Capítulo 4 Prevenção do câncer colorretal: é viável um programa para o Brasil? Paulo Roberto Arruda Alves Os programas de prevenção do câncer colorretal podem ser desenvolvidos em escala limitada, dirigindo-se a um segmento específico da sociedade e promovidos por grupos e associações privadas, ou em escalas populacional e universal, necessariamente de responsabilidade governamental. O Brasil necessita de programas de prevenção do câncer colorretal nas regiões nas quais sua incidência é média ou alta, ou seja, no Sudeste, em toda a faixa litorânea até o Nordeste e em parte do Centro-Oeste. Há uma imensa extensão territorial, ainda que de densidade populacional baixa, para a qual não se justifica a alocação, na prevenção do câncer colorretal, dos escassos recursos humanos e financeiros. Um programa educacional nacional, através dos meios de comunicação de massa, atingiria essas regiões e despertaria uma demanda por FBG pre congresso 155x225.pmd 69 testes de detecção e atitudes de prevenção, que talvez não pudessem ser satisfeitas. Os programas de prevenção do câncer colorretal têm as suas populações-alvo, dentro de uma população geral de determinada região, nas quais o risco de câncer é maior: são os grupos de risco. Para esses grupos são dirigidos preferencialmente as ações e recursos de prevenção. Ainda que pareça lógico o critério de aplicar recursos nas populações com maior incidência de câncer colorretal, é duvidosa a viabilidade política de se excluir uma área do Brasil do programa de prevenção, dada a baixa incidência regional desse tumor. As estratégias disponíveis para prevenção secundária do câncer colorretal são bastante conhecidas;1-6 1. Pesquisa de sangue oculto nas fezes, com a resina do guaiaco, realizada anual ou bienalmente, a 10/5/2007, 17:35 Gastroenterologia: da Patogenia à Prática Clínica partir da quinta década, que, caso positiva, indica a realização de investigação adicional, usualmente através da colonoscopia com polipectomia ou outro tratamento que se fizer necessário. Esta estratégia tem sido utilizada nos grandes estudos populacionais, com aderência de 50% da população-alvo, índices de positividade de 5% e redução da mortalidade por câncer colorretal de 25%. A análise desses estudos demonstra sua eficiência em custo. Todas as estratégias que envolvem a pesquisa de sangue oculto têm sua eficiência fortemente dependente da aderência daqueles cujo exame foi negativo, para que voltem para a próxima rodada de sangue oculto, no ano seguinte. Talvez uma das dificuldades desses programas esteja associada à necessidade de o paciente manipular as fezes, na colheita das amostras, o que mantém a baixa aderência da população-alvo. Outro aspecto negativo da pesquisa de sangue oculto pelo método do guaiaco é a sua inespecificidade, que impõe a necessidade de dietas restritivas em alimentos ricos em peroxidases, animal ou vegetal, para reduzir os falsospositivos. 2. Colonoscopia única, aos 60 anos, com subseqüente tratamento das lesões encontradas e exclusão dos portadores de colonoscopia normal de qualquer estudo subseqüente de prevenção do câncer colorretal. Ainda que as simulações destes estudos os apresentam como eficientes em custo, ainda não foram publicadas grandes séries que demonstrem sua viabilidade na prática real. 3. Retossigmoidoscopia flexível única, aos 55 anos, com tratamento das lesões identificadas e indicação de colonoscopia nos pacientes portadores de lesão significante (adenoma viloso, de mais de 2 cm, com alto grau de displasia ou lesões múltiplas) à retossigmoidoscopia. Esta estratégia está em curso no Reino Unido, tendo sido incluídos já milhares de indivíduos, com resultados ainda incompletos. 4. Estudos combinando pesquisa de sangue oculto nas fezes, anual ou bienalmente, e retossigmoidoscopia em intervalos de 3 a 5 anos. As simulações desta estratégia também a apontam como eficiente em custo. As vantagens dos programas que empregam como medida inicial a pesquisa de sangue oculto apresentam a vantagem de se lançarem a campo sem necessidade de intervenção médica direta, porém gerarão uma demanda por colonoscopias maior, já que os falsos-negativos serão investigados. Países nos quais a mão-de-obra médica é barata têm cogitado o emprego apenas da colonoscopia como método de rastreamento pela sua especificidade. Talvez esse seja o caso do Brasil, que dispõe de colonoscopistas treinados; no entanto, o equipamento é escasso e caro no nosso meio. Nos países desenvolvidos, os programas de prevenção do câncer colorretal têm sido iniciados em escala limitada, em determinadas áreas, ainda que envolvendo grande número de indivíduos. O lançamento de um programa em escala nacional de início corre o risco em escala também maior e eventualmente sem possibilidade de 70 FBG pre congresso 155x225.pmd 70 10/5/2007, 17:35 Paulo Roberto Arruda Alves correção, dada a escala adotada. Portanto, os programas limitados, ou mesmo pontuais, são de grande valia para medir a resposta ao programa, verificar as dificuldades e ajustá-las subseqüentemente à realidade encontrada. Um programa de rastreamento para o Brasil é viável, porém deverá ser implantado de forma pontual, a seguir limitada, para em uma fase ulterior alcançar âmbito nacional. 2. 3. 4. 5. 6. Referências Bibliográficas 1. Benson AB, Desch CE, Flynn PJ et al. 2000 update of American Society of Clinical Oncology colorectal cancer surveillance guidelines. J Clin Oncol 2000; 18: 3586-88. Hardcastle JD, Thomas WM, Chamberlain J et al. Randomized, controlled trial of faecal occult blood screening for colorectal cancer. Lancet 1996; 348: 1472-77. Kronborg O, Fenger C, Olsen J et al. Randomized study of screening for colorectal cancer with faecal-occult blood test. Lancet 1996; 348: 1467-71. Mandel JS, Bond JH, Church TR et al. Reducing mortality from colorectal cancer for fecal occult blood: Minnesota Colon Cancer Control Study. N Engl J Med 1993; 328: 1365-71. Rex D, Johnson D, Lieberman D et al. 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