esses eventos se repetem e, dependendo do empenho empregado, podem “dar a
volta por cima” sem precisar fraudar o Jogo. O fair-play será uma obrigação para a garantia
de um Jogo limpo. Essas crianças crescidas se interessarão por jogos que produzem desafios,
que os exponham em perigos eminentes de lucros ou prejuízos, sentimentos comuns dos jogos
competitivos.
Considerações finais: que lições educativas as crianças e seus professores podem ter com
as brincadeiras os jogos na escola?
Com a evolução da tecnologia e a sendentarização do homem, conforme decreta Le
Breton (2003): “a humanidade passou a ser uma humanidade sentada”, cada vez mais é
urgente estimular o movimento corporal através de jogos e de brincadeiras nos loci escolares.
A passagem da criança, da educação infantil ao ensino fundamental, é preenchida com
brincadeiras, jogos e o movimento farto, mas que ainda ficam restritos às aulas de educação
física. Se o professor adotar brincadeiras em suas aulas, quando sozinhas, nos encontros
fugidios entre uma aula e outra ou ao recreio, elas vão reproduzir esse movimento adotado
pelos professores. Esse mesmo movimento pode ser adotado na sala de aula, a partir daquela
fase de ler e escrever como conteúdos de pauta para a ascensão do sujeito.
Se é verdade que a criança aprende só quando é submetida a um ensino sistemático
com conteúdos centrados em seu aspecto intelectivo, pode estar aí o fracasso de uma criança,
enquanto um ser globalizado e com a chanse de ser lúdico não ser estimulado pela ludicidade
enquanto método em qualquer fase do desenvolvimento infantil e para qualquer criança, como
forma de aprendizado e de estímulo de aprendizagem.
As virtudes que sucedem com a adoção da brincadeira no design escolar e seu
enfrentamento com a formação total das crianças podem favorecer às crianças: identificar,
classificar, agrupar, ordenar, seriar, simbolizar, combinar, estimar, e ao mesmo tempo,
desenvolver a atenção, a concentração, a socialização, o fair-play, sem mesmo a interferência
do adulto. A brincadeira é por si só estimuladora na aquisição de algum conhecimento. A
percepção daquilo que consideramos como espaço “sagrado”, enquanto instituições de ensino,
é que cada vez mais a brincadeira, o jogo ― o lúdico, enquanto rubrica do Homo ludens,
assim como o movimento corporal estão privados do processo de aprendizagem.
Questões relacionadas com a escola, à criança e à ludicidade nortearam este texto mais
propriamente dito, levantando a seguinte problematização: A escola da educação infantil ao
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ensino fundamental oportuniza momentos de brincadeira, favorecendo o movimento lúdico
tão requerido pela infância? Onde é permitido brincar na instituição escolar?
As instituições escolares devem fazer parte deste projeto, por compreender através de
estudos que as necessidades infantis, no que se refere a processos de formação e
desenvolvimento, em relação ao mundo que a cerca, deve interagir com outros sujeitos, com o
brinquedo e ainda entendendo a criança como um ser lúdico, criativo, curioso, ativo
corporalmente e expressivo e imergir em escolas deve ter à disposição toda a liberdade
corpórea, no que diz respeito a uma fartura de movimento, preenchendo as obrigações
pedagógicas, desde o primeiro ano, em sua maior parte do tempo possível.
É na (des) ordem, quem sabe que teremos uma maior disposição de atividades lúdicas
com crianças ocupando os pátios e preenchendo o recreio com muito movimento e carreira.
Deveria ser prioridade nas escolas reconhecer o processo educacional buscando atender
adequadamente às necessidades gerais do ser humano, naquilo que compreende a sua
estrutura complexa, como nos ensina Edgar Morin (2006): biológicas, psicológicas, sociais,
culturais e de aprendizado.
REFERÊNCIAS
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1984.
BROUGÈRE, Gilles. Brinquedos e Companhia. São Paulo: Cortez, 2004.
CHÂTEAU, Jean. O jogo e a criança. São Paulo, Summus, 1987.
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PIAGET, Jean. A formação do símbolo na criança: imitação, jogo e sonho, imagem e
representação. Rio de Janeiro: Guanabara, 3ª. Ed., 1978.
OLIVEIRA, Sonia C. & GOMES, Cleomar F. Adolescência e ludicidade: jogos e
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WINNICOTT, Donald Woods. O brincar e a realidade. Rio de Janeiro: Imago Editora,
1975.
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