Leia atentamente os textos abaixo. Secretário diz que é favorável à descriminalização das drogas LÉO GERCHMANN da Agência Folha, em Porto Alegre O secretário Nacional de Segurança Pública, Luiz Eduardo Soares, manifestou-se nesta terça-feira favoravelmente à descriminalização das drogas, ressalvando, porém, que essa não é a opinião oficial do governo federal. "Sou favorável à descriminalização, mas é uma posição do Luiz Eduardo Soares, e não do secretário, porque não é essa a posição do governo. O contexto internacional exige uma série de mediações", afirmou ele, durante discurso nesta terça-feira no 16º Fórum da Liberdade, em Porto Alegre (RS). Mesmo com toda a preocupação em mostrar que é uma "opinião pessoal", Soares afirmou que o governo federal "vai discutir e trazer para a sociedade essa discussão". Soares aproveitou que esteve anteontem na capital gaúcha para o lançamento do Plano Nacional de Segurança Pública e participou ontem do fórum. Ainda sobre drogas e narcotráfico, o secretário nacional afirmou que, para haver um combate ao atacado do comércio de entorpecentes, é importante que "a lavagem [de dinheiro] seja objeto de uma investigação sistemática". Em relação ao varejo, defendeu o trabalho com a auto-estima dos jovens, para que eles não sejam recrutados pelo narcotráfico. "No narcotráfico, [os jovens] encontram não só consumo, mas oportunidade de valorização da auto-estima, ainda que perversa. Há busca de reconhecimento, valorização e simbologia de poder. Temos de compreender que um drama social representa a base do comércio varejista, interceptando com políticas sociais essa ponta e fiscalizando, ao mesmo tempo, o comércio atacadista." Corregedoria única A respeito do combate à corrupção, Soares afirmou que "a polícia boa deve ser isolada da polícia má" e que "as corregedorias devem ser únicas e subcorporativas". Ou seja, polícias Civil e Militar devem ter uma corregedoria que acompanhe suas atuações, mas sem manter vínculo com uma ou outra. "Deve-se dar força a auditorias independentes com poder de investigação, com participação da comunidade e apoio político que sustente isso", disse. Ao lançar o plano nacional, Soares defendeu a implementação de cinco pontos nos Estados, como requisitos para o recebimento de parte dos R$ 404 milhões a serem distribuídos ainda neste ano: capacitação e valorização de agentes, gerenciamento de informação, reorganização institucional, investimento em perícia e controle externo dos organismos de segurança pública. Ex-chefe da OMS condena descriminalização da maconha da France Presse, em Oslo (Noruega) A ex-chefe da OMS (Organização Mundial da Saúde), Gro Harlem Brundtland, condenou hoje a descriminalização das chamadas "drogas leves", como a maconha. "Temos que pensar bem antes de tomar uma posição", informou a agência de notícias NTB. "Eu não acho que isto seja muito perspicaz. Que apoio daria aos países que lutam contra as drogas?", questionou. A ex-diretora-geral da OMS, que deixou o cargo em julho passado, falou após receber um prêmio em Oslo por seus esforços na luta contra o tabagismo. Como chefe da OMS, Brundtland, ex-premiê norueguesa, fez da campanha para conter as 5 milhões de mortes ao ano relacionadas com o tabaco uma de suas prioridades. "A descriminalização tornaria mais difíceis os esforços para proteger as crianças e os jovens. Precisamos manter a legislação rígida", continuou. Segundo relatório de 2002, divulgado pelo Conselho Internacional de Controle de Narcóticos, com sede em Viena, os seguintes países descriminalizaram a droga: Itália, Luxemburgo, Portugal e Espanha. O Reino Unido recentemente reduziu a pena do fumo da maconha, para que a polícia pudesse se concentrar nas drogas mais pesadas, como a cocaína, a heroína e o ecstasy. Projeto de lei prevê penas alternativas DA REPORTAGEM LOCAL No dia 12/2, a Câmara dos Deputados aprovou o fim da pena de prisão para os usuários de drogas. Mas isso não significa a descriminalização do uso de drogas. De acordo com o projeto de lei, que agora tramita no Senado, quem for detido consumindo ou portando drogas poderá ser advertido pelo juiz, ser obrigado a prestar serviços comunitários ou ter de freqüentar curso ou programa educativo durante cinco meses. Hoje a lei determina pena de seis meses a dois anos de prisão para usuários de drogas. Para o deputado federal Paulo Pimenta (PT-RS), relator do projeto de lei na Câmara, o texto avançou o máximo possível sem descriminalizar as drogas. "Acho que era necessário enfrentar a hipocrisia de manter o cárcere como medida terapêutica para o usuário ou para o dependente", disse. O secretário nacional Antidrogas, general Paulo Uchôa, lembra que o projeto de lei, se aprovado, substituirá as leis "remendadas de 1976" e instituirá o Sisnad (Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas). "Com o projeto criamos um instrumento legal sobre o qual é possível trabalhar alguns avanços, como a questão de acabar com as penas privativas de liberdade para o usuário e para o dependente. Mas também devemos falar do endurecimento das penas para o tráfico", disse, lembrando que o projeto de lei torna crime o financiamento do tráfico (pena de 8 a 20 anos de prisão) e institui o agravamento da pena para traficantes que varia de 5 a 15 anos de prisão- em caso de envolvimento de servidores públicos (como policiais), de crianças e adolescentes ou de associação com o tráfico internacional. As principais críticas que o projeto de lei recebe são as de que estimularia o uso de drogas. Em reportagem publicada na Folha em 13/2, deputados evangélicos criticaram o projeto de lei, afirmando que ele "desestimulará o trabalho da polícia" e incitará o uso de drogas. "[O projeto] é um estímulo moral ao uso das drogas, porque a prisão ainda é um freio para os usuários", reclamou o deputado Jefferson Campos (PMDB-SP). "Houve pouco tempo de discussão para um projeto polêmico como esse", disse o presidente da Frente Parlamentar Evangélica, Adelor Vieira (PMDB-SC). O general Uchôa não concorda com essa posição, embora diga que a respeita. "Muitas vezes os pais ocultam ou acobertam o uso de drogas dos filhos com medo que ele vá para a prisão. Alguns impedem até o tratamento por causa desse medo. Por isso a necessidade desse novo olhar, de extinguir a prática danosa de encarcerar o usuário", afirmou. Para o deputado federal Fernando Gabeira (sem partido-RJ), que mantém posição histórica a favor da descriminalização das drogas, o projeto representa um avanço ao acabar com a prisão para usuários. "Para milhares de jovens, sobretudo os mais pobres, o projeto representa a garantia de que eles não vão ser submetidos à violência, aos maus-tratos e à coexistência com delinqüentes na cadeia. Para os pais da classe média, significa que não serão achacados como eram antes", disse. Paulo Pimenta toca num outro ponto que a nova lei deixa mais claro: o da pessoa que fornece drogas, por exemplo, a um amigo. "Dentro do crime de tráfico, essa pessoa foi classificada de outra forma: como quem estimula, instiga o uso de drogas. Ela terá uma pena mais reduzida, de um a três anos de prisão", afirmou. (GUILHERME WERNECK) PUBLICIDADE DE DROGA Imagine-se , por hipótese, que o Brasil conclua que não vale a pena manter proibidas drogas como a maconha e a cocaína e decida legalizá-las. São de fato crescentes as vozes que defendem a legalização, mesmo entre pessoas responsáveis e conservadoras. Costumam argumentar que os danos provocados pelo tráfico superam em muito os malefícios que seriam gerados pelo consumo. O debate está aberto. O fato é que nem o mais radical dos militantes pró-legalização defenderia que empresas pudessem anunciar produtos derivados da maconha e da cocaína na TV. Muito menos em horário nobre e com mensagens que visassem especificamente os jovens. Quando a droga é o álcool, porém, por já ser legalizada, essa parece ser a situação mais natural do mundo. Do ponto de vista da saúde pública, o álcool causa mais danos do que todas as drogas ilícitas reunidas. Assim, chega a ser desconcertante a força do lobby das cervejas, que está prestes a evitar, mais uma vez, que a propaganda de bebidas seja banida, como o foi para efeitos práticos a publicidade de cigarros. E o governo Lula tem, lamentavelmente, se mostrado mais sensível aos apelos dos fabricantes e da área publicitária que aos interesses da saúde pública. A defesa que esta Folha faz da proibição da propaganda não é um ranço moralista. O jornal, na realidade, considera que o problema das drogas, por ser insolúvel, estaria melhor equacionado com a descriminalização do consumo -e, quem sabe, num futuro distante, com a legalização- do que com a repressão. Admitir o fato de que as pessoas usam drogas e entender que se trata de um problema de saúde, e não de polícia, não significa que se deva incentivar o consumo de substâncias que causam dependência. Ao contrário, jovens já demonstram por conta própria tendências autodestrutivas, que mereceriam, sim, campanhas de esclarecimento. Nesse sentido, estimular o consumo é algo pouco razoável, que deveria ser proscrito.