SOCIEDADE DE EDUCAÇÃO DO VALE DO IPOJUCA – SESVALI MANTENEDORA DA FACULDADE DO VALE DO IPOJUCA – FAVIP CURSO DE BACHARELADO EM DIREITO FRANCISCO DE ARRUDA GUERRA NETO DISCUSSÕES ACERCA DO TRÁFICO DE DROGAS E DESCRIMINALIZAÇÃO DA MACONHA CARUARU 2011 Luiz de França Leite Diretor Presidente da Faculdade do Vale do Ipojuca Vicente Jorge Espindola Rodrigues Diretor Vice-Presidente da Faculdade do Vale do Ipojuca Profª. MScMauricélia Bezerra Vidal Diretora Executiva da Faculdade do Vale do Ipojuca Profª. MSc Rita de Cássia Souza Tabosa Freitas Coordenadora do Curso de Direito FRANCISCO DE ARRUDA GUERRA NETO DISCUSSÕES ACERCA DO TRÁFICO DE DROGAS E DESCRIMINALIZAÇÃO DA MACONHA Monografia apresentada ao Curso de Direito da Faculdade do Vale do Ipojuca - FAVIP, para obtenção do grau de Bacharel em Direito, sob a orientação da professora Paula Isabel Bezerra Rocha Wanderley. CARUARU 2011 G934d Guerra Neto, Francisco de Arruda. Discussões acerca do tráfico de drogas e descriminalização da maconha / Francisco de Arruda Guerra Neto. -- Caruaru : FAVIP, 2011. 46 f. : Orientador(a) : Paula Isabel Bezerra Rocha Wanderley. Trabalho de Conclusão de Curso (Direito) -- Faculdade do Vale do Ipojuca. 1. Maconha. 2. Descriminalização. 3. Estado. 4. Sociedade. 5. Problemas. I. Título. CDU 34[12.1] Ficha catalográfica elaborada pelo bibliotecário: Jadinilson Afonso CRB-4/1367 FRANCISCO DE ARRUDA GUERRA NETO DISCUSSÕES ACERCA DO TRÁFICO DE DROGAS E DESCRIMINALIZAÇÃO DA MACONHA Monografia apresentada ao Curso de Direito da Faculdade do Vale do Ipojuca - FAVIP, para obtenção do grau de Bacharel em Direito, sob a orientação da Professora Paula Isabel Bezerra Rocha Wanderley. Aprovada em:___/___/___ BANCA EXAMINADORA ___________________________________________ Paula Isabel Bezerra Rocha Wanderley. ___________________________________________ Membro da Banca Examinadora ___________________________________________ Membro da Banca Examinadora "É graça divina começar bem. Graça maior persistir na caminhada certa. Mas graça das graças é não desistir nunca." Dom Hélder Câmara Aos meus pais Ednaldo e Raquel grandes batalhadores que lutaram para que eu conseguisse concretizar este sonho. À minha eterna avó Odete de Lima (in memoriam) que se emocionou ao saber que eu tinha passado no vestibular. Ao meu primo Welington (in memoriam). À minha namorada Lívia Beatriz que sempre me incentivou a buscar o meu melhor. AGRADECIMENTOS Primeiramente a Deus, que sem sua força este sonho não seria concretizado; Ao meu pai Ednaldo, por também ser este um sonho dele; A minha mãe Raquel, por sempre depositar confiança e por toda sua batalha para que pudesse financiar meus estudos; A minha avó, Odete (in memoriam), por ter vibrado, comemorado e se emocionado ao receber a notícia de que eu tinha passado no vestibular; A minha avó Anete, que sempre torceu pelas minhas realizações; A minha irmã Karen, que sei que torce muito por mim; A minha namorada Lívia Beatriz, amor de minha vida, que fez com que eu acordasse para o curso de Direito, incentivando e fazendo com que eu acreditasse em meu sonho; Ao meu Tio Erivaldo Guerra, que foi em quem sempre me espelhei e por sempre ter incentivado todos da família a estudarem; Ao meu primo Welington “Boião” (in memoriam), por ter propiciado 23 anos de alegrias, brincadeiras e histórias que jamais serão esquecidas; Aos meus sogros Juarez e Iêda, que são como segundos pais; Minha cunhada Larissa, por ser louca por mim; A minha “sobrinha” Suzy (in memoriam), por todo seu companheirismo; Ao meu amigo Lucas Melo, que muito meu ajudou neste trabalho; Agradeço a professora Paula Rocha, por ter orientado de forma brilhante, por toda sua atenção poissinequa non teria concretizado esse trabalho; Enfim, obrigado meu Deus, por tudo. RESUMO Este trabalho tem como principal objetivo demonstrar os problemas sociais que poderão surgir com a descriminalização da maconha, defendendo a corrente protetora da não descriminalização desta droga. Alerta também quanto à dependência que o consumo da ervacannabis sativa, popularmente conhecida como maconha, pode causar sobre o usuário, causando sérios problemas para o mesmo e para a sociedade. Aborda-se, também, a questão da responsabilidade e dever do Estado de zelar para o bem estar da sociedade. Preocupou-se também em mostrar a responsabilidade que o usuário possui no ciclo do tráfico de drogas, alertando quanto as sanções aplicadas a este. Por fim, procurou-se analisar as discussões acerca dos movimentos que defendem a descriminalização da maconha, movimentos estes popularmente conhecidos como marchas da maconha, e logo adiante se preocupou em demonstrar uma possível solução que o Estado pode tomar para que a sociedade não venha a ser prejudicada com os problemas causados pela droga. Palavras-chave: Maconha. Descriminalização. Sociedade. Problemas.Estado. ABSTRACT This work has as main objective to demonstrate the social problems that may arise with the decriminalization of marijuana,advocating the decriminalization of noncurrent protective of this drug. Also warns about the dependence of consumption of the herb cannabis sativa, commonly known as marijuana, can have on the user, causing serious problems for yourself and for society. It approaches also the question of responsibility and duty of the state to ensure the welfare of society. Worried also show the responsibility that the user has the cycle of drug trafficking,warning of the sanctions imposed on that. Finally, we tried toanalyze the discussions about the movements that advocate the decriminalization of marijuana, these movements commonly known as marijuana marches, and immediately bothered to showa possible solution that the state can take to ensure that societywill not be harmed by the problems caused by drugs. Keywords: Marijuana. Decriminalization. Society. Problems.State. SUMÁRIO INTRODUÇÃO 08 CAPÍTULO I: BREVES CONSIDERAÇÕES ACERCA DA LEI N° 11.343/06 1.1 Contexto histórico da Lei n° 11.343/06 1.2 Diferença entre: usuário, dependente, 12 consumidor, (usuários/traficantes) 1.3 Questões econômica envolvida por trás da droga traficante, mulas 14 16 CAPÍTULO II: O ARCABOUÇO PRINCIPIOLOGICO QUE ENVOLVE A TEMÁTICA: INSIGNIFICÂNCIA, INTERVENÇÃO MÍNIMA, FRAGMENTARIEDADE, ALTERIDADE, EXCLUSIVA PROTEÇÃO DO BEM JURIDICO. 2.1 Princípios 18 2.1.1 Princípio da insignificância 18 2.1.2 Princípio da intervenção mínima 20 2.1.3 Princípio da fragmentariedade 22 2.1.4 Princípio da alteridade 23 2.1.5 Princípio da exclusividade do bem jurídico 24 2.2 A constitucionalidade dos crimes de perigo abstrato? 25 2.3 Relação de consumo: usuário x traficante 27 CAPÍTULO III: A MARCHA PELA DESCRIMINALIZAÇÃO: APOLOGIA AO CRIME OU LIBERDADE DE EXPRESSÃO? 3.1 Despenalizar não é descriminalizar 30 3.2 Uma analise de duas realidades – Brasil e Holanda 30 3.3 Polêmica em torno da descriminalização da maconha 33 CONSIDERAÇÕES FINAIS REFERÊNCIAS 8 1. INTRODUÇÃO Como já sabido, há muito tempo as drogas vem causando sérios problemas a humanidade, e a cada dia o aumento de seu consumo cresce de forma avassaladora. Como relata Nelson Hungria após o fim da primeira guerra mundial o consumo de drogas teve um considerável aumento na Europa, devido a diversos fatores como: o ódio, os sonhos destruídos e as lembranças terríveis. Com todos os problemas prejudiciais causados pela droga ao ser humano, cabe ao Estado a busca de soluções para combater as mesmas. O ordenamento jurídico brasileiro inovou o tratamento aos usuários e dependentes de drogas com a criação da Lei 11.343 de 23 de agosto de 2006, revogando leis anteriores relacionadas as drogas, como as leis 6368/76 e 10.409/02,no que se refere a traficante de drogas o seu tratamento criminal se tornou mais rigoroso, já no tocante ao usuário e dependente de drogas a lei buscou uma forma de resgate, propiciando tratamento terapêutico ao usuário e ao dependente. Assim como a lei produz beneficio ao usuário e dependente, esta possui caráter retroativo, podendo envolver o condenado e ou o suspeito investigado em inquérito policial, chamando assim esse beneficio produzido pela lei de novatio legis in melius. Quanto ao traficante de drogas, que a ele foi imposta uma pena mais rigorosa ocorreu uma novatio legis in pejus. Por outro lado existem movimentos que lutam em favor da descriminalização de uma certa droga ilícita: a maconha. Tais movimentos são conhecidos como marchas da maconha, onde já se discutiram até mesmose a pratica deste movimento configurava apologia ao crime, onde o STF decidiu que tais manifestações eram definidas como direito de liberdade de expressão. Vislumbra se aqui a demonstração dos problemas que surgirão com a possível descriminalização da maconha, tais como o aumento da criminalidade, fortalecimento do tráfico e o perigo causado à saúde pública. Mas também mostraremos algumas medidas a serem adotadas para que consigamos extinguir esta lastima. Por fim, tentou-se mostrar que a possível solução de todos os problemas que advém das drogas, seja a mudança de todo um sistema de corrupção que circula por trás das policias, políticos, mídia e etc. 9 1.2 Objetivos 1.2.1 Objetivos Gerais O referido trabalho tem como objetivo alertar quanto aos problemas que poderão surgir com a possível descriminalização da maconha. Pretende mostrar também a realidade brasileira comparando-a com a de países que já legalizaram a maconha. 1.2.2. Objetivos específicos Demonstrar o amparo legal da lei de drogas; Apresentar o arcabouço princípiológico que envolve a temática; Realizar uma avaliação nas leis anteriores que tratavam de política preventiva contra as drogas no Brasil; Alertar quanto a futuros problemas que poderão surgir com a possível descriminalização da maconha, focando cada vez mais o bem estar da sociedade. 1.3. Justificativa No momento em que o Estado poderia se desgastar o combate do tráfico de drogas, devido a movimentos que reivindicam a descriminalização da maconha no Brasil. O bem estar da sociedade não pode ser colocado em uma posição de duvida, ou seja, não podemos arriscar com a descriminalização da maconha, pois não tenhamos duvidas quanto ao surgimento de problemas sociais, como o aumento da criminalidade, problemas relacionados à saúde pública, aumento significativo do número de dependentes desta droga. Assim, mesmo com toda a pressão vinda das marchas da maconha em favor da descriminalização desta droga, o Estado deve reprimir o tráfico e o consumo, e em momento algum deve se abster de sua responsabilidade de zelar pelo bem estar da sociedade. O objetivo deste trabalho é mostrar a responsabilidade que o Estado tem de fiscalizar e punir o usuário e traficante, mostrando que eles são proporcionalmente iguais responsáveis pelo tráfico de drogas. E também em dar toda a base para o 10 tratamento do dependente de drogas. Além de criar políticas de prevenção para que pessoas que nunca tiveram contato com a maconha venham a provar desta droga e consequentemente virar um dependente, mesmo esta sendo tida como uma droga leve, mas esta pode servir de trampolim para que os usuários experimentem drogas mais pesadas. Alertamos quanto ao tratamento dado ao usuário pela Lei n° 11.343/06, onde este é colocado a medidas socioeducativas, sendo vedada a pena restritiva de liberdade. Nossa proposta seria a imposição de um rigor maior na pena restritiva de direitos dado ao usuário, além do Estado disponibilizar o tratamento do usuário dependente, como forma de sanar esta lastima na saúde pública brasileira. Os argumentos da corrente protetora da descriminalização devem ser considerados devido ao direito de liberdade de expressão, mas não podemos arriscar a descriminalização da maconha no Brasil, visto que países que liberaram o uso desta droga, hoje pensam em rever essa situação, devido aos problemas que decorreram desta legalização. Devemos mudar e fiscalizar todos os corruptos que compõem o sistema, fiscalizar todo o ciclo que a droga percorre, e punir todos os envolvidos que de forma direta ou indiretamente facilitam a prática desta conduta. O tráfico de drogas é um problema geral de todos. 1.4. Metodologia 1.4.1. Natureza da pesquisa Quanto aos fins É sugestiva e explicativa, pois propõe possíveis soluções para os problemas que possam existir com a possível descriminalização da maconha. Quanto aos meios Trata-se de uma pesquisa de opinião, pois deriva do estudo da atual lei de drogas, com o surgimento da ideia de descriminalizar a maconha.Requerpesquisa bibliográfica e demonstração de possíveis problemas que poderão surgir com a possível legalização do uso da droga ilícita denominada maconha. 11 Quanto à forma de abordagem A forma de abordagem da pesquisa é estritamente bibliográfica, através de textos, livros e artigos. 1.4.2. Coleta de Dados A coleta de dados foi extraída através de artigos de internet, livros e dispositivos legislativos. livros de direito Penal, Livro de lei de drogas comentada, livro de Direito Constitucional, além da Constituição Federativa do Brasil. 12 CAPÍTULO I. BREVES CONSIDERAÇÕES ACERCA DA LEI N° 11.343/06 1.1 Contexto histórico da Lei n° 11.343/06 Compreender o contexto histórico daLei de drogas é de extrema importância para que consigamos assimilar o significado político e a intenção do legislador com a criação desta. ALei 11.343de 23 de agosto de 2006 é o mais novo diploma legislativo pertencente ao sistema normativo brasileiro, destinado a fiscalizar o uso de drogas ilícitas. Esta leifoi criada com a intenção de introduzir no país uma política preventiva contra as drogas, direcionada para reduzir o perigo coletivo que surge com o consumo proibido de drogas e tutelar o bem jurídico que neste caso é a saúde pública. Deste modo, a nova Lei de Drogas, em sua redação, em alguns pontos, trata com mais rigor o traficante, e em outro momento inovou ao despenalizar condutas que antes eram punidas pela Lei n° 6.368/76, somente atribuindo a tais condutas, penas restritivas de direitos, pois os usuários ou dependentes não terão contra eles instaurado inquérito policial, caso venha a ser preso por posse de droga para consumo pessoal, mas sim será lavrado um termo circunstanciado de ocorrência (TCO). A entrada em vigor da referida Lei foi estabelecida em seu artigo 74, onde esta contou com a vacatiolegis de quarenta e cinco dias. E logo adiante, em seu artigo 75, revogou expressamente as leis anteriores de n° 6.368/76quanto a Lei 10.409/2002, porquanto ambas tratavam dos assuntos relacionados a drogas no Brasil. Assim, as duas leis antigas sobre drogas só irão incidir nos crimes ocorridos no momento de sua vigência, mas com finalidade benéfica, onde só será aplicada se for mais favorável que a lei nova, pois como sabemos a lei sempre retroagirá para beneficiar o réu. Como mencionado acima, no que se referia a assuntos relacionados a drogas, o Brasil possuía em seu ordenamento jurídico as Leis n° 6.368/76 e a Lei n° 10.409/02, esta ultima fora elaborada com a finalidade de substituir a Lei 6.368/76, mas seu projeto era detentor de vários vícios de inconstitucionalidade e problemas técnicos o qual chegou a ser vetado em sua parte penal, vindosomente a ser aceita a sua parte processual. Assim, entrou em vigor a parte penal da Lei 6.368/76 e a parte processual da Lei 10.409/02. Deste modo, o surgimento da Lei de drogas (Lei 11.343/06), extinguiu essa lamentável situação de dubiedade e hibridez. 13 A expressão do artigo 75 não se trata de abolitiocriminis, ou seja, os atos definidos como crimes na legislação anterior continuaram sendo contemplados na nova Lei de Drogas, sendo que ao traficante foi imposta uma pena mais rigorosa do que a pena da lei anterior, aumentando de 5 a 15 anos, onde antes era imposta uma pena de 3 a 15 anos. No que tange à sanção aplicável ao usuário, com a elaboração da Lei de Drogas, houve um tratamento menos rigoroso comparado à Lei 6.368/1976, onde ocorreu a despenalização de tal conduta, como podemos observar os textos de artigosde ambas as leis: Lei 6.368/1976, Art. 16: Adquirir, guardar ou trazer consigo, para o uso próprio, substâncias entorpecentes ou que determine dependência física ou psíquica, sem autorização ou em desacordo com a determinação legal ou regulamentar: Pena – Detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e pagamento de 20 1 (vinte) a 50 (cinquenta) dias-multa. Em seu momento a Lei 11.343/06, extinguiu a pena de prisão, expressando que: Art. 28 – Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido às seguintes penas: I – Advertência sobre os efeitos das drogas; II – Prestação de serviços à comunidade; III – Medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo. o § 1 Às mesmas medidas submete-se quem, para seu consumo pessoal, semeia, cultiva ou colhe plantas destinadas à preparação de pequena quantidade de substância ou produto capaz de causar dependência física ou psíquica. o § 2 Para determinar se a droga destinava-se a consumo pessoal, o juiz atenderá à natureza e à quantidade da substância apreendida, ao local e às 1 Redação dada pela Lei 6.368 de 21 de outubro de 1976. Disponível http://www.010.dataprev.gov.br/sislex/paginas42/1976/6368.htm. Acesso em 03.09.2011. em: 14 condições em que se desenvolveu a ação, às circunstâncias sociais e pessoais, bem como à conduta e aos antecedentes do agente. o § 3 As penas previstas nos incisos II e III do caput deste artigo serão aplicadas pelo prazo máximo de 5 (cinco) meses. o § 4 Em caso de reincidência, as penas previstas nos incisos II e III do caput deste artigo serão aplicadas pelo prazo máximo de 10 (dez) meses. o § 5 A prestação de serviços à comunidade será cumprida em programas comunitários, entidades educacionais ou assistenciais, hospitais, estabelecimentos congêneres, públicos ou privados sem fins lucrativos, que se ocupem, preferencialmente, da prevenção do consumo ou da recuperação de usuários e dependentes de drogas. o § 6 Para garantia do cumprimento das medidas educativas a que se refere o caput, nos incisos I, II e III, a que injustificadamente se recuse o agente, poderá o juiz submetê-lo, sucessivamente a: I - admoestação verbal; II - multa. o § 7 O juiz determinará ao Poder Público que coloque à disposição do infrator, gratuitamente, estabelecimento de saúde, preferencialmente 2 ambulatorial, para tratamento especializado. Diante do exposto, percebe-se que houve novatio legis in mellius quanto à nova disposição e em comparação à pena de detenção da antiga lei. 1.2 Diferença entre: usuário, dependente, consumidor, traficante, mulas (usuários/traficantes) No que se diz respeito ao uso e venda de drogas, existem vários personagens reais que atuam neste cenário negativo da sociedade que é o do tráfico de drogas, e para que consigamos adentrar com firmeza no assunto mencionado na temática, é mister conceituar cada um destes. No que se refere ao usuário de drogas, temos a ideia de que é aquele que faz uso de tais entorpecentes, que podem causar dependência, mas ainda possui total controle de seus 2 Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2006/Lei/L11343.htm. Acesso em: 12.09.2011. 15 atos e vontades. Os arts. 283e 29 da lei 11.343/06 traz consigo a definição de usuário de drogas e as medidas a este imposta de forma mais precisa, como podemos ver o seu texto adiante: Art. 29. Na imposição da medida educativa a que se refere o inciso II do § o 6 do art. 28, o juiz, atendendo à reprovabilidade da conduta, fixará o número de dias-multa, em quantidade nunca inferior a 40 (quarenta) nem superior a 100 (cem), atribuindo depois a cada um, segundo a capacidade econômica do agente, o valor de um trinta avos até 3 (três) vezes o valor do maior salário mínimo. Parágrafo único. Os valores decorrentes da imposição da multa a que se o refere o § 6 do art. 28 serão creditados à conta do Fundo Nacional 4 Antidrogas. Utilizando a inteligência de doutrinadores como Sérgio de Oliveira Médici que acerca de dependente de drogas, conceitua-o como: Aquele que está subordinado às substâncias entorpecentes, sujeito às drogas, sob o poder dos tóxicos,"entendendo-se por dependência "o estado 5 de quem está sujeito, sob o domínio, subordinado aos entorpecentes. Para Nucci, o dependente de drogas assemelha-se ao “doente metal”6.Nas lições de João Farias Júnior: [...] a dependência, pela qual o indivíduo fica viciado (na linguagem vulgar), criando a necessidade invencível de consumir a droga e de procurá-la por todos os meios. O equilíbrio de consumir a droga depende do regular uso da droga, pois, se deixa de usá-la, será acometido de estado patológico 7 caracterizado pela, já aludida, síndrome de abstinência. 3 Vide p. 16. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2006/Lei/L11343.htm. Acesso em: 22 de setembro de 2011. 5 MÉDICI, Sérgio de Oliveira.Tóxicos.São Paulo: Jalovi, 1977. p. 36. 6 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006. p.756. 7 JÚNIOR, João Farias. Manual de Criminologia. 3. ed. Curitiba: Juruá Editora, 2003. p. 120. 4 16 A dependência faz o individuo perder o poder de raciocínio, ao dependente não importa mais nada, só o consumo da droga. Assim, ou seja, damos o exemplo do personagem Dr. Rui Dantas, da obra São Jorge de Ilhéus, de Jorge Amado. Este personagem era advogado com dependência em cocaína, era filho do coronel Manecas Dantas, barão do cacau. Na citada obra faz indicação do vício a uma ligação com loucura/doença, como podemos observar à narrativa: (...) Rui Dantas, que dera para ter ataques de loucura (...) os médicos diziam que eram tóxicos. (...) Manecas Dantas triste com a doença do filho (...) era um dos homens ricos da terra, candidato a Prefeito e os médicos garantiam que bastaria Rui deixar cocaína para se curar. Mas, passada a crise, o rapaz voltava ao pó (...) Rui retirou o anúncio no “Diário de Ilhéus”, o dinheiro mal dava para conseguir cocaína, agora raríssima. Nos bares a mão tremula como se fosse um velho (...) Quando discursava, foi acometido por uma das suas cada vez mais constantes crises de loucura (...) Manecas Dantas (...) Sonhava então o filho brilhante advogado, a família rica, (...) as posições políticas. Agora estava pobre (...) o filho doente, viciado, tendo repentinos ataques de loucura. Os médicos balançavam a cabeça: ou deixa os tóxicos ou termina num hospício. (...) tudo que desejava era morrer antes do filho. Para não vê-lo defunto, ou, ainda, pior, definitivamente louco, sendo levado para um hospício. (...) Rui sorri mansamente, Maneca compreende 8 que ele está sob o efeito da cocaína. Ao consumidor e traficante podemos dizer que estes compõem as duas faces da mesma moeda, embora a lei os trate de modo diferente, entretanto é o consumidor quem fomenta o tráfico de drogas. A figura do traficante é composta pelo criminoso que é responsável pela produção, transporte e comercialização da droga, ou seja, é a pessoa que chefia o tráfico. Deste modo o consumidor é tão responsável pelos problemas que causados pela droga, quanto o traficante que comercializa a droga. Há também outro personagem no ramo do tráfico de drogas, este é o usuário/traficante, conhecido e chamado popularmente de mulasou aviãozinhos. Estes por sua vez é a junção das características e definições do usuário e do traficante. As mulas transportam as drogas da fonte ao traficante ou do traficante ao usuário, por isso recebem tal nome, tendo referência ao animal mula que é utilizado para transportar pequenas cargas. Geralmente aviõezinhos ou mulas são pessoas de baixo poder econômico, que se submetem a trabalho para consumir a droga ou para obter vantagem financeira. Para os 8 AMADO, Jorge. São jorge dos ilhéus. São Paulo: Martins, 1970. pp. 220, 231, 233 e 241. 17 traficantes este tipo de mão de obra é extremamente vantajoso, pois caso a mula seja apreendida, o prejuízo que o traficante irá ter será pequeno. 1.3 Questões econômicas envolvidas por trás da droga O mundo do tráfico traz consigo uma movimentação de capital incalculável, muito lucrativa para traficantes, devido ao grande mercado consumista de drogas ilícitas, sendo notável seu fortalecimento econômico, devido à alta demanda que faz a alimentação deste ciclo de produção e distribuição da droga. Faz-se necessário definir demanda para que consigamos entender esta questão econômica gerada pela droga. Demanda tem seu significado definido no dicionário Aurélio, como “a quantidade de mercadoria ou serviço que um consumidor ou conjunto de consumidores deseja e está disposto a comprar, a um determinado preço”9. Assim conclui-se que a demanda é a satisfação dos desejos e necessidades do consumidor. Este desejo/prazer alimenta e faz crescer de forma avassaladora a economia envolvida por traz do tráfico da maconha.A exemplo temos a Inglaterra, “a economia cannabis e dos seus acessórios influenciou o PIB em face de um movimento superior a 11 bilhões de libras esterlinas (cerca de R$ 53 bilhões)”10. O mercado tem sua existência ligada ao poder de consumo do ser humano. Consome-se não pela necessidade, mas sim para obter o objeto desejado, que este por sua vez é divulgado pela mídia cuja publicidade e marketing faz com que o consumidor pense que o seu objeto de desejou virou um item essencial. Assim trabalhar é o de menos, o mais importante é consumir, e ao mercado não importa saber a origem deste dinheiro. Não importa se tem origem no desvio de verbas públicas, se é fruto de sonegação fiscal, se vem da prostituição ou da venda de drogas ilícitas como a maconha, cocaína, ecstasy, crack e etc. Pois o dinheiro non olet, e ao mercado só interessa uma linguagem: compra e venda. Não tenhamos duvidas quanto ao enorme capital gerado no comercio da droga para traficantes, no caso de uma possível descriminalização esta arrecadação seria direcionada ao Estado, que por sua vez tributaria sobre a droga. Tal arrecadação poderia ser vista como 9 FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Miniaurélio século XXI: O minidicionário da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2001. p.225. 10 MAIEROVITCH, Walter Fanganiello. Os efeitos econômicos da cannabis. In: Carta Capital. São Paulo: Confiança, n. 237, 23 de abril de 2003. p.10. 18 uma forma positiva, mas não podemos nos deixar enganar, por discursos de quem cegamente defende a descriminalização desta droga utilizando argumentos de que com a arrecadação tributária da droga poderia ser revertida em construções de escolas, hospitais, praças e etc. Mas a nosso ver ao mesmo tempo que se arrecadaria o Estado gastaria fortunas com politicas de prevenção de o uso da droga, como o mesmo hoje faz campanhas para tentar diminuir o numero de consumidores de álcool e do tabaco. CAPÍTULO II. O ARCABOUÇO PRINCIPIOLOGICO QUE ENVOLVE A TEMÁTICA: INSIGNIFICANCIA, INTERVENÇÃO MINIMA, FRAGMENTARIEDADE, ALTERIDADE, EXCLUSIVA PROTEÇÃO DO BEM JURIDICO. 2.1 Princípios O significado da palavra princípio está relacionado a início, fonte, origem, mas na área jurídica possui um significado mais abrangente, pois o mesmo carrega consigo as ideias que servem como alicerces que sustentam as intenções da norma jurídica, garantindo a sua aplicabilidade de acordo com os seus posicionamento no ordenamento jurídico. Segundo José Cretella, princípios de uma ciência “são proposições básicas, fundamentais, típicas que condicionam todas as estruturações subsequentes. princípios, neste sentido, são os alicerces da ciência”.11 Determinados doutrinadores lecionam que a falta de observação de um princípio de qualquer ordenamento, em sua aplicação a um caso concreto seria uma afrontadireto à sociedade;sendo assim, a não observação de um princípio seria até mesmo mais grave do que a própria violação de uma lei. Os princípios a cada dia ganham mais força em sua aplicação no sistema normativo nacional, como prova disso temos o exemplo de que vários princípios estãodelineado de forma implícita no ordenamento jurídico, e em nenhum momento podemos nos questionar quanto à existência desses princípios no sistema jurídico brasileiro. 11 CRETELLA JUNIOR, José. Elementos de direito constitucional.São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000.p. 78. 19 É importante, dessa feita, na temática abordada, adentrarmos no arcabouço principiológico para mais à frente construirmos nosso posicionamento. 2.1.1 Princípio da insignificância O princípio da insignificância ou bagatela teve sua origem firmada no direito romano.Tal princípio não estábem definido no ordenamento jurídico brasileiro, não existindo legislação expressa ao assunto. De acordo com tal princípio, o Direito Penal não precisaria se preocupar com as bagatelas, ou seja, não seria interessante para o Estado punir condutas que não tivessem nenhum grau de periculosidade ou que não fosse ofensivo ao bem jurídico tutelado. Segundo Luiz Otávio Alves Ferreira: Este ramo do Direito só opera, por meio da adequação típica, nos casos de lesão jurídica de certa gravidade, pois se a lesão trazida por um fato formalmente típico for irrelevante o fato será considerado penalmente 12 atípico. Para que o princípio da bagatela possa incidir ao caso concreto, devemos analisar a presença de alguns vetores, que são: a mínima ofensividade da ação do autor, a não periculosidade à sociedade, nenhuma existência de lesão jurídica provocada pela ação e o mais baixo grau de reprovação do comportamento do agente. Em nenhum momento podemos confundir os delitos detentores de insignificância com os crimes de menor potencial ofensivo, que são tratados no artigo 61 da Lei n° 9.099/95, onde a competência para julgá-los é dos Juizados Especiais Criminais. Nos crimes de menor potencial ofensivo não existe a insignificância, pois possui gravidade perceptível, ou seja, fere mesmo que levemente um bem jurídico de terceiro, assim não podendo ser utilizado o principio em questão. A aplicabilidade do princípio da insignificância vem causando discussões por parte da doutrina, onde alguns autores admitem que seja viável a aplicação deste princípio, quando o 12 FERREIRA, Luiz Otávio Alves.Ideias básicas sobre o direito penal no estado democrático de direito. Disponível em http://www.iuspedia.com.br. Acesso em: 02 de outubro de 2011. 20 usuário que for encontrado com a posse de pequena quantidade de drogas para o seu consumo. A respeito desse debate, Luiz Flávio Gomes leciona: A posse de droga para consumo pessoal configura uma das modalidades do chamado delito de posse (“delitos de posesión”), que retrata uma categoria penal muito singular no Direito Penal. Mister se faz, para a consumação da infração, constatar a idoneidade ofensiva (periculosidade) 13 do próprio objeto material da conduta. Assim, quis mostrar o autor que se o objeto material da conduta não possuir nenhum caráter de periculosidade, teríamos a incidência do princípio da insignificância ao caso concreto. Em posição contrária vem ainteligência do julgado do egrégioSuperior Tribunal de Justiça, Relator Celso Limongi, pois para o Ministro não é possível reconhecer a insignificância nos casos de posse de drogas para o consumo pessoal, conforme podemos observar a ementa do habeas corpus 130.677 impetrado no STJ: HABEAS CORPUS. PORTE DE SUBSTÂNCIAENTORPECENTE. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. ALEGAÇÃO DE FALTA DE FUNDAMENTAÇÃOQUANTO À DOSIMETRIA DA PENA. COAÇÃO ILEGAL NÃO CARACTERIZADA. ORDEM DENEGADA.a) O princípio da insignificância está ligado ao valor do bem tutelado e não pode ser aplicado aos crimes de porte de substância entorpecente.b) A quantidade de droga apreendida em poder do paciente - 1,75 gramas - não torna atípica a sua conduta.c) A fixação da pena acima do mínimo legal se deveu às circunstâncias judiciais desfavoráveis e não exclusivamente à reincidência do paciente, ficando afastada a alegação de falta de fundamentação na dosimetria da pena.d) Ordem denegada.Em casos como o dos autos, aplicar o princípio da insignificânciaequivaleria a revogar o disposto no artigo 28 da Lei nº 11.343/2006. E não é esse o papel do Judiciário. A pessoa que guarda um grama de maconha,está,logicamente, cometendo o crime em questão. A quantidade da droga apreendida não interfere na configuração do tipo penal. Ou seja, o fato de ter sido encontrado em poder do paciente l,75 gramas de maconha não descaracteriza o tipo penal. Em outras palavras, a aplicação do princípio da insignificância, considerada a 13 GOMES, Luiz Flávio. Artigo disponível www.lfg.com.br/artigos/DROGAS_E_INSIGNIFICANCIA.pdf. Acesso em: 25.09.2011. em: 21 pequena quantidade de entorpecente, seria o mesmo que liberar, contra 14 legem, o porte de pequena quantidade de droga. Por sua vez o Supremo Tribunal Federalse posicionou neste sentido, admitindo que o bem jurídico neste caso não afasta a incidência da insignificância, como podemos ver a jurisprudência. Logo, se a quantidade apreendida for ínfima, mínima e não gerar nenhum perigo a sociedade, admite o STF a aplicabilidade do principio da insignificância. 2.1.2 Princípio da intervenção mínima Também chamado de ultima ratio, o princípiosupra referido consiste na atenção em que o Direito Penal irá dar somente aos bens considerados de maior importância para a vida em sociedade. Sendo assim o Direito Penal só deverá incidir quando os bens jurídico mais importantes não encontrar proteção em qualquer outra ramificação do direito brasileiro. Nestes termos Muñoz Conde aduz: O poder punitivo do Estado deve estar regido e limitado pelo princípio da intervenção mínima. Com isto, quero dizer que o Direito Penal somente deve intervir nos casos de ataques muito graves aos bens jurídicos mais importantes. As perturbações mais leves do ordenamento jurídico são objeto 15 de outros ramos do direito. Também leciona Rogério Greco que: O princípio da intervenção mínima é responsável não somente pela indicação dos bens de maior relevo que merecem a especial do Direito 14 STJ, HC nº. 130.677, rel. Min. Celso Limongi, julgamento em 04/02/2010, publicado em 22.02.2010. 15 MUÑOZ CONDE, Francisco. Introducciónalderecho penal. Montevideo-Buenos Aires, Editora B de F, 2001. p. 59-60. 22 Penal, mas se presta, também, a fazer com que ocorra a chamada 16 descriminalização. Os bens mais importantes para a sociedade são aqueles expressos na Constituição Federal da República, e será com base neste princípio que o legislador acompanhará a evolução da sociedade, modificando e retirando do ordenamento jurídico nacional a incriminação do que antes era considerado um bem de grande importância e que hoje não possui esse tratamento especial. Os Tribunais vêmutilizando o princípio da intervenção mínima do Direito Penalcom frequência em entrosamento com princípios que a ele decorrem, como podemos ver o acórdão proferido pelo Egrégio Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul: Denúncia. Delito do art. 243 da lei 8.069/90 (oferecimento de bebida alcoólica). Rejeição. Mantida. Considerando os princípios da intervenção mínima o direito penal e da adequação social, mantém-se a rejeição da denúncia que imputou a um jovem de 19 anos de idade o crime do art. 243 da lei 8.069/90, porque teria oferecido a outro jovem, este com 15 anos de idade, uma lata de cerveja, quando ambos se encontravam no interior de 17 um clube social . Nesta mesma inteligência, também decidiu o Superior Tribunal de Justiça: RECURSO ESPECIAL. PENAL. FURTO. COMPORTAMENTO SOCIALMENTE REPROVÁVEL. PRINCÍPIO DA INSGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. 1. A missão do Direito Penal moderno consiste em tutelar os bens jurídicos mais relevantes. Em decorrência disso, a intervenção penal deve ter o caráter fragmentário, protegendo apenas os bens jurídicos mais importantes e em casos de lesões de maior gravidade. 2. O princípio da insignificância considera necessária, na aferição do relevo material da tipicidade penal, a presença de uma mínima ofensividade da conduta do agente, nenhuma periculosidade social da ação, reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e inexpressividade da lesão jurídica provocada (precedentes HC 84.412, STF, Rel. Min. Celso de Mello). 3. Se parece claro que o furto de uns “poucos litros de água potável” não ensejaria o acionamento da máquina jurídico-penal do Estado, pela inexpressividade da lesão jurídica provocada, por outra volta, não se deve olvidar que tal conduta se mostra bastante reprovável, sob o ponto de vista de sua repercussão social. Inaceitável a complacência do Estado para com 16 GRECO, Rogério. Código Penal comentado. 5° ed. Niterói, Impetus, 2011.p. 3. TJRS, AC 70019592260, rel. Des. Sylvio Baptista Neto, julgamento em 09.08.2007, publicado em 05.092007. 17 23 aqueles que, em condições de arcar com as respectivas contraprestações, venham a usufruir irregularmente e de forma gratuita de bens e serviços públicos, em detrimento da grande maioria da população. 4. Recurso 18 parcialmente conhecido e provido. Com as decisões acima citadas, podemos perceber que a pena é a forma mais bruta e violenta que o cidadão pode receber, onde o Estado será o responsável de estabelecer a boa convivência da sociedade. 2.1.3 Princípio da fragmentariedade Este princípio caminha lado a lado com o princípio da intervenção mínima, onde também defende que não são todas as ofensas ao bem jurídico que devem ser punidas pelo Direito Penal, devem ser punidas apenas os “fragmentos” mais importantes do bem jurídico protegido, ou seja, o Direito Penal deve ser “fragmentado” onde as condutas mais graves serão tipificadas. Por isso a semelhança com o princípio da intervenção mínima, pois o mesmo defende que o Direito Penal só deverá incidir nos casos que afronte os valores constitucionais fundamentais. Podemos nos basear na inteligência de Muñoz Conde, que sobre o tema relata: Nem todas as ações que atacam bens jurídicos são proibidas pelo Direito Penal, nem tampouco todos os bens jurídicos são protegidos por ele. O Direito Penal, repito mais uma vez, se limita somente a castigar as ações mais graves contra os bens jurídicos mais importantes, daí seu caráter „fragmentário‟, pois toda a gama de ações proibidas e bens jurídicos protegidos pelo ordenamento jurídico, o Direito Penal só se ocupa de uma 19 parte, fragmentos, se bem que maior importância. A natureza fragmentária do Direito Penal só irá ser acionada quando nenhum outro ramo do direito não vier aoferecer a proteção necessária aos bens jurídicos relacionados ao caso. 18 STJ, RESP 406986/MG, rel. Min. Hélio Quaglia Barbosa, julgamento em 23.11.2004, publicado em DJU 17.12.2004. 19 MUÑOZ CONDE, Francisco. Introducciónalderecho penal. Montevideo-Buenos Aires, Editora B de F, 2001. pp. 71-72. 24 Nestes termos a Ministra do STF Cármen Lúcia, se posiciona quanto ao momento de acionamento do princípio da fragmentariedade no Direito Penal, como podemos perceber no seu parecer de RHC 89624/RS, onde menciona: Não há se subestimar a natureza subsidiária, fragmentária, do Direito Penal, que só deve ser acionado quando outros ramos do direito não sejam 20 suficientes para a proteção dos bens jurídicos envolvidos. 3.1.5 Princípio da alteridade Princípio da alteridade, também conhecido como princípio da transcendentalidade,onde não existe previsão expressa quanto a este princípio na Constituição Federativa do Brasil, mas a Lei 11.343/2006 recepcionou este princípio no arcabouço princípiológico do Direito Penal. O princípio da alteridade possui uma visão meramente semelhante com o principio da insignificância, pois o mesmo também proibi a punição de uma conduta considerada meramente subjetiva, ou seja, que não prejudique nenhum bem jurídico de outrem. Assim quando a conduta interna do agente não vier a prejudicar terceiros, onde o único afetado seja o próprio autor não será punível a sua conduta pela incidência do princípio da alteridade ou transcendentalidade. Nestes termos aduz Fernando Capez: “O princípio da alteridade impede o Direito Penal de castigar o comportamento de alguém que está prejudicando apenas a sua própria saúde e interesse”21. É com base no princípio da alteridade que muitos se apegam para fugir da punição no caso de posse de drogas para consumo próprio, pois neste caso qual seria a ofensa causada ao bem jurídico de terceiro? Nenhuma ameaça existiria, mas sim o prejudicado seria o próprio usuário de drogas. A Lei 11.343 de 2006 sendo ciente da importância do princípio da alteridade para o usuário de drogas ilícitas expressou tal princípio em dois artigos de seu texto. De acordo com o artigo 4°, inciso I, no capitulo sobre Sistema Nacional de Políticas sobre Drogas, e entre todos os princípios referente a politica de drogas devemos sempre 20 STF, RHC nº.89624/RS, rel. Min. Cármen Lúcia, julgamento em 09.10.2006, publicado em 07.12.2006. 21 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: legislação penal especial. Ed.6. São Paulo: Saraiva, 2011 p. 756. 25 encontrar“o respeito aos direitos fundamentais da pessoa humana, especialmente quanto à sua autonomia e à sua liberdade”22. Afirma Bianchini em sua obra referente ao tema juntamente com Luiz Flávio Gomes, Rogério Sanches e William Terra de oliveira: Exalta-se, por meio deste princípio, a preocupação com o exercício da máxima liberdade individual não comprometedora da liberdade alheia. Refere-se, portanto, à máxima tolerância a condutas que exprimam o modo de ser, a consciência interna, os atos privados do indivíduo – a peculiar maneira de levar a vida -, que nenhum malefício causam à sociedade. Mais ainda, por intermédio deste princípio protege-se esta liberdade, punindo-se os atos a ela atentatórios ou ofensivos, quando registrada a gravidade da 23 conduta praticada pelo ofensor e a gravidade da lesão à liberdade. Em outro momento a Lei 11.343/2006 traz consigo o princípio da transcendentalidade, trata-se do artigo 22, que vem expressando: Art. 22. As atividades de atenção e as de reinserção social do usuário e do dependente de drogas e respectivos familiares devem observar os seguintes princípios e diretrizes: I - respeito ao usuário e ao dependente de drogas, independentemente de quaisquer condições, observados os direitos fundamentais da pessoa humana, os princípios e diretrizes do Sistema Único de Saúde e da Política 24 Nacional de Assistência Social. Diante do exposto podemos concluir que o princípio da alteridade trouce consigo um favorecimento no tratamento ao usuário e ao dependente de drogas ilícitas, incidindo sempreao caso concreto para não ocorrer a punição do agente, quando o único direito ameaçado for o do próprio agente, sem em momento algum ofender bem jurídico de outrem. 22 Lei 11.343 de 23 de agosto de 2006. Art. 4, I. Disponível em: http://www.planalto.gov.br. Acesso em 29.09.2011. 23 BIANCHINI, Alice. [et al]; GOMES. Luiz Flávio (coordenador). Nova Lei de Drogas comentada artigo por artigo: lei 11.343, de 23.08.2006. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 29. 24 Lei 11.343 de 23 de agosto de 2006. Art. 22, I. Disponível em: http://www.planalto.gov.br. Acesso em 29.09.2011. 26 2.1.5 Princípio da exclusiva proteção do bem jurídico Este princípio também é conhecido como princípio da lesividade ou princípio da ofensividade, teve origem no período iluminista, que através do movimento de secularização tentou solucionar os conflitos que existiam entre a moral e o direito. O princípio da exclusiva proteção do bem jurídico surge quando praticado algum ato que seja lesivo ou até mesmo venha a ameaçar um bem jurídico tutelado pelo Direito Penal, sendo esses bens, os mais relevantes para o ser humano. Assim tal princípio pode ser entendido como a proteção de direitos fundamentais utilizados para o desenvolvimento pessoal do homem. Nilo Batista fez a divisão de suas principais funções, que adiante passo a expor: Proibir a incriminação de uma atitude interna; Proibir a incriminação de uma conduta que não exceda o âmbito do próprio autor; Proibir a incriminação de simples estados ou condições existenciais; Proibir a incriminação de condutas desviadas que não afetem qualquer bem jurídico. No Caso do usuário de drogas, este não estaria em nenhum momento ameaçando ou causando lesividade a um bem jurídico da sociedade, mas sim o único prejudicado seria o próprio usuário de droga. 2.2 Há constitucionalidade dos crimes de perigo abstrato? Vem sendo muito discutida a questão da constitucionalidade do crime de perigo abstrato. De antemão convém conceituar o que é crime de perigo abstrato para melhor entender tal discussão. Luiz Flávio Gomes ensina acerca de crime de perigo abstrato e o conceitua como “crimes que se consumam, apenas com a possibilidade de dano”25. Os delitos de perigo abstrato produz a punição pelo mero desrespeito a lei formal, isto quer dizer que, apenas é necessário a sua motivação, existindo a possibilidade ou não 25 GOMES, Luiz Flávio. Artigo disponível em: http://www.lfg.com.br/public_html/article.php?story=2007214091633277. Acesso em: 12.10.2011. 27 de dano irá se configura como crime. O Direito Penal deve atuar quando a ação do sujeito vier a causar um dano ao bem jurídico que a lei busque tutelar, assim vem sendo muito discutida a constitucionalidade desses crimes, aonde vem ganhando forças a corrente doutrinaria que entende como inconstitucional os crimes de perigo abstrato, pelo devido respeito aos princípio da ofensividade e o princípio do estado de inocência. Nestes termos houve uma tentativa de criar uma corrente que serviria como apoio para que o porte de uma quantidade considerada ínfima seria fato atípico, pois assim não estaria trazendo consigo nenhum perigo para a sociedade. Este delito não causaria nenhuma lesividade, a não ser ao próprio usuário, sendo assim não será tal ato punível, visto que no Direito Penal é vedado a punição à auto lesão. E o que dizer do delito de porte de arma de fogo? Não estaria levando consigo uma ameaça a sociedade? Também não seria punível? Nestes termos não apoiamos a corrente que defende a inconstitucionalidade dos crimes de perigo abstrato, devendo sim, serem punidos os crimes de perigo abstrato. Apoiando essa ideia temos a jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo que proferiu recurso em sentido estrito nº 0006978-63.2010.8.26.0318 interposto pelo Ministério Público, onde julgou o crime de embriaguez na direção de veículo automotor como crime de perigo abstrato, como podemos verum trecho do relatório que diz: O delito descrito no artigo 306, do CTB ésim, crime de perigo abstrato, prescindindo,portanto, de demonstração da efetiva potencialidadelesiva de sua conduta. Sua objetividade jurídica é aincolumidade pública, eis que a condução de veículonestas condições coloca em sério risco acoletividade, bastando para sua comprovação aconstatação de que a concentração de álcool nosangue do agente que conduzia o veículo em viapública era maior do que a admitida pelo tipo penal.É certo que a criação arbitrária pelolegislador de infrações penais para condutas que nãolesam nem criam perigo a bens jurídicos éinadmissível.Entretanto o delito em questão, por suanotoriedade de potencial lesivo à segurança viária,comprovado estatisticamente pelo crescente aumentode acidentes de trânsito causados pela embriaguez aovolante, com prejuízos para a vida, a integridadefísica, a saúde e o patrimônio de uma infinidade depessoas, dispensa a análise de 26 dano virtual em cadacaso. 26 TJSP, RESE nº. 0006978-63.2010.8.26.0318, rel. Des. Renê Ricupero, julgamento em 15.09.2011, publicado em 20.09.2011. 28 Podemos também, citar o julgamento do Habeas Corpus 104.206/RS, 1.ª Turma, tendo como relatora a Min. Cármen Lúcia, onde a mesma aduziu que: O crime de porte ilegal de arma de fogo de uso permitido é de mera conduta e de perigo abstrato, ou seja, consuma-se independentemente da ocorrência de efetivo prejuízo para a sociedade, e a probabilidade de vir a ocorrer algum dano é presumida pelo tipo penal. Além disso, o objeto jurídico tutelado não é a incolumidade física, mas a segurança pública e a paz social, sendo irrelevante o fato de estar a arma de fogo municiada ou 27 não. Precedentes. Utilizando como base as respeitáveis jurisprudências mencionadas acima, não temos duvidas quanto à constitucionalidade dos crimes de perigo abstrato, onde deve ser punível a conduta de posse de maconha para consumo próprio. 2.3 Relação de consumo: usuário x traficante A relação de consumo é composta pelo fornecedor e consumidor; em se falando de consumo de drogas, estes papéis seriam compostos nesta ordem pelo traficante e usuário. Esses dois indivíduos ligados diretamente à droga já foram conceituados neste presente trabalho, agora deveremos mostrar que a relação de consumo entre usuário e traficante possui um vinculo forte que aaos dois personagens deve-se responsabilizar quanto aos problemas que advém desta relação de consumo, além degerar um fortalecimento econômico incalculávelao narcotráfico. Consumo é, segundo Aurélio, “o uso de mercadorias e serviços para asatisfação de necessidades e desejos humanos”28. O usuário ao exercer o seu papel na relação de consumo, esta ligado diretamente a produção da droga, ou seja, sem a procura não existiria a produção, assim o dinheiro de ávidos consumidores de drogas acaba financiando diretamente toda a produção do tráfico, que este por sua vez gera uma série de problemas, principalmente a violência. Neste contexto Roberto Pompeu de Toledo, nos explica com precisão e atribui a cada personagem sua parcela de responsabilidade, vejamos suas palavras, in verbis: 27 STF, HC nº.104.206/RS, rel. Min. Cármen Lúcia, julgamento em 10.08.2010, publicado em 26.08.2010. 28 FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Miniaurélio século XXI: O minidicionário da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2001. p.191. 29 Os consumidores brasileiros, ao violar a lei, são tão responsáveis pelas violências no morro quanto os consumidores americanos, muito mais numerosos e ricos (...) pelas plantações na Bolívia (...) e pelo refino e 29 comercialização de cocaína na Colômbia. Como podemos ver todos os problemas causados pela droga, é de responsabilidade do traficante tão quanto do usuário. Assim não podemos reprimir só um violador da lei, e sim punir todos que compõe essa cadeia. O consumo muitas vezes chega a ser desenfreado, assim o simples hábito de consumir move um ciclo de processos econômicos. Bauman nos explica com mais clareza o retrato dessa realidade desenfreada do consumo, como podemos ver, in verbis: O mercado de consumo e o padrão e conduta que ele exige e cultiva são adaptados à “cultura do cassino” líquido-moderna, que, por sua vez, é adaptada às pressões e seduções do mercado. Os dois se dão bem entre si, se abastecem e se reforçam mutuamente. Para não desperdiçar o tempo de seus clientes, nem prejudicar ou impedir suas futuras mas imprevisíveis alegrias, o mercado de consumo oferece produtos destinados ao consumo imediato, de preferência para um único uso, seguido de rápida remoção e substituição, de modo que os espaços de vida não fiquem congestionados quando os objetos hoje admirados e cobiçados saírem de moda. Os clientes confusos pelo turbilhão da moda, pela atordoante variedade de ofertas e o ritmo vertiginoso de sua mudança, não podem mais recorrer à capacidade de aprender e gravar – e assim precisam (e o fazem com gratidão) aceitar as garantias de que o produto atualmente em oferta é “a coisa”, “a coisa 30 mais quente”, o “must”, aquilo “(com/em) que devem ser vistos”. Com toda essa movimentação de capital, o tráfico gera também uma estrutura para o crime organizado, criando consigo uma onda de empregos, mesmo que ilegais, mas que oferecem um salto na economia dos que comandam o tráfico, assim servindo de espelho para as crianças que os assistem e inocentemente acabam tendo como desejo tal “carreira”. Assim nos explica com mais precisão esse fenômeno norteador de fontes de empregos gerado pelo tráfico de drogas, vejamos suas palavras, in verbis: Outra expressão da criatividade dos favelados é aproveitar a crise das 29 TOLEDO, Roberto Pompeu. O inimigo que nem o Bope encara. In VEJA. São Paulo: Abril, n. 2031, 24 de outubro de 2007. p. 150. 30 BAUMAN, Zygmunt. Vidas desperdiçadas. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2005. p. 146. 30 drogas como fontes locais de emprego. Essa “solução”, ainda que tão extravagante e ilegal, reflete a crise da sociedade norte-americana que com seus milhões de drogados produz bilhões de dólares, cujo excesso derrama aqui. É nessa base que se estrutura o crime organizado, oferecendo uma massa de empregos a própria favela, bem como uma escala de heroicidade dos que o capitaneiam e um padrão de carreira altamente desejável para as crianças. Antigamente, tratava-se apenas do jogo do bicho, que empegava 31 ex-presidiários e marginais, lhes dando condições de existência legal. Cada vez mais vemos nos noticiários da TV a presença de jovens envolvidos com o tráfico de drogas. Praticam essa conduta para obter a satisfação de seus desejos e manter o mesmo padrão de consumo que o mercado do tráfico lhe impõe. Assim esta é a forma moderna de subsistência do ser humano, nesta idéia aduz Bauman: A modernização progrediu de modo triunfante, alcançando as partes mais remotas do planeta; a quase totalidade da produção e do consumo humanos se tornam mediados pelo dinheiro e pelo mercado; a mercantilização, a comercialização e a monetarização da subsistência dos 32 seres humanos penetram os recantos mais longínquos do planeta. Conclui-se que esta relação de mercado só é existente devido ao consumo da droga, onde devemos responsabilizar nas mesmas proporções tanto o usuário que consome para satisfazer o seu vicio, desejo ou prazer, assim financiando todo o império do tráfico de drogas; quanto o traficante que é tomado pela obsessão de lucrar, ou seja, usuário e traficante são as duas faces da mesma moeda. Tenhamos certeza de que não só estes dois personagens são responsáveis por todos os problemas causados pelo consumo e tráfico de drogas, temos também o Estado, que por sua vez é representado por políticos e policiais corruptos que possuem sua parcela de culpa neste sério problema da sociedade brasileira, na medida em que não criam políticas de prevenção, centros de tratamentos para os dependentes, além de não dar a repressão necessária para combater o tráfico de drogas. CAPÍTULO III. A MARCHA PELA DESCRIMINALIZAÇÃO: APOLOGIA AO CRIME OU LIBERDADE DE EXPRESSÃO? 3.1 Despenalizar não é descriminalizar 31 RIBEIRO, Darcy. O povo brasileiro: a formação e o sentido do brasil. São Paulo: Companhia das letras, 1997. p. 204. 32 BAUMAN, Zygmunt. Vidas desperdiçadas. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2005. p. 13. 31 Para que consigamos entender que despenalizar não vem a ser a descriminalização de ato definido como crime, convém destrinchar o que é despenalizar e o que vem a sera descriminalização. Podemos conceituar descriminalização como a exclusão do caráter de infração penal da conduta considerada como crime, ou seja, uma conduta tida na lei penal como crime deixa de ser considerada delituosa. Já a despenalização o delito é tomado pela suavização da pena, mesmo assim continua existindo previsão criminosa para tal conduta. O Superior Tribunal de Justiça entendeu que quem for abordado com alguma quantidade de maconha para uso pessoal comete crime, de acordo com julgamento do RE 430105/RJ33. Assim, a inteligência do julgado mostrou que a despenalização da conduta de posse de droga para consumo próprio, não resultou em sua descriminalização, pois mesmo não estando à mercê da privação do direito de liberdade, ao acusado incidirão outras sanções. Assim,concluímos que a descriminalização vem a ser, neste sentido, o desaparecimento do que antes se configurava como crime. Já em se tratando de despenalização, seu conceito está ligado àcontinuidade da existência do crime, mas a sua esfera punitiva (pena) foi tomada pela extinção. 3.2Uma analise de duas realidades – Brasil e Holanda Em meio às polêmicas discussões sobre a legalização da maconha no nosso país, nada mais interessante que explanar a experiência de uma sociedade cuja realidade, quanto aos efeitos e fatores que englobam esta temática, é diferente da nossa. Na década de 70, mais precisamente em 1976 a Holanda foi um dos países precursores na tolerância do uso da maconha e outras drogas leves, permitindo a venda e o 33 STJ, HC nº. 116.531/SP, rel. Min. Laurita Vaz, julgamento em 25.05.2009, publicado em 15.06.2009. 32 uso destas drogas em lugares autorizados pelo governo, conhecidos como “coffeshops”34 e clubes jovens. De fato os holandeses não legalizaram a maconha, o que se passa é que o governo passou a fazer a distinção dos entorpecentes em drogas leves como a maconha e o haxixe e drogas pesadas como a cocaína, crack e heroína. Admitindo a compra e o consumo das drogas ditas mais leves, por pessoas maiores de 18 anos, onde não existe pena para os que compram até 5 gramas de maconha por dia em lugares preestabelecido que são “coffeshops”, criando uma situação mal definida, na qual o usuário embora compre a droga em um estabelecimento lícito não pode consumi-la em lugares públicos ou em qualquer outro local, que não os permitidos pelo governo, nem muito menos ser responsável pelo plantio da erva Cannabis Sativa.35 A teoria do degrau foi rejeitada pela Holanda, pois foi por conta dessa rejeição que o país tolerou o uso da maconha. Pois tal teoria entende que o consumo de drogas leves serve de trampolim para que o usuário passe a consumir drogas mais pesadas como, por exemplo, a cocaína, heroína e crack. Diferente da Holanda, o Brasil acredita na teoria do degrau. O governo holandês ao implementar está política de controle das drogas, ainda assim, não impediu que o tráfico existisse, sendo movimentado pelas drogas pesadas, como a heroína e a cocaína, cujo o comércio continua proibido. Com essa facilidade de acesso à compra e ao consumo da droga, a Holanda recebe “10 milhões de turistas que gastam 2,45 bilhões de euros. Segundo uma agência europeia (...) a Cannabis, incluídos os derivados, movimenta anualmente no mercado europeu de 12 a 24 bilhões de euros”36. Não foge do comum a circulação de pessoas tomadas pelos efeitos alucinógenas das drogas na Holanda, porém estas pessoas não apresentam nenhum risco, não abordando as demais, isto porque o governo investe em um sistema de segurança com fiscalização, policiamento e sanções coercitivas, como multas e recolhimentos, para usuários que extrapolem os limites da conveniência. Ademais, conta com um sistema de saúde pública eficiente que dar assistência a quase toda população, e se necessário promove internações obrigatórias em clinicas de reabilitação. Expressão utilizada para definir estabelecimentos comerciais destinados à comercialização de café, regulados e autorizados pelo governo local. 35 Disponível em: http://www.conversadepsicologo.com/2009/02/maconha-e-hora-de-legalizar. Acesso em: 29.10.2011. 36 MAIEROVITCH, Walter Fanganiello. Os efeitos econômicos da Cannabis. In: Carta Capital. São Paulo: Confiança, 2003. p. 10. 34 33 O Brasil possui uma extensão de 9.372,614 km², chegando a ser quase do tamanho de toda a Europa, além de possuir uma população de 190.755.799 de habitantes, de acordo com o Censo Demográfico do IBGE elaborado em 2010.O Brasilpossui uma grande extensão territorial, deste modo não podemos fazer comparações com o território holandês, pois o menor estado brasileiro é bem maior que a Holanda, sem esquecer as peculiaridades e falta de controle das fronteiras brasileiras, onde os traficantes bolivianos e colombianos iriam encontrar facilidades de entrar com a droga no Brasil, devido a enorme extensão da fronteira. Para se ter uma ideia, a falta de fiscalização do nosso governo, o desmatamento da Floresta Amazônica, é motivo de preocupação de todos ambientalistas, vez que temos 333 mil km2 desmatados, que significa 11 Bélgicas, e dois territórios iguais ao Reino Unido.37 A Holanda possui uma economia extremamente forte, onde diversos setores contribui para o fortalecimento desta economia, como exemplo os setores da pesca, transporte, comércio, bancos. O porto de Roterdã é considerado o maior porto do mundo, além de ser um fácil acesso aos enormes mercados da Alemanha e do Reino Unido. Possui também uma taxa de desemprego com 3,7% de pessoas ativas fora do mercado de trabalho, sendo amais baixa taxa entre os Estados membros da União Européia38. Questionamos também quanto ao preparo econômico do Estado brasileiro que não estar apto a disponibilizar igualmente a todos os estados da Federação, técnicas de “fiscalização para plantio e venda da droga”, como acreditam os que são a favor da legalização da maconha. O problema não se resume na forma como se rege este assunto e na sua descriminalização. Mas também, se há previsão legal para que as redes de saúde pública assistam os dependentes químicos, fornece-lhes remédios, implantar casas de acolhimentos e investir em postos de saúde, acompanhamento profissional. Mesmo com todo o desenvolvimento econômico e cultural a Holanda pensa em rever essa liberação, pois de acordo com pesquisas, metade dos crimes ocorridos no país tem ligação com os entorpecentes, e o número de presos triplicou nos últimos dez anos.39 37 Disponível em: http://www.pontocapital.com/index.php?pg=noticia&id=5039. Acesso em: 30.10.2011. 38 39 Disponível em: http://www.economico.sapo.pt/noticias. Acesso em: 30.10.2011. Disponível em: http://www.veja.abril.com.br/idade/exclusivo/perguntas_respostas/leis-sobredrogas/index.shtml. Acesso em: 01.11.2011. 34 Diante do exposto entendemos que o Brasil não esta preparado para descriminalizar ou tolerar o uso da maconha. Indicando como exemplo os problemas enfrentados pela Holanda, mesmo esta, sendo um país desenvolvido. 3.3 Polêmica em torno da descriminalização da maconha Os ventos da descriminalização da maconha no Brasil sopram cada vez mais forte, contando com o apoio da massa usuária da droga que marcham para reivindicar contra a politica de drogas no Brasil, onde pleiteiam a legalização do consumo da erva Cannabis sativa, contando também com o apoio de diversas personalidades importantes da sociedade brasileira, tais como o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e o jornalista Arnaldo Jabor, que já se posicionaram a favor da descriminalização. A discussão sobre a venda/uso da maconha não pode ser movida por passionalismo e radicalismo como vem fazendo o ex-Presidente Fernando Henrique ao propor: “temos que sacudir a sociedade”, haja vista que, esta efervescente declaração pode causar impactos bruscos na sociedade e comprometer milhares de jovens e adultos. Para nos darmos conta do prejuízo acarretado à coletividade, fatores psicológicos, psiquiátricos, bioquímica do sistema nervoso humano, neurofarmacologia, psicofarmacologia. A partir dos referidos estudos e intervenções medicinais, têm-se que a maconha tem efeitos nocivos sobre o cérebro, causados de forma aguda, logo após seu uso. Desta feita, o consumo da maconha provoca no usuário mudanças de comportamento, alterações de condutas, com forte quadro agressivo.Quanto a esse cenário, não cabem maiores discussões. Os estudos científicos divergem no que diz respeito aos possíveis efeitos de longo prazo do uso da erva Cannabis Sativa. Alguns trabalhos mostraram deterioração de células nervosas em animais de laboratório e também foram documentadas piora dos resultados acadêmicos. Pesquisadores já demonstraram que a maconha traz prejuízos ao aparelho respiratório contrariamente ao que pensam seus usuários. Pesquisadores da universidade de Yale, nos Estados Unidos, alertam para o fato de que o uso da maconha leva a problemas respiratórios semelhantes aos causados pelo uso do 35 cigarro. Os cientistas detectaram entre usuários frequentes de marijuana sintomas típicos de doenças respiratórias como tosse, secreção pulmonar espessa, falta de ar.40 Nestes termos, notadamente percebemos que o consumo da substância entorpecente em comento é bastante nociva à saúde humana, haja vista conter elementos prejudiciais ao sistema orgânico dos seres humanos, bem assim, causar dependência física e psíquica. Ademais, não se pode deixar de considerar o empenho que a sociedade vem tendo, a mais de meio século, por fim neste deplorável vício que é a maconha. Descriminalizar seria comprometer os nossos jovens aos efeitos maléficos do vício e tirar dos já viciados a esperança de retomar a sua vida normal. A maconha é uma espécie de trampolim, o usuário vai buscando drogas mais pesadas, além do que, na sua maioria, aquele que começa como usuário, para sustentar o vício, furta, rouba ou acaba como traficante. De fato, o crime organizado conta com o tráfico de drogas, como uma das suas principais vias rentáveis, no entanto, é simplório de mais o argumento de que a descriminalização da maconha iria enfraquecer o tráfico e diminuir a violência, assim se posicionou Bo Mathiasen, representante da UNODC (Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crimes), da ONU (Organização das Nações Unidas): “o crime organizado não existe em função da maconha. (...) Legalizar a maconha não vai trazer impacto nenhum sobre as facções criminosas”.41 Acertadamente asseverou Bo Mathiasen, ou, em contrapartida, aqueles que defendem a descriminalização da maconha como medida coercitiva para enfraquecimento das facções criminosas acreditam que com a legalização, futuros comerciantes da maconha vão servir como concorrente do tráfico? Todos estes fatores devem ser levados em conta ao pensarmos em autorizar a circulação da “mercadoria” em apreço, visto que, fatalmente depararemos com uma concorrência desleal, uma vez que, os primeiros terão que recolher impostos e por conseqüência disponibilizar o “produto” por um preço mais elevado, enquanto que o tráfico continuará disponibilizando o “produto” por um preço bem inferior ao de mercado. 40 Saúde em Foco. A discussão sobre a maconha. Disponível http://bomdiamatogrosso.com/alimentacao-e-saude/a-discussao-sobre-a-maconha. Acesso 03.11.2011. 41 Folha de São Paulo. O mito da legalização das drogas. Disponível http://www.eagora.org.br/arquivo/o-mito-da-legalizacao-das-drogas. Acesso em: 03.11.2011. em em: em 36 Ou será que o tráfico, após a descriminalização da maconha, vai passar a recolher impostos para o Estado? O Brasil deve investir em políticas próprias ao combate desse entorpecente, na instalação de unidades de polícia pacificadora e principalmente ampliar a segurança das nossas fronteiras e ajudar países vizinho nesta campanha, para assim, conseguir diminuir o tráfico internacional, afinal, não se pode olvidar a liderança regional do Brasil. A questão da descriminalização engloba diversos aspectos, dentre eles o jurídico, econômico, culturais, políticos. O desafio consiste na continuidade da sanção aplicada à pessoa que praticar o delito em tela, visto que como já relatado neste trabalho, o consumo da maconha causa vários problemas diretos e indiretos em desfavor a sociedade. Sendo assim, deve-se continuar com a repressão dada pela Lei 11.343/06 ao tráfico e ao plantio das ervas matéria-prima das drogas amplamente consumidas aqui e alhures. Mas como vem sendo mencionado neste trabalho as figuras do usuário e traficante possuem uma ligação complementar, onde um só existe se o outro existir, ou seja, são faces de uma mesma moeda. Neste sentido, ao observarmos a nova Lei de drogas esta recepcionou um tratamento penal mais benéfico para o usuário de drogas, e na outra face impôs uma regra mais rigorosa ao traficante. Assim, ao beneficiar o consumidor de drogas, a Lei n° 11.343/06 deu abertura para o surgimento de debates sobre a descriminalização da maconha que vem circulando a pauta das discussões nacionais, onde é mister a comparação da Lei n° 11.343/06 com a já revogada Lein° 6.368/76, como podemos observar o quadro abaixo: LEI N° 11.343/06 LEI N° 6.368/76 Art. 28. Quem adquirir, guardar, tiver em Art. 16. Adquirir, guardar ou trazer depósito, transportar ou trouxer consigo, consigo, para o uso próprio, substancia para o consumo pessoal, drogas sem entorpecente autorização ou em desacordo ou que determine com dependência física ou psíquica, sem determinação legal ou regulamentar será autorização ou em desacordo com submetido às seguintes penas: I – determinação legal ou regulamentar: advertência sobre os efeitos das drogas; Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e pagamento de 20 (vinte) a 37 II – prestação de serviços à comunidade; III – medida educativa 50 (cinquenta) dias-multa. de comparecimento a programa ou cuso educativo. Como observado acima, percebemos que os benefícios dados ao tratamento penal do consumidor de drogas foi o principal ponto onde recaiu sobre este a problemática da descriminalização ou despenalização do consumo da erva Cannabis Sativa;dessa feita, cabe a interpretação dada ao novo diploma sobre drogas, nos ensinamentos de SÉRGIO HABIB nos mostra que trata-se de desprisionalização, observamos, in verbis: De logo, surge a primeira indagação que se faz instintivamente: uso de drogas foi descriminalizado ou despenalizado? Podemos afirmar que nem uma coisa nem outra. A nova lei não retirou como visto acima, o caráter ilícito da conduta de quem vier a usar ou adquirir drogas para o consumo pessoal, de vez que continua a cominar penas para o uso de drogas, embora as outras espécies de pena que não a privativa de liberdade, como se verificava no regime anterior. O que ocorreu, data máxima vênia dos que eventualmente assim não entendam, foi a desprisionalização ou desencarcerização no que tange ao usuário. Pode-se dizer que a prestação de serviços à comunidade não seja pena, embora figure no rol das penas restritivas de direito (art. 43, IV, do Código Penal)? Assim, manteve-se a proibição do uso de drogas, porém não se admite mais que o usuário venha 42 a sofrer qualquer espécie de pena privativa de liberdade . Na outra face da moeda que figura o traficante, a nova Lei de Drogas não recepcionou nenhum beneficio, ao contrário, esta impôs um tratamento bem mais rigoroso do que a lei anterior quanto ao tratamento do traficante de drogas ilícitas. Na prática continuou com as cominações penais da Lei anterior, de acordo com a tabela comparativa exposta abaixo: LEI N° 11.343/06 LEI N° 6.368/76 Art. 33. Importar, exportar, remeter, Art. 12. Importante ou exportar, remeter, 42 DIAS, Ricardo Gueiros Bernardes; BÃNOS, Juliana Silva. Nova lei de drogas. In Revista Jurídica Consulex. Brasília: Consulex, 2006. n. 234. 38 preparar, produzir, fabricar, adquirir, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, vender, expor à venda, oferecer, ter em expor à venda ou oferecer, fornecer ainda que depósito, transportar, trazer consigo, gratuitamente, ter em depósito, transportar, guardar, prescrever, ministrar, entregar trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar a consumo ou fornecer drogas, ainda ou entregar, de qualquer forma, a consumo que gratuitamente, sem autorização ou substância entorpecente ou que determine em desacordo com determinação legal dependência ou regulamentar: autorização física ou ou em psíquica, sem desacordo com determinação legal ou regulamentar; Pena – reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 Pena – reclusão, de 3 (três) a 15 (quinze) (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) anos, e pagamento de 50 (cinquenta) a 360 dias-multa. (trezentos e sessenta) dias-multas. De acordo com o quadro exposto acima, podemos observar que a situação do traficante continua praticamente a mesma em relação ao diploma legal anterior, mudando apenas a questão do aumento de pena. Assim, a nova lei de drogas trata de forma diferenciada as figuras do mundo das drogas: Consumidor e traficante. A finalidade desta comparação é demonstrar que o modo de repressão imposta de forma unilateral, punindo rigorosamente apenas o traficante talvez não gere os efeitos propostos pela Lei 11.343/06, pois conforme o que já demonstramos ao longo deste trabalho a existência do tráfico possui uma ligação direta com os consumidores que o alimentam, financiam e o inflacionam, tendo como base as relações lícitas de mercado que quando ocorre a escassez de determinado produto teremos a elevação do preço deste. Assim a escassez de drogas deve ser observada também a partir dos riscos da atividade produtiva e do comércio da mesma, pois quanto maior o risco, também será maior o preço da mercadoria. O legislador, ao elaborar a nova legislação de drogas, teve a intenção de prevenir os delitos que decorrem das drogas, ou seja, que são praticados devido a todo o ciclo que a droga percorre. Mas na prática a realidade está sendo outra, os crimes continuam sendo praticados, o consumo e o trafico continuam cada vez mais vivos e fortes. Então, como prevenir os delitos? Assim CesareBeccaria nos ensina: 39 Quereis prevenir os delitos? Fazei com que as leis sejam claras, simples e que toda a força da nação se concentre em defendê-las e nenhuma parte dela seja empregada para destruí-las. (...) Se a incerteza das leis recai sobre uma nação indolente pelo clima, mantém e aumenta a indolência e a estupidez. (...) Se recai sobre uma nação corajosa e forte, após muitas oscilações da liberdade à escravidão e da escravidão à liberdade, a 43 incerteza acaba sendo eliminada. Deste modo, a punição imposta ao usuário de droga pela Lei 11.343/06 não está punindo de forma rigorosa, não conseguindo eliminar o numero de usuários e traficantes, isto porque o diploma legal possui uma contradição, a nosso ver, insanável, pois o modo de reprimir o traficante e a forma de beneficiar o usuário criaumacerta esquizofrenia, ou seja, não leva em consideração a relação complementar que existe entre consumidor e traficante, pois como sabemos, ambos são cúmplices do mesmo delito. Assim se houvesse a punição rigorosa e correta do usuário de drogas, faria com que este temesse sercastigado e assim conseguiria reduzir o numero de usuários e ao mesmo tempo o numero de traficantes, pois enquanto existir a presença do consumidor, irá existir a pessoa responsável pela produção e venda da droga, pois a nova lei de drogas no que se refere ao combate do tráfico de drogas ilícitas está fadada de insucesso ao combater apenas a oferta da mercadoria onde a demanda desta esta prestes a uma descriminalização.Por parte devemos concorda com a Lei 11.343/06 no que tange o tratamento do usuário, pois este tem sim que ser tratado, a questão é, deve ser tratado, mas também deve ser punido para que não venha a ser reincidente. A nosso ver o legislador ao elaborar a Lei de drogas, cogitou em descriminalizar a maconha, mas não teve coragem para praticar tal ato, sabendo este que a sociedade não esta preparada para assistir o aumento do numero de usuário de maconha. Tendo ciência dessa fragilidade, simpatizantes da corrente protetora da descriminalização criaram as chamadas marchas da maconha, vários destes movimentos surgiram de forma avassaladora pelo país a fora, com o intuito de dar a coragem necessária que o legislador precisava para elaborar uma nova lei que trouxesse consigo a descriminalização da erva Cannabis Sativa. Com os holofotes do cenário político brasileiro direcionado para as marchas da maconha, surgiu a hipótese de que esses movimentos constituía apologia ao crime, sendo estes reprimidos pelo aparato policial. Mas o STF decidiu que as marchas para a descriminalização da maconha constituía o direito de liberdade de expressão, sendo vedada qualquer ato de repressão contra estes movimentos, como podemos observa a decisão que julgou ADPF n° 187, in verbis: 43 BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas. São Paulo: Martins Fontes, 2002. pp. 131-132. 40 O Tribunal, por unanimidade, rejeitou as preliminares de não-conhecimento da arguição e a de ampliação do objeto da demanda. No mérito, também por unanimidade, o Tribunal julgou procedente a arguição de descumprimento de preceito fundamental, para dar, ao artigo 287 do Código Penal, com efeito vinculante, interpretação conforme à Constituição, “de forma a excluir qualquer exegese que possa ensejar a criminalização da defesa da legalização das drogas, ou de qualquer substância entorpecente 44 específica, inclusive através de manifestações e eventos públicos” . Ao defender a liberação das marchas da maconha no julgamento feito pelo STF a vice procuradora geral da República Deborah Duprat, citou o ex presidente próprio Fernando Henrique em sua defesa, como podemos observar, in verbis: “O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso esteve em um programa de ampla divulgação defendendo a liberação das drogas leves. Além disso fez e atuou num filme com esse objeto. Esse ex-presidente está fazendo apologia ao crime?”, questionou a procuradora. “Se é porque se trata de um 45 ex-presidente, teremos um debate discriminatório” . E continua: “Não cabe ao Estado fazer qualquer juízo de valor sobre a opinião de quem quer que seja. Se permitíssemos isso, nos permitiríamos que o Estado proibisse a opinião da minoria, que é a antítese da democracia”. Em contrário, vemos diversas campanhas que o Estado faz contra o consumo de drogas de menor potencial ofensivo como álcool e o fumo, onde o mesmo tenta diminuir o número de fumantes e dependentes do álcool. Uma grande conquista sobre as drogas de menor potencial ofensivo foi a aprovação da lei seca, onde é proibido dirigir veículo automotor tendo ingerido qualquer quantidade de álcool, pois essa combinação (volante + álcool), era causadora de milhares de mortes no trânsito. Uma droga de poder de 44 ADPF 187. Rel. Min. Celso de Mello, Julgamento em:15.06.2011 Disponível em: http://www.conjur.com.br/dl/relatorio-ministro-celso-mello-adpf-187.pdf. Acesso em: 05.11.2011. 45 Disponível em: http://www.noticias.uol.com.br/cotidiano/2011/06/15/procuradora-cita-fhc-paradefender-marcha-da-maconha.jhtm. Acesso em: 05.11.2011. 41 dependência bem menor do que a maconha, já chega a ser causadora de várias ameaças a sociedade.Então por que o Estado deveria descriminalizar a maconha? Deveria o Estado arriscar? Sabendo que a maconha causa dependência ao usuário, que é causa de aumento de violência dentre outros problemas. Hoje estes usuários marcham reivindicando a descriminalização desta droga, amanhã poderão marchar pedindo o mesmo para drogas mais pesadas como crack, cocaína, ecstasy e etc. Pois como sabemos, o Brasil apoia a teoria do degrau, onde drogas tidas como leves servem de trampolim para que o usuário experimente drogas mais pesadas, assim aumentando o risco de virar dependente. Deste modo o legislador deve estar consciente ao risco que a sociedade corre com a descriminalização da maconha. Mas como respostas a estas reivindicações, tivemos como estimulante para o Estado que busca vencer a guerra contra o tráfico as recentes vitórias nas favelas do Complexo do Alemão, Rocinha e Vidigau localizadas no Estado do Rio de Janeiro, onde a força policial mostrou que o Estado possui capacidade de vencer a guerra contra o tráfico, assim o mesmo não pode se abster da responsabilidade de fiscalização. Deste modo a violência acaba diminuindo, visto que vários crimes decorrem do tráfico de drogas. Sabemos que a tarefa de combater o tráfico de drogas é árdua, pois além do problema da violência causada pela droga, também existem outros problemas que englobam este ciclo, como por exemplo, a questão da corrupção policial, que vemos frequentemente nos noticiários da TV informações sobre acontecimentos relacionado à corrupção policial. Policiais corruptos interagem com traficantes recebendo propina para não fazer a fiscalização necessária, assim dando mais liberdade aos traficantes. Detentores desta liberdade, estes criminosos criam as chamadas facções criminosas, sendo umas das mais conhecidas o PCC (Primeiro Comando da Capital), o CV (Comando Vermelho), entre outras. Estas facções batalham entre si para conseguir mais poder, espaço e territórios para a prática do tráfico de drogas, gerando por trás desta guerra toda uma violência causadora de carnificinas nas favelas brasileiras, mas não só a classe baixa sofre com este mal, a burguesia também é vítima, onde pessoas usam e traficam drogas para satisfazer seu vício e para conseguir manter o luxo que tantos são obcecados.Assim damos o exemplo dessa realidade àestória de João Guilherme, que serviu como base para o livro Meu nome não é Jhonny46. Uma realidade na qual um filho de burguesia chegou à elite do tráfico, este tinha todas as condições necessárias para uma boa vida, e se envolveu no tráfico para manter o vício e o luxo em que vivia, se tornando um “anti-herói” na história da sociedade brasileira. 46 FIUZA,Guilherme. Meu nome não é jhonny. Rio de Janeiro: Record, 2007. 42 De acordo com pesquisa realizada pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), o Brasil no ano de 2004 registrou 11% das mortes ocasionadas por arma de fogo no mundo. Segundo o PNUD, as capitais e regiões metropolitanas ainda são detentoras da maioria dos assassinatos, e são afetadas principalmente pelo tráfico de drogas47. Não tenhamos duvidas quanto ao aumento da violência caso o uso da erva cannabis sativa seja legalizado no Brasil, além deste crescimento de violência, teremos também o aumento de usuários, onde automaticamente irão cada vez mais fortalecer financeiramente o tráfico de drogas, pois como já relatado anteriormente neste trabalho, enquanto houver a procura existirá a oferta.Assim, como o Estado irá conseguir combater o tráfico? se os criminosos irão estar financeiramente preparados para investir na produção e compra de drogas e armamentos pesados, aumentando cada vez mais seu poder. O sistema entrega a mão para salvar o braço, o sistema se reorganiza, articula novos interesses, cria novas lideranças. Enquanto as condições de existência do sistema estiver ai, ele vai existir [...] agora me responde uma coisa, quem você acha que sustenta tudo isso? É e custa caro, muito caro. O sistema é muito maior do que eu imaginava, não é à toa que os traficantes, policiais e milicianos matam tanta gente nas favelas, não é à toa que existem favelas, não é à toa que acontecem tantos escândalos em Brasília que entra governo e sai governo e a corrupção continua, para 48 mudar as coisas vai demorar muito tempo. Mesmo se for preciso mudar todo o sistema, isto inclui os políticos corruptos, milicianos, policiais que facilitam a prática do tráfico. O Estado deve continuar dando toda repressão possível ao tráfico de drogas, para defender o povo desta lastima. Pois o que mais importa é uma vida tranquila em sociedade. Não basta só reprimir o traficante e usuário, por trás de todo o ciclo que a droga percorre, existe toda uma corrupção que facilita a prática do tráfico de drogas. CONSIDERAÇÕES FINAIS 47 Disponível em: http://www.veja.abril.com.br/noticias/brasil/os-gargalos-da-segurança-publica. Acesso em: 10.11.2011. 48 Trecho retirado do filme Tropa de Elite 2. Direção de José Padilha. Gravado em 2010. 43 A ideia de descriminalizar a maconha não é algo novo no cenário político brasileiro, manifestaçõesdenominadas de marchas da maconha percorreram o Brasil, fortalecendo cada vez mais a corrente protetora da descriminalização. Mas como sabemos que esta droga tem o poder de causar dependência ao usuário, isso sendo um risco para a sociedade e onde o Estado é o principal responsável para zelar pelo bem comum, assim estedeve continuar com a repressão dada ao tráfico de drogas, além de repensar nas sanções impostas aos usuários da maconha. O Estado deve continuar responsável pela repressão dada ao tráfico desta droga, assim além de criarpolíticas públicas, UPP‟spara reprimir o tráfico nas favelas, centros de tratamento para os já dependentes de drogas que seriam mantidas pelo Estado, políticas de prevenção para que pessoas que nunca usou drogas, não venham a provar deste mal, deve punir também o usuário com medida mais severas. Para que assim possa reduzir o índice de usuários e traficantes, automaticamente reduziria significativamente os números de delitos ligados a esta conduta, como por exemplo: o furto e o roubo.Entendemos que a Lei 11.343/06 trata de forma correta o traficante, impondo rigor às sanções a este aplicada. Ao descriminalizarmos a erva Cannabis Sativa, teríamos um verdadeiro caos na sociedade brasileira, que sem estar preparada, assistiria o aumento do número de usuários e dependentes desta droga, aumentando também os crimes praticados em decorrência do consumo/dependência da maconha. Notamos que não só o usuário e traficante possui culpa neste problema social, o Estado também possui sua parcela de culpa, no momento em que é formado e representado por alguns políticos e militares corruptos que propositalmente não fiscaliza ou reprime de forma necessária e correta as ações de traficantes, dando brechas para o tráfico de drogascrescer de forma avassaladora, como na verdade já vem. 44 REFERÊNCIAS AMADO, Jorge. São jorge dos ilhéus. São Paulo: Martins, 1970. BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas. São Paulo: Martins, 2002. CRETELLA JUNIOR, José. Elementos de direito constitucional. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. MAIEROVITCH, Walter Fanganiello. Os efeitos econômicos da cannabis. In: Carta Capital. São Paulo: Confiança, 2003. MÉDICI, Sérgio de Oliveira. Tóxicos. São Paulo: Jalovi, 1977. NUCCI, Guilherme de Souza. Leis penais e processuais penais comentadas.São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. FARIASJÚNIOR, João. Manual de criminologia. 3. ed. 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