46f DA CONTABILIDADE PÚBLICA ÀS CONTAS NACIONAIS: AJUSTAMENTOS DE TRANSPOSIÇÃO E IMPACTO NO DÉFICE DAS ADMINISTRAÇÕES PÚBLICAS DOS PAÍSES IBÉRICOS Maria Antónia Jorge de Jesus Departamento de Contabilidade da ISCTE Business School ISCTE – Instituto Universitário de Lisboa Av. das Forças Armadas, 1649-026 LISBOA – PORTUGAL Susana Margarida Jorge Faculdade de Economia – Universidade de Coimbra Av. Dias da Silva, 165 – 3004 -512 COIMBRA – PORTUGAL Área temática: F) Sector Público Idioma de apresentação: Português Palavras-chave: Contabilidade Pública, Contabilidade Nacional, Administrações Públicas, Critérios de Convergência, Défice Orçamental Público. 1 DA CONTABILIDADE PÚBLICA ÀS CONTAS NACIONAIS: AJUSTAMENTOS DE TRANSPOSIÇÃO E IMPACTO NO DÉFICE DAS ADMINISTRAÇÕES PÚBLICAS DOS PAÍSES IBÉRICOS Resumo Considerando as diferenças mais relevantes entre a Contabilidade Pública (CP – perspectiva microeconómica) e a Contabilidade Nacional (CN – perspectiva macroeconómica), este artigo analisa os principais ajustamentos realizados em Portugal e em Espanha, no sector das Administrações Públicas, na conversão dos dados da CP para a CN. Adicionalmente, avalia o impacto desses ajustamentos no défice/excedente da Administração Central de ambos os países. Seguindo uma metodologia qualitativa, o estudo empírico é baseado em fontes documentais que permitem identificar os ajustamentos mais significativos na passagem das Contas Públicas para as Contas Nacionais e avaliar o respectivo impacto nos dados notificados pelos Países Ibéricos, no âmbito do Procedimento relativo aos Défices Excessivos (PDE), permitindo uma análise comparativa. Foram utilizados, para ambos os casos, os dados da notificação de Abril de 2010, cobrindo o período de 2006 a 2009, relativos ao reporte do défice/excedente orçamental da Administração Central. Os resultados desta investigação indicam que, no conjunto, os ajustamentos têm um impacto bastante mais significativo em Espanha do que em Portugal e que a categoria de “outros ajustamentos” é que tem maior impacto relativo no défice/excedente da Administração Central de ambos os países. Deste modo, este estudo aponta para a necessidade de um sistema de informação contabilística comum aos dois sistemas (CP e CN), a par da premência de ser estabelecida uma framework comum a todos os Estados-membros da UE, no sentido de harmonizar o tratamento contabilístico a adoptar na passagem dos dados das Contas Públicas para a Contas Nacionais, de forma permitir uma maior transparência nos dados reportados no contexto do PDE, tornando-os mais credíveis e comparáveis. 2 Introdução Como tem sido enfatizado por vários autores (e.g. Lüder, 2000; Jones, 2000; Montesinos e Vela, 2000; e Keuning e Tongeren, 2004), a problemática do relacionamento entre a Contabilidade Pública (CP) e a Contabilidade Nacional (CN) afigura-se como um relevante objecto de estudo, sobretudo num contexto em que vários países por todo o mundo têm procedido a reformas dos seus sistemas contabilísticos governamentais. No contexto Europeu, os vários Estados-membros obrigados a usar o Sistema Europeu de Contas Nacionais e Regionais (SEC95) para a preparação das suas Contas Nacionais, têm procedido nas últimas décadas a reformas consideráveis dos seus sistemas de Contabilidade Pública, designadamente introduzindo a base de acréscimo, aproximando-se à contabilidade de tipo empresarial. Por outro lado, se para as Contas Nacionais existe um sistema harmonizado, para a Contabilidade Pública, embora sejam reconhecidas convergências inegáveis, a harmonização está longe de ser alcançada. Veja-se, por exemplo, os casos de Portugal e Espanha, onde no primeiro o saldo de partida das Contas Públicas para as Contas Nacionais é reportado em base de caixa, enquanto que no segundo o saldo de parida já é em base de acréscimo. A questão em análise prende-se, portanto, em saber se, particularmente no contexto das Administrações Públicas, as reformas dos sistemas de Contabilidade Pública (CP – perspectiva micro económica) têm conduzido a um maior alinhamento com o sistema de Contas Nacionais (CN – perspectiva macroeconómica), já que a informação deste depende da disponibilizada pelo primeiro. Adicionalmente, as divergências e incongruências eventualmente existentes entre os dois sistemas (CP e CN) põem em causa a relevância, fiabilidade e comparabilidade dos rácios estabelecidos no artigo 104º do Tratado da União Europeia e nos requisitos do Protocolo sobre o Procedimento relativo aos Défices Excessivos (PDE), que permitem avaliar e monitorizar a disciplina orçamental dos Estados-membros (EM), no âmbito da União Económica e Monetária (UEM). Assim, neste artigo começam por evidenciar-se, do ponto de vista teórico, as principais diferenças entre os dois sistemas contabilísticos, CP e CN, no que concerne aos elementos das estruturas conceptuais subjacentes, designadamente quanto aos princípios contabilísticos, dos quais resultam diferentes critérios de reconhecimento (base de caixa – CP versus base de acréscimo – CN) e valorimetria (custo histórico – CP versus preços de mercado – CN). Partindo deste contexto, o objectivo principal do trabalho é identificar os principais ajustamentos na transposição dos dados do sector das Administrações Públicas (APUS) da CP para a CN nos países da Península Ibérica. 3 Finalmente avalia-se também o impacto desses ajustamentos nos défices públicos das respectivas Administrações Centrais, reportado por ambos os países no âmbito do PDE, com suporte nos dados das notificações de Abril de 2010. Para além da Introdução e das Conclusões, o artigo segue organizado em seis secções. Na secção 1 é feito o enquadramento geral das relações entre a CP e a CN. A secção 2 discute as principais características das reformas da CP em Portugal e em Espanha, evidenciando as suas aproximações e/ou divergências. A secção 3 apresenta as questões metodológicas subjacentes a este estudo, enquanto que a secção 4 identifica as principais fontes utilizadas na preparação das Contas Nacionais por ambos os países. Na secção 5 são identificados os principais ajustamentos de transposição das Contas Públicas para as Contas Nacionais, tanto em Portugal como em Espanha. A secção 6 avalia o impacto desses ajustamentos no respectivo défice/excedente orçamental da Administração Central, para o período de 2006 a 2009, tendo como ponto de partida os dados da TABELA 2A – Défice da Administração Central – Passagem das Contas Públicas para as Contas Nacionais, constantes da Notificação de Abril de 2010, quer para Portugal, quer para Espanha. O propósito último será o de apresentar algumas conclusões que permitam conhecer quais os ajustamentos com maior impacto. 1. Contabilidade Pública versus Contabilidade Nacional Na perspectiva da CP, destacam-se as principais características comuns às reformas levadas a cabo nos últimos anos neste domínio, enquadradas no contexto da New Public Management (NPM)1 e identificadas por autores como Brusca Alijarde (1997), Vela Bargues (1996), Montesinos e Vela (2000), Brusca Alijarde e Benito López (2002), Brusca e Condor (2002), Jones e Lüder (2003, Benito e Brusca (2004) e Benito López et al. (2007): § Introdução da contabilidade por partidas dobradas, de acordo com os Princípios Contabilísticos Geralmente Aceites (PCGA), com uma aproximação progressiva ao modelo empresarial e uma tendência generalizada para a introdução da base de acréscimo, embora com diversos graus de implementação; § Manutenção da importância do acompanhamento da execução orçamental, integrado como subsistema do "Sistema de Informação para a Gestão Pública" ou desenhado de forma autónoma, com uma tendência crescente para a atribuição de um papel importante à contabilidade patrimonial e de gestão; § Adaptação e desenvolvimento de informação pública em consonância com os princípios e metodologias da NPM, ou seja, especialmente orientada para a tomada de decisões e avaliação do desempenho; § Enquadramento das reformas da CP num contexto mais amplo de mudanças na gestão do sector público, que abarcam a modernização da Administração Pública, na sequência de várias pressões no sentido do controlo das despesas públicas; § Reforço do papel da informação contabilística, tanto a nível interno como suporte para a avaliação do desempenho das entidades públicas, como a nível 4 § § § externo como factor de incremento da responsabilização e da transparência; Motivação subjacente às mudanças no sentido da obtenção de informação que permita ir além do mero controlo orçamental, passando a ser dada cada vez mais importância à informação de carácter patrimonial/financeira, com a elaboração e divulgação de demonstrações financeiras nesta perspectiva; Preocupação crescente quanto à preparação e divulgação de informação de carácter qualitativo, como indicadores de desempenho, de forma a avaliar a eficiência e eficácia dos serviços públicos; Aproximação da CP à CN para que os necessários ajustamentos, reclassificações e eliminações sejam feitos de forma fácil e segura, com o propósito de aplicar os mesmos princípios e critérios a ambos os sistemas, para que a mesma informação possa ser utilizada tanto para fins micro como macro. Todavia, de acordo com vários estudos de âmbito internacional, a maioria dos países que adoptaram a base de acréscimo na vertente financeira, não o fizeram na vertente orçamental dos respectivos sistemas contabilísticos aplicáveis ao Sector Público, designadamente na elaboração do orçamento anual e na divulgação da respectiva execução (Lüder e Jones, 2003; 2006;Sterck et al., 2006; Benito et al., 2006). Quanto à base contabilística em que o orçamento é preparado e a respectiva execução divulgada, os vários estudos demonstram que a principal inovação introduzida na óptica financeira/patrimonial – introdução da base de acréscimo, não foi acompanhada na óptica orçamental, onde prevalece a base de caixa ou de compromissos. Ou seja, as reformas introduzidas não se traduzem em alterações no sistema contabilístico propriamente dito, mas nas questões associadas à divulgação de informação de políticas fiscais, no sentido de uma maior transparência orçamental (Benito et al., 2006;Sterck et al., 2006; Yamamoto, 2006). Na perspectiva da CN, salienta-se o facto de o Regulamento nº 2223/96 (CE) do Conselho (com as subsequentes emendas)2 obrigar os Estados-membros da União Europeia a preparar as suas Contas Nacionais com base no SEC95, que constitui o suporte contabilístico para a preparação e divulgação de informação a prestar ao EUROSTAT para feitos específicos de controlo da política monetária e dos agregados nacionais, como o PIB, o défice e a dívida relativos ao sector das Administrações Públicas (APUS), no contexto dos critérios de convergência estabelecidos no artigo 104º do Tratado de Maastricht (Sierra Molina et al., 2005). O SEC95 é, portanto, o pilar metodológico para as regras relacionadas com os critérios de convergência definidos no Tratado da União Europeia, nomeadamente para o cumprimento dos requisitos do Protocolo sobre o Procedimento dos Défices Excessivos (PDE). Este Protocolo, anexo ao Tratado, estabelece que os dois critérios de convergência – o défice orçamental e a dívida pública, se reportam a indicadores do sector Administrações Públicas, cuja monitorização é essencial para assegurar a disciplina orçamental essencial aos objectivos da UEM. Fixa ainda os valores de referência para a relação entre o défice orçamental e o PIB em 3% e para a relação entre a dívida pública e o PIB em 60%. 5 Consequentemente, assume grande relevância o estudo das relações entre a CP e a CN, até porque os dados do sector das APUS são obtidos a partir dos sistemas de CP de cada um dos Estados-membros, cuja diversidade e diferenças com os sistemas macro podem pôr em questão a relevância, fiabilidade e comparabilidade dos rácios que suportam as decisões financeiras no contexto do PEC (Lüder, 2000; Montesinos e Vela, 2000; Sierra Molina et al., 2005; Benito López at al., 2006). Cordes (1996), Jones e Lüder (1996), Montesinos e Vela (2000) identificam as principais diferenças entre os dois sistemas contabilísticos, no que concerne: § À definição das entidades que integram o conceito de Sector Público, que é mais abrangente na CP do que na CN, visto que esta apenas inclui as unidades institucionais públicas não mercantis, não abrangendo as entidades públicas orientadas para a produção de bens e serviços destinados ao mercado, como por exemplo as empresas públicas; § Ao momento de reconhecimento das transacções, cujo registo ocorre principalmente em base de acréscimo na óptica da CN, enquanto que a CP assenta na base de caixa, na base de caixa modificada ou na base do acréscimo modificado; § Ao âmbito das transacções a registar, salientando a exigência do SEC95 quanto ao reconhecimento de transacções não monetárias, como a depreciação de activos fixos, incluindo infra-estruturas, transacções que os sistemas de CP de um modo geral não contemplam; § À valorimetria das transacções reconhecidas, que a CN considera deverem ser valoradas a preços de mercado, enquanto que o custo histórico (de aquisição ou de produção) prevalece no âmbito da CP. Jones e Lüder (1996) destacam ainda as seguintes questões relevantes nas relações entre a CP e a CN: § As contradições entre a teoria e a prática dos agregados nacionais, obtidos em base de acréscimo, e os dados do sector das APUS obtidos de acordo com a base de caixa, e respectivas implicações no cálculo dos rácios estabelecidos no Tratado da UE; § As divergências decorrentes da definição de entidade informativa, atendendo à definição de unidade institucional e dos sectores e subsectores institucionais definidos no SEC95, considerando que o facto de determinadas entidades públicas não serem incluídas no sector S.13 afecta, directamente, a determinação quer do défice orçamental, quer da dívida pública; § Os ajustamentos que é necessário efectuar na transposição para as Contas Nacionais dos dados da CP relativamente ao sector das APUS devido, também, aos diferentes critérios de valorimetria adoptados por cada um dos sistemas, ajustamentos que podem afectar a fiabilidade aos indicadores macroeconómicos. Este último aspecto é salientado por Keuning e Tongerin (2004), num estudo sobre as relações entre a CP e a CN centrado no caso da Holanda, onde refere que as 6 diferentes regras contabilísticas aplicáveis aos dois sistemas dão origem a vários ajustamentos de transposição. Muitas das diferenças entre a CP e a CN estão relacionados com as estruturas conceptuais subjacentes a cada um dos sistemas , necessariamente distintas. Assim, o Quadro 1 compara os utilizadores e respectivas necessidades informativas de ambos os sistemas, bem como as finalidades e objectivos que a CP e a CN se propõem alcançar para satisfazer essas necessidades e, consequentemente, os diferentes princípios contabilísticos e critérios de valorimetria. Quadro 1: CP versus CN – utilizadores, objectivos e critérios de reconhecimento e valorimetria Tema UTILIZADORES NECESSIDADES INFORMATIVAS FINALIDADES OBJECTIVOS Contabilidade Pública Governos, organismos internacionais, empresas, organismos de supervisão, credores e investidores, instituições e analistas financeiros, gestores, contribuintes, representantes dos eleitores, público em geral Contabilidade Nacional Instituições comunitárias, governos, analistas e decisores de políticas fiscais e outros agentes da vida económica e social . Informação acerca da posição financeira, do desempenho e dos cash flows de determinada entidade, para que seja útil para a avaliação e para a tomada de decisões acerca da atribuição de recursos Dados agregados de modo a satisfazer as necessidades de análise e conhecimento da realidade económica e para a tomada de decisões no âmbito das políticas económicas e fiscais Gestão Controlo Análise e Divulgação Análise económica Tomada de decisões e formulação de políticas económicas Prestação de Responsabilidades (Accountability) Análise e avaliação macroeconómica Tomada de decisões Proporcionar informação para a preparação, implementação e monitorização das políticas económicas dos Estados -membros no âmbito da UEM Vertente orçamental – base de caixa RECONHECIMENTO VALORIMETRIA Vertente financeira – base de caixa, base de acréscimo (acréscimo modificado ou acréscimo completo) Base de acréscimo completo para todas as transacções (monetárias e não monetárias) Custo histórico (de aquisição ou de produção) Preços de mercado (referência básica) 7 Deve ser salientado que a base de acréscimo, como critério de conhecimento adoptado genericamente pelo SEC95, foi posteriormente alterada no que respeita ao reconhecimento dos impostos e das contribuições sociais, de acordo com o Regulamento (CE) nº 2156/2000, que vem permitir que os EM utilizem três ópticas distintas: § Óptica da especialização económica, isto é, respeitando o momento em que o factor gerador dos impostos ocorre, ajustando os montantes previsivelmente incobráveis; § Óptica de caixa ajustada, segundo a qual a fonte utilizada são os recebimentos em dinheiro, os quais deverão ser ajustados ao longo do tempo, de modo a que os montantes recebidos possam ser atribuídos ao período de tempo em que se verificou a actividade geradora da obrigação fiscal; § Óptica de caixa pura, no caso de não ser possível aplicar nenhum dos métodos precedentes. O IPSASB (International Public Sector Accounting Standards Board)3 desenvolveu um programa de trabalho no sentido da convergência entre as IPSASs e os sistemas de Contas Nacionais (GFMS2001, SCN93 e SEC95), consubstanciado no Research Report intitulado “International Public Sector Accounting Standards (IPSASs) and Statistical Bases of Financial Reporting: an analysis of Differences and Recommendations for Convergence ”. Este relatório identifica as diferenças entre as duas perspectivas contabilísticas e aponta recomendações no sentido da eliminação ou redução das diferenças detectadas, sempre que tal seja viável e não contrarie os objectivos específicos de cada um dos sistemas (IPSASB, 2005). A análise do Research Report acima referido permitiu identificar, juntamente com a revisão de literatura, os principais temas que estão na origem das diferenças entre a CP e a CN: § Definição e âmbito da entidade informativa e do sector objecto de divulgação; § Preparação e divulgação de demonstrações financeiras consolidadas – diferença de perspectiva entre a CP e a CN; § Critérios de reconhecimento e valorimetria adoptados por cada um dos sistemas no registo das operações; § Relações entre as entidades pertencentes ao sector das APUS e as empresas públicas: injecções de capital, privatizações, tratamento contabilístico dos dividendos, etc. 2. O processo de Reforma da Contabilidade Pública em Portugal e Espanha Seguindo as principais tendências internacionais, nomeadamente no espaço da União Europeia, no início da década de noventa iniciou-se um processo de reforma da CP, primeiro em Espanha e depois em Portugal, inseridas num conjunto mais vasto de reformas da Administração Pública. A principal característica das reformas neste âmbito é consubstanciada na introdução da base de acréscimo nos sistemas contabilísticos aplicáveis às entidades do sector público. 8 O processo de reforma apresenta algumas semelhanças nos dois países, tendo Portugal seguido de muito perto a reforma que foi iniciada em Espanha com a publicação do Plan General de Contabilidad Pública de 1994 (PGCP 94)·, que surge na sequência de importantes iniciativas legislativas emanadas nas duas décadas precedentes, designadamente da publicação da Ley General Pressupestuaria (LGP) – Lei 11/1977, de 4 de Janeiro. Esta lei introduz modificações importantes na concepção da CP, criando as bases jurídicas que permitiram a implementação posterior da reforma propriamente dita (Montesinos e Vela, 2000). Foi posteriormente substituída pela Lei 47/2003, de 26 de Novembro, actualmente em vigor, da qual se destaca o seu artigo125º que confere ao IGAE (Intervención General de la Administración del Estado) amplas competências neste domínio, passando a ser o de organismo responsável pela gestão da CP em Espanha, desde a aprovação e implementação dos Planos de Contas aplicáveis a todas as entidades do sector público, até ao estabelecimento de todos os princípios e regras que devem ser seguidos na preparação das contas públicas, quer na vertente orçamental, quer na vertente financeira/patrimonial (Pina Martínez e Torres Pradas, 1999). Destaca-se ainda o artigo 122º da nova LGP (Lei 47/2003) que define os princípios contabilísticos aplicáveis ás entidades públicas e estabelece a existência de três grupos de entidades que constituem o sector público e que aplicam Planos de Contas distintos: § Entidades do Sector Público Administrativo – aplicam as regras e princípios estabelecidos no Plano Geral de Contabilidade Pública; § Entidades do sector empresarial do Estado – aplicam as regras e princípios do Plano geral de Contabilidade das Empresas; § Entidades do sector público fundacional – aplicam as regras e princípios do Plano geral de Contabilidade para as Entidades Sem Fins Lucrativos Saliente-se que em Espanha o PGCP944 foi um marco fundamental da reforma da CP naquele país, na medida em que estendem a adopção da base de acréscimo se estendeu a todos os organismos do sector público administrativo, com uma ampla implementação por força do papel desempenhado pelo IGAE (Fernandes e Carvalho, 2001). Todavia, são evidenciadas por Montesinos e Vela (2000) duas importante excepções previstas no PGCP 94 no que respeita à base de acréscimo: § Bens de domínio público – estes activos fixos, nomeadamente infraestruturas e bens culturais, são reconhecidos no balanço das entidades públicas durante o período de construção e desreconhecidos logo que completada a sua construção; § Subsídios e transferências, correntes e de capital, são reconhecidas em base de caixa modificada 5, bem como as despesas e receitas orçamentais; Recentemente ocorreu em Espanha uma ampla reforma da Contabilidade Empresarial, no sentido da adaptação à realidade espanhola das da Normas Internacionais de Relato Financeiro (NIRFs), na sequência da qual se optou por seguir 9 a mesma lógica relativamente ao sector público, ou seja, aproximar a CP às IPSASs emitidas pelo IPSASB, com um âmbito de aplicação a nível internacional. Neste sentido, foi publicado em Abril de 2010 um novo Plano de Contabilidade Pública que deverá entrar em vigor em 2011. Em Portugal, um marco importante da reforma da CP é a publicação de um novo Regime da Administração Financeira do Estado (RAFE) – Decreto-Lei 155/92, de 28 de Julho, de acordo com o qual, e em consonância com a Lei 8/90, de 20 de Fevereiro – Lei de Bases da Contabilidade Pública, os sistemas contabilísticos a aplicar às entidades públicas passam a ser: § Serviços com Autonomia Administrativa (regime geral): contabilidade de caixa e contabilidade de compromissos; § Serviços com Autonomia Administrativa e Financeira (regime excepcional): contabilidade de acréscimo e contabilidade de compromissos na vertente orçamental. Em complemento, surge em 1991 uma nova Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado (LEOE) – Lei 6/91, de 20 de Fevereiro, que estabelece os princípios e regras para a elaboração e execução do orçamento anual. Esta lei é posteriormente revogada pela Lei 91/2001, de 20 de Agosto – Lei do Enquadramento Orçamental (LEO), que em termos contabilísticos se limita a reforçar a necessidade de aplicação do Plano Oficial de Contabilidade Pública (POCP) a todo o SPA, considerando-o como um instrumento de gestão das entidades públicas (Lei 91/2001- art. 10º). Todavia, é com a publicação em 1997 do POCP, que seguiu de muita perto o PGCP de 1994, que se inicia a etapa mais significativa da reforma da CP em Portugal, constituindo este instrumento " (…) um passo fundamental na reforma da administração financeira e das contas públicas (…)" (DL 232/97, Preâmbulo, 1), passo esse decisivo para a introdução da contabilidade em base de acréscimo nas entidades públicas, com o propósito de permitir a " (…) construção de indicadores de avaliação da economia, eficiência e eficácia da aplicação de dinheiros públicos e, em simultâneo, a criação das condições para a elaboração de um Balanço de Estado." (Caiado e Pinto, 2002:40). O sistema contabilístico do POCP, tal como os Planos Sectoriais entretanto publicados, designadamente os de aplicação na Administração Central (AC), utiliza em simultâneo duas bases contabilísticas. Para além disso, verifica-se, de acordo com os Relatórios de Actividade da Comissão de Normalização Contabilística para a Administração Pública (CNCAP), que a sua implementação tem indo a ocorrer quase exclusivamente nos Serviços e Fundos Autónomos (SFA) da AC – serviços com autonomia administrativa e financeira, enquanto que os Serviços Integrados (SI) – serviços apenas com autonomia administrativa, continuam a aplicar a base de caixa modificada (Jesus, 2008). As reformas ocorridas nos países Ibéricos apresentam uma característica comum que é a de aproximar o sistemas de CP à contabilidade empresarial, introduzindo de forma 10 generalizada a base de acréscimo, pelo menos na vertente financeira/patrimonial, procurando desta forma uma aproximação com a CN, por forma a preparar ambos os países para a entrada na União Económica e Monetária, indo ao encontro das novas nas necessidades informativas decorrentes do cumprimento dos critérios de convergências exigidos pelo Pacto de Estabilidade e Crescimento, ao qual os dois países, na qualidade de Estados-membros da EU integrantes do euro, se encontram vinculados, passando a ter que seguir nas suas Contas Nacionais os requisitos do SEC95. A questão que se coloca é se, apesar das reformas ocorridas no âmbito da CP, os critérios aplicáveis ases entidades do sector público, em particular às que integram o sector das Administrações Públicas, estão em consonância com as exigências do SEC95, pilar metodológico para a preparação da CN, conforme evidenciado na secção precedente. 3. Metodologia e Fontes de Informação Este estudo segue uma orientação qualitativa no que concerne ao respectivo desenho de investigação, uma vez que o propósito é descrever, analisar e comparar práticas contabilísticas focadas num determinado contexto, de uma forma sistemática, abrangente e integrada (Miles e Huberman, 1994; Ryan et al., 2002). Entende-se que esta perspectiva qualitativa é a que melhor se coaduna com um dos propósitos deste trabalho, ou seja, caracterizar sistemas contabilísticos e identificar quais as principais diferenças entre eles, com enfoque na situação portuguesa e espanhola, em particular na Administração Central (AC) destes países. Os estudos de natureza qualitativa utilizam muitas vezes dados qualitativos combinados com dados quantitativos (Miles e Huberman, 1994; Ryan et al., 2002), o que também se adopta nesta investigação. No primeiro caso, foram utilizadas essencialmente fontes documentais, enquanto que no segundo caso, foram utilizados os dados quantitativos constantes da 1ª Notificação do ano 2010 (Notificação de Abril), mais precisamente da TABELA 2A, que explica a passagem do défice/excedente das Contas Públicas para o défice/excedente na óptica das Contas Nacionais, relativamente à Administração Central de Portugal e de Espanha, para o período de 2006 a 2009. Relativamente a Portugal, a principal fonte documental é o Documento Metodológico denominado “Inventário de Fontes e Métodos relativo à compilação de dados no âmbito do Procedimento dos Défices Excessivos”, publicado em Setembro de 2007 doravante designado por Inventário de Fontes e Métodos (INE, 2007). No que concerne a Espanha, o respectivo Inventário de Fontes e Métodos (EDP Consolidated Inventory of Sources and Methodos) é também o principal documento de suporte para esta investigação, uma vez que identifica os procedimentos, as fontes, os métodos e os critérios de reconhecimento utilizados na preparação das Contas 11 Nacionais para o Sector das Administrações Públicas, designadamente para o subsector S.1311 – Administração Central (EUROSTAT, 2009). 4. Fontes utilizadas na preparação das Contas Nacionais O enquadramento legal subjacente à divulgação de informação relativa às APUS compreende o Regulamento (CE) nº 3605/93 do Conselho (com as modificações introduzidas pelo Regulamento (CE) nº 475/2000 do Conselho e pelo Regulamento (CE) nº 351/2002 da Comissão), onde se encontram definidas as regras e o campo de aplicação das notificações no âmbito do PDE por parte dos Es tados-membros, e, ainda, o próprio SEC95 (Regulamento nº 2223/96 do Conselho, de 25 de Junho). O Inventário de Fontes e Métodos de Portugal (INE, 2007), acima referido, também publicado no site do EUROSTAT, surge na sequência da assinatura, em Janeiro de 2006, do “Acordo de Cooperação Institucional no Domínio das Estatísticas das Administrações Públicas”, envolvendo o Instituto Nacional de Estatística (INE), o Banco de Portugal e a Direcção Geral do Orçamento (DGO), entidades que se comprometem a uma cooperação activa no sentido de ser alcançada uma harmonização metodológica relativa à compilação de dados e à actualização dos inventários de fontes e métodos utilizados na preparação das Contas Nacionais relativas ao sector das Administrações Públicas. A responsabilidade pela coordenação da compilação dos dados pertence ao INE relativamente a todos os anos, excepto para o ano da própria notificação, cujos dados estimados são da responsabilidade da DGO. O cálculo do défice orçamental a partir das contas não financeiras 6 das APUS é da responsabilidade do INE, enquanto que o Banco de Portugal é responsável pelo cálculo do défice orçamental a partir das contas financeiras, e pelo cálculo da dívida pública. De qualquer forma, a responsabilidade pelas notificações perante o EUROSTAT é do INE, independentemente da responsabilidade individual de cada um dos organismos na preparação de cada um dos quadros de notificação. Para Espanha, segundo o respectivo Inventário de Fontes e Métodos (EUROSTAT, 2009), é também o Instituo Nacional de Estatística a entidade responsável pelo reporte das notificações perante o EUROSTAT, em cooperação como o Banco de Espanha e com o IGAE (Intervención General de la Administración del Estado). Cabe ao IGAE, como organismo responsável pelas Contas Públicas em Espanha, a responsabilidade pela preparação das contas não financeiras de todas as entidades que constituem o perímetro do sector das Administrações Públicas, de acordo com a classificação efectuada pelo Instituto Nacional de Estatística de Espanha, no cumprimento dos requisitos do SEC95 para a delimitação daquele sector. Compete-lhe ainda compilar todos os dados relativos às contas não financeiras e apurar o défice/excedente orçamental, enquanto que o Banco de Espanha de Espanha, tal como o de Portugal, é a entidade responsável pelas contas financeiras e pelo cálculo da dívida pública. 12 Os Inventários de Fontes e Métodos de ambos os países descrevem as fontes e métodos utilizados na preparação das TABELAS de notificação reportados ao EUROSTAT no contexto do PDE. O Quadro 2 apresenta os períodos de notificação a que os Estados-membros se encontram obrigados para efeitos do cumprimento dos requisitos legais em vigor no contexto do PDE. Quadro 2: Periodização das notificações no contexto do PDE Período de Referência Natureza dos dados 7 (N-4) Definitivos Notificação de Abril de (N) (N-3) Definitivos Até ao final de Março do período (N) (N-2) Provisórios (N-1) Preliminares (N) Estimados Período de Referência Natureza dos dados (N-4) Definitivos (N-3) Definitivos (N-2) Provisórios (N-1) Provisórios 1ª Notificação 2ª Notificação Notificação de Outubro de (N) Até final de Setembro do período (N) (N) Fonte: Inventário de Fontes e Métodos (INE, 2007; EUROSTAT, 2009). Estimados O reporte de Abril de 2010 contempla, assim, a estimativa dos dados para esse ano, os dados preliminares relativos ao ano de 2009, os dados provisórios de 2008 e as contas definitivas de 2007 e 2006. O reporte de Outubro de 2010 apenas diferirá do anterior por apresentar já os dados provisórios relativos ao ano de 2009. Para este ano, os dados definitivos serão incluídos na notificação de Abril de 2012. Este estudo está focado na Administração Central e no respectivo défice/excedente orçamental, pelo que importa identificar as principais fontes utilizadas na preparação das contas não financeiras, dado que as mesmas representam na CN os fluxos entre unidades institucionais relacionados com receitas e despesas, cujo saldo (B.9) representa a Capacidade (+) / Necessidade (-) líquida de financiamento do Sector S.13, neste caso correspondendo ao défice/excedente do subsector S.1311 – Administração Central. Por outro lado, as contas financeiras reportam-se às transacções relacionadas com empréstimos obtidos e concedidos (transacções financeiras) entre unidades institucionais e representam o montante pelo qual o défice/excedente orçamental é financiado/aplicado, através da contracção/reembolso de passivos e da aquisição/alienação de activos financeiros (EUROSTAT, 1996). Assim, o Quadro 3 identifica as principais fontes e bases contabilísticas utilizadas, quer por Portugal, quer por Espanha, na preparação das contas não financeiras, para 13 as contas preliminares (N-1) e provisórias (N-2) da Notificação de Abril de N e para as contas provisórias (N-1) e definitivas (N-2) da Notificação de Outubro de N. Os dados das contas provisórias de N-2 não registam alterações entre as duas notificações anuais, uma vez que em Outubro de N, os dados definitivos relativos a N-1, ainda que disponíveis, não são todavia incluídos nessa Notificação (INE, 2007; EUROSTAT, 2009). Esta situação é válida para ambos os países e, no que respeita às contas estimadas (N) e preliminares (N-1), da Notificação de Abril de N, os dados são obtidos a partir das estimativas da execução orçamental efectuadas pela DGO (Portugal) e pelo IGAE (Espanha). Quadro 3: Fontes e bases contabilísticas utilizadas nas contas não financeiras Contas provisórias Portugal § Espanha Tanto para o subsector Estado como para os SFA, a informação tem origem em dados provenientes da implementação orçamental recolhidos pela DGO, informação que é preparada em base de caixa e de compromissos § Relativamente às entidades do Ministério da Saúde, os dados provisórios são preparados em base de acréscimo, de acordo com as regras do POCMS § Tanto para o subsector Estado como para as restantes entidades da AC, os dados são obtidos a partir do Sistema de Informação Contabilístico centralizado no IGAE § Para o subsector Estado a informação orçamental é obtida em base de acréscimo, tanto para as des pesas correntes como de capital; apenas as transacções financeiras são reportadas em base de caixa § Para as restantes entidades da Administração Central, toda a informação é preparada com base nas respostas aos questionários enviados a cada uma das entidades , contemplando informação orçamental sobre o saldo entre receitas e despesas , o saldo orçamental final e os ajustamentos adequados para cumprimento dos requisitos da CN Contas definitivas Portugal § As contas definitivas têm como suporte os dados da Conta Geral do Estado (base de caixa) para o subsector Estado § Para as restantes entidades, os dados são provenientes das demonstrações financeiras divulgadas de acordo com os Planos de Contas (base de acréscimo) aplicáveis à Administração Central Espanha § Tanto para o subsector Estado como para as outras entidades da AC, os dados definitivos têm como suporte a Conta Geral do Estado § Todos os dados reportados têm por base os Planos de Contas aplicáveis a cada uma das entidades do Sector Público, portanto toda a informação é preparada em base de acréscimo Fonte: Inventário de Fontes e Métodos (INE, 2007; EUROSTAT, 2009) 14 Constata-se, portanto, que, em ambos os países, são utilizadas várias fontes para cada um dos tipos de contas, salientando-se que o saldo de partida das Contas Públicas para as Contas Nacionais, para efeitos de reporte da TABELA 2A, é o saldo orçamental do subsector Estado em ambos os casos, embora esse saldo seja reportado em base de caixa relativamente a Portugal, ao passo que no caso de Espanha o saldo é reportado em base de acréscimo, já não incluindo portanto os saldos das transacções financeiras (INE, 2007; EUROSTAT, 2009). 5. Principais ajustamentos de transposição Por força das diferenças de critérios contabilísticos entre a CP e a CN, referido na secção 1, verifica-se a necessidade de serem efectuados ajustamentos na transposição dos dados das Contas Públicas para as Contas Nacionais. Com base nos Inventários de Fontes e Métodos de Portugal e Espanha (INE, 2007; EUROSTAT, 2009), foram identificados os ajustamentos mais significativos que ocorrem fundamentalmente nas contas provisórias e definitivas, abarcando várias categorias, que são comuns aos dois países, embora com tratamentos contabilísticos distintos. As categorias de ajustamentos comuns abarcam os ajustamentos de base contabilística – impostos e contribuições sociais, cálculo dos juros em base de acréscimo e outras contas a receber/pagar, bem como a reclassificação de determinadas operações. O Quadro 4 evidencia o tratamento contabilístico para os ajustamentos de base contabilística, efectuados pelos dois países para as seguintes rubricas: impostos e contribuições sociais, despesas primárias8e juros. Quadro 4: Ajustamentos relativos às diferenças de base contabilística Ajustamentos Situações Portugal Impostos sobre a produção, impostos especiais sobre o consumo (produtos petrolíferos, tabaco, álcool e bebidas alcoólicas) e contribuições sociais § Ajustamento temporal de acordo com a seguinte fórmula: [Receita de (N) em base de caixa + Receita de (N) recebida em Janeiro de (N+1) – Receita recebida em Janeiro de (N)] Espanha § O reconhecimento é feito com base nas declarações fiscais (momento da liquidação), sendo retiradas as anulações e cancelamentos entretanto verificados § Conhecido o valor por cobrar no final de N, é efectuada uma previsão das dívidas incobráveis 15 Ajustamentos Situações Portugal § IVA com base num modelo econométrico, baseado num sistema de médias acumuladas Ajustamento temporal de acordo com a seguinte fórmula: [Receita de (N) em base de caixa + ¾ dos recebimentos de Janeiro e Fevereiro de receita de (N+1) – ¾ dos recebimento de Janeiro e Fevereiro de (N)]. § Ajustamento temporal de acordo com a seguinte fórmula: [Despesas do ano (N) em base de caixa modificada + Despesas de (N) que permanecem em dívida para (N+1) – Despesas pagas em (N) relativas a compromissos de anos anteriores ] Despegas primárias, correntes e de capital § Juros Espanha Ajustamento temporal de acordo com a seguinte fórmula: [Juros pagos no ano (N) + Juros incorridos em (N) e a pagar em (N+1) – Juros pagos em (N) incorridos em (N1) ] § Não é efectuado qualquer ajustamento para as despesas correntes , uma vez que o seu registo já é feito em base de acréscimo na óptica da CP § Para os benefícios sociais é feito um ajustamento, tento em conta que em CP o cálculo das pensões do anterior é actualizado de acordo com o Índice Geral de Preços do Consumidor, efeito que tem de ser retirado tendo em linha de conta o princípio do acréscimo aplicável na CN § Para as despesas de capital, cujo contrato prevê um único pagamento, tem de ser efectuado o ajustamento temporal de forma a reconhecer, no ano N, a parte do pagamento efectuado que corresponde ao activo reconhecido § O registo das despesas e receitas respeitantes a esta rubrica é efectuado no momento em que se encontram completos os procedimentos administrativos relativos às respectivas transacções; assim, só haverá lugar a ajustamentos , no caso de existirem processos administrativos pendentes § A base de acréscimo já está prevista em todos os Planos de Contas 9 aplicáveis às várias entidades Fonte: Inventários de Fontes e Métodos (INE, 2007; EUROSTAT, 2009). No que respeita aos impostos e contribuições sociais, no caso de Portugal é efectuado pela DGO o ajustamento temporal de base de caixa pura para a base de caixa ajustada, de acordo com o regime de excepção previsto no Regulamento (CE) 2516/2000, que altera o regime geral da base de acréscimo preconizado pelo SEC95 (EUROSTAT, 1996). 16 Em Espanha, o reconhecimento em CP é feito com base no momento da liquidação dos impostos e das contribuições sociais (com base nas declarações fiscais), não sendo necessário qualquer ajustamento temporal, mas apenas a determinação dos montantes incobráveis estimados, conforme previsto no Regulamento acima referido, para a óptica da base de acréscimo. Este ajustamento é feito pelo Instituto Nacional de Estatística de Espanha, de acordo com modelos econométricos específicos para cada um dos impostos, conforme descrito no Anexo 4 do Inventário de Fontes e Métodos (EUROSTAT, 2009). Na realidade não se trata de um ajustamento de base contabilística propriamente dito, dado que o ponto de partida já é o saldo em base de acréscimo. Para as despesas primárias, no caso de Portugal, são feitos ajustamentos temporais, tendo como suporte informativo os dados em base de caixa modificada (caixa + compromissos) recolhidos pela DGO. O ajustamento relativo aos juros é realizado pelo Instituto de Gestão do Crédito Público (IGCP), que analisa individualmente empréstimo a empréstimo e título a título. Em Espanha, a base de acréscimo é já adoptada em todas as entidades, pelo que apenas são efectuados ajustamentos pontuais relativos às despesas correntes relacionas com benefícios sociais e a determinadas despesas de capital. Os Inventários de Fontes e Métodos de ambos os países (INE, 2007; EUROSTAT, 2009) destacam ainda os ajustamentos associados à reclassificação de determinadas operações, para os quais é incorporada informação complementar que não se encontra reflectida nos suportes contabilísticos (Conta Geral do Estado ou Demonstraç ões Financeiras). Estes ajustamentos contemplam várias e distintas situações, são efectuados por diferentes entidades e a partir de variadas fontes. A título de exemplo, o Quadro 5 identifica algumas dessas operações , bem como o respectivo ajustamento de reclassificação, comuns aos dois países. Quadro 5: Ajustamentos relativos à reclassificação de operações específicas Tipo de operações Injecções de capital nas empresas públicas Ajustamentos § É analisada cada uma das operações para decidir se a injecção de capital deve ser classificada como operação financeira, logo sem impacto negativo no défice, ou como operação não financeira (transferência de capital), com impacto no défice de acordo com as regras do SEC95 e do MDD do SEC9510 § É necessário analisar a rentabilidade das empresas que recebem as injecções de capital, para determinar se das mesmas são expectáveis rendimentos futuros para as APUS (operações financeiras) ou se apenas se destinam a cobrir prejuízos acumulados dessas empresas (operações não financeiras) 17 Tipo de operações Dividendos pagos pelas empresas públicas às APUS Despesas com equipamento militar Subsídios da EU (neutralidade dos fundos comunitários) Ajustamentos § De acordo com o MDD do SEC9511, é analisada operação a operação para determinar se todo o montante dos dividendos recebidos deve ser considerados como um rendimento, logo com impacto positivo no défice § Aquele Manual refere que os dividendos dêem ser classificados como rendimentos apenas quando calculados com base no resultado corrente da entidade pagadora, não sendo considerados como tal a parte dos dividendos calculada sobre venda de activos, ganhos de capital ou reservas acumuladas. Esta parte deve tratada como retiradas de capital, portanto sem impacto no défice § São efectuados ajustamentos temporais entre o momento de registo na óptica orçamental (pagamento das despesas) e o momento de registo na óptica do SEC95 (entrega do equipamento militar) § É feito um levantamento por parte de todas as entidades que gerem estes subsídios, sentido de avaliarem o montante das despesas financiadas pela UE, as quais são ajustadas para que, em cada período, o montante destas despesas iguale as respectivas receitas, com o propósito de que estes subsídios tenham um efeito neutro no défice Fonte: Inventários de Fontes e Métodos (INE, 2007; EUROSTAT, 2009) De acordo com o Inventário de Fontes e Métodos para Espanha (EUROSTAT, 2009), para além dos ajustamentos de reclassificação referidos no Quadro acima, são ainda efectuados ajustamentos no final do exercício, para efeito de reporte no âmbito do PDE, relativamente a outras situações específicas, tais como: § Ganhos de capital do Banco Central – reflectem ajustamentos derivados de ganhos relativos a dividendos e a vendas de activos, em que o Banco Central assume o papel de holding, tratando-se de operações financeiras, logo sem impacto no défice/excedente orçamental; § Seguros de crédito à exportação garantidos pelo Estado – trata-se de operações de risco de crédito assumidas pela Compañia Espñola de Seguros Credito a la Exportación em nome do Estado, que nas Contas Nacionais têm de ser consideradas como se fossem arrogadas directamente pelo Estado Espanhol; § Adiantamentos às Comunidades Autónomas e às Corporaciones Locales, que são efectuados aos sector da Administração Estadual e da Administração Local e que não se encontram registados no saldo orçamental do subsector Estado. 6. Impacto dos ajustamentos no Défice das ACs O impacto quantitativo das diferenças contabilísticas entre a CP e a CN na Administração Central pode ser avaliado, relativamente ao défice orçamental, a partir da análise da TABELA 2A do PDE – “Défice da Administração Central – Passagem da 18 Contabilidade Pública para a Contabilidade Nacional”. Tanto em Portugal como em Espanha, a TABELA 2A é construída com suporte no saldo orçamental (défice/excedente) em CP do subsector Estado (EUROSTAT, 2010a, 2010b). Todavia, enquanto que no caso português esse saldo resulta da diferença entre todas as receitas e todas as despesas, em base de caixa, no caso espanhol, o saldo de partida é divulgado já em base de acréscimo. Assim, existem categorias de ajustamentos que são distintas para cada um dos países e outras que são comuns, conforme Quadro 6. Quadro 6: Categorias de ajustamentos de passagem do défice da AC em CP para CN Categorias Portugal Espanha Operações financeiras incluídas no saldo orçamental X - Operações não financeiras não incluídas no saldo orçamental - X Ajustamentos de base contabilística X X12 Saldo de outras entidades da AC X X Outros ajustamentos 13 X X Fonte: TABELA 2A (EUROSTAT, 2010a, 2010b) Salienta-se o facto de Espanha não reportar ajustamentos relativos às “operações financeiras incluídas no saldo orçamental”, uma vez que o saldo do subsector Estado já é calculado depois de eliminadas essas operações, sem impacto no défice (EUROSTAT, 2009), o que não significa que elas não existiam, mas só não se encontram evidenciadas na TABELA 2A (EUROSTAT, 2010b). Todavia, os dados daquele país mostram uma categoria que não se encontra nos dados notificados por Portugal e que se designa “operações não financeiras não incluídas no saldo orçamental”. Trata-se, segundo o Inventário de Fontes e Métodos de Espanha, de situações objecto de tratamento específico, tais como as operações FAD (Fondo de Ayuda al Desarrollo) e do Fundo de Investimentos Locais (Fondo Estatal de Inversión Local). Estas operações não se encontram registadas no subsector Estado, embora sejam consideradas como transferências (operações financeiras) na óptica das Contas Nacionais (EUROSTAT, 2009). O impacto das categorias acima assinaladas foi, conforme referido, quantificado com suporte na análise nos dados da TABELA 2A da Notificação de Abril de 2010, de cada um dos países, que compreende os dados para os anos de 2006 e 2007 (contas definitivas), 2008 (contas provisórias) e 2009 (contas preliminares)14 (EUROSTAT, 2010a, 2010b). O Gráfico 1 compara, para cada um dos países e para os anos em apreço, o valor do total dos ajustamentos em termos absolutos 15, com o total do saldo de partida (saldo 19 do subsector Estado), antes dos ajustamentos, também em termos absolutos. Gráfico 1:Total de ajustamentos versus Défice orçamental da AC (PT versus ES) 60.000,0 50.000,0 Portugal Défice 40.000,0 Portugal Total ajustamentos 30.000,0 Espanha Excedente/Defice 20.000,0 Espanha Total ajustamentos 10.000,0 0,0 2006 2007 2008 2009 Constata-se que o peso dos ajustamentos no seu conjunto, no saldo orçamental é mais significativo em Espanha do que em Portugal, situando-se nos 60% em 2006, 26% em 2008 e apresentando valores entre os 55% e os 53%, em 2007 e 2009, respectivamente. Para Portugal o total dos ajustamentos representa entre 10% e 12%, entre 2006 e 2008, e 7,5% em 2009. Comparando com o estudo realizado para este país relativamente aos anos de 2004 a 2007, com base nos dados da 1ª Notificação de Abril de 2008, verifica-se que, em termos relativos, o peso dos ajustamentos se tem mantido no que respeita as contas provisórias e definitivas, mas são agora inferiores nas contas preliminares (7,5% em 2009 contra 5% em 2007) (Jesus, 2008; Jesus e Jorge, 2010)16. De uma forma geral, conclui-se, tal como no estudo anterior, que em Portugal o peso relativo dos ajustamentos vai crescendo à medida que as contas passam de preliminares para provisórias e destas para definitivas, o que indica a natureza precária dos primeiros dados notificados, dados que estes apenas incorporam alguns ajustamentos iniciais, conforme referido no estudo anterior (Jesus e Jorge, 2010). Em Espanha não se verifica esta tendência que relaciona o peso dos ajustamentos no défice/excedente orçamental com a natureza dos dados notificados, evidenciando-se antes o facto de esse peso ser sempre muito mais relevante em Espanha (na ordem dos 50% e mais) do que em Portugal (na ordem dos 10% a 12%). 20 Os Gráficos 2 e 3, que evidenciam para o período em análise a evolução dos ajuntamentos em Portugal e Espanha, respectivamente. Gráfico 2: Evolução do Total de ajustamentos (PT) O Gráfico 2 mostra que, em Portugal, o total dos ajustamentos tem um efeito positivo no saldo de partida (défice em CP), em todos os anos em análise, excepto em 2007; evidencia ainda que, em valores absolutos, os ajustamentos nas contas de 2009 (ainda preliminares) são os mais significativos. Na realidade, o défice total da AC em CN (após ajustamentos) surge inferior ao défice de partida (défice do subsector Estado em CP) em cerca de 780 milhões de euros nas contas definitivas de 2006, contra cerca de 1.225 milhões de euros nas contas preliminares de 2009. Esta situação aponta para que os ajustamentos comecem a ser efectuados numa fase mais preliminar, dado que registam agora um peso relativo de 7,5%, quando representavam apenas 5% no estudo anteriormente referido (Jesus e Jorge, 2010). Gráfico 3:Evolução do Total de ajustamentos (ES) 21 O Gráfico 3 ilustra, para o mesmo período e para Espanha, a evolução do total dos ajustamentos, evidenciando um montante de ajustamentos em 2009 (contas preliminares) que quase triplica relativamente a 2006 e quase que duplica relativamente a 2007, em ambos os casos dados de contas definitivas. De qualquer forma, salienta-se que é no ano de 2009 que ambos os países registam um montante mais elevado do total dos ajustamentos evidenciados na TABELA 2A, embora com percentagens muito distintas relativamente aos respectivos défices /excedentes orçamentais (7,5% e 53%, respectivamente, conforme já referido). Os gráficos que se seguem vão permitir uma análise detalhada dos ajustamentos, evidenciando o peso relativo de cada uma das categorias face ao défice/excedente orçamental dos Países Ibéricos. O Gráfico 4 evidencia o peso relativo de cada uma das categorias face ao défice orçamental, no que concerne a Portugal. Gráfico 4: Total de ajustamentos (detalhados) versus Défice orçamental da AC (PT) Constata-se que a categoria “operações financeiras incluídas no saldo orçamental” regista, em 2008 e 2009, um impacto positivo no défice de partida (CP), ao passo que os “ajustamentos de base contabilística” são os menos significativos, o que contrasta com a análise do estudo já mencionado, onde esta categoria surgia como a mais significativa (Jesus e Jorge, 2010). A rubrica relativa ao “saldo de outras entidades da AC”, com impacto positivo no défice das contas definitivas (2006 e 2007) e provisórias (2008), surge com impacto negativo em 2009 (contas preliminares). Importa, contudo, salientar que os dados que afectam esta rubrica em 2009 ainda não resultam das demonstrações financeiras das entidades que não fazem parte do subsector Estado, mas apenas de valores provisórios, essencialmente provenientes de dados orçamentais, pelo que é expectável que o seu montante registe um acréscimo quando os dados passarem, consecutivamente, a provisórios e a definitivos. 22 Quanto aos “outros ajustamentos”, tal como no estudo anterior, representam sempre um impacto negativo no saldo de partida, apresentado todavia valores relativamente estáveis no período agora em análise. Recorde-se que os ajustamentos que integram esta categoria estão relacionados com reclassificações de determinadas operações, reclassificações que indiciam uma melhor qualidade dos dados notificados. O Gráfico 5, também reportado a Portugal, ilustra a evolução de cada uma das categorias de ajustamentos, confirmando a análise anterior (Jesus e Jorge, 2010) de que, para o caso português, as “operações financeiras incluídas no saldo orçamental”, sempre com impacto positivo, registam valores mais elevados nos dados mais recentes, enquanto que para os “outros ajustamentos”, sempre com impacto negativo, se observa uma certa constância. Gráfico 5: Evolução de ajustamentos (PT) 2.000 1.500 1.000 10³€ 500 0 -500 2006 2007 2008 2009 -1.000 Operações financeiras incluídas no saldo orçamental Ajustamentos de base contabilísitca Saldo de outras entidades da AC Outros ajustamentos Por sua vez, o Gráfico 6 permite uma análise detalhada das várias categorias de ajustamentos relativamente aos dados da TABELA 2A notificados pelo Estado espanhol. 23 Gráfico 6: Total de ajustamentos (detalhados) versus Défice orçamental da AC (ES) 10³€ Excedente/Defice 30.000 20.000 Operações financeiras incluídas no saldo orçamental 10.000 0 -10.000 2006 2007 2008 2009 Operações não financeiras não inlcuídas no saldo orçamental -20.000 Ajustamentos de base contabilísitca - juros -30.000 Saldo de outras entidades da AC -40.000 -50.000 Outros ajustamentos -60.000 Neste caso, há que realçar o facto de as notificações de Espanha, ao contrário de Portugal, não evidenciarem o ajustamento relativo à categoria “operações financeiras incluídas no défice orçamental”. Por outro lado, tanto a categoria “ajustamentos de base contabilística”, que apenas diz respeito aos juros da dívida pública, tal como evidenciado a propósito do Quadro 6, como a categoria “saldo de outras entidades da AC” apresentam ambas valores pouco relevantes. Destaca-se, todavia, a categoria de “outros ajustamentos”, com impacto sempre negativo no saldo inicial do subsector Estado (défice/excedente em CP), responsável pela quase totalidade dos ajustamentos, já que tem um peso no saldo inicial de quase 60% em 2006, cerca de 50% em 2007 e 2008 e de 37% nas contas de 2009, mesmo sendo estes últimos dados ainda preliminares. De salientar a rubrica relativa a “operações não financeiras, não incluídas no saldo orçamental”, que não existe nos dados reportados por Portugal, que apresenta para Espanha percentagens significativas do respectivo défice em 2008 (24%, com impacto positivo) e 2009 (12%, com impacto negativo). O Gráfico 7 confirma estas ilações, evidenciando a evolução de cada uma das categorias ao longo do período em análise, para o caso espanhol. 24 Gráfico 7: Evolução de ajustamentos (ES) 6.000 4.000 2.000 0 -2.000 -4.000 -6.000 10³€ -8.000 -10.000 -12.000 -14.000 -16.000 -18.000 -20.000 -22.000 2006 2007 2008 2009 Operações não financeiras não inlcuídas no saldo orçamental Ajustamentos de base contabilísitca - juros Saldo de outras entidades da AC Outros ajustamentos Este gráfico ilustra a importância das duas categorias atrás assinaladas, para além de mostrar que as “operações não financeiras não incluídas no saldo orçamental” registam valores semelhantes em 2006 e 2007, anos em que a Espanha reportou excedentes orçamentais, registando um pico em 2008 (5.800 milhões de euros, com impacto positivo), ano em que este país passou a notificar défices em vez de excedentes orçamentais; nos dados de 2009, esta rubrica apresenta um valor significativo (6.500 milhões de euros), com impacto negativo no défice inicial. O mesmo gráfico mostra ainda que a categoria “outros ajustamentos” tem sempre impacto negativo no saldo inicial e que o seu montante assume uma relevância crescente nos anos em que Espanha apresentou défices orçamentais, representando nas contas preliminares de 2009 um valor muito significativo (mais de 20.000 milhões de euros, num défice de 56.000 milhões de euros). Conclusões No que respeita às diferenças entre a Contabilidade Pública e a Contabilidade Nacional, a revisão de literatura permitiu identificar diferenças do ponto de vista conceptual relacionadas com critério de reconhecimento (base de caixa versus base de acréscimo) e valorimetria (custo histórico versus justo valor), decorrentes do facto de os dois sistemas preconizarem objectivos distintos, consequência dos diferentes utilizadores e respectivas necessidades informativas. Para além disso, foram identificados temas específicos onde as diferenças entre os dois sistemas são mais relevantes, com destaque para: § Definição e âmbito da entidade informativa e do sector objecto de divulgação; § Preparação e divulgação de demonstrações financeiras consolidadas; § Critérios de reconhecimento e valorimetria adoptados por cada um dos 25 § sistemas no registo das operações; Relações entre as entidades pertencentes ao sector das APUS e as empresas públicas. A revisão de literatura permitiu ainda evidenciar que se reveste de grande importância o estudo das relações entre a CP e a CN no contexto da UEM, uma vez que os Estados-membros da UE, particularmente os integrantes da zona euro, são obrigados a cumprir os critérios de convergência definidos no Tratado de Maastricht. Esses critérios são avaliados com base nas Contas Nacionais dos vários os Estadosmembros, que utilizam uma metodologia contabilística comum – o SEC95, mas que têm como ponto de partida os dados do sector das APUS que são preparados segundo os princípios e regras da CP, que não só diferem dos da CN, como (ainda) divergem de país para país. Incidindo este estudo nos Países Ibéricos, ressalta-se o facto de o processo de reforma no âmbito da CP nestes dois países ter genericamente acompanhado as principais tendências seguidas nos restantes países da Europa, no sentido da mudança da base de caixa para a base de acréscimo. Este facto constitui um factor de aproximação entre os sistemas de CP e de CN, que o estudo empírico vem confirmar, na medida em que aponta para uma cada vez menor relevância dos ajustamentos de base contabilística na passagem das Contas Públicas para as Contas Nacionais. O estudo empírico, seguindo uma metodologia qualitativa, identificou os vários ajustamentos e respectivo tratamento contabilístico que em Portugal e Espanha são realizados na passagem do défice/excedente orçamental com base no saldo de partida em CP para o saldo/excedente na óptica da CN, com suporte nos Inventários de Fontes e Métodos divulgados por estes dois Estados-membros. Avaliou ainda o impacto desses ajustamentos no défice da Administração Central de ambos os países, com base nos dados reportados na TABELA 2A (passagem do saldo orçamental em CP do subsector Estado para o défice/excedente orçamental no contexto do PDE) da Notificação do PDE de Abril de 2010, compreendendo dados relativos ao período de 2006 a 2009. Esta análise evidencia que, no seu conjunto, os ajustamentos têm um peso mais significativo em Espanha do que em Portugal. Da análise detalhada por categorias de ajustamentos, conclui-se que a categoria de “outros ajustamentos” vem assumindo, em ambos os países, um peso mais cada vez mais significativo. Dado que esta categoria representa as reclassificações de determinadas operações, objecto de diferente tratamento contabilístico em CP e em CN, entende-se que deve ser dada crescente atenção a este tipo de situações que, ainda que com bastantes particularidades, têm consequências importantes na qualidade dos dados reportados. Relativamente a Portugal, destaca-se ainda o facto de os “ajustamentos de base contabilística”, que no estudo realizado em 2008 representavam o maior peso, não apresentarem nos dados mais recentes um peso significativo no conjunto dos 26 ajustamentos. Esta constatação parece mostrar que houve algum reconhecimento da necessidade de convergência entre os sois sistemas (CP e CN), com consequências práticas. Esse esforço deve ser alargado à criação de um sistema de informação contabilístico comum como ponto de partida, de forma a minimizar a necessidade de ajustamentos, que forçosamente põem em causa a credibilidade da informação, quer micro, quer macro. No que concerne a Espanha, não só não é possível fazer essa comparação, dada a inexistência de estudos prévios neste domínio, como pelo facto de o saldo de partida da CP ser reportado em base de acréscimo, se poder inferir que já existe uma maior convergência entre os dois sistemas , relativamente ao que se passa em Portugal, no que respeita aos critérios de reconhecimento, pela informação recolhida junto das fontes consultadas. Sugere-se que esta linha de investigação seja alargada a outros países da União Europeia, de preferência cobrindo um período alargado de tempo, com o propósito de tirar ilações acerca do verdadeiro impacto das diferenças contabilísticas e da necessidade ou não de dar passos no sentido da convergência entre os dois sistemas , ou, pelo menos, no sentido da criação de um framework comum aos vários países envolvidos, no sentido de harmonizar o tratamento contabilístico a adoptar na passagem dos dados das Contas Públicas para a Contas Nacionais, de forma permitir uma maior transparência nos dados reportados no contexto do PDE, tornando-os comparáveis e credíveis. 27 Referências bibliográficas Benito, B. e Brusca, I. (2004), The harmonization of government financial information systems: the role of IPSASs, Journal of Policy Analysis, 6(1): 7, April. Benito, B. e Brusca, I. 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Legislação Portuguesa Lei 8/90, de 20 de Fevereiro – Lei de Bases da Contabilidade Pública Lei 6/91, de 20 de Fevereiro – Lei do Enquadramento do Orçamento do Estado Lei 91/2001, de 20 de Agosto – Lei do Enquadramento Orçamental Decreto-lei 155/92, de 28 de Julho – Regime da Administração Financeira do Estado Decreto-lei232/97, de 3 de Setembro – Plano Oficial de Contabilidade Pública Legislação Espanhola Real Decreto Legislativo 2/2007, de 28 de Dezembro – Ley General Estabilidad Presupuestaria Ley 11/1977, de 4 de Janeiro - primeira Ley General Presupuestaria (LGP) Ley 47/2003, de 26 de Noviembre, General Presupuestaria Orden de 6 de Maio de 1994 do Ministerio da Economía Y Hacienda – Plan General de Contabilidad Pública de 1994 Orden EHA/1037/2010, de 13 de Abril do Ministerio da Economía Y Hacienda – Novo Plan General de Contabilidad Pública 29 Legislação Comunitária Regulamento (CE) nº 3605/93 do Conselho, de 22 de Novembro, relativo à aplicação do Protocolo sobre o Procedimento relativo aos Défices Excessivos, anexo ao Tratado que constitui a Comunidade Europeia [JO L 332, de 3.12.1993]. Regulamento (CE) nº 2223/96 do Conselho, de 25 de Junho, relativo ao Sistema Europeu de Contas Nacionais e Regionais na Comunidade [JO L 310, de 30.11.1996]. Regulamento (CE) nº 475/2000 do Conselho, de 28 de Fevereiro, que altera o Regulamento (CE) 3605/93 do Conselho relativo à aplicação do Protocolo sobre o Procedimento relativo aos Défices Excessivos, anexo ao Tratado que constitui a Comunidade Europeia [JO L 058, de 03.03.2000]. Regulamento (CE) nº 2516/2000 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 7 de Novembro, que altera os princípios comuns dos Sistema Europeu de Contas Nacionais e Regionais (SEC95) na Comunidade, no que se refere aos impostos e às contribuições sociais, e altera o Regulamento (CE) 2223/96 do Conselho [JO L 290, de 17.11.2000]. Regulamento (CE) nº 351/2002 da Comissão, de 25 de Fevereiro, que altera o Regulamento (CE) 2223/96 do Conselho no que respeita às referências do SEC95 [JO L 055, de 26.02.2002]. Regulamento (CE) nº 2103/2005 do Conselho, de 12 de Dezembro, que altera o Regulamento (CE) nº 3605/93 no que respeita à qualidade dos dados estatísticos no contexto do Procedimento relativo aos Défices Excessivos [JO L 337, de 22.12.2005]. 1 New Public Management (NPM) é um movimento com início nos primeiros anos da década de oitenta que visava introduzir na Gestão da Administração Pública princípios e ferramentas aplicáveis à gestão do sector empresarial privado. Este movimento abrange um vasto conjunto de tópicos de gestão e, particularmente no que respeita aos sistemas contabilísticos e financeiros, este movimento induz à introdução da base de acréscimo nas entidades do Sector Público, com o propósito da CP passar a fornecer informação útil para a tomada de decisões e para a prestação de responsabilidade (accountability) (Olsen et al., 2001). 2 Regulamento do Conselho (CE) nº448/98; Regulamento da Comissão (CE) nº 1500/2000; Regulamento do Parlamento e do Conselho nº 2516/2000; Regulamento da Comissão (CE) nº 995/2001;Regulamento do Parlamento e do Conselho nº 2258/2002; Regulamento da Comissão (CE) nº 113/2002. 3 Organismo emissor de normas contabilísticas de âmbito internacional, aplicáveis ao sector público, denominadas IPSASs (International Public Sector Accounting Standards). Sucedeu ao Comité para o Sector Público da IFAC (International Federation of Accountants). 4 Publicado mediante Ordem do Ministerio de Economía y Hacienda, de 6 de Maio de 1994 (PGCP´94), aplicável a partir de Janeiro de 1995. 5 Base de caixa modifica significa, no PGCP em Espanha, que as despesas e receitas são reconhecidas quando ocorrem as decisões administrativas subjacentes e não no momento do pagamento ou recebimento (base de caixa), nem quando o facto gerador ocorre (base de acréscimo) (Montesinos e Vela, 2000). 6 Será explicada adiante a diferenças entre contas financeiras e contas não financeiras, na óptica da CN. 7 Estas denominações correspondem à tradução feita pelo INE para as designações em língua inglesa, da natureza dos dados, que são: Final (Definitivos); Half-finalized (Provisórios); Estimated (Preliminares) e Planned (Estimados), de acordo com o Regulamento (CE) nº 2103/2005. 8 Despesas primárias correspondem às despesas correntes e de capital, excepto juros da dívida pública. 9 Existem ainda ajustamentos efectuados pela Direcção Geral do Tesouro e Política Financeira de Espanha relativamente a eventuais diferenças de mensuração no que respeita a operações específicas, tais como troca de obrigações, operações de recompra ou reescalonamento de dívidas e alteração de taxas de juro e taxa de câmbio, em consonância com os mercados internacionais (EUROSTAT, 2009). 10 No caso específico das injecções de capital, está em causa a versão actualizada da Parte II, Capítulo 3 do Manual do Défice e da Dívida (MDD) do SEC95 (EUROSTAT, 2003). 11 Manual do Défice e da Dívida (MDD do SEC95), Parte II, Capítulo 3, ponto 2 (EUROSTAT, 2002). 12 Apenas estão evidenciados ajustamentos de base contabilística, relativos aos juros . 30 13 Nesta categoria incluem -se rubricas referidas no Quadro 5, como as injecções de capital, o equipamento militar, as operações de leasing financeiro, bem como os ajustamentos específicos do caso espanhol mencionados na secção 5, como sejam os ganhos de capital do Banco Central, os seguros de crédito à exportação e os adiantamentos às Comunidades Autónomas e às Corporaciones Locales . 14 Não são considerados os dados relativos ao ano de 2010, uma vez que se trata de dados meramente estimados. 15 Portugal reporta sempre défices orçamentais (CN) em todos os anos (na ordem dos 5.000 milhões de euros de 2006 a 2008 e um pouco mais de 14.000 de euros em 2009) (EUROSTAT, 2010ª), ao passo que Espanha apresentava excedentes em 2006 e 2007 (cerca de 17.500 milhões de euros e 26.000 milhões de euros, respectivamente), passando a registar défices nos anos seguintes (24.000 milhões de euros e 56.000 milhões de euros, respectivamente) (EUROSTAT, 2010b). 16 Relativamente a Espanha não é conhecido qualquer estudo neste domínio, pelo que não é possível efectuar uma análise comparativa. 31