UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE CENTRO DE ESTUDOS GERAIS INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS Pós-Graduação em Ciência Ambiental Gestão da contaminação biológica por espécies vegetais exóticas no Parque Nacional da Serra dos Órgãos, Rio de Janeiro, Brasil. MICHELLE DE OLIVEIRA RIBEIRO Niterói 2009 Livros Grátis http://www.livrosgratis.com.br Milhares de livros grátis para download. ii MICHELLE DE OLIVEIRA RIBEIRO GESTÃO DA CONTAMINAÇÃO BIOLÓGICA POR ESPÉCIES VEGETAIS EXÓTICAS NO PARQUE NACIONAL DA SERRA DOS ÓRGÃOS, RIO DE JANEIRO, BRASIL. Dissertação apresentada ao curso de PósGraduação em Ciência Ambiental da Universidade Federal Fluminense, como requisito parcial para obtenção do Grau de Mestre. Área de Concentração: Gestão Ambiental. Sob a orientação do Prof. Dr. Rodrigo Medeiros Niterói 2009 iii R484 Ribeiro, Michelle de Oliveira Gestão da contaminação biológica por espécies vegetais exóticas no Parque Nacional da Serra dos órgãos, Rio de Janeiro, Brasil / Michelle de Oliveira Ribeiro . – Niterói : [s.n.], 2009. 134 f. Dissertação (Mestrado em Ciência Ambiental) – Universidade Federal Fluminense, 2009. 1.Gestão ambiental. 2.Parque Nacional da Serra dos Órgãos (RJ). 3.Espécies Exóticas Invasoras. I.Título. CDD 574.52642 iv MICHELLE DE OLIVEIRA RIBEIRO GESTÃO DA CONTAMINAÇÃO BIOLÓGICA POR ESPÉCIES VEGETAIS EXÓTICAS NO PARQUE NACIONAL DA SERRA DOS ÓRGÃOS, RIO DE JANEIRO, BRASIL. Dissertação apresentada ao curso de PósGraduação em Ciência Ambiental da Universidade Federal Fluminense, como requisito parcial para obtenção do Grau de Mestre. Área de Concentração: Gestão Ambiental. Aprovada em 03 de março de 2009. BANCA EXAMINADORA ________________________________________________________________ Prof. Dr. Rodrigo Medeiros (orientador) ________________________________________________________________ Prof. Dr. Claudio Belmonte de Athayde Bohrer _______________________________________________________ Prof. Dr. André Felippe Nunes de Freitas Niterói 2009 v A todos que, de alguma forma, tornaram este sonho realidade. Dedico vi AGRADECIMENTOS Li uma vez que misteriosas são as razões que nos levam ao caminho árduo e tortuoso da busca do conhecimento. Mais insondáveis ainda são as razões que levam pessoas ao nosso redor a nos apoiarem e estimularem nessa escolha. Estas pessoas merecem toda a minha gratidão eternamente. Por isso gostaria de agradecer a todos que me ajudaram a manter sempre aceso o desejo da descoberta, que facilitaram e conspiraram para que essa dissertação fosse realizada e que nesse intento tornaram este caminho mais prazeroso. Agradeço... ... a Deus, por ter me dado forças e sabedoria para trilhar a estrada da vida. Por ter me sustentado e me guiado até aqui, sempre com sua mão bondosa a me abençoar. Agradeço por fazer a cada dia um milagre em mim. ... aos meus pais, Miguel Archanjo Ribeiro e Joana Darc de Oliveira, por serem realmente pais pra mim. Por me ensinarem tudo o que sei, conduzindo meu desenvolvimento da melhor maneira possível, pelo zelo com que cuidam de mim, pela paciência, pelo incentivo, pelo amor. Por fazerem de mim aquilo que sou hoje. ... ao meu querido irmão Alexandre de Oliveira, minha cunhadinha Aline de Oliveira e a minha sobrinha linda Júlia pelo amor dedicado a mim, pelo companheirismo, por me apoiarem e estarem sempre prontos a me ajudar no que for preciso. Enfim, agradeço a minha família por serem o meu alicerce, meu ponto de apoio e de fuga quando preciso. Sou parte da minha família, portanto, este trabalho também é dela. ... ao amor da minha vida, Alex Machado Pavão, por ter a coragem de vir me encontrar e lutar por nós desde o início. Por me amar em todos os momentos, por acreditar em mim, me apoiar, incentivar e estar ao meu lado sempre, me erguendo em cada queda. Seu companheirismo foi importante em todas as etapas desta jornada. Agradeço a compreensão e apoio durante todo o trabalho de campo e por esperar pelo meu regresso. A tranqüilidade e paciência de todas as vezes que recorria a ele quando entrava em desespero por qualquer razão e pela ajuda incondicional. Seu amor foi fundamental por colocar felicidade em minha vida e sonhos em meus pensamentos! Te amo!!! ... a Universidade Federal Fluminense, por me aceitar e me dar as ferramentas e oportunidades para que este dia chegasse. Por permitir que eu estudasse novas coisas, aprendendo a cada dia um pouquinho mais e através do meu projeto poder descobrir o quão fascinantes são as florestas. vii ... ao meu orientador, Rodrigo Medeiros, por ter acreditado neste trabalho e aceitado o desafio de concretizá-lo, por toda a ajuda e orientação e pelas oportunidades de crescimento e desenvolvimento. ... aos professores que não somente me ensinaram disciplinas, mas que também me deram lições de vida e me ensinaram como é o mundo real. ... em especial aos professores André Felippe Nunes de Freitas e Roberto Tozani pela valiosa ajuda em pontos vitais para a concretização deste trabalho. ... a todos da turma PGCA 2007, grandes amigos feitos sob medida!!! Pessoas tão incríveis e interessantes que me fazem sentir que fazer Ciência Ambiental é poder participar de um mundo de pessoas fantásticas que lutam por um mundo melhor!!! Obrigada pela divertida convivência dentro e fora da sala de aula, pelo aprendizado que tive com vocês, por todos os momentos, pelas risadas, pela grande ajuda e apoio que sempre me deram e por acreditarem em mim quando parecia que ninguém acreditava... Vocês são anjos de verdade!!! ... aos amigos do LAGEAM e do LEFBV pela ajuda nos trabalhos de campo e de escritório, pelos momentos de trabalho duro e de diversão, pelo aprendizado. Valeu! ... a Flavio Guerra Barroso, Carolina Porto Ricardo da Silva e Thiago de Azevedo Amorim, grande equipe de campo!!! Valeu o sofrimento na úmida e fria Serra dos Órgãos!!! Sem vocês esse trabalho não seria uma realidade, Obrigada! ...a todos os meus amigos, por fazerem parte da minha vida, levando um pouco de mim com vocês e deixando um pouco de vocês comigo! ... ao Parque Nacional da Serra dos Órgãos e ao SISBIO, por terem me recebido de braços abertos e aprovado prontamente o projeto e me dado permissão para a realização da pesquisa. ... a Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, especialmente aos Departamentos de Ciências Ambientais (Instituto de Florestas) e Fitotecnia (Instituto de Agronomia) por ceder seus laboratórios para uso durante o projeto. ... a CAPES, pela bolsa de estudos que permitiu a realização desta dissertação. ... a Fundação O Boticário de Proteção à Natureza, pelo apoio dado ao projeto, que continuará... A todos meu muito obrigada!!! viii “O futuro dependerá daquilo que fazemos no presente” Mahatma Gandhi ix SUMÁRIO LISTA DE FIGURAS.............................................................................................................. xi LISTA DE TABELAS ........................................................................................................... xiv LISTA DE QUADROS........................................................................................................... xv LISTA DE SIGLAS ............................................................................................................... xvi RESUMO............................................................................................................................... xvii ABSTRACT ......................................................................................................................... xviii 1. INTRODUÇÃO GERAL ..................................................................................................... 1 2. REFERENCIAL TEÓRICO ............................................................................................... 4 2.1. A contaminação biológica por espécies exóticas ................................................................ 5 2.2. A contaminação biológica através dos tempos .................................................................. 10 2.3. Gestão e manejo das espécies exóticas vegetais................................................................ 14 2.4. A questão da contaminação biológica no âmbito da conservação da biodiversidade ....... 17 3. OBJETIVOS ....................................................................................................................... 28 4. ÁREA DE ESTUDOS: O PARQUE NACIONAL DA SERRA DOS ÓRGÃOS.......... 29 CAPÍTULO I – IDENTIFICAÇÃO E DIAGNÓSTICO DAS ESPÉCIES EXÓTICAS . 43 1. Introdução ............................................................................................................................. 44 2. Metodologia .......................................................................................................................... 46 2.1. Ocorrência de espécies exóticas .................................................................................. 46 2.2. Estrutura da vegetação e distribuição das espécies exóticas ....................................... 47 2.3. Parâmetros microclimáticos ........................................................................................ 51 3. Resultados e discussão ......................................................................................................... 52 3.1. Ocorrência de espécies exóticas .................................................................................. 52 3.2. Estrutura da vegetação ................................................................................................. 56 3.2.1. Estrato arbóreo ................................................................................................. 56 3.2.2. Estrato herbáceo ............................................................................................... 57 3.3. Distribuição das espécies exóticas no ambiente e os fatores que a influenciam ......... 59 3.4. Espécies exóticas invasoras que causam problemas ao ecossistema nativo ................ 66 CAPÍTULO II – GESTÃO E MANEJO DE ESPÉCIES EXÓTICAS NO PARQUE NACIONAL DA SERRA DOS ÓRGÃOS ........................................................................... 69 1. Introdução ............................................................................................................................. 70 2. Metodologia .......................................................................................................................... 71 3. Resultados e discussão ......................................................................................................... 75 3.1. Impatiens walleriana ................................................................................................... 75 3.2. Hedychium coronarium ............................................................................................... 81 3.3. Demais espécies exóticas............................................................................................. 92 x 5. CONCLUSÕES GERAIS .................................................................................................. 94 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS E RECOMENDAÇÕES .................................................. 96 LITERATURA CITADA ..................................................................................................... 100 ANEXO 1 ............................................................................................................................... 112 ANEXO 2 ............................................................................................................................... 114 xi LISTA DE FIGURAS 4. ÁREA DE ESTUDOS: O PARQUE NACIONAL DA SERRA DOS ÓRGÃOS Figura 1. Paisagem do Parque Nacional da Serra dos Órgãos – vista do Dedo de Deus. Foto: autor desconhecido .................................................................................... 29 Figura 2. Localização do Parque Nacional da Serra dos Órgãos em relação ao Rio de Janeiro e ao Brasil. (adaptado de IBAMA, 2009) ............................................... 32 Figura 3. Novos Limites do Parque Nacional da Serra dos Órgãos. Fonte: Adaptado de PARNASO .......................................................................................................... 34 Figura 4. Distribuição mensal da temperatura no Parque Nacional da Serra dos Órgãos .. 35 Figura 5. Antiga estação meteorológica que funcionou na sede Teresópolis do Parque Nacional da Serra dos Órgãos. Foto: Acervo PARNASO .................................. 35 Figura 6. Distribuição mensal das chuvas no Parque Nacional da Serra dos Órgãos ........ 36 Figura 7. Zoneamento do Parque Nacional da Serra dos Órgãos. Fonte: Adaptado de PARNASO .......................................................................................................... 41 Figura 8. Estrada da Barragem, Parque Nacional da Serra dos Órgãos, RJ. Foto: Michelle Ribeiro ................................................................................................................. 42 CAPÍTULO I – IDENTIFICAÇÃO E DIAGNÓSTICO DAS ESPÉCIES EXÓTICAS Figura 1. Área de estudos: trecho da zona de uso intensivo do Parque Nacional da Serra dos Órgãos. Estrada da Barragem, Sede Teresópolis. Fonte: adaptado de Google.. ............................................................................................................... 48 Figura 2. Distribuição das parcelas de estudo no Parque Nacional da Serra dos Órgãos. Fonte: adaptado de SIG-PARNASO ................................................................... 49 Figura 3. Usos das espécies vegetais exóticas encontradas no Parque Nacional da Serra dos Órgãos, RJ..................................................................................................... 56 Figura 4. Temperaturas médias nas classes de distância da vegetação em relação à estrada no mês de setembro de 2008 ............................................................................... 60 Figura 5. Temperaturas médias nas classes de distância da vegetação em relação à estrada no mês de outubro de 2008 .................................................................................. 61 Figura 6. Umidade Relativa (UR) nas classes de distância da vegetação em relação à estrada no mês de setembro de 2008 ................................................................... 62 Figura 7. Umidade Relativa (UR) nas classes de distância da vegetação em relação à estrada no mês de outubro de 2008 ..................................................................... 62 Figura 8. Taxas de sombreamento nas diferentes classes de distância da vegetação em relação à estrada................................................................................................... 63 Figura 9. Área no PARNASO com ocorrência da espécie Impatiens walleriana (beijinho). Foto: Michelle Ribeiro ........................................................................................ 67 xii Figura 10. Área no PARNASO com ocorrência da espécie Hedychium coronarium (líriodo-brejo). Foto: Michelle Ribeiro........................................................................ 67 CAPÍTULO II – GESTÃO E MANEJO DAS EXÓTICAS NO PARQUE NACIONAL DA SERRA DOS ÓRGÃOS Figura 1. Localização das áreas em que foram instaladas as parcelas dos experimentos de manejo de H. coronarium e I. walleriana. Fonte: adaptado de SIGPARNASO..... ..................................................................................................... 72 Figura 2. Áreas infestadas pela espécie Impatiens walleriana. (a) área com alta infestação (≥ 67%) e (b) área com baixa infestação (≤ 33%). Fotos: Michelle Ribeiro ....... 73 Figura 3. Áreas infestadas pela espécie Hedychium coronarium. (a) área com alta infestação (≥ 67%) e (b) área com baixa infestação (≤ 33%). Fotos: Michelle Ribeiro ................................................................................................................. 73 Figura 4. Resposta de I. walleriana ao manejo por arranquio em áreas com baixas densidades populacionais, no Parque Nacional da Serra dos Órgãos, RJ ........... 75 Figura 5. Resposta de I. walleriana ao manejo por arranquio em áreas com altas densidades populacionais, no Parque Nacional da Serra dos Órgãos, RJ ........... 75 Figura 6. Taxas de regeneração da espécie I. walleriana aos 60 dias após intervenção de manejo, em situação de baixa densidade populacional ....................................... 77 Figura 7. Taxas de regeneração da espécie I. walleriana aos 60 dias após intervenção de manejo, em situação de alta densidade populacional .......................................... 77 Figura 8. Produção de matéria seca nas parcelas de arranquio da espécie I. walleriana ... 78 Figura 9. Área com baixa densidade da espécie Impatiens walleriana em que foi testado o arranquio das plantas. (a) antes da aplicação do tratamento; (b) logo após a intervenção de manejo e (c) 60 dias após a intervenção. Fotos: Michelle Ribeiro... .............................................................................................................. 79 Figura 10. Área com alta densidade da espécie Impatiens walleriana em que foi testado o arranquio das plantas. (a) antes da aplicação do tratamento; (b) logo após a intervenção e (c) 60 dias após a intervenção. Fotos: Michelle Ribeiro ............ 80 Figura 11. Resposta de H. coronarium em áreas com baixas densidades populacionais às técnicas de manejo, no Parque Nacional da Serra dos Órgãos, RJ ................... 81 Figura 12. Resposta de H. coronarium em áreas com altas densidades populacionais às técnicas de manejo, no Parque Nacional da Serra dos Órgãos, RJ ................... 81 Figura 13. Taxas de regeneração da espécie H. coronarium aos 120 dias após intervenção de manejo, em situação de baixa densidade populacional................................ 83 Figura 14. Taxas de regeneração da espécie H. coronarium aos 120 dias após intervenção de manejo, em situação de alta densidade populacional .................................. 84 Figura 15. Produção de matéria seca nos tratamentos para manejo da espécie H. coronarium em área de baixa densidade populacional ..................................... 86 Figura 16. Produção de matéria seca nos tratamentos para manejo da espécie H. coronarium em área de alta densidade populacional........................................ 86 xiii Figura 17. Detalhe de um pedaço de rizoma de H. coronarium. Foto: Michelle Ribeiro .. 87 Figura 18. Comparação entre os valores de massa fresca e massa seca encontrados nos diferentes tratamentos testados para a espécie Hedychium coronarium em áreas com baixas densidades populacionais .............................................................. 88 Figura 19. Comparação entre os valores de massa fresca e massa seca encontrados nos diferentes tratamentos testados para a espécie Hedychium coronarium em áreas com altas densidades populacionais ................................................................. 88 Figura 20. Área com baixa densidade da espécie Hedychium coronarium em que foi testado o arranquio das plantas. (a) antes da aplicação do tratamento; (b) logo após a intervenção e (c) 120 dias após a intervenção. Fotos: Michelle Ribeiro.... .......................................................................................................... 90 Figura 21. Área com alta densidade da espécie Hedychium coronarium em que foi testado o arranquio das plantas. (a) antes da aplicação do tratamento; (b) logo após a intervenção e (c) 120 dias após a intervenção. Fotos: Michelle Ribeiro .......... 90 Figura 22. Área com baixa densidade da espécie Hedychium coronarium em que foi testado o corte raso das plantas. (a) antes da aplicação do tratamento; (b) logo após a intervenção e (c) 120 dias após a intervenção. Fotos: Michelle Ribeiro.... .......................................................................................................... 91 Figura 23. Área com alta densidade da espécie Hedychium coronarium em que foi testado o corte raso das plantas. (a) antes da aplicação do tratamento; (b) logo após a intervenção e (c) 120 dias após a intervenção. Fotos: Michelle Ribeiro .......... 91 xiv LISTA DE TABELAS CAPÍTULO I – IDENTIFICAÇÃO E DIAGNÓSTICO DAS EXÓTICAS Tabela 1. Temperaturas médias nas classes de distância borda-interior de vegetação no mês de outubro de 2008 .................................................................................... 61 Tabela 2. Valores médios de Umidade Relativa (UR) nas classes de distância bordainterior de vegetação no mês de outubro de 2008 ............................................... 62 Tabela 3. Taxas de sombreamento nas classes de distância borda-interior de vegetação analisadas ............................................................................................................ 63 CAPÍTULO II – GESTÃO E MANEJO DAS EXÓTICAS NO PARQUE NACIONAL DA SERRA DOS ÓRGÃOS Tabela 1. Comportamento quantitativo da população de I. walleriana após 60 dias da aplicação dos métodos de controle ...................................................................... 76 Tabela 2. Comportamento quantitativo da população de H. coronarium após 120 dias da aplicação dos métodos de controle ...................................................................... 82 xv LISTA DE QUADROS CAPÍTULO I – IDENTIFICAÇÃO E DIAGNÓSTICO DAS EXÓTICAS Quadro 1. Espécies exóticas vegetais encontradas no Parque Nacional da Serra dos Órgãos............................................................................................................... 53 xvi LISTA DE SIGLAS APA – Área de Proteção Ambiental CAP – Circunferência à Altura do Peito CDB – Convenção sobre Diversidade Biológica CONABIO – Comissão Nacional de Biodiversidade COP – Conference of the Parties EMBRAPA – Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária ESALQ – Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz EUA – Estados Unidos da América FAO – Food and Agriculture Organization FIOCRUZ – Fundação Oswaldo Cruz FNMA – Fundo Nacional do Meio Ambiente FUNBIO – Fundo Brasileiro para a Biodiversidade GISD – Global Invasive Species Database GISIN – Global Invasive Species Information Network GISP – Global Invasive Species Programme I3N – IABIN Invasives Information Network IABIN – Inter-American Biodiversity Information Network IBAMA – Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística ICSU – International Council for Science Id – Índice de Dispersão de Morisita ISSG – Invasive Species Specialist Group MMA – Ministério do Meio Ambiente NBII – National Biological Information Infrastructure ONU – Organização das Nações Unidas PARNASO – Parque Nacional da Serra dos Órgãos PIB – Produto Interno Bruto PROBIO – Projeto de Conservação e Utilização Sustentável da Diversidade Biológica Brasileira PRONABIO – Programa Nacional da Diversidade Biológica SBSTTA – Subsidiary Body on Scientific, Technical and Technological Advice SCOPE – Scientific Committee on the Problems of the Environment SNUC – Sistema Nacional de Unidades de Conservação SSC – Species Survival Commission UC – Unidade de Conservação UFV – Universidade Federal de Viçosa UICN – União Internacional para a Conservação da Natureza UNEP – United Nations Environment Programme USP – Universidade de São Paulo xvii RESUMO A contaminação biológica por espécies exóticas invasoras é considerada uma das maiores ameaças à biodiversidade mundial. Entretanto, no Brasil as informações sobre este assunto são ainda escassas, especialmente sobre sua distribuição e controle em áreas protegidas. O presente estudo foi realizado objetivando compreender alguns aspectos do processo de invasão biológica e determinar ações de controle apropriadas para algumas espécies exóticas. O trabalho foi executado na zona de uso intensivo do Parque Nacional da Serra dos Órgãos, na Sede Teresópolis, situado no Domínio Tropical Atlântico. Para determinar a ocorrência de espécies vegetais exóticas nas áreas de estudo foram realizados caminhamentos pela Estrada da Barragem. Posteriormente foram aleatoriamente alocadas 30 parcelas de 10x10m ao longo da mesma estrada, situadas a diferentes distâncias no gradiente borda-interior de mata a fim de estudar a estrutura populacional das espécies exóticas e sua distribuição na floresta. Nestas parcelas foram mensuradas variáveis fitossociológicas para o estrato arbustivo-arbóreo como espécie, CAP e altura total, sendo incluídos na amostragem os indivíduos com CAP igual ou superior a 8cm. Para realizar as medidas no estrato herbáceo, foi montada, em cada parcela, uma sub-parcela de 5x5m, em que foram virtualmente plotados 100 pontos eqüidistantes. Em cada ponto uma vara foi fixada verticalmente em relação ao solo e foram anotadas as espécies que a tocaram e o número de toques de cada espécie. Visando entender os padrões de distribuição espacial encontrados para as espécies exóticas foram mensuradas variáveis relativas ao microclima nas parcelas de estudo (sombreamento, temperatura e umidade relativa do ar). Foram encontradas 24 espécies exóticas pertencentes a 20 famílias diferentes, sendo as espécies Hedychium coronarium e Impatiens walleriana as que ocorreram com maior freqüência. Nas parcelas para os estudos de estrutura populacional, só foram encontradas as espécies H. coronarium e I. walleriana. Estas espécies herbáceas se concentram nas bordas florestais e exercem dominância sobre as espécies nativas nas áreas em que ocorrem, excluindo-as localmente. Foi observado que H. coronarium e I. walleriana ocorrem em áreas com temperatura mais elevada, menor umidade relativa do ar e menor grau de sombreamento. A partir dos resultados obtidos foi instalado um experimento para testar o adequado controle para H. coronarium e I. walleriana. Foram alocadas, de modo aleatório, parcelas em áreas com altas e baixas taxas de infestação das espécies citadas. Para H. coronarium foram testados o arranquio e o corte raso das plantas e para I. walleriana foi testado apenas o arranquio. O arranquio forneceu bons resultados para ambas as espécies, sendo considerado adequado para o controle de suas populações. Contudo, devem ser tomados cuidados para que o arranquio das plantas não cause danos ao ecossistema. Recomenda-se, por esta razão, que o arranquio seja associado com o plantio de espécies nativas de rápido crescimento, bem como sejam realizados repasses periódicos e o contínuo monitoramento das áreas manejadas. Para as demais espécies exóticas encontradas em pequenas populações recomenda-se a remoção por corte ou arranquio a fim de atender à legislação vigente e como medida preventiva para que estas não cheguem ao status de invasoras. Palavras-chave: Espécies exóticas invasoras, Contaminação biológica, Gestão, Parque Nacional da Serra dos Órgãos, Floresta Atlântica xviii ABSTRACT Introduction and spread of exotic invasive species are considered one of the greatest threats to biodiversity worldwide. In Brazil, however, the information on this subject is still scarce, especially about its distribution and control in protected areas. Aiming to understand some aspects of the invasion process and to determine appropriate control actions for some alien species, a study was carried out. The work took place in the intensive use zone of the Serra dos Órgãos National Park, that belongs to Atlantic Rain Forest domain. To determine which species occur in the studied area, we made walks by Barragem road. After that, 30 parcels of 10x10m were randomly allocated along the road, at different distances of the road to study population structure of the alien species and its distribution through the forest. In these parcels were measured fitossociological variables like specie, DBH and total height to trees and shrubs with 8cm of DBH, at least. To measure herbs it was allocated a sub-parcel of 5x5m inside each 10x10m parcel. In these sub-parcels 100 points were virtually allocated. In each point a cane was fixed on the ground and was noted down the species that touched the cane and the number of touches it. Were found 24 different alien species, but Hedychium coronarium and Impatiens walleriana occurred more frequently. On population structure parcels, only H. coronarium and I. walleriana were found. These herbaceous species gathered in forest edges and overpower native species, excluding these species. Aiming to understand the spatial distribution patterns found for the alien species, we measured microclimatic variables like temperature, shade percentage and relative humidity. We observed that H. coronarium and I. walleriana occur in hotter, drier and less shading areas. From these results an experiment was carried out aiming to promote the appropriate control of H. coronarium and I. walleriana. Parcels of 2x5m were randomly allocated in areas with high and low density of these species. To H. coronarium were tested the effect of total manually uproot and of the cut of plants. To I. walleriana only manually uproot was tested. Uprooting plants was efficient in controlling populations of H. coronarium and I. walleriana and its application is appropriate for the management of these alien species in the studied areas. However, the management by uprooting plants must to be careful. It’s recommended uprooting plants in association with plantation of rapid grow native species. Periodic surveys and continuous monitoring of the treated areas are important either. It’s also recommended the removal of the other alien species found according to the laws and to prevent that these species became invaders. Keywords: invasive alien species, biologic contamination, management, Serra dos Órgãos National Park, Atlantic Rain forest. 1 1. INTRODUÇÃO GERAL A diversidade biológica é resultado da evolução de espécies durante bilhões de anos e pode ser entendida como “a variabilidade de organismos vivos de todas as origens, compreendendo, dentre outros, os ecossistemas aquáticos e os complexos ecológicos de que fazem parte; compreendendo ainda a diversidade dentro de espécies, entre espécies e de ecossistemas” (CDB, 2000:11). A biodiversidade é a base da sustentabilidade dos ecossistemas e fonte dos serviços e recursos naturais utilizados pelos seres humanos, sendo, portanto, necessária para a sobrevivência da vida na Terra, inclusive da espécie humana. Além da utilidade, as espécies têm seu valor de existência não relacionado às necessidades humanas. Existem razões morais, éticas, culturais, estéticas e científicas para a conservação da biodiversidade (CMMAD, 1991). Barreiras naturais impostas às espécies, sejam geográficas ou climáticas, impedem sua dispersão, limitando suas áreas de ocorrência, além de terem provocado o isolamento de comunidades durante as eras geológicas. Tal isolamento geográfico significa que os processos evolutivos têm ocorrido de modo diverso nestas comunidades, formando espécies diferentes que estabeleceram relações específicas entre si (PRIMACK e RODRIGUES, 2002). Como resultado, temos hoje ecossistemas em que as espécies co-evoluíram, estabeleceram interações entre si, adaptaram-se a coexistência e ao ambiente em que vivem, formando comunidades completamente distintas (PRIMACK e RODRIGUES, op cit). Entretanto, ao longo de centenas de anos, os obstáculos à dispersão de espécies têm sido quebrados pela ação humana (CARROLL, 2007; CARVALHO e JACOBSON, 2005; DAEHLER, 2003; D’ANTONIO e VITOUSEK, 1992). Animais, vegetais e microrganismos são levados através de oceanos e montanhas e introduzidos em ecossistemas que jamais alcançariam sozinhos (CARLTON, 1996; D’ANTONIO e VITOUSEK, 1992). Esta “dança” de espécies manipulada pela vontade humana vem causando alterações nos padrões de evolução estabelecidos por milhares de anos e provocando efeitos danosos à diversidade biológica (CORDEIRO e RODRIGUES, 2005; KOLAR e LODGE, 2001). Estes efeitos eram até então desconhecidos em virtude do sucesso que estas espécies obtiveram ao colonizar os novos ambientes em que foram lançadas. Deve-se fazer um parêntese para dizer que quando uma espécie se encontra fora da sua área de ocorrência natural, colonizando um novo ambiente, diz-se que ela é exótica. E a este 2 processo em que espécies exóticas invadem novos ambientes e se naturalizam, causando mudanças e prejuízos nestes, chama-se contaminação biológica (IBAMA, 2006). Não se pode perder de vista que a espécie humana está inserida nos processos ecossistêmicos e depende do meio ambiente em que vive. Por isso, danos à diversidade biológica trazem também prejuízos à espécie humana. É importante notar que os impactos da contaminação biológica não se dão apenas sobre os ecossistemas naturais e sua biodiversidade, mas afetam também a economia e saúde humana. Os prejuízos econômicos causados pela contaminação biológica à agricultura brasileira foram estimados em US$ 42,6 bilhões e os custos ambientais associados às invasões biológicas são da ordem de US$ 6,7 bilhões, segundo estudos recentes (THIENGO et al., 2007). Os custos relacionados à saúde humana são mais difíceis de estimar economicamente, mas constituem impactos que não podem ser deixados de lado quando se trata da problemática das espécies exóticas invasoras. Por estas razões, nos últimos anos a comunidade científica tem despertado para o problema das espécies exóticas invasoras, que constituem hoje a segunda maior ameaça à diversidade biológica mundial, perdendo apenas para a destruição de habitats causada pela exploração humana (ELLISON e BARRETO, 2004; JENKINS e MOONEY, 2006; KOHLI et al., 2006; ZILLER, 2000). Diante da importância da diversidade biológica e da evidente dependência humana dos recursos por ela gerados, as atividades antrópicas que vêm causando prejuízos a esta devem ser revistas. Gerir os recursos naturais de maneira sustentável é uma necessidade que começou a ganhar contornos nítidos desde a Conferência de Estocolmo, em 1972, e consolidou o conceito de desenvolvimento sustentável em 1987 firmado na obra “Nosso Futuro Comum” (Relatório Brundtland). A Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB), assinada em 1992 durante a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (Rio-92), tem o modelo de desenvolvimento sustentável como seu objetivo, expresso em seu artigo I1. O artigo 225 da Constituição Federal brasileira de 1988 corrobora esta necessidade, colocando inclusive o meio ambiente equilibrado como um direito de todos. Conservar os ecossistemas e sua biodiversidade é, portanto, uma questão de responsabilidade com as futuras gerações humanas e com um ambiente que têm valor em si 1 Os objetivos desta Convenção, a serem cumpridos de acordo com as disposições pertinentes, são a conservação da diversidade biológica, a utilização sustentável de seus componentes e a repartição justa e eqüitativa dos benefícios derivados da utilização dos recursos genéticos, mediante, inclusive, o acesso adequado aos recursos genéticos e a transferência adequada de tecnologias pertinentes, levando em conta todos os direitos sobre tais recursos e tecnologias, e mediante financiamento adequado (CDB,2000:10). 3 próprio. Pode-se dizer ainda que a conservação da diversidade biológica é uma questão de sobrevivência. Neste contexto, a contaminação biológica deve ser tratada com seriedade em virtude dos diversos impactos que causa. Impactos estes que podem ser sinergéticos, ou seja, combinados a impactos causados por outras fontes podem ter seus efeitos multiplicados. Ações de gestão da contaminação causada pelas espécies exóticas invasoras se tornam fundamentais, especialmente quando se trata do Brasil, que contêm uma das maiores biodiversidades do mundo. Entretanto, para que estas ações sejam bem sucedidas, devem ser baseadas em estudos até então escassos ou até inexistentes para alguns ecossistemas ou espécies. No que tange a Mata Atlântica, o bioma com maior diversidade biológica no Brasil (COSTA et al., 2000), complexo e já tão transformado, estudos e ações eficazes de gestão das bioinvasões são necessários, a fim de conservar este valioso patrimônio da humanidade. 4 2. REFERENCIAL TEÓRICO Os ambientes mais ricos em diversidade biológica no mundo são as Florestas Tropicais. Em quase todos os grupos de organismos a biodiversidade tende a aumentar em direção aos trópicos, atingindo seu auge nas Florestas Tropicais Úmidas próximas ao Equador (ODUM, 1988; PRIMACK e RODRIGUES, 2002). Neste contexto, a Floresta Atlântica merece destaque por ser o segundo conjunto de florestas especialmente expressivas na América do Sul. Este bioma, além de apresentar elevada biodiversidade, possui muitas espécies endêmicas, raras e ameaçadas de extinção (RAMBALDI et al., 2003), sendo considerado um dos 34 hotspots mundiais (zonas de alta diversidade e concentração de espécies endêmicas e que sofrem elevada pressão antrópica, sendo importantes em termos conservacionistas) (CHIARELLO, 1999; CRONEMBERGER e VIVEIROS DE CASTRO, 2007; MITTERMEIER et al., 2005). Apesar de sua importância, as atividades humanas vêm transformando o Domínio Tropical Atlântico diretamente ao longo dos tempos, devastando as áreas de mata para atender às necessidades de desenvolvimento econômico da população e, como conseqüência disto, hoje este ecossistema é um dos mais ameaçados do mundo (MORELLATO e HADDAD, 2000; OLIVEIRA-FILHO e FONTES, 2000; SAYER e WHITMORE, 1991). Este processo se deu em razão da grande ocupação das áreas de Floresta Atlântica pelos colonizadores europeus e, atualmente, estas áreas coincidem com as mais populosas do Brasil (OLIVEIRAFILHO e FONTES, 2000). Outra razão para a exploração das áreas florestadas é o potencial para exploração econômica neste ecossistema ser amplo e variado. Cultivos agrícolas como cana-de-açúcar, café e cacau, criação de gado e especulação imobiliária são alguns exemplos de causas para a devastação da Mata Atlântica, que causou grande degradação ambiental; restam hoje aproximadamente 27% da cobertura vegetal original (BRASIL, 2008). Primack e Rodrigues (2002), afirmaram que o maior perigo da degradação ambiental é a extinção de espécies, pois “uma vez que uma espécie é extinta, sua população não pode ser recuperada, a comunidade que ela habitava torna-se empobrecida e seu valor potencial para os seres humanos jamais poderá se concretizar”. Sobre a biodiversidade mundial, o conhecimento acerca deste assunto, especialmente nos trópicos, permanece precário, ao passo que as taxas de degradação de habitats e extinção de espécies atingem níveis alarmantes nestas regiões (LORINI et al., 1996). Atualmente são considerados como os processos mais 5 danosos à biodiversidade mundial a fragmentação florestal (LAURANCE e DELAMÔNICA, 1998) e a contaminação biológica (ZILLER, 2001) e, embora sejam tão relevantes, seus diferentes efeitos ainda são pouco conhecidos. 2.1. A contaminação biológica por espécies exóticas Quando uma espécie é encontrada fora de sua área de distribuição natural, notadamente como conseqüência da atuação humana nos ecossistemas, diz-se que ela é exótica ou alienígena (ZILLER, 2000). Uma vez que uma espécie exótica se estabelece no ambiente em que foi inserida e sua distribuição ou abundância entra em processo de aumento, colocando em risco outras espécies ou todo um ecossistema, torna-se uma invasora e este processo é denominado invasão biológica ou contaminação biológica (BRASIL, 2008; CDB, 2000; CORDEIRO e RODRIGUES, 2005; PIVELLO, 2005; PYSEK, 1995 apud DISLICH et al., 2002; ZILLER, 2000). Ziller (2000) e Fernandez (2004) enfatizam que a contaminação biológica pode ser entendida como o processo em que atividades antrópicas colocam em contato espécies que evoluíram separadamente e que, portanto, não possuem adaptações para coexistirem. Estas novas espécies, após serem introduzidas podem se neutralizar ou ocasionar graves alterações ao ambiente invadido (ZILLER, 2000). Um ecossistema que sofreu o processo de invasão biológica está biologicamente contaminado ou poluído. A contaminação biológica ou biopoluição causa mudanças nos ambientes naturais e prejuízos à biodiversidade, visto que as espécies exóticas dominam nichos anteriormente ocupados pelas espécies nativas, causam danos à estas e ao funcionamento dos ecossistemas. Contudo, os danos causados pela bioluição não se limitam à diversidade biológica, mas atingem também a economia e a saúde humana (IBAMA, 2006; FERNANDEZ, 2004; ZILLER, 2000). Segundo Pivello (2005), no processo de contaminação biológica podem ser notadas quatro fases distintas. Primeiro ocorre a introdução da espécie, que é a chegada desta em um ecossistema em que antes não era encontrada. Encontrando condições ambientais favoráveis a espécie consegue se estabelecer (ou fixar-se) no ambiente, o que caracteriza a segunda fase do processo. Posteriormente, entrando na terceira fase, ocorre a expansão da espécie, através de altas taxas reprodutivas e uma grande capacidade de dispersão. Cabe ressaltar que as características supracitadas são fundamentais para o sucesso do estabelecimento destas 6 espécies no novo ambiente. Finalmente, a última fase é caracterizada pelo equilíbrio alcançado pela espécie na comunidade. Esta condição de equilíbrio se dá, em geral, pela dominância da espécie exótica invasora sobre as nativas (CARROLL, 2007), culminando numa condição ecológica inferior à original. Segundo Callaway e Aschehoug (2000), “muitas espécies invasoras não são dominantes, mas competitivamente erradicam seus novos vizinhos”. As espécies exóticas podem ser introduzidas nos novos ambientes de maneira acidental ou intencional (DISLICH et al., 2002), sendo este processo mais intenso em habitats frágeis e degradados. De acordo com Laurance e Bierregaard (1997), florestas que apresentam um pequeno grau de perturbação raramente sofrem invasões biológicas. Formulou-se então a hipótese de que a resistência de uma comunidade às invasões seja diretamente proporcional ao número de espécies, pressupondo que, quanto maior a riqueza, maior a estabilidade (CARROLL, 2007; HUTCHINSON, 1959; MACK et al., 2000). Quanto maior a riqueza, menor é a probabilidade das espécies introduzidas conseguirem espaço, já que os recursos do sistema estão sendo utilizados de forma mais integral e os nichos estão todos ocupados (HUTCHINSON, 1959). Dessa forma, nichos vagos em uma comunidade são facilitadores ao estabelecimento de espécies exóticas (ZILLER, 2000). Nem todas as espécies introduzidas em um novo ambiente se tornam invasoras, muitas vezes sequer conseguem se estabelecer por não encontrarem condições necessárias à sua sobrevivência. Por outro lado, as densidades populacionais das espécies exóticas podem permanecer baixas caso as condições não sejam favoráveis no novo ambiente. Caso as condições mudem, estas espécies podem proliferar, tornando-se pragas (MYERS et al., 2000). Entretanto, muitas espécies exóticas obtêm sucesso em seu estabelecimento e propagação pela ausência de predadores naturais, patógenos ou pelo fato das espécies nativas possuírem mecanismos auto-reguladores de populações (ABREU et al., 2003). Muitas vezes, a atuação humana nos ecossistemas também pode ser mais um facilitador para o estabelecimento de espécies exóticas. O homem, agindo sobre os ecossistemas, altera os padrões naturais criando condições nas quais as espécies exóticas levam vantagens competitivas sobre as nativas (PRIMACK e RODRIGUES, 2002). As perturbações no ambiente potencializam a dispersão e o estabelecimento de invasoras, principalmente quando ocorre redução da diversidade de espécies e a recorrência de perturbações, aumentando a susceptibilidade das comunidades aos processos de bioinvasão (ZILLER, 2000). Com todos esses facilitadores, os recursos que nos locais de origem das espécies eram alocados para a formação de defesas são redirecionados para crescimento e reprodução 7 (HÄNFLING e KOLLMAM, 2002 apud ABREU e RODRIGUES, 2005). Em conseqüência disto, a tendência é de as espécies exóticas tornarem-se maiores, reproduzindo-se com maior freqüência e aumentando a expectativa de vida no novo ambiente, apresentando uma bionomia distinta do seu local de origem. Em ecossistemas florestais as invasões biológicas são comumente iniciadas pelas bordas em virtude das perturbações sofridas nestas áreas tornarem o ambiente mais susceptível ao processo de invasão (FENSHAM e COWIE, 1998; STOHLGREN et al., 2002). A borda da floresta é um ambiente alterado onde tais espécies, caso encontrem condições favoráveis, podem se estabelecer, aumentando em número e se dispersando para o interior do fragmento (PATON, 1994). Nas bordas há um relevante aumento na luminosidade, incidência de ventos, temperatura e queda na umidade relativa do ar. Estas alterações limitam a ocorrência de muitas espécies nativas sensíveis às variáveis microclimáticas citadas e, consequentemente, dão vantagens competitivas às espécies resistentes. No Brasil, vários estudos relatam invasões biológicas a partir das bordas no Cerrado (PIVELLO et al., 1999), na Mata Atlântica e na Amazônia (DISLICH et al., 2002; SCARIOT, 2001 apud ABREU e RODRIGUES, 2005). É também relativamente comum a colonização de clareiras por vegetais exóticos. Contudo, com o fechamento do dossel essas plantas tendem a ser eliminadas do sistema (LAURANCE e BIERREGAARD, 1997). Estradas têm sido relatadas também como importantes condutos para a invasão de áreas naturais por espécies exóticas (GELBARD e BELNAP, 2003). Veículos transportam sementes de plantas exóticas para áreas não infestadas e as operações de construção e manutenção das estradas geram sítios seguros para a germinação de sementes e o estabelecimento das plantas. Como a dispersão das espécies exóticas acontece em decorrência das atividades humanas, qualquer perturbação no ambiente pode significar uma via de contaminação, seja ela uma estrada, trilha ou clareira, entre outras (RODOLFO et al., 2007). Neste contexto é importante dizer que as espécies exóticas invasoras normalmente são mais resistentes à variações ambientais, conseguindo, portanto, se estabelecer em diferentes ecossistemas. É interessante destacar que a destruição direta de habitats por desmatamento e fragmentação provoca o aumento na formação de bordas florestais, que por sua vez acabam por facilitar as invasões biológicas. As espécies exóticas invasoras atualmente estão dispersas por todos os biomas, em todos os principais grupos taxonômicos (BAILEY et al., 2007; DISLICH et al., 2002; SANTOS et al., 2005b) e os impactos provocados por estas sobre as espécies nativas são bastante graves, mas não totalmente conhecidos (AZEVEDO e ARAÚJO, 2005; MARTINS 8 et al., 2004). Sabe-se que, por vezes, processos de extinção são desencadeados (FONTES et al., 2003; KOHLI et al., 2006; PARKER et al., 1999; PIVELLO, 2005) e a biopoluição causada pelas exóticas pode se dar em diversos níveis, desde efeitos genéticos, sobre os indivíduos, populações e comunidades, até efeitos sobre os processos ecossistêmicos. Efeitos genéticos incluem alterações nos padrões de fluxo gênico e hibridizações, por exemplo. Os efeitos sobre indivíduos podem se dar através de mudanças em aspectos morfológicos, comportamentais ou de seu crescimento e mortalidade. Quando atingem populações, as espécies exóticas podem modificar sua dinâmica ao atuar em aspectos de sua abundância, crescimento e taxas de extinção. Alterações na riqueza de espécies, diversidade e estrutura trófica são formas com que as espécies exóticas causam impactos sobre as comunidades. As bioinvasões são passíveis ainda de causar efeitos sobre os processos ecossistêmicos, como disponibilidade de nutrientes, produtividade e regime de perturbações (PARKER et al., 1999). Pimentel et al. (2001) disseram que a agressividade e a pressão exercida pelas espécies exóticas sobre os ambientes invadidos podem causar alterações na disponibilidade de recursos e no estado de nutrientes do solo (no caso das espécies vegetais), bem como em sua ciclagem. As espécies exóticas podem também competir com as nativas por recursos chegando até a ocupar os nichos destas, após excluí-las do sistema. Introduzir ou facilitar a disseminação de patógenos é outro impacto citado no estudo. As plantas invasoras podem ainda alterar o microclima e tornar o solo mais susceptível a queimadas. Outro problema ocasionado por invasores é a transformação da estrutura e composição dos ecossistemas, através de sua homogeneização e empobrecimento, destruindo, como resultado, os atributos característicos do bioma local (BRASIL, 2008). Podem também alterar geomorfologicamente o habitat e tornar-se pragas em cultivos agrícolas (D’ANTONIO e VITOUSEK, 1992). Segundo Ziller (2000), o aspecto mais grave das invasões biológicas, quando comparadas a outros tipos de impactos ambientais, é o fato de apresentarem comportamento inverso a estes. Enquanto a maior parte dos problemas ambientais é amenizada com o tempo, as invasões biológicas se agravam à medida que as espécies exóticas ocupam o espaço das nativas, diminuindo a resiliência dos ecossistemas naturais. De acordo com o Secretariado da Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB), estudos realizados nos Estados Unidos da América, Reino Unido, Austrália, África do Sul, Índia e Brasil mostram que as perdas econômicas causadas pelas espécies exóticas invasoras nas culturas, pastagens e áreas florestadas chegam a um montante de aproximadamente 250 bilhões de dólares por ano. Os danos ambientais anuais calculados para as nações 9 contempladas no estudo atingem cifras que se aproximam dos 100 bilhões de dólares. Esses valores representam uma perda anual per-capita de 240 dólares em decorrência das invasões biológicas (BRASIL, 2008). A partir destes levantamentos, e considerando-se perdas semelhantes para as demais nações do mundo, foram realizadas projeções que mostram que os danos à nível mundial decorrentes da introdução de espécies exóticas superariam 1,4 trilhões de dólares.ano-1, montante que representa cerca de 5% da economia mundial. Deve-se atentar também para os custos referentes às ações de prevenção, controle e erradicação das espécies invasoras nos diferentes ecossistemas. Weston et al (2005), citando Westbrooks (1998), colocaram que as ações de controle de ervas custam bilhões de dólares anualmente à economia americana. O potencial das espécies se tornarem invasoras e os custos que podem gerar devem também ser previstos a fim de se evitar danos ambientais e custos econômicos. Tratando ainda sobre os países alvo do levantamento feito pela CDB, computou-se um total de mais de 120 mil invasões de espécies animais, vegetais e microrganismos. Extrapolando-se estes dados para os diversos ecossistemas da Terra, estima-se um total de 480 mil introduções de espécies exóticas até o momento. Desde o ano de 1600, as espécies exóticas invasoras teriam sido responsáveis por 39% das extinções de espécies animais que tem causas conhecidas. Por outro lado, não se pode negar que algumas vezes a introdução de espécies exóticas traz consigo ganhos, principalmente econômicos. Muitas das introduções de espécies tiveram propósitos econômicos, no setor agropecuário. Introduzem-se espécies exóticas porque delas se tem conhecimento para a produção e a economia nacional depende destas. Dados de 1998 mostram que 31% das exportações brasileiras correspondem aos chamados produtos da biodiversidade, destacando-se café, soja e laranja (todas espécies exóticas) e 26% da matriz energética nacional é oriunda da biomassa vegetal (incluindo álcool, lenha e carvão vegetal) (ALBAGLI, 1998). Atividades relacionadas à agroindústria respondem por aproximadamente 40% do PIB brasileiro. Pode-se notar a dependência da economia brasileira em relação às espécies exóticas porque 64% das colheitas brasileiras são de recursos genéticos exóticos (ALBAGLI, op. cit.). No entanto, quando as espécies exóticas estão sob controle, confinadas a ecossistemas agrícolas, não se pode dizer que são espécies invasoras, pois suas populações não estão em processo de aumento, não ameaçam espécies ou ecossistemas nativos nem tampouco causam prejuízos. Problemas com estas espécies podem ocorrer caso se perca o controle sobre seu cultivo e estas alcancem ecossistemas nativos, estabeleçam-se neles e causem algum tipo de dano, como os descritos por Crosby (1993). 10 A introdução de espécies em novos ambientes pela ação humana tem também um forte componente cultural. Transportavam-se espécies que estavam atreladas à cultura humana. Neste ponto o paisagismo talvez seja sua expressão mais visível, como, por exemplo, quando os colonizadores traziam consigo espécies ornamentais e animais de estimação para formar um ambiente familiar na colônia. Estes aspectos se tornam mais claros quando se analisa o histórico das introduções de espécies exóticas. 2.2. A contaminação biológica através dos tempos As primeiras translocações de espécies tiveram a intenção de suprir necessidades agrícolas, florestais, paisagísticas e outras de uso direto (ZILLER, 2001). Além de serem utilizadas para alimentação e ornamentação, estão entre as finalidades da introdução de espécies exóticas, produção florestal, controle de erosão, experimentação científica, camuflagem militar, usos medicinais e religiosos (ZILLER, 2000). Antes da Revolução Industrial as pessoas levavam plantas cultivadas e animais domésticos de um lugar para outro ao se estabeleceram em novas áreas (PRIMACK e RODRIGUES, 2002). O transporte de espécies entre ecossistemas ganhou força e velocidade com a evolução dos meios de transporte e o processo de globalização. O transporte rápido de pessoas e cargas através do mundo leva espécies de uma área à outra, tendo estas plenas condições de sobrevivência. De acordo com Pivello (2005:1), “embora Darwin, em 1860, já tivera notado o problema das invasões biológicas, o primeiro cientista a escrever sobre o assunto foi Charles Elton, por volta de 1950”, com a obra “The Ecology of Invasions by Animals and Plants”. Charles Darwin (1809-1882) registrou a densa ocupação dos pampas, na Argentina e no Chile, pela espécie Cynara cardunculus, vulgarmente conhecida como cardo. Blum et al. (2005), no entanto, relatam que os primeiros trabalhos abordando a contaminação de ecossistemas por espécies exóticas invasoras datam do século XIX, na África do Sul. Este país tratou como “praga”, pela primeira vez, uma espécie vegetal invasora. Ziller (2001) acrescenta que um visitante do Parque Nacional Yosemite, nos Estados Unidos, solicitou, em 1865, que esta área fosse protegida da crescente ocupação por plantas daninhas européias. Primack e Rodrigues (2002) relataram que a introdução de espécies exóticas ao longo da história pode ter acontecido e continuar acontecendo de várias formas. Durante a colonização, os europeus levaram centenas de espécies de mamíferos e pássaros para as colônias, para que tivessem um ambiente familiar e caça garantida quando retornassem. Nesta 11 época, diversas espécies de plantas foram introduzidas também com o intuito de tornar a paisagem da colônia familiar para os europeus (SANTOS et al., 2005a). Crosby (1993) conta que as regiões das “Neo-Europas”2 escolhidas pelos imigrantes europeus para se instalarem foram as arenas onde espécies nativas e exóticas viveram sua mais significativa competição. Animais como cabritos e porcos eram deixados por marinheiros europeus em ilhas ainda não habitadas para que seguramente encontrassem alimento ao regressarem. Espécies vegetais eram introduzidas com fins ornamentais, agrícolas ou para pastagens. Contudo, muitas dessas espécies deixaram de ser cultivadas e se estabeleceram nos novos locais. Tais introduções foram intencionais. Todavia, muitas espécies exóticas foram e continuam a ser introduzidas de forma acidental. Por exemplo, sementes de ervas daninhas que contaminam lotes de sementes colhidas com fins comerciais e que acabem sendo lançadas em novos locais, como o caso do arroz-vermelho e do arroz-branco cultivado. O capim-colonião (Panicum maximum) chegou ao Rio de Janeiro como resto do forro das “camas” dos escravos nos porões dos navios negreiros (ABREU, 1992). Ratos e insetos foram transportados acidentalmente em navios e aviões; doenças e parasitas são levados com seus hospedeiros e grandes navios comumente carregam inúmeras espécies marinhas em suas águas de lastro (PRIMACK e RODRIGUES, 2002). Pivello (2005) cita alguns exemplos clássicos de espécies exóticas invasoras e tentativas de manejo destas espécies na história, como o caso da introdução de coelhos Oryctolagus cuniculus na Inglaterra e na Austrália. Essa espécie, nativa da Península Ibérica, foi levada, no século XII, da França para a Inglaterra e daí para a Austrália em 1778. Nos novos locais sua população aumentou a ponto de se tornarem pragas, causando grandes prejuízos nos cultivos agrícolas. Foi realizado o controle biológico da espécie, através da contaminação dos coelhos com o vírus da mixomatose. Este patógeno, embora letal à maioria dos indivíduos, deixou de ser eficiente no controle populacional à medida que foram selecionadas populações de coelhos resistentes ao vírus. O molusco-zebrado (Dreissena polymorpha) foi levado aos Grandes Lagos (Estados Unidos e Canadá) na água de lastro de navios, tornando-se uma praga que ameaça espécies nativas. No Brasil pode ser citado o caso da abelha africana Apis mellifera, introduzida para pesquisas e liberada acidentalmente dos laboratórios da ESALQ-USP na década de 50, espalhando-se por toda a América de Sul e Central. Esta espécie compete com as abelhas 2 Neo-Europas são as áreas de outros continentes que foram colonizadas por europeus. 12 nativas por recursos e é agressiva aos seres humanos (PIVELLO, 2005; PRIMACK e RODRIGUES, 2002). Na década de 1960, o Brasil começou a usar variedades exóticas como solução para a recuperação florestal, e incentivos fiscais eram concedidos por parte do governo a quem plantasse pinos e eucaliptos para produção florestal. O mesmo ocorria no setor pastoril, com a implantação de gramíneas africanas, como as braquiárias, para fins forrageiros. Entretanto, com o fim dos incentivos, muitos plantios foram abandonados e as espécies cultivadas acabaram por alcançar matas nativas, como o caso da invasão de áreas no Paraná por Pinus sp. O mexilhão-dourado (Limnosperma fortunei), espécie que vem causando vultosos prejuízos econômicos, é um molusco fluvial originário da China e que foi registrado pela primeira vez no Brasil em 1999. Trazido pela água de lastro de navios, esta espécie se reproduz assustadoramente causando danos ao funcionamento de hidrelétricas e o entupimento nas tubulações de esgotos e de águas pluviais (IBGE, 2004). Algumas endemias que ocorrem no Brasil, como a esquistossomose e a filariose, são exóticas. O vírus da dengue é originário da Ásia e transmitido no Brasil pelo mosquito Aedes aegypti, nativo da África. O caramujo-gigante-africano (Achatina fulica) é classificado entre as cem piores espécies exóticas invasoras de ocorrência mundial. Sua introdução no Brasil ocorreu por volta de 1988, tendo sido transportado intencionalmente para fins comerciais no setor alimentar. Entretanto, de acordo com a legislação brasileira, a introdução de espécies exóticas para produção necessita da aprovação do órgão ambiental responsável. Esta aprovação parece não ter sido obtida. Além disso, aparentemente esta iguaria culinária não proporcionou o sucesso anunciado pela mídia ao ser rejeitada pelo paladar brasileiro. Então, muitos criadores soltaram os caramujos no ambiente. As populações de A. fulica alcançam rapidamente enormes densidades e causam sérios danos econômicos em áreas agrícolas, danificam jardins e oferecem riscos sanitários como hospedeiro de nematódeos causadores de doenças e do vetor da meningoencefalite (FICHER et al., 2006; THIENGO et al., 2007). Invasões biológicas também ocorrem entre regiões brasileiras. O sagüi-estrela (Callithrix penicilata), por exemplo, originário do nordeste do Brasil é considerado invasor nas matas do centro-sul e sudeste do país, para onde foi levado como animal de estimação, competindo com as espécies de micos locais (IBGE, 2004; PEREIRA, 2006). O tucunaré, Cichla ocellaris, peixe nativo da Amazônia, foi introduzido em outras regiões do Brasil, onde se tornou um voraz predador das espécies locais (observação pessoal). Muitos vegetais que foram introduzidos com fins ornamentais e paisagísticos acabaram tornando-se invasoras de ambientes terrestres, como, por exemplo, Impatiens 13 parviflora (beijinho), Archontophoenix cunninghamiana (palmeira-imperial-australiana), Pinus spp. (pinheiro), Dracaena fragrans (dracena), entre outras espécies (PIVELLO, 2005). A espécie Tecoma stans (amarelinho ou ipê-de-jardim), originária do México e do sul dos Estados Unidos, foi introduzida no Brasil como planta ornamental por volta de 1971 e infesta áreas do Paraná (VIBRANS et al., 2005). A gramínea africana Brachiaria sp domina o estrato herbáceo em reservas do Cerrado, competindo com plântulas de espécies arbóreas nativas (PIVELLO, 2005). De acordo com Sanches et al. (2007), sementes da espécie Terminalia catappa (Amendoeira), nativa da Ásia, parecem ter chegado ao Brasil misturadas às areias que eram utilizadas como lastro dos navios. Troncos destas árvores também serviriam de lastro e junto com eles, teriam vindo partes das copas, frutos e sementes. Esta espécie também é largamente utilizada como ornamental e na arborização urbana. Ziller (2000) relata a invasão da estepe gramíneo-lenhosa no estado do Paraná por espécies do gênero Pinus, introduzido para produção florestal e também utilizado como planta ornamental. Santos e colaboradores (2005a) explicam que as introduções de espécies exóticas com fins ornamentais se devem à forte influência européia no paisagismo brasileiro. Estas influências forneceram o repertório de elementos para a composição dos jardins e da arborização urbana do Brasil, que utilizavam maciçamente vegetação exótica. Auguste Glaziou e Burle Marx são exemplos de paisagistas que fizeram uso de plantas exóticas em seus projetos. A Ásia e a África são as maiores fontes de espécies invasoras para o Brasil. Em relação aos animais terrestres invasores, as áreas de origem da maior parte destas espécies para o Brasil são a Europa e a região do Mar Mediterrâneo. Este fato explica-se pelas relações históricas e comerciais entre estas regiões (IBGE, 2004). No entanto, o Brasil também é fonte de espécies invasoras de outras partes do mundo. Por exemplo, as espécies aquáticas Salvinia molesta e Eichhornia crassipes (aguapé) são nativas da América do Sul e infestam lagos e represas por toda a faixa tropical do Globo. Estas plantas costumam ter explosões populacionais que reduzem drasticamente a concentração de oxigênio dissolvido na água, acarretando em elevações nos índices de mortalidade de peixes e outros organismos aquáticos (IBGE, op cit). É interessante notar que a maior parte das espécies vegetais e boa parte das espécies animais invasoras foram trazidas para o Brasil de maneira intencional (IBGE, 2004). Este fato mostra a necessidade de um maior controle sobre as invasões biológicas. 14 2.3. Gestão e manejo das espécies exóticas vegetais Para realizar o manejo de espécies invasoras podem ser aplicadas técnicas com o objetivo de erradicá-las das áreas afetadas ou tão somente controlar suas populações. Normalmente, a erradicação das espécies invasoras é extremamente difícil de ser alcançada em virtude do árduo e oneroso esforço necessário para que sejam eliminados todos os indivíduos de uma dada espécie. Outro fator que porventura pode inviabilizar a tentativa de erradicação de uma exótica invasora é a exigência que este procedimento faz da utilização de tratamentos mais drásticos, que podem prejudicar as espécies nativas (PIVELLO, 2005). Muitas vezes, realizar o controle das populações invasoras se torna uma alternativa mais viável (PIVELLO, 2005), apesar de existir a possibilidade de ocorrerem os mesmos problemas de quando é tentada a erradicação, caso não sejam realizados estudos prévios e tomadas as medidas necessárias ao bom andamento do plano de manejo. Executar o controle de populações de maneira equivocada pode culminar na recolonização das áreas tratadas pela espécie que se deseja remover do ambiente. Somado a isto, deve-se dizer que somente a remoção da espécie invasora pode não ser suficiente para que o ecossistema recupere suas funções, uma vez que nichos podem ficar desocupados por longos períodos em função da recolonização das áreas pelas nativas ser lenta (ENRIGHT, 2000). As espécies nativas podem já ter estabelecido interações com as exóticas e serem prejudicadas pela súbita erradicação destas. Fontes de espécies podem estar localizadas longe das áreas atingidas por exóticas e a escassez de recursos tróficos ou abrigo após a aplicação das técnicas de remoção das espécies pode levar ao abandono pela fauna nativa (ZAVALETA et al., 2001). Falando particularmente sobre espécies vegetais, os solos ficarão mais vulneráveis aos processos erosivos e o ambiente como um todo exposto a condições climáticas desfavoráveis (maior insolação, menor retenção de umidade pelo solo e ar, ausência de proteção contra chuvas e ventos), o que dificulta a recolonização pelas nativas. Algumas invasoras alteram o ambiente tão significativamente que este se torna inóspito para o estabelecimento das nativas (ZAVALETA et al., 2001). Com isso, as áreas ficam sujeitas à novas invasões e as tentativas de erradicação ou controle das espécies invasoras podem não alcançar o sucesso esperado. A associação de diferentes metodologias para restauração da vegetação nativa é então recomendada, por aumentar o ritmo de sua sucessão e garantir a sustentabilidade dos processos ecossistêmicos (REIS et al., 2003). O plantio de mudas de espécies nativas de rápido crescimento, por 15 exemplo, auxilia na restauração dos locais manejados, assegurando, desta forma, o êxito das ações de manejo. A priori, no entanto, devem ser realizados estudos com o objetivo de se conhecer detalhadamente a população invasora e o habitat biocontaminado, para que os programas de erradicação e/ou controle não comprometam espécies da fauna e da flora nativas que possam estar associadas às exóticas, bem como para que sejam aplicadas as técnicas corretas de remoção (ABREU e RODRIGUES, 2005). Pivello (2005), em seu trabalho, descreveu a possibilidade de manejar as espécies exóticas invasoras por meio de modificações em suas populações ou comunidades ou ainda alterando aspectos dos ambientes afetados e/ou sua paisagem. As estratégias de manejo aplicadas podem ainda ser preventivas ou remediadoras. O manejo de populações e comunidades consiste na aplicação de técnicas mecânicas, químicas ou biológicas, bem como associações entre estas, que objetivem o desfavorecimento da espécie invasora ou o favorecimento das nativas. Tratando de espécies vegetais, entre as técnicas mecânicas estão o corte raso, o arranquio, o anelamento, o sombreamento e a queima, cada uma adequada a diferentes situações (PIVELLO, 2005). Com o corte raso espera-se obter o enfraquecimento do vegetal através da retirada de sua biomassa epígea. Para cada espécie devem ser testadas a melhor época e freqüência de aplicação do método (PIVELLO, 2005). O arranquio busca a remoção direta de toda a biomassa vegetal e pode ser aplicado de forma manual ou mecanizada. Entretanto, este método traz consigo desvantagens, pois o ato de arrancar as plantas revolve o solo (COUTINHO, 1982; D’ANTONIO e MEYERSON, 2002), destruindo seus agregados e deixando-o mais vulnerável à processos erosivos; além de causar perturbações ao banco de sementes e plântulas e também à fauna do solo. Apesar disso, tomando-se precauções para exercer o mínimo impacto no meio, a técnica pode ser uma boa alternativa para controlar populações invasoras. O anelamento é aplicado exclusivamente em espécies de porte arbóreo e busca interromper o fluxo de seiva da raiz às folhas e, com isso, causar a morte do vegetal. Retira-se um anel profundo do tronco do vegetal, de modo a extrair toda a casca (externa e interna). Desta forma, é afetado o floema, que é o conjunto de tecidos vivos especializados para a condução da seiva elaborada (BURGER e RICHTER, 1991). Este método é menos dispendioso que a derrubada direta e causa menos impactos no ambiente, uma vez que com a morte lenta do vegetal seus galhos caem aos poucos, impedindo a abertura de grandes clareiras. 16 O sombreamento é realizado por meio do plantio de espécies nativas de rápido crescimento e causa também o enfraquecimento e morte das espécies vegetais exigentes de luz. Gramíneas invasoras de áreas de Cerrado são especialmente sensíveis à esta técnica, já que possuem metabolismo do tipo C4 (MOZETO et al., 1996 apud PIVELLO, 2005). Neste caso, a variante do método a ser testada é o grau de sombreamento, para que não sejam negativamente afetadas também as espécies nativas. A queima é feita na tentativa de dar vantagens competitivas às nativas, desfavorecendo as exóticas. Em áreas de Cerrado foi observado que, para a Poaceae africana Melinis minutiflora (capim-gordura), queimadas periódicas reduzem seu vigor e favorecem as herbáceas nativas, principalmente se o manejo for conduzido durante a floração da exótica (PIVELLO, 2005). Esta técnica, contudo, deve ser utilizada com extremo cuidado para que o fogo não saia de controle, causando impactos negativos ao ambiente, como a queima de espécies nativas e a perda de fertilidade do solo. Pelo risco oferecido por esta técnica, é proibido seu uso em unidades de conservação. As técnicas químicas para manejo de vegetais muitas vezes se mostram mais eficientes em curto prazo, além de demandar um esforço de trabalho menor. Entretanto, trazem consigo inúmeros riscos ambientais, principalmente em se tratando de unidades de conservação. A legislação brasileira, inclusive, não permite o uso de herbicidas em unidades de conservação. A possível poluição dos solos e coleções d’água, envenenamento de animais (PIVELLO, 2005) e a morte de espécies vegetais nativas devido à não seletividade dos herbicidas figuram entre os riscos ambientais mencionados. As pessoas que aplicarão o herbicida (seja por pulverização, seja por injeção) devem ser bem treinadas a fim de evitar acidentes e o uso exagerado destes defensivos químicos. O controle biológico, feito através da introdução de parasitas ou predadores, é uma técnica que só deve ser adotada após rígida e exaustiva experimentação controlada. No Brasil ainda não existe nenhum caso de êxito no uso do controle biológico (DINIZ, 2005). O controle biológico clássico consiste em introduzir inimigos naturais existentes na mesma área de origem da planta invasora. Esta metodologia de controle biológico apresenta maiores chances de obter sucesso, pois utiliza espécies que têm relações co-evolutivas com a planta-alvo. Com isso, pode-se dizer que os agentes introduzidos apresentarão duas características relevantes: capacidade de controlar a população de invasores e especificidade, ou seja, a espécie introduzida não fará uso de outras espécies durante seu ciclo de vida (DINIZ, 2005). 17 A introdução de inimigos naturais da espécie alvo presentes nas áreas invadidas caracteriza o controle biológico não clássico. Esta forma de controle pode não apresentar resultados satisfatórios se o agente controlador não for parte permanente da biota local, se fazendo necessárias, neste caso, reintroduções. Caso este problema não ocorra, a densidade populacional do inimigo natural pode não ser suficiente para controlar a espécie invasora. Para contornar tal situação devem ser aplicadas técnicas inundativas ou aumentativas da população do agente selecionado (DINIZ, 2005). Existem ainda os métodos de controle que buscam manejar as paisagens, sendo estes principalmente preventivos. Dentre as técnicas utilizadas neste tipo de controle está a instalação de “cortinas verdes” ao redor das áreas que se quer proteger, a fim de diminuir a chegada de propágulos das plantas invasoras (PIVELLO, 2005). Para que o controle das invasões biológicas seja eficiente e os impactos causados por estas nos ambientes sejam minimizados, se fazem fundamentais práticas de gestão. A gestão das invasões biológicas deve visar o uso de práticas que garantam a conservação da biodiversidade, reduzindo o impacto ambiental gerado pelas espécies exóticas. Qualquer ação que objetive realizar a gestão de espécies exóticas deve ser baseada em estudos prévios que norteiem as melhores ferramentas a serem aplicadas. Fazem parte do arcabouço de conhecimentos associados à esta temática informações sobre aspectos biológicos, ecológicos e populacionais da espécie-alvo. Quanto maior a quantidade de dados disponíveis ao gestor, maior é a segurança na escolha e aplicações das ações. Técnicas de manejo de espécies, recuperação de áreas degradadas e reflorestamento são algumas ferramentas a serem utilizadas quando da gestão das invasões biológicas. É extremamente importante também a implantação de políticas públicas para a inserção da gestão de espécies exóticas invasoras que envolvam a realização de estudos sobre o assunto, a conscientização da comunidade para o problema, a elaboração de legislação específica para o transporte e introdução destas espécies, além de outras ações preventivas e remediadoras necessárias. 2.4. A questão da contaminação biológica no âmbito da conservação da biodiversidade Apesar das invasões biológicas serem um problema antigo, somente por volta de 1980 a comunidade científica se interessou por este assunto quando o Comitê Científico em 18 Problemas Ambientais (SCOPE3) identificou os problemas das invasões biológicas como um assunto globalmente importante (KOHLI et al, 2006; OLDHAM, 2008; PIVELLO, 2005). Na década de 1990 a contaminação biológica foi reconhecida como uma das maiores ameaças à biodiversidade mundial por diversos autores (AZEVEDO e ARAÚJO, 2005; DISLICH et al, 2002). Em 1987, com a obra Nosso Futuro Comum (também conhecido como Relatório Brundtland), a Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento propôs “uma agenda global para a mudança”. Neste relatório a conservação da biodiversidade é justificada pela “possibilidade de as espécies contribuírem sempre mais e de uma infinidade de formas para o bem-estar da humanidade” (CMMAD, 1991), sendo igualmente importantes os serviços ecossistêmicos. A introdução de espécies alienígenas, contudo, é apenas citada como uma possível causa de extinção de espécies. Não se percebe neste relatório uma grande preocupação com a questão das espécies exóticas invasoras. A gestão das invasões biológicas não é abordada entre as formas, tendências e causas de extinção nem entre as sugestões de ação necessárias para a conservação da diversidade biológica. Uma de suas principais recomendações foi a realização de uma conferência mundial para direcionar os assuntos ambientais – o que culminou com a Rio-92. A Rio-92 teve como principal tema a discussão sobre o desenvolvimento sustentável e como reverter o atual processo de degradação ambiental. Durante a conferência foram firmados vários acordos, protocolos e convenções, sendo um dos mais importantes deles a Agenda 21. No que tange à diversidade biológica, este documento coloca que “os bens e serviços essenciais de nosso planeta dependem da variedade e variabilidade dos genes, espécies, populações e ecossistemas” (CNUMAD, 2001). Neste documento, a introdução inadequada de plantas e animais exógenos é colocada como uma das principais causas da perda de diversidade biológica. Ainda durante a Rio-92 foi assinada a Convenção sobre 3 O SCOPE (Scientific Committee on the Problems of the Environment) é uma organização interdisciplinar com competência em ciências naturais e sociais, focada nas questões ambientais globais e que opera na interface entre casos científicos e de tomada de decisão. Foi criado durante o 10º encontro do Comitê Executivo do ICSU (International Council for Science) em 1969, como um mecanismo para unir cientistas a fim de realizar avaliações científicas internacionais e interdisciplinares dos problemas ambientais. A missão do SCOPE é identificar e avaliar criticamente a importância das emergentes questões ambientais globais ou regionais, enfatizando aquelas que necessitam de uma perspectiva interdisciplinar. Uma rede mundial de cientistas e instituições científicas desenvolve sínteses e revisões do conhecimento científico sobre questões ambientais correntes ou potenciais. Seus projetos vão de estudos sobre biodiversidade e ecossistemas, espécies exóticas invasoras, ciclos biogeoquímicos incluindo o impacto das atividades humanas, química e ecossistemas e saúde humana e o ambiente. O maior desafio do SCOPE é priorizar suas atividades entre os numerosos tópicos a serem explorados e encontrar o equilíbrio entre o regional e o global, e entre interesses científicos e políticas sobre questões ambientais (OLDHAM, 2008). 19 Diversidade Biológica, principal instrumento na atualidade que trata das questão das invasões biológicas. As discussões para a elaboração de uma Convenção sobre Diversidade Biológica iniciaram-se na década de 1980, mas apenas em junho de 1987, durante uma reunião do Conselho de Administração do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA4), foi dada a partida para a elaboração oficial da Convenção. A versão final do tratado, porém, foi aprovada somente em 22 de maio de 1992, em Nairóbi, Quênia. Durante a Rio-92 a Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB) foi aberta à adesão, tendo entrado em vigor em 29 de dezembro de 1993. Com a CDB foi estabelecido um novo código de conduta, a nível internacional, sobre a biodiversidade (ALBAGLI, 1998). A CDB é hoje a principal referência internacional para debate e ações relativas à diversidade biológica e define como um dos itens prioritários o cuidado com espécies exóticas e os problemas que estas podem causar à biodiversidade. Em seu artigo 8º, alínea “h” a CDB diz que as nações membro devem “prevenir a introdução de, controlar ou erradicar as espécies exóticas que ameacem ecossistemas, habitats ou espécies” (CDB, 2000:14). A Conferência das Partes (COP) é o órgão supremo decisório no âmbito da CDB e os avanços na implementação da Convenção acontecem através das decisões tomadas em seus encontros periódicos. Por exemplo, no que se refere às invasões biológicas, a Decisão V/8 da 5a Conferência das Partes estabeleceu diretrizes para a prevenção e controle de espécies exóticas invasoras que ameaçam ecossistemas, habitats ou espécies. A decisão VI/23, tomada durante a COP 6, também trata das espécies exóticas. A CDB propõe uma abordagem hierárquica para o manejo das espécies exóticas invasoras. A base desta abordagem é a prevenção de novas introduções, mas considera a erradicação a melhor alternativa quando a prevenção falha (JENKINS e MOONEY, 2006). A Conferência das Partes estabeleceu sete Programas de Trabalho Temáticos que correspondem a alguns dos maiores biomas do planeta. Cada programa estabelece uma visão e princípios básicos para guiar os trabalhos. Eles também expõem questões-chave a serem consideradas, identificam saídas potenciais e propõe um cronograma e meios para alcançá-lo (CBD, 2009). Os Programas de Trabalho da CDB são: Programa de Trabalho sobre Biodiversidade Marinha e Costeira 4 O PNUMA é um programa integrado das Nações Unidas, criado após a Conferência de Estocolmo (1972), encarregado de coordenar as ações intergovernamentais de proteção e monitoramento ambiental (ALBAGLI, 1998). 20 Programa de Trabalho sobre Biodiversidade das Águas Continentais Programa de Trabalho sobre Biodiversidade Florestal Programa de Trabalho sobre Biodiversidade das Terras Áridas e Sub-úmidas Programa de Trabalho sobre Biodiversidade das Montanhas Programa de Trabalho sobre Biodiversidade Agrícola Programa de Trabalho sobre Biodiversidade de Ilhas A Convenção de Bern5, da qual quase todos os países Europeus são signatários, é mais um encontro internacional relevante que aborda o tema das invasões biológicas. Em seu artigo 11, o texto desta Convenção convoca as partes para um controle das introduções de espécies alienígenas e seu comitê permanente tem aprovado várias recomendações, instando os países a erradicarem as espécies introduzidas (GENOVESI, 2005). Esta convenção foi idealizada com a finalidade de garantir a conservação da fauna e flora européias e seus habitats naturais através da cooperação entre os países signatários. Com o passar do tempo, os problemas causados pelas espécies exóticas se agravaram e essa questão assumiu tal dimensão, que em 1996, a preocupação com as conseqüências negativas do processo de globalização sobre o meio ambiente levou a Organização das Nações Unidas e o Governo da Noruega a convocar o Primeiro Encontro Internacional sobre Espécies Exóticas Invasoras, em Trondeim, Noruega. Participantes do encontro, que ficou conhecido como a Conferência de Trondeim, concluíram que as espécies exóticas invasoras se tornaram uma das maiores ameaças à diversidade biológica mundial e recomendaram que uma estratégia global e um mecanismo para tratar o problema fossem criados (GISP, 2009). Em 1997, como fruto da Conferência de Trondeim, a Organização das Nações Unidas (ONU) – através do SCOPE, do Programa de Meio Ambiente (UNEP) e de outros órgãos internacionais como a FAO (Food and Agriculture Organization) – criou o Programa Global de Espécies Invasoras (GISP6). A missão desta organização é conservar a biodiversidade e sustentar a subsistência minimizando a dispersão e os impactos das espécies invasoras (GISP, 2009). Os quatro primeiros anos deste programa foram dedicados à elaboração de diagnósticos e diretrizes. Com a colaboração dos países integrantes da ONU (inclusive o Brasil), o programa apontou algumas linhas de ação: definição de estratégias (nacionais e 5 A Convenção para a Conservação da Fauna e Flora Européias e Habitats Naturais (Convenção de Bern) foi assinada em Bern, Suíça, em 1979, mas só ganhou força em 1982. Os principais objetivos da convenção são garantir a conservação e proteção das espécies da fauna e flora e seus respectivos habitats naturais, aumentar a cooperação entre os países signatários e regular a exploração destas espécies (incluindo as espécies migratórias). A convenção impõe obrigações legais às partes contratantes, protegendo mais de 500 espécies vegetais e mais de 1000 espécies animais (JNCC, 2009). 6 GISP, em inglês, Global Invasive Species Programme 21 regionais) para o controle e erradicação de espécies invasoras; capacitação técnica e humana para o controle e erradicação de espécies invasoras; implementação de atividades de pesquisa; construção de sistemas de informação de acesso geral e a conscientização através de simpósios regionais, nacionais e internacionais (ZILLER, 2001). Com o aumento da preocupação com o impacto causado pelas espécies exóticas e dos estudos sobre o tema, a realização de encontros e as publicações se tornaram mais freqüentes, culminando no surgimento, em 1999, do periódico especializado Biological Invasions (ABREU, 2008; OLIVEIRA e MACHADO, 2009). A 6ª Reunião do Órgão Subsidiário de Aconselhamento Científico, Técnico e Tecnológico (SBSTTA) da CDB, realizada em março de 2001, em Montreal, no Canadá, teve como foco a contaminação biológica e deu seqüência à elaboração e implementação do GISP, além de consolidar os princípios a serem seguidos para o tratamento do problema das invasões biológicas (ZILLER, 2001). Nesta conferência o GISP emitiu um “Chamado à Ação”, que descrevia os efeitos das espécies exóticas invasoras como um problema global e desafiava governos, organizações intergovernamentais, organizações não-governamentais, o setor privado e todas as demais partes interessadas a tomar providências para implementar uma Estratégia Global sobre Espécies Exóticas Invasoras (GISIN, 2009). Depois disto, o GISP coordenou sete workshops regionais para avaliar as ameaças, impactos e necessidades sobre as espécies exóticas invasoras. Estes workshops resultaram em várias declarações, como as Declarações de Kirstenbosch e Davis (África do Sul e EUA), Declaração de Copenhagen (países das regiões Nórdica e Báltica) e a Declaração de Brasília (países da América do Sul) (GISIN, 2009). Posteriormente, a Estratégia Global para Conservação Vegetal, adotada pela Conferência das Partes da CDB em 2002, convocou os signatários para erradicar as espécies exóticas que ameaçam plantas, comunidades vegetais, habitats e ecossistemas associados (GENOVESI, 2005). Iniciada em 2002 pela Infra-estrutura Nacional de Informações Biológicas dos EUA (National Biological Information Infrastructure – NBII) como uma série de projetos piloto sob responsabilidade do IABIN (Inter-American Biodiversity Information Network) e fundada pelo Departamento de Estado dos EUA, a Rede de Informações sobre Espécies Invasoras do IABIN (IABIN Invasives Information Network – I3N) é uma rede temática da IABIN e veio para desenvolver ferramentas para a coleção e intercâmbio de informações sobre espécies exóticas invasoras nas Américas. O I3N integra informações dos países do continente americano para dar apoio a um diagnóstico e gestão das espécies exóticas invasoras, 22 fornecendo capacitação, ferramentas eletrônicas e apoio para o desenvolvimento de bancos de dados e ampliação do acesso à informação. Participam desta rede os seguintes países: Argentina, Bahamas, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Costa Rica, República Dominicana, Equador, El Salvador, Guatemala, Jamaica, México, Panamá, Paraguai, Peru, Estados Unidos e Uruguai (I3N, 2009). Como parte de uma iniciativa global sobre espécies invasoras conduzida pelo GISP, foi desenvolvido o Banco de Dados Global sobre Espécies Invasoras (Global Invasive Species Database – GISD). Este banco de dados objetiva aumentar o conhecimento público sobre as espécies exóticas invasoras e facilitar a realização de atividades de prevenção e gestão destas. É gerenciado pelo Grupo de Especialistas em Espécies Invasoras (ISSG) pertencente à UICN. O GISD tem seu foco nas espécies exóticas invasoras que ameaçam a biodiversidade nativa e aborda todos os grupos taxonômicos em todos os ecossistemas (ISSG, 2009). É importante esclarecer que o Grupo de Especialistas em Espécies Invasoras (Invasive Species Specialist Group – ISSG) é parte da Comissão para a Sobrevivência das Espécies (Species Survival Commission – SSC) da UICN. O ISSG é um grupo global de 146 especialistas de 41 países. O ISSG objetiva reduzir as ameaças aos ecossistemas naturais e às espécies nativas contidas nestes aumentando o conhecimento sobre espécies exóticas invasoras e sobre meios para prevenir, controlar ou erradicá-las (ISSG, 2009). Em 2003 a NBII foi procurada pela Agência de Oceanos Negócios Internacionais Científicos e Ambientais do Departamento de Estado dos Estados Unidos da América, que pediu para coordenar um workshop para a implementação de uma rede de informações sobre espécies invasoras que ocorreu em 2004, em Baltimore, Maryland, EUA. Progressos importantes foram feitos pelos 76 participantes de 26 países que entraram em acordo sobre os tipos e formatos de informações a serem coletadas pelos participantes do banco de dados online sobre espécies invasoras. A Global Invasive Species Information Network (GISIN) foi formada então para gerar uma plataforma com a finalidade de dividir informações sobre espécies invasoras em nível global, via internet e outros meios digitais. O estatuto do GISIN, conhecido como a Declaração de Baltimore foi lançado em junho de 2004 (GISIN, 2009). A temática das invasões biológicas é tão importante que o tema do Dia Internacional para a Diversidade Biológica em 2009 (22 de maio) será “Espécies Exóticas Invasoras: uma das maiores ameaças à biodiversidade e ao bem-estar ecológico e econômico da sociedade e do planeta” (CBD, 2009). 23 A UICN7 (União Internacional para a Conservação da Natureza) aponta como um princípio para a conservação da biodiversidade a criação de uma abordagem política, legal e institucional das ameaças impostas por espécies exóticas. Para que isto se torne uma realidade deve haver legislação em nível nacional que trate da prevenção e remediação dos problemas, além de cooperação internacional a fim de minimizar as introduções de espécies (ZILLER, 2000). Em nível nacional, as invasões biológicas começaram a ganhar espaço com a presença de algumas espécies que vêm causando prejuízos econômicos como o mexilhão-dourado (CORDEIRO e RODRIGUES, 2005). No Brasil, o tema esteve inicialmente em evidência durante a Rio-92 (ABREU, 2008) e as ações acerca das espécies exóticas invasoras foram iniciadas em reconhecimento à CDB, que entrou em vigor nesta nação somente em 1994, por meio do Decreto Legislativo nº. 2. Em dezembro de 1994, por meio do Decreto 1.354, no âmbito do Ministério do Meio Ambiente, foi instituído o Programa Nacional da Diversidade Biológica (PRONABIO), para apoiar a implementação de projetos que atendessem às recomendações da CDB (ALBAGLI, 1998). O Programa objetiva, de acordo com informações do portal da CDB no Brasil, em consonância com as diretrizes e estratégias da CDB e da Agenda 21, promover parceria entre o Poder Público e a sociedade civil na conservação da diversidade biológica, na utilização sustentável de seus componentes e na repartição justa e eqüitativa dos benefícios dela decorrentes (CDB, 2009). A maior iniciativa do PRONABIO foi o estabelecimento de dois mecanismos de financiamento: o Projeto de Conservação e Utilização Sustentável da Diversidade Biológica Brasileira (PROBIO), que é um projeto de financiamento governamental e o Fundo Brasileiro para a Biodiversidade (FUNBIO), um fundo privado (ALBAGLI, 1998). O PROBIO8 tem por objetivos identificar ações prioritárias e estimular a elaboração de subprojetos que promovam parcerias entre os setores públicos e privados, gerando e divulgando informações e conhecimentos sobre biodiversidade. O FUNBIO9, por sua vez, é o maior fundo de 7 A UICN (em inglês IUCN – International Union for Conservation of Nature) é uma organização internacional que congrega instituições governamentais e não-governamentais e cientistas voluntários para ajudar o mundo a encontrar soluções pragmáticas para as pressões ambientais. Foi fundada em 1948 como a primeira organização ambiental global do mundo. Sua missão é influenciar, encorajar e auxiliar as sociedades do mundo inteiro a conservar a integridade e diversidade da natureza e garantir que qualquer uso dos recursos naturais seja justo e ecologicamente sustentável (IUCN, 2009). 8 O PROBIO é um projeto de governo criado em 1996, coordenado pelo MMA, com os objetivos de auxiliar o governo a iniciar um programa para a conservação e o uso sustentável da biodiversidade, identificando ações prioritárias; estimular o desenvolvimento de subprojetos demonstrativos e disseminar informações sobre biodiversidade (ALBAGLI, 1998). 9 O FUNBIO tem como objetivo principal estabelecer-se como mecanismo financeiro de longo prazo para o apoio a projetos de conservação e uso sustentável da diversidade biológica no Brasil (ALBAGLI, 1998). 24 biodiversidade já estabelecido em qualquer país e é o primeiro entre os fundos de biodiversidade a integrar completamente o setor privado (ALBAGLI, 1998; CDB, 2009). Ainda assim pouco foi feito sobre as espécies exóticas presentes no Brasil e apenas em 2001 o Brasil realizou discussão, coordenada pelo GISP, sobre o tema com a promoção da Reunião de Trabalho sobre Espécies Exóticas Invasoras, que resultou na Declaração de Brasília (Anexo). O evento foi realizado pelo Governo Brasileiro, por meio de parceria entre o Ministério do Meio Ambiente (MMA) e a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA) e contou com a participação doas países da América do Sul. A reunião contou ainda com a colaboração do Governo dos Estados Unidos da América, por meio do Departamento de Estado e da Embaixada dos Estados Unidos da América no Brasil, além de apoio do GISP (IBAMA, 2006:5). Na Declaração de Brasília, representantes da Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Equador, Guiana Francesa, Paraguai, Peru, Suriname, Uruguai e Venezuela, reconheceram que as espécies exóticas invasoras constituem uma das principais ameaças à biodiversidade e aos ecossistemas naturais, além dos riscos à saúde humana. No mesmo ano o MMA lançou, por meio do PROBIO e em parceria com o Fundo Nacional do Meio Ambiente (FNMA), um edital com o objetivo de selecionar projetos voltados ao manejo de espécies ameaçadas de extinção ou o controle de espécies invasoras (IBAMA, 2006). Em 2003 o MMA decidiu elaborar o “Primeiro Informe Nacional sobre Espécies Exóticas Invasoras” por intermédio do PROBIO. Para tanto, o PROBIO lançou uma carta consulta para a seleção de 5 subprojetos visando a produção de informes sobre as espécies exóticas invasoras (MMA, 2009). O objetivo desta proposta, ainda não oficialmente publicado, é sistematizar e divulgar a informação existente sobre o tema. Neste mesmo ano foi criada, através do Decreto nº. 4.703, a Comissão Nacional de Biodiversidade (CONABIO), com a finalidade de coordenar, acompanhar e avaliar as ações do PRONABIO. Tem como competência, entre outras, coordenar a elaboração da Política Nacional da Biodiversidade, e promover a implementação dos compromissos assumidos pelo Brasil junto a CDB (CDB, 2009). Na I Conferência Nacional de Meio Ambiente, realizada em 2003, existe somente uma deliberação que diz respeito à restrição e controle da entrada de espécies exóticas no Brasil, bem como a transferência de espécies entre os biomas brasileiros (FERREIRA et al., 2005). 25 Neste ano ainda, o Instituto Hórus e a The Nature Conservancy iniciaram, no Brasil, um levantamento das espécies exóticas invasoras presentes. Em 2004, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) incluiu as espécies exóticas invasoras no cálculo dos indicadores de desenvolvimento sustentável (dimensão ambiental – biodiversidade). “A construção de indicadores de desenvolvimento sustentável no Brasil integra-se ao conjunto de esforços internacionais para concretização das idéias e princípios formulados na Agenda 21” (IBGE, 2004), com o objetivo de acompanhar a sustentabilidade do padrão de desenvolvimento brasileiro, considerando aspectos ambientais, sociais, econômicos e institucionais. Foi realizado, em outubro de 2005, o I Simpósio Brasileiro sobre Espécies Exóticas Invasoras, em Brasília (DF), pelo MMA e Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), em parceria com a Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ), a EMBRAPA, a Universidade Federal de Viçosa (UFV), o Instituto Oceanográfico da USP (Universidade de São Paulo) e o Instituto Hórus (IBAMA, 2006). O Simpósio contou com a participação de representantes de oito países: África do Sul, Argentina, Brasil, Estados Unidos, Havaí, Jamaica, Nova Zelândia e Portugal. Vários temas foram abordados, destacando-se a legislação nacional e a regulamentação do uso de espécies de valor econômico; prioridades para financiamento; sensibilização e educação; controle e monitoramento e análise de risco, prevenção e detecção precoce. As discussões resultaram em recomendações específicas para o MMA e para o IBAMA que ainda estão sendo analisadas e avaliadas com vistas à sua implementação (BRASIL, 2008; IBAMA, 2006). Neste mesmo evento foi proposta pela então Ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, a criação, no âmbito da CONABIO (Comissão Nacional de Biodiversidade), de uma Câmara Técnica Permanente sobre Espécies Exóticas Invasoras. Percebeu-se necessária a criação desta câmara em razão dos resultados do Seminário, dos compromissos assumidos pelo Brasil no âmbito da CDB e da legislação brasileira que trata sobre as invasões biológicas (IBAMA, 2006). A câmara está em fase de deliberação pela CONABIO (BRASIL, 2008). A Estratégia Nacional criada pelo Brasil para tratar as invasões biológicas “estabelece ações prioritárias a serem desenvolvidas e/ou apoiadas pelo Ministério do Meio Ambiente para o período de 2008 a 2011, com recomendações das estratégias, mecanismos de ação a serem empregados na prevenção, erradicação, mitigação e controle das espécies exóticas invasoras” (BRASIL, 2008). Quanto à legislação brasileira atualmente existente sobre as invasões biológicas, ainda são poucos os instrumentos aplicáveis ao tema. A disseminação de espécies exóticas está 26 enquadrada no art. 61 da Lei de Crimes Ambientais (Lei nº. 9.605, de 12/02/1998). De acordo com o Capítulo IV, art. 31, da lei nº. 9.985, de 18 de julho de 2000 (SNUC – Sistema Nacional de Unidades de Conservação), “é proibida a introdução nas Unidades de Conservação de espécies não autóctones (SNUC, 2003:25)”. O decreto nº. 4.339, de 22 de agosto de 2002, institui princípios e diretrizes para a implementação da Política Nacional da Biodiversidade, que trata sobre as espécies exóticas invasoras, estabelecendo que devem ser realizados inventários e mapeamentos sobre estas, bem como pesquisas para subsidiar sua prevenção, erradicação e controle. Também são contempladas ações efetivas de prevenção, controle e erradicação de espécies exóticas invasoras que possam afetar a biodiversidade. Para garantir que os objetivos da Política Nacional de Biodiversidade sejam implementados e também para suprir lacunas de gestão da biodiversidade do país, o MMA coordenou, entre 2004 e 2005, a formulação do PAN-Bio – Diretrizes e Prioridades do Plano de Ação para a Implementação da Política Nacional da Biodiversidade (MMA, 2009). O PAN-Bio estabelece, entre suas diretrizes e prioridades, que devem ser realizados estudos sobre o impacto de espécies-problema e o monitoramento e controle alfandegário para prevenção da introdução de novas espécies exóticas. Estabelece também que seja criado um programa nacional de monitoramento, controle e prevenção de espécies exóticas invasoras. Além disso, o PAN-Bio recomenda que sejam fomentadas atividades de recuperação de áreas e de domesticação, manejo e produção utilizando espécies nativas (PAN-Bio, 2006). O Ministério do Meio Ambiente (MMA) considera que as informações relacionadas à contaminação biológica ainda são incipientes. Com o objetivo de mudar esta realidade, o MMA, por meio da Diretoria do Programa Nacional de Conservação da Biodiversidade declarou o início, a partir de agora, de “um amplo e efetivo programa voltado às espécies exóticas invasoras” (BRASIL, 2008). Ainda de acordo com o MMA As ações deste programa envolvem, entre outras, atividades relativas à identificação e localização das principais espécies problemas no país; avaliação dos impactos ambientais e sócio-econômicos causados por estas espécies; levantamento dos projetos já realizados ou em andamento, em âmbito nacional; criação de mecanismos de controle, monitoramento, mitigação, prevenção e erradicação, inclusive com vistas a minimizar as introduções acidentais; definição de estratégias para ampliação das discussões sobre o tema; estabelecimento de prioridades para o período de 2005 a 2010; levantamento da legislação nacional sobre espécies exóticas invasoras, e proposição de revisão, se for o caso, ou elaboração de legislação específica; e organização de uma efetiva parceria entre os 27 setores governamental, não-governamental, acadêmico-científico e iniciativa privada. Este programa proporcionará uma melhor organização e divulgação dos trabalhos existentes e avanços nesta área, contribuindo para a capacitação dos órgãos competentes e progressos em pesquisa. Desta maneira será realizado mais efetivamente o controle e monitoramento dos impactos causados pela contaminação biológica. O MMA está realizando também o levantamento de informações relacionadas aos aspectos legais das invasões biológicas. Como evidenciado ao longo dos últimos anos, tem sido notado um aumento na preocupação acerca das espécies exóticas invasoras (HOWARD, 2004). Em função das rápidas mudanças impostas pelo homem ao ambiente, os estudos versando sobre este tema vêm sendo considerados da mais alta prioridade (LORINI, 1996). Entretanto, no Brasil, as informações sobre invasões biológicas são ainda escassas (AZEVEDO e ARAÚJO, 2005; BLUM et al., 2005; BRASIL, 2008). Martins et al. (2004) argumentam que existem poucos estudos sobre espécies exóticas em áreas protegidas porque os impactos são lentos no longo prazo e pouco evidentes nas fases iniciais. Almejando a conservação da biodiversidade mundial foram criadas áreas protegidas que, de acordo com o artigo II da CDB, são áreas definidas geograficamente que são destinadas, ou regulamentadas, e administradas para alcançar objetivos específicos de conservação (CDB, 2000). Atualmente, as unidades de conservação10 são as principais ferramentas disponíveis na tentativa de se preservar espécies, ecossistemas e paisagens para que continuem a existir no futuro (GATTI et al., 2005). No entanto, a invasão por espécies exóticas representa um grave problema para o funcionamento dos ecossistemas e ameaça a diversidade biológica em diferentes unidades de conservação, como mostrado por diversos estudos (ABREU, 2008; CORDEIRO e RODRIGUES, 2005; FERREIRA et al., 2005; GATTI et al., 2005; GOMES e MAGALHÃES, 2005; INSTITUTO HÓRUS, 2008; MARTINS et al., 2004; MENEZES, 2006; PEREIRA, 2006; RIBEIRO, 2006; RODOLFO et al., 2007; SANCHES et al., 2007; SANTOS et al., 2005b; SILVA e FILGUEIRAS, 2003; ZANCHETTA e DINIZ, 2006). 10 O artigo 2º da Lei nº 9.985, de 18 de julho de 2000, define unidade de conservação como Espaço territorial e seus recursos ambientais, incluindo as águas jurisdicionais, com características naturais relevantes, legalmente instituído pelo Poder Público, com objetivos de conservação e limites definidos, sob regime especial de administração, ao qual se aplicam garantias adequadas de proteção (SNUC, 2003:9). 28 3. OBJETIVOS A presente dissertação tem como objetivo principal determinar a ocorrência de espécies vegetais exóticas invasoras e avaliar metodologias de manejo visando estabelecer um conjunto de ações orientadas à gestão da contaminação biológica por espécies vegetais exóticas no Parque Nacional da Serra dos Órgãos, Rio de Janeiro, Brasil. Como objetivos específicos pretendeu-se: 1. Identificar as espécies vegetais exóticas que ocorrem no Parque Nacional da Serra dos Órgãos, inferindo sobre os processos de invasão; 2. Realizar o levantamento da estrutura populacional das espécies exóticas encontradas, bem como outras características ecológicas relevantes; 3. Estudar os padrões de ocupação do espaço pelas espécies, considerando aspectos microclimáticos; 4. Avaliar o impacto das espécies exóticas sobre as nativas a partir das informações levantadas e determinar as espécies mais agressivas; 5. Conduzir experimentos de campo para o manejo das espécies mais agressivas a fim de levantar informações sobre seu controle em ambientes naturais; 6. Propor ações de manejo das áreas com espécies invasoras. Os resultados obtidos neste trabalho são apresentados em dois capítulos. O primeiro capítulo faz um diagnóstico da contaminação biológica do Parque Nacional da Serra dos Órgãos. Nele são respondidos os quatro primeiros objetivos específicos. Procurou-se, neste capítulo, conhecer o estado do Parque Nacional da Serra dos Órgãos em relação às invasões biológicas. Saber quais espécies exóticas estão presentes, entender os padrões de ocupação do ambiente apresentados por estas e como elas afetam a biota nativa. No segundo capítulo investigou-se as técnicas de manejo mais apropriadas ao controle populacional das espécies invasoras que causam maiores problemas à biodiversidade no Parque Nacional da Serra dos Órgãos, visando gerar informações que permitam realizar a adequada gestão das invasões biológicas na área de estudo. 29 4. ÁREA DE ESTUDOS: O PARQUE NACIONAL DA SERRA DOS ÓRGÃOS Embora eu tenha visto em outras partes do Brasil muitas e variadas florestas primitivas, nenhuma me pareceu mais bela e mais amena do que aquelas que, perto da cidade do Rio de Janeiro e recobrindo as encostas dos montes, recebem o nome de Serra do Mar [Serra dos Órgãos](...) Estas florestas me agradaram muito mais que as outras e ficaram para sempre gravadas no meu espírito, não só porque fossem primitivas e, com isso, um presente para os meus olhos espantados, mas na verdade porque excedem em beleza e suavidade. K.F. von Martius, Botânico alemão, 1817 Figura 1 – Paisagem do Parque Nacional da Serra dos Órgãos – vista do Dedo de Deus. Foto: autor desconhecido. 30 A Serra dos Órgãos fascinou aqueles que chegaram ao Rio de Janeiro no início da colonização européia, como descrito pelo naturalista alemão Karl Friederiech von Martius. O relevo da serra (Figura 1) inspirou seu nome, dado em função da semelhança entre esta formação geológica com picos mais ou menos paralelos e os tubos de um órgão de igreja (CRONEMBERGER e VIVEIROS DE CASTRO, 2007). Terceiro Parque Nacional criado no país, o Parque Nacional da Serra dos Órgãos (PARNASO) foi criado através do Decreto-Lei nº 1822, em 30 de novembro de 1939. Esta Unidade de Conservação protege uma das mais importantes áreas de Mata Atlântica, reconhecida internacionalmente como Reserva da Biosfera e um dos cinco hotspots de biodiversidade mais ameaçados do planeta (CHIARELLO, 1999). O PARNASO pertence à primeira geração de parques nacionais do Brasil, que foram criados “como monumentos naturais para resguardar porções do território nacional que tivessem valor científico e estético”, como previa a Constituição de 1937 (CRONEMBERGER e VIVEIROS DE CASTRO, op. cit.). A beleza cênica dos maciços rochosos, proteção de mata primária e floresta pluvial montana, a riqueza da flora e da fauna e a contribuição para a manutenção climática da região são algumas características da Serra dos Órgãos que motivaram a criação do Parque Nacional da Serra dos Órgãos. Atualmente esta unidade de conservação tem como objetivos conservar e proteger a paisagem e a biodiversidade da Serra do Mar na região serrana do Estado do Rio de Janeiro, além de promover a pesquisa e a educação ambiental (ICMBIO, 2009). De acordo com Cronemberger e Viveiros de Castro (2007:14), a primeira sugestão de criação do Parque foi formulada pelo engenheiro Armando Vieira e publicada pelo Jornal do Commercio em 25 de setembro de 1938. A nota fala em Converter as cabeceiras dos rios que correm para a Baixada Fluminense, para Teresópolis e para o município de Petrópolis, abrangendo as montanhas elevadas e os picos altaneiros que dispunham com as Agulhas Negras de Itatiaia e os vértices agudos da Serra do Caparão, as primazias de pontos culminantes do Brasil, de onde se destacam o inconfundível Dedo de Deus, os Castelos do Açu, o Campo das Antas, num belíssimo parque nacional que nada ficaria devendo às mais adiantadas criações desse gênero. É interessante mencionar que o decreto de criação do Parque não determinava seus limites, dizendo que “a área do Parque seria fixada depois do indispensável reconhecimento e estudo da região feitos sob a orientação do Serviço Florestal”. O decreto apenas dizia que o 31 parque ocuparia terras dos municípios de Teresópolis, Petrópolis e Magé (na época, Guapimirim ainda não havia se emancipado de Magé). Apenas 45 anos depois, em 1984, o Decreto nº. 90.023 definiu os limites geográficos do Parque. Segundo o relato de Cronemberger e Viveiros de Castro (2007), este longo período sem a delimitação da área do Parque contribuiu para agravar os problemas fundiários e de ocupação humana, principalmente em algumas localidades como o Garrafão, em Guapimirim, e Bonfim, em Petrópolis. Os organizadores contam ainda que a implantação das estruturas físicas do Parque teve início na década de 1940, período em que o PARNASO dispunha de grandes recursos financeiros. Neste período foram construídos o prédio da administração, garagem, oficinas, depósitos, apartamentos e casas funcionais. As obras paisagísticas incluíram a construção da piscina natural, vias internas e jardins. O projeto arquitetônico e paisagístico tem a assinatura de Ângelo Murgel, cujos projetos recebiam predominantemente a influência do estilo moderno. Ângelo Murgel foi também o arquiteto responsável pelos projetos dos Parques Nacionais do Itatiaia e do Iguaçu. Até a década de 1950, o PARNASO era um cartão de visitas do Governo brasileiro, recebendo freqüentemente a visita de Embaixadores, Ministros de Estado e Presidentes. Dispondo de recursos que ultrapassavam a arrecadação do município de Teresópolis, o Parque chegou a ter cerca de 250 funcionários, incluindo extravagâncias como garçons de smoking nos abrigos que atendiam às autoridades que subiam a trilha do Sino em lombo de mulas. Um fato histórico importante para este estudo é a utilização de espécies exóticas no projeto paisagístico do Parque Nacional da Serra dos Órgãos (CRONEMBERGER e VIVEIROS DE CASTRO, 2007). Algumas espécies, portanto, foram introduzidas intencionalmente nos jardins e podem ter se alastrado pelo Parque, causando hoje em dia problemas para o manejo desta UC. O PARNASO está situado na região central do Estado do Rio de Janeiro, entre os paralelos 22°52’e 22°24’S e os meridianos 45°06’e 42°69’W (Figura 2), abrangendo os municípios de Teresópolis, Petrópolis, Magé e Guapimirim. A Serra dos Órgãos está inserida no chamado Bloco da Região Serrana Central, compondo um dos cinco blocos de remanescentes florestais do Estado do Rio de Janeiro (ROCHA et al., 2003). Associado a outras 21 unidades de conservação, o PARNASO integra o Mosaico da Mata Atlântica Central Fluminense, uma das áreas com maior concentração de endemismo e de espécies ameaçadas no hotspot Mata Atlântica. 32 TERESÓPOLIS PETRÓPOLIS MAGÉ GUAPIMIRIM Figura 2 – Localização do Parque Nacional da Serra dos Órgãos em relação ao Rio de Janeiro e ao Brasil (adaptado de IBAMA, 2009). 33 O PARNASO teve sua área ampliada pelo Decreto assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 13 de setembro de 2008, que altera a redação dos artigos 1º, 2º, 3º e 4 do Decreto nº. 90.023, de 2 de agosto de 1984. O Parque agora totaliza 20.050 hectares que protegem florestas de encosta e campos de altitude (Figura 3). A grande e brusca variação de altitude criou ambientes únicos de grande diversidade biológica. De acordo com Veloso (1945) e Bernardes (1952 apud ALVES, 2007) o clima da região da Serra dos Órgãos é classificado como Cfb segundo Köppen, onde predominam condições mesotérmicas com verões amenos e invernos frescos e não há uma estação seca definida. Entretanto, Davis (1945) e Rizzini (1954) argumentam que junho, julho e agosto são meses secos e marcam uma nítida estação seca e fria. Os valores médios anuais para temperatura variam entre 13° e 23°C, sendo que nas cotas superiores a 800 m os termômetros não ultrapassam os 19°C. A distribuição mensal de temperatura no PARNASO pode ser observada (Figura 4) pelos dados coletados durante o período de 1944 a 1952 (RIZZINI, 1954) na estação meteorológica que funcionou na sede Teresópolis de 1943 a 1970 (Figura 5). No inverno, as temperaturas mínimas são baixas, chegando a 1°C em julho e agosto e nas partes altas da serra a temperatura cai a -5°C (CRONEMBERGER e VIVEIROS DE CASTRO, 2007). É freqüente a ocorrência de névoa com chuvas persistentes, devido à interceptação de frentes frias vindas do sul. As chuvas nesta região são principalmente orográficas e apresentam distribuição sazonal, concentrando-se nos meses de verão, com período de seca no inverno. A pluviosidade da região da Serra dos Órgãos é a mais elevada do estado do Rio de Janeiro em função das chuvas provocadas pela presença da Serra do Mar (CRONEMBERGER e VIVEIROS DE CASTRO, 2007). As médias de precipitação pluviométrica variam entre 1500 e 3000 mm anuais e a distribuição mensal durante o período de 1944 a 1952 pode ser observada na figura 6. Os dados mensais de pluviosidade foram também coletados pela antiga estação meteorológica da sede Teresópolis. Estes dados mostram que existe um período de seca na área do Parque durante os meses de inverno e não há déficit hídrico. A umidade relativa do ar média é de cerca de 90% e geadas podem ocorrer nos meses de inverno, especialmente nas partes mais altas (ICMBIO, 2009; RIZZINI, 1954). Há diferenças entre as vertentes da serra, sendo as vertentes voltadas para o oceano mais úmidas que aquelas voltadas para o norte e oeste (CRONEMBERGER e VIVEIROS DE CASTRO, 2007). 34 35 Figura 4 – Distribuição mensal da temperatura no Parque Nacional da Serra dos Órgãos. Figura 5 – Antiga estação meteorológica que funcionou na sede Teresópolis do Parque Nacional da Serra dos Órgãos. Foto: Acervo PARNASO. ppt (mm) 36 500 450 400 350 300 250 200 150 100 50 0 Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez Meses Figura 6 – Distribuição mensal das chuvas no Parque Nacional da Serra dos Órgãos. Quanto à hidrografia, o PARNASO protege importantes mananciais que drenam para as duas principais bacias hidrográficas fluminenses: a do Paraíba do Sul e a da Baía de Guanabara (ICMBIO, 2009). As encostas do Parque orientadas para o sul, que incluem os rios Soberbo, Bananal, Sossego, Inhomirim, Santo Aleixo, Iconha e Corujas, drenam para a Baía de Guanabara. Já as encostas voltadas para norte drenam para o Rio Paraíba do Sul através dos rios Beija-Flor, Paquequer, Jacó, Bonfim, Córrego Bento, Ponte de Ferro e Itamarati (CRONEMBERGER e VIVEIROS DE CASTRO, 2007). A intensa precipitação no verão gera distúrbios naturais importantes na dinâmica do ecossistema local. Durante chuvas torrenciais, formam-se rios temporários e o volume dos rios perenes é aumentado. O volume dos rios aumenta de forma rápida também nos verões chuvosos, gerando o fenômeno conhecido por cabeça-d’água ou tromba d’água, principalmente no rio Soberbo (ALVES, 2007). Os movimentos de massa, especialmente os de escorregamento, também são comuns na área do Parque em decorrência das chuvas intensas. É importante mencionar a importância que o Parque Nacional da Serra dos Órgãos tem na proteção dos mananciais de abastecimento da região de entorno e na estabilidade climática, beneficiando quase 700.000 habitantes. O PARNASO apresenta relevo montanhoso, formado por escarpas e reversos da Serra do Mar, denominado “frente dissecada do bloco falhado”. As declividades são acentuadas (quase 50% da área apresenta declive superior a 30°), com uma grande variação altitudinal em uma área relativamente pequena, sendo que as cotas mais elevadas predominam na parte central do Parque, a área mais alta de toda a Serra do Mar (CRONEMBERGER e VIVEIROS DE CASTRO, 2007). Os limites altitudinais variam entre 200 m e 2.263 m na Pedra do Sino, 37 ponto culminante da Serra dos Órgãos. A maior parte da área do Parque é formada por vales profundos e encaixados, que se opõe ao relevo quase plano dos Campos de Altitude (IBDF/FBCN, 1980 apud ALVES, 2007). O PARNASO está inserido numa área pertencente ao sistema orográfico da Serra do Mar, caracterizado, segundo Amador (1997 apud CRONEMBERGER e VIVEIROS DE CASTRO, 2007), pela presença de gnaisses granitóides do período pré-cambriano. As formas das montanhas da Serra dos Órgãos são produto da grande resistência das rochas graníticas à erosão. Uma grande diversidade de classes de solos ocorre no Parque, sendo os Latossolos o grupo que cobre a maior parte da área. Tipos de solo pertencentes a esta classe e que ocorrem no PARNASO são o Latossolo Amarelo, Latossolo Vermelho-Amarelo e o Latossolo Vermelho. O Litossolo se restringe a pequenas áreas de maiores altitudes e os solos hidromórficos ocorrem nas regiões mais baixas, próximas a cursos d’água (ICMBIO, 2009). A área do Parque está inserida no Bioma Mata Atlântica, apresentando como formações vegetacionais Florestas Ombrófilas Densas Submontana, Montana e Altomontana e os Refúgios Ecológicos Altomontana (campos de altitude). A Floresta Ombrófila Densa Submontana ocorre entre 50 e 500 m de altitude e caracteriza-se por uma estrutura essencialmente fanerofítica, com a ocorrência de caméfitas, epítitas e lianas (ALVES, 2007). Ocorrem também espécies como Euterpe edulis (palmeira juçara), Dicksonia sellowiana (samambaiaçu), Byrsonima crassifolia (murici), Talauma ovata (baguaçu), e Cecropia sp. (embaúba). Esta formação está associada a solos profundos e bem drenados e o dossel alcança entre 15 e 20 m de altura. De acordo com Cronemberger e Viveiros de Castro (2007) esta fisionomia apresenta, normalmente, somente o estrato arbóreo e o interior da floresta é composto por densa vegetação, mas sem definição de estratos. A camada de serrapilheira costuma ser fina e, consequentemente, durante o período seco fica ressecado. A Floresta Ombrófila Densa Montana é a formação vegetacional que ocorre entre 500 e 1500 m de altitude e é predominante no PARNASO (ICMBIO, 2009). Esta formação é a possui maior estratificação vertical entre as fisionomias da Mata Atlântica. Relacionada a solos profundos de rochas cristalinas decompostas, esta fisionomia apresenta árvores de até 40 metros de altura e o dossel fica entre 25 e 30 m. O estrato arbóreo é dominado por grandes árvores, como Cariniana legalis (jequitibá-rosa), Sloanea sp. (ouriceiro), e Vochysia oppugnata (canela-santa). Os troncos e os galhos das árvores são cobertos de epífitas, além de lianas, begônias, aráceas e samambaias. O estrato herbáceo é povoado por begônias, orquídeas, bromélias e gramíneas (ICMBIO, 2009). 38 Na faixa altitudinal que vai de 1500 a 1800 metros ocorre a Floresta Ombrófila Densa Altomontana. São matas nebulares, que ocorrem em áreas que frequentemente são encobertas por nuvens. A vegetação é caracterizada por árvores de troncos tortuosos e cobertos por musgos e epífitas, de pequeno porte, com altura entre 5 e 10 m (CRONEMBERGER e VIVEIROS DE CASTRO, 2007). Acima de 1800 m de altitude, a floresta é substituída pelos Campos de Altitude, uma vegetação baixa e aberta, de porte herbáceo-arbustivo. Esta vegetação está associada a áreas com solos rasos, e radiação solar intensa. Devido ao baixo aporte de matéria orgânica em virtude da grande elevação, a vegetação tem aspecto seco. Nas áreas mais declivosas e expostas a ventos e chuva a rocha é nua e quase não há cobertura vegetal. Ocorrem apenas pequenas manchas dominadas por Velloziaceae e Amaryllidaceae (CRONEMBERGER e VIVEIROS DE CASTRO, op. cit.). Rizzini (1954), no seu estudo Flora Organensis, identificou 2.003 espécies de plantas no PARNASO, sendo 1.220 dicotiledôneas, 352 monocotiledôneas, 284 pteridófitas e 147 briófitas. Muitas espécies são endêmicas (especialmente as que ocorrem nos campos de altitude) ou estão sob algum tipo de ameaça (CRONEMBERGER e VIVEIROS DE CASTRO, 2007). Já em relação à fauna do Parque, já foram registradas 462 espécies de aves, 83 de mamíferos, 102 de anfíbios, 82 de répteis e 6 de peixes. De acordo com dados publicados por Lewinsohn (2006), as espécies de vertebrados terrestres registradas no Parque correspondem a 20% do total de espécies desse grupo existentes no Brasil em uma área que corresponde a 0,00125% do território nacional. A grande diversidade de espécies encontrada no Parque pode ser explicada pela existência de diversos habitats, formados pela variação nas condições climáticas, tipos de solo e formações vegetacionais (CRONEMBERGER e VIVEIROS DE CASTRO, 2007). Muitas das espécies da fauna encontradas no PARNASO são raras, endêmicas ou estão ameaçadas de extinção. 28 das 83 espécies de mamíferos constam nas listas oficiais de espécies ameaçadas de extinção, bem como 51 espécies de aves e 16 de anfíbios. Das 217 espécies endêmicas da Mata Atlântica, 143 ocorrem na área do Parque. A área do PARNAO é dividida em três setores – Teresópolis, Guapimirim e Petrópolis – e em zonas, de acordo com o uso permitido em cada área. O zoneamento de uma unidade de conservação busca, desta forma, a ordenação de seu território, levando em consideração as fragilidades e potencialidades de cada ambiente. De acordo com Galante et al. (apud 39 CUNHA, 2004), estas zonas refletem o grau de preservação, proteção e representatividade da biodiversidade. O artigo 2° do SNUC dispõe que o zoneamento é a Definição de setores ou zonas em uma unidade de conservação com objetivos de manejo e normas específicos, com o propósito de proporcionar os meios e as condições para que todos os objetivos da unidade possam ser alcançados de forma harmônica e eficaz (SNUC, 2003:10). O zoneamento do PARNASO foi revisto durante os trabalhos de elaboração do novo plano de manejo e será descrito a seguir, com o mapa de zoneamento (Figura 7) e a caracterização de cada zona. As informações foram retiradas do novo plano de manejo do PARNASO (VIVEIROS DE CASTRO, 2008). Zona Intangível: é aquela que represente o mais alto grau de preservação, onde a primitividade da natureza permanece o mais preservada possível, não se tolerando quaisquer alterações humanas. Funciona como matriz de repovoamento de ouras zonas onde já são permitidas atividades humanas regulamentadas. Essa zona é dedicada à proteção integral de ecossistemas, dos recursos genéticos e ao monitoramento ambiental. O seu objetivo básico de manejo é a preservação, garantindo a evolução natural. Zona Primitiva: é aquela onde tenha ocorrido pequena ou mínima intervenção humana, contendo espécies da flora e da fauna ou fenômenos naturais de grande valor científico. Deve possuir características de transição entre a Zona Intangível e a Zona de Uso Extensivo. O objetivo geral do manejo desta zona é a preservação do ambiente natural e ao mesmo tempo facilitar as atividades de pesquisa científica, conscientização ambiental e formas primitivas de recreação. Zona de Uso Extensivo: é aquela constituída em sua maior parte por áreas naturais, podendo apresentar algumas alterações humanas. Caracteriza-se como uma transição entre a zona Primitiva e a Zona de Uso Intensivo. O seu objetivo é a manutenção de um ambiente natural com mínimo impacto humano, apesar de oferecer acesso e facilidade públicos para fins educativos e recreativos. Zona de Uso Intensivo: é aquela constituída por áreas naturais ou alteradas pelo homem. O ambiente é mantido o mais próximo possível do natural, podendo conter: centro de visitantes, museus, outras facilidades e serviços. O objetivo geral do seu 40 manejo é facilitar a recreação intensiva e a conscientização ambiental em harmonia com o ambiente natural. Zona Histórico-Cultural: é aquela onde são encontradas amostras do patrimônio histórico-cultural ou arqueo-paleontológico, que serão preservadas, estudadas, restauradas e interpretadas para o público, servindo à pesquisa, conscientização ambiental e ao uso científico. Seus objetivos incluem preservar as manifestações históricas e culturais para pesquisas, estudos, conscientização ambiental e interpretação e proteger sítios históricos ou arqueológicos, em harmonia com o meio ambiente. Zona de Recuperação: é aquela que contém áreas consideravelmente antropizadas. Zona provisória que, uma vez restaurada, será incorporada novamente a uma das categorias de zonas permanentes. As espécies exóticas introduzidas deverão ser removidas e a restauração deverá ser natural ou naturalmente induzida. Esta zona permite o uso público somente para a realização de atividades de conscientização ambiental. O objetivo geral do manejo desta zona é deter a degradação dos recursos e/ou recuperar as áreas. Zona de Uso Especial: é aquela que contém as áreas necessárias à administração, manutenção e serviços da unidade de conservação, abrangendo habitações, oficinas e outros. Estas áreas serão escolhidas controladas de forma a não conflitarem com seu caráter natural e devem localizar-se, sempre que possível, na periferia da unidade de conservação. O objetivo geral de manejo é minimizar o impacto da implantação das estruturas ou dos efeitos das obras no ambiente natural ou cultural da UC. Zona de Uso Conflitante: constituem-se em espaços localizados dentro de uma unidade de conservação, cujos usos e finalidades, estabelecidos antes da criação da unidade, conflitam com os objetivos de conservação da área protegida. São áreas ocupadas por empreendimentos de utilidade pública, como gasodutos, oleodutos, linhas de transmissão, antenas, captação de água, barragens, estradas, cabos óticos e outros. O objetivo geral de manejo é minimizar o impacto causado pelos empreendimentos no ambiente natural ou cultural da UC. Zona de Ocupação Temporária: são áreas dentro das unidades de conservação onde ocorrem concentrações de populações humanas residentes e as respectivas áreas de uso. Zona provisória, uma vez realocada a população, será incorporada a uma das zonas permanentes. Os objetivos gerais de manejo são garantir a integridade das áreas não regularizadas e ainda ocupadas dentro da unidade de conservação. 41 42 Este estudo foi realizado no trecho da Zona de Uso Intensivo da sede Teresópolis. A área amostral compreendeu a mata localizada no eixo da Estrada da Barragem (Figura 8). Esta área é localizada na periferia da unidade de conservação, concentra a visitação e administração do Parque. Devido ao grande fluxo de pessoas e veículos e à localização no limite da unidade, fazendo borda com a cidade de Teresópolis, esta área funciona como entrada para espécies exóticas que podem se tornar invasoras e de lá alcançar outras áreas da unidade de conservação. Figura 8 – Estrada da Barragem, Parque Nacional da Serra dos Órgãos, RJ. Foto: Michelle Ribeiro. CAPÍTULO I IDENTIFICAÇÃO E DIAGNÓSTICO DAS ESPÉCIES EXÓTICAS 44 1. Introdução Qualquer ação para gestão de uma espécie exótica deve ser baseada em estudos prévios sobre aspectos ecológicos e populacionais destas espécies. Somente desta forma podese conseguir sucesso na gestão, através do controle mais efetivo e menos impactante do ponto de vista ecológico. Do contrário, a situação de degradação do ambiente pode ser agravada. O primeiro passo deve ser a identificação das espécies exóticas que ocorrem na área de estudo. Os atributos de uma comunidade, como o número de espécies e suas abundâncias, são medidas que refletem as características do habitat e as interações entre as espécies que o compõe (HUTCHINSON, 1959; MARTINS, 1987; PINTO-COELHO, 2000). O número de espécies exóticas pode, seguindo este raciocínio, fornecer idéia do grau de perturbação sofrido pela floresta. Estudos sobre a estrutura das populações de uma comunidade permitem detectar como as espécies presentes se relacionam (CAMACHO et al., 2005; PINTOCOELHO, 2000). Desta forma, podem-se identificar desequilíbrios e verificar se uma espécie exótica presente significa uma ameaça caso ela esteja exercendo algum tipo de dominância sobre as nativas. A estrutura da comunidade vegetal leva também à compreensão dos fatores que regulam as comunidades. Neste sentido, é importante que seja dito que os padrões de ocupação do ambiente pelas espécies, sejam nativas ou exóticas, podem ser explicados também pelas condições ambientais da área, além de outros fatores. Harper (1987), diz que para entender a distribuição e a abundância de uma espécie no espaço é necessário conhecer, além de outros fatores, os efeitos das condições ambientais sobre suas populações. As condições ambientais são fatores (temperatura, umidade relativa do ar, salinidade, entre outros) que influenciam o funcionamento dos organismos vivos (LIMA-RIBEIRO et al., 2007; BEGON et al., 2006) e podem atuar como fatores limitantes que controlam a distribuição ou a sobrevivência de uma espécie, como expresso nas leis do mínimo de Liebig11 e da Tolerância de Shelford12. 11 Lei do Mínimo de Liebig (1840): o crescimento dos vegetais é limitado pelo elemento cuja concentração é inferior a um valor mínimo, abaixo do qual as sínteses não podem mais fazer-se. Essa lei foi ampliada e hoje fala-se em Fator Limitante: um fator ecológico desempenha papel de fator limitante quando está ausente ou reduzido, abaixo de um mínimo crítico ou se excede o nível máximo tolerável. Torna difícil a sobrevivência, o crescimento ou a reprodução de uma espécie (ARANTES, 2008; ASSIS, 2005; KREUS et al., 1995; MALAVOLTA, 2006). 12 Lei da Tolerância de Shelford (1911): cada espécie apresenta em função dos diversos fatores ecológicos, limites de tolerância, dentro dos quais sua existência é possível. Entre os limites superior e inferior da faixa de tolerância aos fatores ecológicos situa-se o ótimo ecológico das espécies, que são as condições em que a espécie apresenta um melhor desenvolvimento (FIRKOWSKI, 1991; SILVA e SCHRAMM, 1997). 45 São considerados como os fatores ambientais mais importantes à limitação da distribuição dos organismos, a temperatura, luz e presença de água, que pode ser expressa de modos diversos como umidade relativa do ar ou do solo. Diversos autores relatam ser a temperatura, individualmente, a condição mais importante aos seres vivos e existe uma relação bastante estreita entre esta e a umidade relativa do ar (BEGON et al., 2006; CAIRES et al., 2008; HICKEL et al., 2007; OKAMOTO et al., 2006). As diferentes espécies de organismos se diferenciam segundo suas preferências e tolerâncias térmicas, expressando seu grau de adaptação em um ambiente. A temperatura pode determinar a distribuição e, ao mesmo tempo, limitar as atividades dos organismos (MACIEIRA e PRONI, 2004). Já a umidade relativa determina as taxas de perda de água pelos organismos. Embora muitos processos físicos e biológicos sejam acelerados em temperaturas mais altas, o estresse de água também aumenta com a temperatura e muitos tipos de organismos não podem sobreviver a temperaturas maiores que 45°C (MACIEIRA e PRONI, 2004; RICKLEFS, 2003). Em relação à luminosidade, pode-se dizer que toda a energia da vida vem da luz do sol, ou seja, especialmente para os vegetais, a incidência de luz também se torna um fator que condiciona a distribuição das espécies num ecossistema (RICKLEFS, 2003; SANTOS, 2007; SOUZA, 2005). As espécies vegetais são normalmente classificadas de acordo com sua tolerância à radiação solar. As espécies pioneiras, por exemplo, necessitam de intensa luminosidade para se desenvolver enquanto as espécies climácicas só germinam em condições de terreno sombreado (MACIEL et al., 2003; SANTOS et al., 2004). Os organismos atuam em reciprocidade com o meio físico, sendo influenciados por ele e influenciando-o (PINTO-COELHO, 2000). Isto quer dizer que as variações microclimáticas são muito importantes nos estudos de ecologia de populações e comunidades, pois determinam os padrões de ocorrência das espécies no ambiente (BEGON et al., 2006; MACIEIRA e PRONI, 2004; TERBOGH, 1971). As condições microclimáticas de um ambiente determinam quais espécies são capazes de habitá-lo, em virtude de suas adaptações e tolerância. Os ambientes de bordas florestais apresentam condições em que muitas espécies climácicas, por exemplo, não conseguem se desenvolver por não tolerarem alta incidência luminosa. Os padrões de distribuição das espécies no ambiente podem dizer muito também sobre suas estratégias de dispersão e suas relações com as outras espécies da comunidade. O modo como os organismos se dispersam influenciam o arranjo espacial que mostram no ambiente afetam as formas com que eles interagem com seus vizinhos (BEGON et al., 2006; HARPER, 46 1987). A competição interespecífica, por exemplo, ocorre de formas e em intensidades diferentes se a espécie se distribui aleatoriamente ou em agregados. Neste capítulo serão apresentados resultados do levantamento das espécies vegetais invasoras que ocorrem no Parque Nacional da Serra dos Órgãos e discutidos os processos que permitiram ou provocaram a invasão. Posteriormente, serão determinadas as espécies exóticas que causam problemas à biodiversidade nas áreas de estudo, por meio da análise da estrutura populacional destas e a compreensão dos padrões de distribuição destas no ambiente, levando em consideração aspectos referentes às condições microclimáticas do meio. 2. Metodologia Dislich e colaboradores (2002), afirmam não existir ainda um consenso sobre métodos de quantificação do impacto causado pelas espécies exóticas invasoras. Entretanto, Parker e colaboradores (1999) indicam que três fatores devem ser considerados para se obter uma medida do grau de impacto: área total ocupada, abundância local e alguma medida do impacto por indivíduo. Como qualquer biomassa, espaço ou energia dominado pelo invasor significa recursos não mais disponíveis para as espécies nativas, a determinação de indicadores ecológicos, tais como abundância, cobertura espacial ou biomassa, que possam quantificar esse domínio torna-se extremamente importante para determinar o grau de impacto causado pela espécie invasora sobre a comunidade florestal nativa. Por esta razão foram levantadas informações como espécies exóticas que ocorrem na área de estudo, dados sobre estrutura populacional destas, sua distribuição no espaço e fatores microclimáticos que possam exercer influência sobre esta distribuição. Com este levantamento buscou-se entender o processo de invasão biológica no PARNASO e o impacto que as espécies exóticas causam no ecossistema nativo, a fim de atingir os objetivos especificados para este estudo. Foram então aplicados os métodos descritos a seguir. 2.1. Ocorrência de espécies exóticas A fim de identificar espécies exóticas que ocorrem no PARNASO foram realizados levantamentos bibliográficos buscando listas de espécies exóticas já registradas na área do 47 PARNASO. Por meio de consultas aos funcionários do Parque e pesquisadores foram também levantadas algumas espécies exóticas de ocorrência naquela área. Foram realizados também caminhamentos pela estrada da Barragem (Figura 1), um trecho da zona de uso intensivo na Sede Teresópolis, visando atingir a maior área possível com o objetivo de identificar espécies exóticas ainda não registradas para o PARNASO e confirmar a ocorrência das espécies listadas com base na literatura. Ademais, as espécies amostradas durante o levantamento de campo para estudo da estrutura da vegetação foram classificadas em nativas ou exóticas e estas, após identificação, foram também utilizadas para compor o quadro de espécies exóticas registradas na área. 2.2. Estrutura da vegetação e distribuição das espécies exóticas Para o estudo da estrutura das populações de espécies vegetais exóticas presentes em um trecho da zona de uso intensivo da sede Teresópolis do Parque Nacional da Serra dos Órgãos foi aplicado o método de parcelas com distribuição aleatória. Partindo do pressuposto que as invasões biológicas são iniciadas pelas bordas florestais e, posteriormente, as espécies exóticas se disseminam para o interior da floresta (PATON, 1994), foram alocadas, com auxílio de Sistema de Informação Geográfica (SIG PARNASO) do Parque e da Carta Topográfica de Teresópolis na escala de 1:25.000 (IBGE Folha SF.23-Z-B-II-3-SO / MI2716-3-SO), 30 parcelas de 10 x 10 m ao longo da Estrada da Barragem (Figura 2). Para tanto, a área escolhida para a realização do estudo (trecho de mata localizado ao longo da Estrada da Barragem) foi delimitada nos mapas e foi lançado um grid sobre esta, tendo sido sorteados os locais para delimitação das parcelas. Estas parcelas foram distribuídas por toda a extensão da estrada de modo a contemplar o gradiente borda-interior de mata com a finalidade de verificar a capacidade de invasão das espécies exóticas. Para tanto, as parcelas foram alocadas parcelas a 0, 20 e 40 m de distância da estrada, de acordo com a Figura 2. Estas distâncias foram definidas com base no estudo realizado por Laurance e Bierregaard (1997). Segundo estes autores, para vários fatores físicos, os efeitos de borda são sentidos até 100 m, sendo mais intensos nos primeiros 15 a 60 m. Essa distância média da borda em direção ao interior da floresta que será estudada tenta incluir os efeitos sentidos para vários aspectos, pois a largura da borda difere com a variável estudada (PRIMACK e RODRIGUES, 2002). 48 Legenda Estrada da Barragem Figura 1 Área de estudos: trecho da zona de uso intensivo do Parque Nacional da Serra dos Órgãos. Estrada da Barragem, Sede Teresópolis. Fonte Adaptado de Google. Localização Regional 49 50 Em cada parcela foram incluídos na amostragem todos os indivíduos de hábito arbóreo, arbustivo e herbáceo. Para o estrato arbustivo-arbóreo foram coletados dados como espécie e número de indivíduos em cada parcela dos indivíduos com CAP maior ou igual a 8 cm. Outras características importantes como indícios de herbivoria ou outro uso da espécie pela fauna (como abrigo, por exemplo) foram anotadas também. Para o levantamento de espécies herbáceas foram alocadas parcelas de 5 x 5 m no interior das parcelas fitossociológicas de 10 x 10 m. O modelo utilizado foi uma modificação do método de pontos descrito por Becker e Crockett (1973 apud Pellegrini et al., 2007). Foram distribuídos 100 pontos eqüidistantes dentro da parcela. O procedimento consiste em se fixar verticalmente uma vara no solo em cada um dos pontos de amostragem, registrandose todas as espécies tocadas pela vara, bem como o número de toques por espécie. Todas as espécies (arbóreas, arbustivas e herbáceas) que não puderam ser classificadas como nativas ou exóticas em campo tiveram amostras de material botânico coletado e herborizado segundo as técnicas descritas por Sylvestre e Rosa (2002) para posterior identificação em herbário. Para efeitos deste trabalho apenas foram identificadas em nível de espécie as espécies exóticas. Os espécimes amostrados nas parcelas de estudo da estrutura da comunidade vegetal foram agrupados segundo sua origem (nativas ou exóticas) para a realização das análises de estrutura. As análises dos dados incluíram os cálculos de parâmetros fitossociológicos (freqüência, densidade, vigor, índice de cobertura, índice de valor de importância), que foram comparados entre nativas e exóticas dentro de cada classe de distância de parcelas em relação à estrada e entre classes de distância para o grupo de exóticas. Diferenças entre a ocorrência de espécies exóticas no gradiente borda-interior de floresta foram testadas através da análise de variância seguida do teste de Tukey a 5% de probabilidade, depois de ter sido testada a normalidade dos dados coletados através do teste de Kolmogorov-Smirnov. Para analisar o padrão de distribuição espacial das espécies exóticas no ambiente foi aplicado o Índice de Dispersão de Morisita (Id) que teve sua significância testada através do teste F para significância do Id, de acordo com metodologia descrita por Antonini e NunesFreitas (2004). 51 2.3. Parâmetros microclimáticos Para verificar a existência de correlação entre características microclimáticas das áreas estudadas e a estrutura das populações das espécies exóticas encontradas neste estudo, que possam ter influência sobre os processos de invasão, foram coletados, nos sítios de estudo, dados de temperatura média, umidade relativa do ar, e grau de sombreamento através de taxas de cobertura do dossel. A coleta de dados foi realizada com o auxílio de um termo-higroanemômetro luxímetro digital (modelo THAL-300) para as variáveis temperatura e umidade relativa. Duas vezes por mês, nos meses de setembro e outubro, foram mensuradas as variáveis supracitadas nas parcelas de estudo durante o período da manhã e durante o período da tarde. Estas medições foram realizadas incluindo duas épocas distintas: o final da estação seca e o início da estação úmida. Para analisar a cobertura do dossel foi feita uma adaptação da metodologia proposta por Cortines (2008). Para tanto, foram tiradas fotografias do dossel da floresta com uma câmera digital posicionada a 1 m de altura em relação ao solo. Em cada parcela de estudo foi tirada uma fotografia em cada vértice e outra no centro. Com o auxílio do software Area Measure 2.1, foi calculado para cada foto o percentual ocupado pelas copas das árvores. Depois de testada a normalidade dos dados coletados através do teste de KolmogorovSmirnov, foram comparadas estatisticamente, através da análise de variância e teste de médias de Tukey, as médias de cada parâmetro a fim de detectar diferenças entre as classes de distância das parcelas alocadas em campo. No caso das variáveis cujos dados não tenderam a uma distribuição normal (dados expressos em percentual), procedeu-se a transformação logaritmo (x + 1), onde x é a variável analisada. Tendo sido detectadas diferenças significativas nas variáveis analisadas entre os sítios de estudo procedeu-se a análise de correlação linear simples de Pearson entre cada variável (temperatura, umidade relativa e cobertura do dossel) e a densidade de espécies exóticas a fim de verificar se existe relação entre estas nas parcelas de estudo. Foi realizada ainda a análise de regressão linear múltipla a fim de estimar como se dá a associação existente entre a densidade de espécies exóticas nos sítios de estudo e as variáveis microclimáticas mensuradas nestes. 52 3. Resultados e discussão 3.1. Ocorrência de espécies exóticas Foram registradas, no levantamento de campo, consultas aos administradores do Parque e bibliografia consultada (GATTI et al., 2005), 37 espécies pertencentes a 32 gêneros de 25 famílias. Destas, 19 (51,3%) foram listadas por Gatti et al (2005), 1 (2,7%) tiveram sua ocorrência indicada pela administração do Parque e 17 (46,0%) constituíram novas ocorrências amostradas neste estudo (Quadro 1). Cabe ressaltar que o trabalho de Gatti et al (2005) foi o único encontrado em que foi feito um levantamento das espécies exóticas presentes no PARNASO. Algumas espécies registradas pela literatura não tiveram sua ocorrência confirmada por este trabalho, pois não foram encontradas nas áreas amostradas. É o caso das espécies Citrus limon, Artocarpus heterophyllus, Pinus sp., Hydrangea macrophylla, Ficus pumila, Poa annua, Melinis minutiflora e Pteridium aquilinum. Isto não quer dizer que estas espécies não ocorram no Parque, apenas não foram encontradas nas áreas contempladas por este estudo. Estas espécies podem ocorrer em outras áreas do PARNASO, como por exemplo, foi relatada pela administração do Parque a presença de Pinus sp. na Trilha da Travessia e Hidrangea macrophylla nos arredores do Abrigo 4, na Trilha da Pedra do Sino. Em contrapartida, algumas espécies exóticas encontradas neste estudo ainda não haviam sido relatadas como de ocorrência no Parque Nacional da Serra dos Órgãos. São as espécies Citrus cf. reticulata, Citrus cf. sinensis, Syzygium cf. malaccense, Eucalyptus sp., Persea americana, Dracaena fragrans, Mangifera indica, Roystonia oleraceae, Euphorbia milii, Morus cf. nigra, Hibiscus cf. rosa-sinensis, Cordyline terminalis, Tradescantia pallida, Malvaviscus arboreus e Monstera deliciosa. Três das espécies exóticas encontradas por este estudo foram avistadas fora das áreas de amostragem (ver Quadro 1). É interessante destacar que algumas espécies registradas como exóticas pela literatura que deixavam dúvidas quanto sua origem, foram pesquisadas e classificadas como nativas, tendo sido, por este motivo, apesar de encontradas em campo, desconsideradas na lista organizada com base nos resultados das análises deste trabalho. 53 Quadro 1: Espécies exóticas vegetais encontradas no Parque Nacional da Serra dos Órgãos Forma biológica Arbórea Arbustiva Espécie Nome comum Família Origem Uso Principal Local onde a espécie foi encontrada Coordenadas UTM Encontrada por pinheiro-do-paraná Araucariaceae Brasil Produção de madeira - - Gatti et al., 2005 jaqueira Moraceae Índia e Malásia Frutífera - Gatti et al., 2005 Citrus cf. reticulata Blanco tangerina Rutaceae Sudeste asiático Frutífera Em frente ao Centro de Visitantes Citrus cf. sinensis (L.) Osbeck laranja Rutaceae Ásia Frutífera Citrus limon (L.) Burm. f. limão Rutaceae Sudeste asiático Frutífera No Poço do Castelo (cachoeira próxima à portaria) - Cupressus sp cedro Cupressaceae Ásia Ornamental Ao lado da casa do pesquisador Eriobotrya japonica (Thunb.) Lindl. nêspera Rosaceae Sudeste da China Frutífera No estacionamento Eucalyptus sp eucalipto Myrtaceae Austrália Produção de madeira Próximo à casa do pesquisador Mangifera indica L. mangueira Anacardiaceae Sul e sudeste asiático Frutífera No estacionamento Morus cf. nigra L. amoreira Moraceae China e Japão Frutífera No Poço do Castelo (cachoeira próxima à portaria) Persea americana Mill* abacate Lauraceae México Frutífera Nos jardins da sede Guapimirim 707279,19 E 7516088,99 S 707490,86 E 7516143,06 S 706062 E 7515457 S 707113,64 E 7516116,24 S 707113,64 E 7516116,24 S 707503,38 E 7516147,78 S 705567,35 E 7511090,90 S Pinus sp pinheiro Pinaceae Hemisfério norte Produção de madeira - - Roystonea oleracea (Jacq.) Cook palmeira-imperial Arecaceae América Central e Antilhas Ornamental No jardim de uma das casas funcionais (próxima ao Centro de Visitantes) Syzygium cf. malaccense (L.) Merr. & LM Perry.* jambo Myrtaceae Índia e Malásia Frutífera Nos jardins da sede Guapimirim Allamanda cf. schotti Pohl alamanda Apocynaceae Norte e Nordeste do Brasil Ornamental Calliandra sp** esponjinha Fabaceae - Ornamental Cordyline terminalis (L.) Kunth dracena-vermelha Liliaceae Índia, Malásia e Polinésia Ornamental 707256,09 E 7516135,05 S 705590,84 E 7511084,84 S 707395,72 E 7516133,44 S 707499,86 E 7516135,10 S Ruscaceae África Ornamental coroa-de-cristo Euphorbiaceae Madagascar Ornamental bico-de-papagaio Euphorbiaeceae México Ornamental hibisco Malvaceae Ásia Tropical Ornamental Próximo à piscina Hidrangea macrophylla (Thunb.) Ser. hortência Hydrangeaceae Ornamental - Malvaviscus arboreus Cav. hibisco Malvaceae Japão México e norte da América do Sul Ornamental Próximo à entrada da Trilha Primavera Musa sp bananeira Musaceae - Frutífera No jardim de uma das casas funcionais (próxima ao Centro de Visitantes) Yucca sp yuca Agavaceae Ornamental Atrás da pousada Rubus rosifolius Smith.** amora silvestre Rosaceae Frutífera - Araucaria angustifolia (Bert.) O. Kuntze** Artocarpus heterophyllus Lamk. Dracaena fragrans* (L.) Ker Gawl. Euphorbia milii Des Moul. Euphorbia pulcherrima Willd. ex Klotzsch Hibiscus cf. rosa-sinensis L. dracena América do Norte, Central e oeste da Índia Brasil – Mata Atlântica Em frente a uma das casas funcionais (próxima à portaria) Na portaria e na trilha para o Poço do Castelo Margeando a estrada da sede Guapimirim, próximo à portaria No jardim de uma das casas funcionais (próxima à portaria) e atrás da portaria. Aproximadamente à 200m da Trilha Primavera 707380,43 E 7516139,58 S 706798,93 E 7515918,55 S 707194,54 E 7516061,33 S 706804,94 E 7515935,49 S 707281,40 E 7516133,22 S 706316,81 E 7515215,09 S - Este estudo Este estudo Gatti et al., 2005 Gatti et al., 2005 e este estudo Gatti et al., 2005 e este estudo Este estudo Este estudo Este estudo Este estudo Administração do Parque Este estudo Este estudo Gatti et al., 2005 e este estudo Gatti et al., 2005 Este estudo Este estudo Este estudo Gatti et al., 2005 e este estudo Este estudo Gatti et al., 2005 Este estudo Gatti et al., 2005 e este estudo Gatti et al., 2005 e este estudo Gatti et al., 2005 54 Forma biológica Herbácea Espécie Nome comum Família Origem Uso Principal Local onde a espécie foi encontrada Coordenadas UTM Encontrada por Ficus pumila L. unha-de-gato Moraceae China, Japão e Austrália Ornamental - - Hedychium coronarium J. König lírio-do-brejo Zingiberaceae Ásia Tropical Ornamental Margeando toda a Estrada da Barragem - Impatiens cf. balsamina L. Impatiens walleriana Hook.f. Melinis minutiflora P. Beauv. beijinho beijinho capim-gordura Balsaminaceae Balsaminaceae Poaceae Ásia tropical África África Ornamental Ornamental Forrageira Monstera deliciosa Liebm. costela-de-adão Araceae México Ornamental - Poaceae Leste da Ásia Forrageira samambaia-do-campo Poaceae Poaceae Pteridófita Europa - Forrageira Forrageira Ornamental Margeando toda a Estrada da Barragem Ao lado do Centro de Visitantes e próximo à Trilha Primavera Próximo à casa do pesquisador e na portaria - trapoeraba-roxa Commelinaceae México Ornamental Na portaria 707255,36 E 7516123,96 S 707490,86 E 7516143,06 S 707499,86 E 7516135,10 S Gatti et al., 2005 Gatti et al., 2005 e este estudo Gatti et al., 2005 Este estudo Gatti et al., 2005 Pennisetum cf. villosum R. Vr. ex Fresen. Pennisetum sp Poa annua L. Pteridium aquilinum (L.) Kuhn. Tradescantia pallida (Rose) D.R. Hunt var. purpurea Boom Este estudo Este estudo Gatti et al., 2005 Gatti et al., 2005 Gatti et al., 2005 Este estudo *Espécies encontradas durante visita à Sede Guapimirim. Esta área não está incluída nos trabalhos de campo deste estudo, mas optou-se por registrar as espécies exóticas avistadas naquela região. **Espécies encontradas na literatura nas listagens de espécies exóticas, mas consideradas nativas neste estudo. 55 O levantamento de plantas exóticas no Parque Nacional da Serra dos Órgãos resultou no registro de 34 espécies, pertencentes a 24 famílias. Destas, 13 apresentam hábito arbóreo, 10 possuem hábito arbustivo e 11 são de hábito herbáceo. Com base apenas nos trabalhos de campo, foi registrada a ocorrência de 24 espécies diferentes de 20 famílias, sendo 10 espécies arbóreas, 9 arbustivas e 5 herbáceas. Araucaria angustifolia havia sido considerada exótica para a área, talvez por atualmente esta espécie estar restrita a poucos locais mais ao Sul do Brasil, mas estudos têm mostrado que sua distribuição anterior aos grandes ciclos de exploração era bastante ampla. Mesmo sendo uma espécie típica da Floresta Ombrófila Mista, o pinheiro-do-paraná ocorre em áreas de Floresta Estacional Semidecidual e Floresta Ombrófila Densa, bem como em refúgios da Serra do Mar e da Serra da Mantiqueira, tendo sido, inclusive, encontrados fósseis no nordeste brasileiro (IBGE, 1992). O mesmo ocorreu para a espécie Rubus rosifolius, nativa do sudeste brasileiro e de ocorrência natural na Mata Atlântica. De acordo com Lorenzi e colaboradores (2006), sua distribuição vai de Minas Gerais e Rio de Janeiro até o Rio Grande do sul. Já a espécie do gênero Calliandra (identificada na literatura apenas em nível de gênero) encontrada em campo foi identificada como Calliandra brevipes, que é originária do sudeste do Brasil, Uruguai e nordeste da Argentina (LORENZI E SOUZA, 2001), portanto, nativa. Com relação ao beijinho, na literatura havia sido identificada a espécie Impatiens balsamina. Entretanto, em campo a espécie encontrada foi identificada como Impatiens walleriana e não foram encontrados indivíduos da espécie I. balsamina. A maior parte das espécies exóticas encontradas (51%) são tradicionalmente utilizadas com fins paisagísticos (Figura 3). É provável que estas espécies tenham sido introduzidas no Parque em algum momento do passado como ornamentais, já que são amplamente cultivadas ao redor do mundo com este fim (LORENZI e SOUZA, 2001). O histórico do PARNASO (ver item Área de Estudo) confirma esta suposição, já que no projeto paisagístico do Parque, espécies exóticas foram largamente utilizadas na composição dos jardins. Outras espécies exóticas encontradas, notadamente as arbóreas, são frutíferas (30%). Estas introduções são explicadas por se acreditar, no passado, que o plantio de árvores frutíferas traria benefícios para a fauna do Parque, atraindo animais. 56 Figura 3 – Usos das espécies vegetais exóticas encontradas no Parque Nacional da Serra dos Órgãos, RJ Das espécies exóticas diagnosticadas no Parque, Hedychium coronarium (lírio-dobrejo) e Impatiens walleriana (beijinho) são as que ocorrem em maior freqüência nas áreas de estudo. Das 30 parcelas alocadas ao longo da estrada da Barragem, o beijinho foi encontrado em 1/3 das parcelas e o lírio-do-brejo em 1/6, todas localizadas na borda da mata. As demais espécies não foram encontradas no interior de nenhuma parcela alocada, tendo sido avistadas apenas durante o caminhamento pela Estrada da Barragem. Estas apresentaram populações compostas por poucos indivíduos isolados e não foram encontrados vestígios de recrutamento. É notório que o beijinho e o lírio-do-brejo são espécies exóticas invasoras e causam problemas à biodiversidade local em vista de suas elevadas freqüências. 3.2. Estrutura da vegetação 3.2.1. Estrato arbóreo Não foi encontrado dentro das parcelas nenhum indivíduo exótico pertencente ao estrato arbustivo-arbóreo, o que confirma que as populações destas espécies exóticas estão em baixas densidades nas áreas estudadas do PARNASO. A estrutura da vegetação arbustivo-arbórea das áreas amostradas apresenta, portanto, freqüência relativa de 100% para as espécies nativas e 0% para as exóticas. Os demais parâmetros fitossociológicos mensurados mostraram também valores percentuais máximos 57 para as espécies nativas (densidade relativa e vigor relativo). O índice de valor de importância (IVI) para a comunidade foi de 300 para as espécies nativas e de 0 (zero) para as exóticas. Através destas análises fica claro que as espécies arbóreas e arbustivas encontradas pela metodologia de caminhamento não significam ameaça à flora nativa, pois não estão causando modificações na estrutura da comunidade. 3.2.2. Estrato herbáceo No estrato herbáceo, as únicas espécies exóticas amostradas nas parcelas de estudo foram Impatiens walleriana e Hedychium coronarium. Estes dados confirmam, portanto, as inferências acerca dos resultados obtidos na fase de identificação das espécies exóticas ocorrentes no Parque Nacional da Serra dos Órgãos. Excetuando-se estas duas espécies herbáceas, as demais espécies exóticas que tiveram sua ocorrência registrada para a Serra dos Órgãos ocorrem em populações tão pequenas que a metodologia de amostragem utilizada para o estudo da estrutura da comunidade vegetal não foi capaz de detectá-las. A estrutura da comunidade vegetal herbácea adjacente à estrada mostrou que na classe de distância mais externa da floresta (0-10 m de distância da estrada) as espécies exóticas apresentaram uma freqüência relativa (FR) de 52% contra 48% de todas as espécies nativas. Em termos de densidade relativa, as espécies exóticas apresentam um valor significativamente superior (84%) quando contraposto às espécies nativas (16%), o que mostra que no estrato herbáceo as espécies exóticas dominam o ambiente. O índice de valor de cobertura mostra também que as espécies exóticas (IVC = 58) cobrem uma área maior que as nativas (IVC = 41,5). As espécies exóticas também apresentaram um valor de importância superior (195,2) ao das espécies nativas (104,8). Estes dados mostram que, nesta faixa de vegetação, as espécies exóticas conseguiram se estabelecer na área e obtiveram sucesso na colonização do ambiente, se dispersando, ocupando o espaço das espécies nativas e substituindo estas na paisagem. Estas espécies, nas áreas em que ocorrem, estão levando vantagens competitivas sobre as nativas e exercendo dominância sobre estas no ambiente, o que explica as densidades bem superiores apresentadas por estas. Isto fica mais evidente quando se considera que os valores apresentados pelas espécies exóticas são referentes a apenas duas espécies (Impatiens walleriana e Hedychium coronarium). As análises de estrutura da vegetação nas áreas amostradas do estrato herbáceo mostraram que nas faixas de vegetação mais internas da floresta (20-30 m e 40-50 m a partir da borda formada pela estrada) não há a ocorrência de espécies exóticas. Nestas classes de distância as espécies nativas apresentaram valores de freqüência relativa (FR), densidade 58 relativa (DR) e vigor relativo (VR) iguais a 100% e um valor de importância na comunidade (IVI) igual a 300 (limite superior do índice), já que espécies exóticas não contribuíram na composição da comunidade. As áreas mais internas das florestas, de modo geral, sofrem menor influência dos efeitos de borda e menor pressão antrópica, sendo, por estas razões menos sujeita a invasões. A própria vegetação funciona como uma barreira à dispersão das espécies exóticas para o interior, tamponando o sistema de modo a torná-lo mais resistente a impactos. Os valores do Índice de Dispersão de Morisita encontrados para as populações de Hedychium coronarium e Impatiens walleriana foram 1,74 (F = 17,835; p < 0,05) e 4,29 (F = 99,289; p < 0,05), respectivamente. Estes valores indicam um padrão de distribuição agregado para as populações das duas espécies (Id > 1). Janzen (1976 apud ANTONINI e NUNESFREITAS, 2004), afirma que o padrão de distribuição agregado está relacionado à espécies vegetais de dispersão zoocórica ou autocórica, à quantidade de sementes produzidas e à duração do período de frutificação. O lírio-do-brejo apresenta síndrome de dispersão do tipo zoocoria e o beijinho se dispersa por autocoria (ver Anexo 2), o que justifica o padrão de dispersão encontrado para as espécies. Entretanto, nestas espécies a reprodução assexuada (ou clonal) é mais importante que a por sementes. Begon e colaboradores (2006), explicam que quando a presença de um indivíduo atrai ou dá origem a outro perto deste a distribuição desta espécie também se dá por agregados. Hedychium coronarium e Impatiens walleriana também se enquadram neste caso, em função da realização de dispersão por clones. Estas duas espécies apresentam crescimento clonal em forma de falanges, nome dado em analogia às falanges – unidades de infantaria – do exército romano, fortemente protegidos por seus escudos presos em volta da formação. Nesta estratégia de dispersão as distâncias entre os clones são curtas as matrizes são protegidas por estes. As espécies, então, expandem seus clones devagar, mantendo a área ocupada originalmente por longos períodos e penetrando facilmente por entre as plantas vizinhas. Com isso, a capacidade competitiva desta espécie é aumentada e ela consegue facilmente se estabelecer e se expandir pelo ambiente, excluindo as demais espécies que ali ocorriam originalmente (LOPEZ et al., 1994; LOVETT DOUST e LOVETT DOUST, 1982). Ainda de acordo com Begon e colaboradores (2006), a dispersão agregada ocorre também quando os indivíduos têm maiores chances de sobreviver em (ou tendem a ser atraídos para) determinadas partes do ambiente. Os fatores relacionados ao microclima podem explicar este padrão, pois são formadas áreas em que as condições para o desenvolvimento destas espécies são propícias. 59 3.3. Distribuição das espécies exóticas no ambiente e os fatores que a influenciam Foram detectadas significativas diferenças (P < 0,05) nos índices ecológicos analisados entre as classes de distância das parcelas de estudo em relação à estrada. 100% dos indivíduos exóticos amostrados se concentraram na borda da mata, na faixa que vai de 0 a 10m na direção estrada – interior da floresta. Ribeiro (2006) encontrou o mesmo padrão de distribuição para a espécie Dracaena fragrans no Parque Nacional da Tijuca. Esta espécie está amplamente distribuída nas margens das estradas principais da unidade de conservação, mas a medida que se afasta das bordas em direção ao interior da floresta nota-se um declínio na densidade populacional da espécie. Declínios na presença de espécies exóticas em função do distanciamento das estradas ou bordas foram observados também no Parque Nacional Glacier (Montana - EUA), na Califórnia, no Deserto de Mojave e no Parque Nacional de Canyonlands (GELBARD e BELNAP, 2003). Gelbard e Belnap (2003), em seu estudo, observaram que áreas distantes de estradas apresentam menos espécies exóticas do que próximas a estradas, bem como a riqueza de espécies exóticas tende a aumentar e a riqueza das nativas tende a diminuir em áreas próximas a estradas melhor pavimentadas quando comparadas a estradas mais rústicas. Neste estudo os autores encontraram também correlações entre a riqueza de espécies exóticas e a largura da estrada adjacente. Estudando a Trilha do Poço Preto no Parque Nacional da Iguaçu, Rodolfo e colaboradores (2007) detectaram também que a maioria das espécies exóticas registradas se concentra em suas margens ou a poucos metros no interior da mata. Blum e colaboradores (2005) constataram que a grande maioria dos indivíduos das espécies exóticas encontradas na APA de Guaratuba, Paraná, ocorre na faixa de vegetação mais próxima das margens da Represa do Vossoroca. As bordas florestais atuam como facilitadoras da chegada de propágulos e do desenvolvimento de espécies oportunistas e de rápido crescimento, como as espécies exóticas. Estas espécies se aproveitam das alterações no ambiente em decorrência das ações humanas para invadirem estes locais. Normalmente as espécies exóticas apresentam outra característica que as ajuda na colonização de ambientes de borda: são pouco exigentes quanto às condições ambientais. No caso específico de trilhas e estradas abertas em meio à mata nativa em unidades de conservação, estas podem funcionar como porta de entrada para espécies exóticas através dos seus visitantes e funcionários. Os veículos e pedestres que transitam por estas estradas podem disseminar sementes que trazem consigo acidentalmente e, caso estas encontrem condições 60 ambientais favoráveis, podem germinar e se estabelecer no ambiente culminando em novas invasões. Foram investigadas possíveis razões que explicassem a preferência das espécies Hedychium coronarium e Impatiens walleriana em ocorrer nas bordas florestais. Aspectos como temperatura, umidade relativa do ar e, de forma indireta, a incidência luminosa na área (através da taxa de cobertura do dossel) poderiam ser responsáveis por restringir a área de ocupação das espécies em estudo. Em relação à variável temperatura não foram notadas diferenças significativas (P > 0,05) para o mês de setembro nas medições realizadas (Figura 4). Já para o mês de outubro (Figura 5), as temperaturas no interior da floresta e nas áreas de borda mensuradas se mostraram diferentes (P < 0,05), sendo as duas faixas mais internas (20 -30 m e 40-50 m) mais frias que a faixa mais externa (0-10 m). No entanto, entre aquelas não foram sentidas diferenças, como pode ser visto na tabela 1. Figura 4 – Temperaturas médias nas classes de distância da vegetação em relação à estrada no mês de setembro de 2008 61 Figura 5 – Temperaturas médias nas classes de distância da vegetação em relação à estrada no mês de outubro de 2008 Tabela 1 – Temperaturas médias nas classes de distância borda-interior de vegetação no mês de outubro de 2008 Classes de distância (m) 0-10 Temperatura (°C) 21,3 ± 0,80a 20-30 20,1 ± 0,77b 40-50 19,4 ± 0,94b Médias seguidas de letras iguais não diferem entre si pelo teste de Tukey ao nível de 5% de probabilidade. As medições de umidade relativa do ar apresentaram o mesmo padrão da temperatura, ou seja, não foram exibidas diferenças significativas (P > 0,05) entre os dados coletados em setembro (Figura 6), mas em outubro (Figura 7) os valores encontrados diferiram significativamente entre si (P < 0,05). Quando comparadas as médias de umidade relativa do mês de outubro nas áreas de estudo, a média dos valores encontrados nas parcelas localizadas entre 20 e 30 e entre 40 e 50 m não diferem entre si, mas são significativamente maiores do que a média dos valores mensurados nas parcelas de 0 a 10 m da borda da floresta (Tabela 2). 62 Figura 6 – Umidade Relativa (UR) nas classes de distância da vegetação em relação à estrada no mês de setembro de 2008 Figura 7 – Umidade Relativa (UR) nas classes de distância da vegetação em relação à estrada no mês de outubro de 2008 Tabela 2 – Valores médios de Umidade Relativa (UR) nas classes de distância borda-interior de vegetação no mês de outubro de 2008 Classes de distância (m) 0-10 UR (%) 77,1 ± 3,35a 20-30 81,1 ± 2,31b 40-50 83,8 ± 3,12b Médias seguidas de letras iguais não diferem entre si pelo teste de Tukey ao nível de 5% de probabilidade. 63 Foram detectadas diferenças significativas (P < 0,05) nas taxas de cobertura do dossel entre as diferentes classes de distância da estrada nas áreas amostradas (Tabela 3). As áreas localizadas entre 40 e 50 m de distância da estrada são mais sombreadas que aquelas entre 0 e 10 m de distância (Figura 8). No entanto, as parcelas localizadas entre 20 e 30 m de distância da borda não foram significativamente diferentes em termos de sombreamento quando comparadas às parcelas mais externas nem tampouco se comparadas às parcelas mais internas. Estas análises demonstram que é formado um gradiente, em que o sombreamento aumenta à medida que se caminha em direção ao interior da mata. Tabela 3 – Taxas de sombreamento nas classes de distância borda-interior de vegetação analisadas Classes de distância (m) 0-10 Sombreamento (%) 71,6 ± 6,18a 20-30 75,4 ± 5,16ab 40-50 79,2 ± 3,12b Médias seguidas de letras iguais não diferem entre si pelo teste de Tukey ao nível de 5% de probabilidade. Figura 8 – Taxas de sombreamento nas diferentes classes de distância da vegetação em relação à estrada. Existe forte correlação linear negativa (r = -0,869) entre a presença de espécies exóticas e a taxa de sombreamento da área. Ou seja, existe uma tendência de aumento na presença das espécies exóticas à medida que o sombreamento diminui. Esta correlação 64 confirma a observação feita de que as espécies exóticas encontradas no estudo de estrutura da vegetação - beijinho e lírio-do-brejo – ocorrerem apenas nas parcelas com menor grau de sombreamento. Schumacher e Poggiani (1993), explicam que o microclima de uma floresta caracteriza-se, primeiramente, pela modificação sofrida na luz que penetra através da cobertura das árvores. Nas florestas tropicais a iluminação sob o dossel pode descer ao intervalo de 0,1 a 1% da iluminação de um terreno descoberto. A ação das copas das árvores na absorção seletiva da luz resulta na formação de um microclima diferenciado sob a floresta, que não se mostrou favorável ao estabelecimento das espécies exóticas ou, nestas áreas, as espécies nativas se mostram mais competitivas. Em relação à temperatura e umidade relativa do ar, os dados obtidos mostram que existe uma tendência das áreas mais internas da floresta apresentarem maior umidade relativa e menor temperatura. Entretanto, seria ideal que a coleta de dados tivesse sido realizada durante o período de um ano, a fim de ser verificada a influência da sazonalidade nas diferenças entre as diferentes faixas de vegetação para as variáveis mensuradas. A insuficiência de medições pode acarretar em análises errôneas, mas, de modo geral, existe um consenso de que o microclima nas bordas florestais apresenta maior temperatura, menor umidade relativa, maior incidência luminosa (ou menor grau de sombreamento) e maior exposição a ventos (BALDISSERA e GANADE, 2005; FERNANDEZ, 2004; LAURANCE e BIERREGAARD Jr, 1997; PRIMACK e RODRIGUES, 2002). Admite-se, portanto, uma queda significativa na temperatura e aumento na umidade relativa do ar à medida que se percorre o gradiente borda-interior de floresta, como mostraram os dados coletados em outubro de 2008. As variáveis temperatura e umidade relativa também estão correlacionadas com a presença das espécies exóticas na área de estudo. Existe correlação direta entre temperatura e a presença de espécies exóticas (r = 0,925) e a umidade relativa está inversamente correlacionada à presença das exóticas (r = -0,914). Isto quer dizer que a ocupação das áreas estudadas pelas espécies exóticas aumenta à medida que a temperatura aumenta e a umidade relativa cai. Pela análise de Regressão Linear Múltipla, a relação entre a densidade de espécies exóticas encontradas nos sítios de estudo e as variáveis microclimáticas (temperatura, umidade relativa do ar e taxa de sombreamento) pode ser explicada pela equação y = 6706,840392 + 290,610*x1+ 52,110*x2 - 43,012*x3, onde y é a densidade de espécies exóticas na área, x1 é a variação na temperatura, x2 é a variação na umidade relativa do ar e x3 representa a taxa de cobertura do dossel. Os valores calculados durante a regressão para o teste t de Student mostraram que todos os coeficientes são significativos. O valor obtido para 65 o coeficiente de determinação R2 (0,868) foi relativamente alto, o que indica um poder de explicação da equação de regressão de 86,8%. A tabela ANOVA permite inferir sobre a qualidade geral da regressão. Analisando o teste F e o valor de p (0,191) percebe-se que a equação de regressão se mostra significante, ou seja, a regressão tem boa qualidade. Pela equação de regressão múltipla, que leva em consideração os efeitos da codependência entre as variáveis incluídas na análise, pode-se dizer que as densidades populacionais do beijinho e do lírio-do-brejo aumentam com o aumento na temperatura do ar, permanecendo os outros fatores constantes. Ocorre também um aumento na densidade das espécies exóticas se a umidade relativa for aumentada, mantendo-se constante todas as demais variáveis. Pode-se perceber, para esta variável, que a regressão linear múltipla contradiz o resultado da correlação simples, o que pode ser explicado em função da análise de correlação não levar em consideração o efeito das outras variáveis independentes (indicadores ambientais) sobre a variável dependente (densidade de espécies exóticas). É interessante mencionar ainda que a correlação mede a força de relacionamento entre duas variáveis, enquanto a regressão dá a equação que descreve como se dá esse relacionamento em termos matemáticos. Ainda analisando a equação de regressão obtida, pode-se dizer que o grau de sombreamento tem o efeito de diminuir a densidade de espécies exóticas, os outros fatores permanecendo iguais. Pode-se dizer então que I. walleriana e H. coronarium possuem características biológicas que permitem que estas ocorram e/ou tenham maior facilidade em colonizar áreas mais quentes e com menor grau de sombreamento. Como já foi dito, uma das características das espécies exóticas invasoras é a baixa exigência em condições ambientais específicas. Por esta razão, elas conseguem colonizar áreas que as espécies nativas mais exigentes têm dificuldade em se estabelecer e conseguem excluí-las por competição. No interior da mata outras espécies estão em condições ótimas para sua sobrevivência, tendo maiores chances competitivas contra espécies invasoras. Com relação à umidade relativa do ar, a equação de regressão diz que a um aumento nesta variável corresponde um aumento na ocorrência de exóticas. Esta análise se torna mais evidente quando confrontada com as observações de campo, em que foi notado que estas espécies ocorrem com maior freqüência em áreas próximas à cursos d’água, ou seja, com maior grau de umidade. Outras variáveis não contempladas neste trabalho podem também exercer influência sobre a distribuição das espécies exóticas nas áreas de estudo. A umidade do solo pode ser importante para I. walleriana e H. coronarium, visto que estas espécies acumulam grandes quantidades de água (ver capítulo 2). H. coronarium, particularmente, ocorre próxima à 66 coleções d’água e é considerada por alguns autores uma macrófita aquática (Anexo 2). O tipo e fertilidade do solo e a topografia da área também podem ser responsáveis pela ocorrência das espécies em alguns locais e ausência em outros. 3.4. Espécies exóticas invasoras que causam problemas ao ecossistema nativo Como dito anteriormente, a fração exóticas foi representada nas parcelas de estrutura da comunidade vegetal por apenas duas espécies: beijinho e lírio-do-brejo. Estas espécies foram introduzidas com fins ornamentais e se dispersaram alcançando outras áreas (CRONEMBERGER e VIVEIROS DE CASTRO, 2007). A dominância destas espécies sobre as nativas mostra que as características biológicas destas espécies (Anexo 2) permitiram que elas se adaptassem muito facilmente ao novo ambiente e proporcionaram vantagens competitivas a estas em relação às espécies nativas nas condições encontradas nas áreas em que ocorrem. Outras vantagens encontradas por estas espécies foram a ausência de predadores e parasitas, por exemplo, já que não é comum a observação de vestígios de herbivoria ou doenças nestas espécies em campo. Como resultado, as espécies se alastraram pela área de uso intensivo do Parque. Contudo, elas estão limitadas às bordas florestais. Foi observado, de forma rara e fora das parcelas de estudo, que em situações de interior de floresta o beijinho estava presente iniciando a colonização em algumas clareiras e o lírio-do-brejo começa a penetrar na mata acompanhando os córregos na sua dispersão. O lírio-do-brejo, particularmente, ocorre preferencialmente nas proximidades dos cursos d’água. A estratégia de dispersão em agregados apresentada por estas espécies permite que elas formem densos blocos e chegam a excluir localmente as espécies nativas (Figuras 9 e 10). De acordo com Williamson (1996), um dos efeitos ecológicos conhecidos provocados por populações de espécies exóticas é o crescimento em densas concentrações, excluindo outras espécies. Com base na alta freqüência destas espécies e na dominância destas sobre as nativas, pode-se dizer que elas acabam por ocupar nichos das espécies nativas, causando um desequilíbrio ecológico local. 67 Figura 9 – Área no PARNASO com ocorrência da espécie Impatiens walleriana (beijinho). Foto: Michelle Ribeiro Figura 10 – Área no PARNASO com ocorrência da espécie Hedychium coronarium (lírio-dobrejo). Foto: Michelle Ribeiro 68 É interessante mencionar que, segundo informações do Instituto Hórus (2008), as duas espécies são consideradas invasoras em diversos outros locais no Brasil e no mundo. No banco de dados on-line do Instituto há registros da espécie H. coronarium invadindo áreas nos estados do Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Paraná, Rio de Janeiro (na Reserva Biológica da União e na Reserva Biológica de Poço das Antas), Rio Grande do Sul, Santa Catarina e São Paulo. Invade também áreas úmidas e sub-bosques da Floresta Atlântica comumente colonizando as zonas litorâneas, tendo sido encontrada na Estação Ecológica do Tripuí, Ouro Preto, MG (SANTOS et al, 2005b). A espécie também é considerada invasora no Havaí (TUNISON, 1991) e na Flórida (GILMAN, 1999). De acordo com o GISP (2009), a espécie ocorre ainda na Polinésia Francesa, Ilha de Guadalupe (Caribe), Ilha de Martinica (Caribe), Nova Caledônia, na Ilha da Reunião, nas Ilhas Samoa, em Galápagos, na Micronésia, Ilhas Fiji, Guam, Japão, Austrália e nas Ilhas Maurício. Já para a espécie I. walleriana os locais de invasão registrados são várias áreas protegidas em Minas Gerais, Paraná, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e São Paulo. De acordo com Lorenzi e Souza (2001) o beijinho é encontrado também em locais abertos por toda a Serra do Mar. Segundo o GISD (2009), I. walleriana ocorre também na Polinésia Francesa, Guadalupe, Martinica, Nova Caledônia e na Ilha da Reunião, sendo comum em países quentes. Por serem as espécies H. coronarium e I. walleriana as que ocorrem em densidades populacionais maiores, causando problemas à biodiversidade do Parque Nacional da Serra dos Órgãos, foram testadas técnicas para controle e gestão das populações destas espécies. CAPÍTULO II GESTÃO E MANEJO DE ESPÉCIES EXÓTICAS NO PARQUE NACIONAL DA SERRA DOS ÓRGÃOS 70 1. Introdução Invasões biológicas são consideradas atualmente uma grande ameaça à biodiversidade e causam sérios problemas em Unidades de Conservação (CRONK e FULLER, 1995; MARTINS et al., 2004; WILLIAMSON, 1996). Para o Parque Nacional da Serra dos Órgãos, foram registradas 34 espécies vegetais exóticas, sendo as espécies Impatiens walleriana e Hedychium coronarium aquelas que causam os maiores problemas ao Parque. Estas espécies podem ser consideradas invasoras nas áreas em que ocorrem, pois causam danos às espécies nativas em virtude de sua ampla distribuição e elevada abundância. É interessante o registro encontrado da espécie H. coronarium na Flora Brasiliensis (VON MARTIUS e EICHLER, 1844), indicando que sua introdução no Brasil seja anterior ao ano de 1844, data de publicação da obra. Para I. walleriana ainda não foram encontrados indícios da data de sua introdução. Contudo, sabe-se que o fator responsável pela introdução destas duas espécies no Brasil foi a forte influência européia na tradição paisagística brasileira. As principais influências sofridas pelo Brasil – francesa e inglesa – ditaram o repertório de elementos utilizados na composição dos projetos paisagísticos (SANTOS et al., 2005a). Com isto, era maciça a utilização de espécies exóticas nos jardins e espaços públicos brasileiros, tendo sido desta forma introduzidas as espécies alvo deste estudo. No PARNASO foram observados trechos em que ocorre monodominância por estas espécies, que parecem estar se expandindo gradativamente, colonizando novas áreas. Algumas clareiras abertas no meio da mata apresentam indivíduos de I. walleriana e a espécie H. coronarium parece estar acompanhando o leito do rio e colonizando áreas mais internas. Portanto, sugere-se que o comportamento destas espécies nas áreas estudadas é invasor, podendo causar a exclusão competitiva de espécies da flora nativa e afetando indireta e negativamente animais nativos, já que comprometeria a disponibilidade de recursos. Desta forma, intervenções para a retirada destas espécies dos habitats invadidos estão se tornando ferramentas essenciais para a manutenção da biodiversidade local (WILCOVE e CHEN, 1998). No entanto, as ações de gestão de espécies exóticas invasoras devem ser baseadas em estudos e experimentos prévios para determinar o método mais eficiente para o controle das populações invasoras. Desta forma pode-se escolher o método mais eficiente, obtendo sucesso nas intervenções de manejo e causando o mínimo impacto sobre a biota nativa. Para atender a este requisito, neste capítulo procurou-se conduzir experimentos de campo para o manejo das espécies Impatiens walleriana e Hedychium coronarium, a fim de 71 levantar informações sobre seu controle na área de estudo. Ao final dos experimentos e com base nos resultados obtidos, são propostas ações de manejo das áreas com as espécies invasoras estudadas. São também discutidas as medidas a serem adotadas em relação às demais espécies exóticas encontradas nas áreas estudadas do Parque Nacional da Serra dos Órgãos. 2. Metodologia A partir do levantamento populacional das espécies vegetais exóticas e com base nos dados obtidos, foi instalado um experimento in-situ para testar o adequado controle das espécies com as maiores densidades populacionais. Com o objetivo de determinar o método mais adequado para a realização do controle das espécies invasoras Impatiens walleriana (beijinho) e Hedychium coronarium (lírio-do-brejo), os experimentos seguiram a metodologia abaixo descrita. Diferentes métodos foram aplicados para cada espécie em separado e testados em áreas com diferentes graus de infestação das espécies invasoras. O critério adotado dividiu as áreas em que as espécies ocorriam em três classes: alta, média e baixa infestação. Foi convencionado que as áreas com alta infestação de espécies invasoras são aquelas em que a espécie ocorre em uma parcela maior ou igual a 67% da unidade amostral. Locais com médio grau de infestação têm entre 34 e 66% da área coberta pelas espécies alvo e áreas com baixa infestação possuem menos de 33% de ocorrência das espécies alvo deste estudo. Para a diferenciação destas áreas foi determinada a porcentagem de cobertura das espécies. Foram tiradas fotos das áreas que comporiam as parcelas de estudo. Com o auxílio de um editor de imagens (Photoshop versão CS2), as parcelas foram divididas em 100 partes iguais, sendo computado o número de quadrantes em que a espécie alvo ocorria, que corresponde ao percentual da área que a espécie ocupa. Com o objetivo de determinar o comportamento das espécies frente às técnicas de manejo em situações extremas, os tratamentos foram testados em áreas classificadas com alta e baixa infestação das espécies em estudo. As áreas de estudo novamente foram escolhidas às margens da Estrada da Barragem, um trecho da zona de uso intensivo do Parque, na sede Teresópolis (Figura 1). Não foram utilizadas as mesmas parcelas do Capítulo 1 em que as espécies foram encontradas por estas não satisfazerem as condições de cobertura estabelecidas. Foi feita então uma nova varredura nas margens da estrada para localizar áreas com elevada (Figuras 2 e 3) e baixa freqüência (Figuras 2 e 3) das espécies alvo. 72 73 a b Figura 2 – Áreas infestadas pela espécie Impatiens walleriana. (a) área com alta infestação (≥ 67%) e (b) área com baixa infestação (≤ 33%). Fotos: Michelle Ribeiro a b Figura 3 – Áreas infestadas pela espécie Hedychium coronarium. (a) área com alta infestação (≥ 67%) e (b) área com baixa infestação (≤ 33%). Fotos: Michelle Ribeiro Foram testados os efeitos de dois métodos de controle mecânico sobre a espécie Hedychium coronarium: corte-raso e arranquio das plantas. Para Impatiens walleriana foi testado apenas o arranquio. Além das parcelas testemunhas, em que não foram aplicados quaisquer tratamentos. É interessante salientar que para I. walleriana não foi testado o corte raso em virtude da textura da espécie. Como a espécie é bastante tenra, proceder o arranquio se torna uma tarefa fácil e o corte raso, por sua vez, se torna dispensável. O corte raso é recomendado para espécies difíceis de serem removidas com raiz, seja pelo porte da espécie ou seu tipo radicular, seja por características do solo ou a distribuição das nativas na área agirem como impedimento. Nas áreas selecionadas para a implantação do experimento foram alocadas as parcelas de estudo de modo aleatório. O arranjo experimental seguiu o delineamento de blocos ao 74 acaso com três repetições para cada tratamento. Cada parcela foi constituída por dois metros de largura por cinco metros de comprimento, perfazendo uma área útil de 10 m2. Cinco quadrados de 0,5 x 0,5 m (0,25 m2) foram lançados aleatoriamente em cada parcela experimental e, na área delimitada por cada quadrado, foi computado o número de ramets das espécies estudadas encontrados. Para efeitos práticos, foram contabilizados ramets13 das espécies estudadas no lugar de indivíduos (genets), já que como as espécies se reproduzem vegetativamente é extremamente difícil a separação dos genets. Desta forma também os resultados reproduzem a ocupação espacial das espécies nas áreas infestadas. A produção de biomassa foi determinada apenas nas parcelas em que foram aplicados os diferentes métodos de controle mecânico das espécies. Para tanto, recolheu-se todo o material presente em cada quadrado de 0,25 m2 nas parcelas. Após a determinação da massa total fresca por parcela, as amostras foram secas em estufa de ventilação forçada a 60°C por 72 horas, para posterior pesagem da matéria seca total. O intervalo de tempo para avaliação da eficiência dos tratamentos testados foi estabelecido em função do ciclo das espécies. Impatiens walleriana floresce após 8 a 10 semanas do plantio e Hedychium coronarium floresce num período de 4 a 6 meses depois da germinação. Desta forma, as coletas de informações foram realizadas aos 20, 40 e 60 dias após a aplicação dos tratamentos para a espécie Impatiens walleriana e aos 20, 40, 60, 80, 100 e 120 dias após tratamentos para a espécie Hedychium coronarium. Da mesma forma um quadrado de 0,5 m de lado foi locado aleatoriamente cinco vezes em cada parcela experimental a cada ocasião. Nestes quadrados foi contabilizado o número de indivíduos encontrados. Na última avaliação para cada espécie foi determinada a biomassa que regressou ao sistema seguindo a metodologia indicada anteriormente. Diferenças entre os métodos de manejo foram testadas através da aplicação da análise de variância seguida do teste de Tukey ao nível de 5% de probabilidade para as densidades populacionais das espécies na última avaliação após aplicação dos tratamentos. Do mesmo modo foi testada a existência de diferenças significativas entre a aplicação dos métodos de manejo em áreas com baixas e altas taxas de infestação pelas espécies exóticas. 13 Um genet (também chamado de colônia clonal) é um grupo de indivíduos geneticamente idênticos, originados por reprodução vegetativa a partir de um ancestral comum. Em plantas, refere-se como ramet a cada “indivíduo” em uma população como esta. Embora muitas espécies vegetais se reproduzam sexuadamente através da produção de sementes, outras se reproduzem por estolões ou rizomas subterrâneos e formam colônias clonais. Acima do solo estas plantas parecem ser indivíduos distintos, mas permanecem interconectados e são todos clones. Não é sempre simples reconhecer uma colônia clonal, especialmente se ela se espalha subterraneamente e também ocorre reprodução sexuada. 75 3. Resultados e discussão 3.1. Impatiens walleriana Os resultados obtidos mostram que após a aplicação do controle mecânico por arranquio, as médias das densidades populacionais da espécie I. walleriana, após 60 dias, Densidade Populacional (ramets/m2) continuam abaixo daquelas inicialmente encontradas nas áreas de estudo (Figuras 4 e 5). 70 60 50 40 30 20 10 0 60,27 58,67 47,2 Início 47,2 48 0 0 Intervenção 50,67 0,53 20 dias Tempo Controle 40 dias 0,80 60 dias Arranquio Figura 4 – Resposta de I. walleriana ao manejo por arranquio em áreas com baixas Densidade Populacional (ramets/m2) densidades populacionais, no Parque Nacional da Serra dos Órgãos, RJ. 250 200 204,53 186,40 194,13 191,20 186,40 208,53 150 100 50 0 Início 2,13 0 0 Intervenção 20 dias Tempo Controle 40 dias 3,2 60 dias Arranquio Figura 5 – Resposta de I. walleriana ao manejo por arranquio em áreas com altas densidades populacionais, no Parque Nacional da Serra dos Órgãos, RJ. 76 Os resultados indicaram que em áreas com baixas densidades populacionais quanto em áreas com altas densidades o método de arranquio mostra-se eficaz para o controle de I. walleriana. Na área em que a espécie foi encontrada em menores densidades, inicialmente foi observada uma média de 58,7 ramets/m2 e, 60 dias após o arranquio das plantas, apenas 0,8 ramets/m2 foram encontrados. Já nas parcelas alocadas nos locais onde havia altas densidades populacionais da espécie, antes da aplicação do método de controle havia 204,5 ramets/m2 e na última avaliação após sua aplicação foram encontrados 3,2 ramets/m2. Nos gráficos apresentados pode-se perceber também, por meio das densidades populacionais encontradas nas parcelas controle, que a população de I. walleriana mostra uma tendência à ascensão. Entretanto, este aumento populacional pode também ser atribuído à uma característica intrínseca da espécie ou uma resposta às variações climáticas locais. A continuidade dos estudos poderá confirmar estas suposições, pois o conhecimento biológico e ecológico que se tem atualmente sobre a espécie é muito restrito. Conntudo, o aumento populacional observado, associado às altas densidades populacionais, corrobora a inferência de esta espécie possuir caráter invasor e deslocar as espécies da flora nativa nas áreas em que ocorre e dominar o ambiente. Desta forma, pode-se afirmar ser recomendável o uso de métodos de controle para a população desta espécie no PARNASO. Foram observadas significativas diferenças (P < 0,05) entre as densidades populacionais da espécie I. walleriana encontradas nas parcelas de estudo 60 dias após a aplicação dos tratamentos (Tabela 1). Estes resultados mostram a eficiência do arranquio no controle populacional desta espécie, já que ao final do experimento ela continua com densidades bastante inferiores às encontradas inicialmente. Tabela 1 – Comportamento quantitativo da população de I. walleriana após 60 dias da aplicação dos métodos de controle. Situação Método de controle Baixa densidade Alta densidade Densidade Populacional (ramets/m2) Controle 60,27 ± 26,56a 208,53 ± 39,07a Arranquio 0,80 ± 0,80b 3,20 ± 0,80b Médias seguidas de letras iguais na coluna não diferem entre si pelo teste de Tukey ao nível de 5% de probabilidade. 77 A partir das densidades populacionais encontradas, foram calculadas as taxas de regeneração da espécie que, 60 dias após a aplicação do tratamento, mostram um retorno de apenas 1,36% e 1,56%, respectivamente, em baixa e alta densidade populacional (Figuras 6 e 7). Figura 6 – Taxas de regeneração da espécie I. walleriana aos 60 dias após intervenção de manejo, em situação de baixa densidade populacional. Figura 7 – Taxas de regeneração da espécie I. walleriana aos 60 dias após intervenção de manejo, em situação de alta densidade populacional. 78 Pelas figuras acima pode ser observado que o crescimento populacional da espécie durante o experimento nas áreas manejadas foi menor do que nas áreas que não sofreram intervenção. Em áreas com baixas densidades populacionais de I. walleriana, aos 60 dias, foi observado um aumento na ocupação do espaço pela espécie da ordem de 27,68% nas parcelas que não sofreram intervenção e 1,36% nas áreas manejadas. Já nas áreas com altas densidades populacionais da espécie, as taxas de aumento foram de 11,87% nas parcelas controle e de 1,56% nas parcelas que sofreram o arranquio. Estas menores taxas de crescimento e a redução na densidade de I. walleriana nas parcelas de arranquio evidenciam a eficiência de controle do método empregado, comprovando a viabilidade de sua utilização sobre a espécie estudada. Entretanto não foram observadas diferenças significativas (P>0,05) na eficiência do tratamento quando este é aplicado em áreas com baixa ou alta infestação da espécie. Foram encontradas grandes diferenças entre a biomassa encontrada antes da aplicação do método de controle mecânico e após este, nas parcelas experimentais. Os valores médios de produção de biomassa mostram que em baixas densidades populacionais, o teor de matéria seca de I. walleriana nas parcelas de estudo foi reduzido de 1.147 Kg.ha-1 para 13 Kg.ha-1. Em áreas com densidades maiores da espécie foi observado o mesmo padrão, uma redução de 1.920 Kg.ha-1 para apenas 27 Kg.ha-1(Figura 8). 1920 Massa Seca (Kg/ha) 2000 1500 1147 1000 500 13 27 Baixa densidade Alta densidade 0 Inicial Final Figura 8 – Produção de matéria seca nas parcelas de arranquio da espécie I. walleriana. Estes resultados mostram uma remoção de aproximadamente 99% da biomassa desta espécie exótica do ecossistema nativo, nas duas situações de ocupação do ambiente pela espécie. 79 É importante ressaltar que os experimentos realizados neste estudo foram observados por um período curto de apenas 60 dias. Como o conhecimento sobre a biologia e ecologia desta espécie é muito restrito, a continuidade do monitoramento das áreas manejadas está sendo feito e poderá demonstrar se no médio e longo prazo os padrões observados até aqui se repetem. Através das figuras 9 e 10 abaixo pode ser avaliada visualmente a eficiência do método mecânico de controle da espécie I. walleriana através da diferença na ocupação das áreas de estudo por esta antes e após a intervenção de manejo. a c b Figura 9 – Área com baixa densidade da espécie Impatiens walleriana em que foi testado o arranquio das plantas. (a) antes da aplicação do tratamento; (b) logo após a intervenção de manejo e (c) 60 dias após a intervenção. Fotos: Michelle Ribeiro 80 a b c Figura 10 – Área com alta densidade da espécie Impatiens walleriana em que foi testado o arranquio das plantas. (a) antes da aplicação do tratamento; (b) logo após a intervenção e (c) 60 dias após a intervenção. Fotos: Michelle Ribeiro Como se pode perceber através das imagens, a flora nativa demora a colonizar o ambiente, o que deixa as áreas manejadas expostas à novas invasões. Além disso, as áreas ficam sujeitas também a outros tipos de impactos como, por exemplo, um maior índice de erosão do solo e de nutrientes, com o conseqüente assoreamento e eutrofização de córregos próximos, abandono pela fauna, aumento da insolação e da temperatura do ar e do solo, queda na umidade relativa, entre outros. Para que impactos como estes não ocorram durante as intervenções de manejo desta espécie no Parque Nacional da Serra dos Órgãos devem ser tomados cuidados. O plantio imediato de espécies nativas de crescimento rápido pode favorecer a recuperação das áreas submetidas ao manejo, potencializando seus resultados. Na área em que o beijinho ocorria em grandes concentrações, notou-se que houve em uma das parcelas, num primeiro momento, o domínio da área pela espécie nativa Hydrocotyle sp. (Araliaceae) que se beneficiou em muito com a remoção da espécie exótica. Para evitar este tipo de problema, também é recomendável que seja associado ao arranquio o plantio de espécies nativas de rápido crescimento. Desta forma a área é sombreada e ocupada mais rapidamente, evitando novas invasões e reduzindo também os demais impactos citados anteriormente. 81 3.2. Hedychium coronarium Diferentemente do padrão encontrado para I. walleriana, as densidades populacionais observadas para a espécie Hedychium coronarium (Figuras 11 e 12) indicam ser esta uma espécie bastante agressiva, em vista do grande aumento populacional ocorrido durante os Densidade Populacional (ramets/m2) experimentos de manejo. 30 25 20 15 10 5 0 Controle Início Intervenção 20 dias 40 dias 60 dias 80 dias 100 dias 120 dias 8 8 8 8,27 13,33 21,6 25,33 26,13 Arranquio 8,27 0 0 0,53 0,53 1,07 1,87 2,67 Corte raso 12 0 3,2 8,8 12,8 18,13 25,33 28,53 Tempo Controle Arranquio Corte raso Figura 11 – Resposta de H. coronarium em áreas com baixas densidades populacionais às Densidade Populacional (ramets/m2) técnicas de manejo, no Parque Nacional da Serra dos Órgãos, RJ. 100 80 60 40 20 0 Início Intervenção 20 dias 40 dias 60 dias 80 dias 100 dias 120 dias Controle 50,93 50,93 50,93 63,47 65,60 71,47 81,6 81,87 Arranquio 52,80 0 0 0,53 0,8 2,13 5,87 14,4 Corte raso 44,53 0 33,07 40,53 50,93 63,47 78,93 82,67 Controle Tempo Arranquio Corte raso Figura 12 – Resposta de H. coronarium em áreas com altas densidades populacionais às técnicas de manejo, no Parque Nacional da Serra dos Órgãos, RJ. 82 Foram observadas diferenças significativas (P < 0,05) entre as densidades populacionais da espécie H. coronarium nos diferentes tratamentos aplicados (Tabela 2). As parcelas em que foi feito o arranquio das plantas mostraram, ao final do experimento, densidades populacionais inferiores às encontradas nas parcelas de corte raso e controle (que não diferiram entre si) (Tabela 3). Estes dados mostram que o arranquio desta espécie é eficiente como método de controle, pois após 120 dias a população se manteve menor do que a inicialmente encontrada. O mesmo não se pode dizer para o corte raso já que no momento da última leitura do experimento a população manejada já exibia densidades superiores às encontradas no momento inicial. As parcelas controle mostram a expansão da população de H. coronarium, que em áreas de pequena ocupação aumentou em 3,3 vezes. Nessa condição, a densidade populacional inicialmente observada para a espécie era de 8 ramets/m2 e, decorridos 120 dias do início do experimento, passou para 26 ramets/m2. Na área em que a espécie já se encontrava em maiores densidades populacionais, o aumento proporcional foi menor, passando de aproximadamente 51 ramets/m2 para 82 ramets/m2, o que significa 1,6 vezes de aumento. Tabela 2 – Comportamento quantitativo da população de H. coronarium após 120 dias da aplicação dos métodos de controle. Situação Método de controle Baixa densidade Alta densidade Densidade populacional (ramets/m2) Sem controle 26,13 ± 19,75a 81,87 ± 5,08a Arranquio 2,67 ± 2,44b 14,40 ± 2,40b Corte Raso 28,53 ± 16,17a 82,67 ± 2,01a Médias seguidas de letras iguais na coluna não diferem entre si pelo teste de Tukey ao nível de 5% de probabilidade. No entanto, o aumento populacional observado pode ser uma característica intrínseca da espécie, típico de uma fase de desenvolvimento. Pode ser uma resposta às condições climáticas também, ou seja, ser sazonal. Souza (1985 apud Pellegrini et al., 2007) explica que variações nos dados de produção de algumas espécies decorrem, em parte, da variação sazonal dos fatores climáticos, como precipitação, radiação solar e temperatura. Simberloff e Gibbons (2004), em seu estudo perceberam que as populações de algumas espécies exóticas parecem ser caracterizadas por uma rápida expansão seguida de rápido declínio. Contudo, 83 mesmo se ocorrer uma queda na população de uma espécie exótica invasora, não quer dizer que danos persistentes ao ecossistema não tenham sido causados. Por esta razão, da mesma forma que para I. walleriana, o monitoramento das áreas manejadas em longo prazo mostrará se o comportamento observado permanece ou se é variável ao longo do tempo. Assim como para I. walleriana, os dados apresentados até o momento mostram uma tendência de aumento de suas populações no Parque Nacional da Serra dos Órgãos, através de altas taxas de recrutamento. Esta é uma indicação de um caráter agressivo exibido por H. coronarium, que por suas características pode ser classificada como invasora nas áreas estudas, exercendo dominância, competindo com espécies nativas por espaço e recursos e levando, muitas vezes, vantagens sobre estas. Os gráficos apresentados acima mostram que também as densidades populacionais das parcelas submetidas a controle mecânico por corte raso, ao final do experimento, superaram aquelas inicialmente encontradas nas áreas de estudo. Apenas o controle por arranquio mostrou resultados satisfatórios. A eficiência dos tratamentos testados pode ser demonstrada também através da análise das taxas de regeneração da espécie, calculadas a partir das densidades populacionais encontradas nas parcelas de estudo (Figuras 13 e 14). Figura 13 – Taxas de regeneração da espécie H. coronarium aos 120 dias após intervenção de manejo, em situação de baixa densidade populacional. 84 Figura 14 – Taxas de regeneração da espécie H. coronarium aos 120 dias após intervenção de manejo, em situação de alta densidade populacional. Pode-se perceber, através da análise dos gráficos acima, a diferença encontrada entre a eficiência dos métodos de controle quanto ao percentual de incremento populacional da espécie submetida ao manejo. Em situação de baixa densidade populacional, aos 120 dias póscontrole, o percentual de retorno de H. coronarium ao sistema foi maior quando aplicado o controle através do corte raso das plantas (237,78%) comparativamente ao controle por arranquio (32,26%). A área onde a espécie ocorre em altas densidades populacionais apresentou o mesmo comportamento, chegando a regeneração nas parcelas de corte raso a taxas de 185,63%, bem superiores aos 27,27% obtidos com o arranquio das plantas. Por estes dados pode-se notar que o corte raso desta espécie não traz resultados satisfatórios, mas o arranquio mostrou melhores resultados, sendo eficiente no controle de suas populações. As taxas de regeneração de H. coronarium nas parcelas experimentais durante o período de 120 dias de leituras mostraram que também houve um aumento populacional da espécie nas parcelas em que não foi realizada nenhuma intervenção de manejo. Nas parcelas alocadas em áreas com baixas densidades populacionais da espécie foi notado um aumento de 226,63% na colonização da área por esta. Um aumento de 60,73% da densidade populacional desta espécie foi mensurado nas áreas com altas densidades populacionais. Estes dados indicam ter H. coronarium uma tendência de expansão nas áreas estudadas. O retorno dos indivíduos de H. coronarium submetidos ao corte raso foi alto e rápido, chegando a superar, em termos de densidade populacional, os valores encontrados nas 85 parcelas em que não foi aplicado nenhum método de controle. Cabe ressaltar que o retorno de indivíduos de lírio-do-brejo ao sistema se deu apenas por reprodução vegetativa, já que os experimentos foram conduzidos fora do período reprodutivo da espécie. Também fica evidente a ineficácia deste método para o controle populacional da espécie H. coronarium visto que, passados apenas 60 dias do corte das plantas, mais de 100% dos indivíduos encontrados inicialmente nas parcelas já haviam regressado ao ambiente. Pode-se então classificar esse método como não recomendado neste caso, para esta espécie, uma vez que os custos e esforços despendidos para a aplicação desta técnica seriam perdidos em pouco tempo. O corte dos indivíduos de H. coronarium parece, inclusive, proporcionar uma rebrota mais vigorosa, já que a espécie recolonizou a área de forma mais agressiva que a situação inicialmente encontrada. Quanto ao método de controle mecânico por arranquio, a utilização deste não se mostrou eficiente para a erradicação da espécie, pois permitiu um retorno de aproximadamente 30% dos indivíduos de lírio-do-brejo num período de quatro meses. Contudo, visando reduzir as populações de lírio-do-brejo a fim de fornecer vantagens competitivas às espécies nativas para que o equilíbrio local seja restabelecido, o arranquio forneceu bons resultados. A fim de potencializar os resultados obtidos com o arranquio das plantas, este método de controle deve ser consorciado com o plantio de espécies nativas de rápido crescimento. Experimentos que testem os benefícios deste consórcio devem ser realizados, bem como as melhores espécies a serem plantadas. Nos casos em que a erradicação de uma espécie exótica invasora é extremamente difícil em virtude das características biológicas desta, é altamente recomendado que suas populações sejam mantidas em baixas densidades para que danos maiores ao ecossistema não sejam causados (como extinções locais de espécies nativas, por exemplo) e o ambiente mantenha sua resiliência. Os métodos de controle, no entanto, não diferiram pela análise de variância (P > 0,05) quando aplicados em áreas com baixa ou alta densidade de populações de H. coronarium. Houve significativa redução nos valores de biomassa encontrados antes e após as intervenções de manejo apenas nas áreas em que foi aplicado o arranquio das plantas. Nas parcelas de corte raso foi observado, de modo contraproducente, o aumento da quantidade de massa seca presente no sistema após a aplicação do tratamento, como pode ser observado nas figuras 15 e 16. 86 Figura 15 – Produção de matéria seca nos tratamentos para manejo da espécie H. coronarium em área de baixa densidade populacional. Figura 16 – Produção de matéria seca nos tratamentos para manejo da espécie H. coronarium em área de alta densidade populacional. Onde o lírio-do-brejo estava colonizando o ambiente de forma esparsa, a biomassa encontrada inicialmente nas parcelas de arranquio (16.750 Kg.ha-1) foi reduzida em 64,48% quando feita nova avaliação 120 dias após aplicação do tratamento (5.950 Kg.ha-1). Na área em que a espécie foi encontrada em altas densidades, a quantidade de massa seca foi reduzida de 98.270 Kg.ha-1 para 26.800 Kg.ha-1, uma redução da ordem de 72,73%. 87 Em relação ao corte raso, também fica evidente a baixa eficácia da aplicação deste método no controle de populações de H. coronarium. Em áreas com baixas densidades da espécie foi observado um aumento de biomassa de 1.650 Kg.ha-1 para 3.390 Kg.ha-1, o que significa um percentual de aumento de 105%. Já nas áreas com altas concentrações de líriodo-brejo, a biomassa passou de 6.130 Kg.ha-1 para 11.390 Kg.ha-1, ou seja, 85,81% de aumento. As grandes diferenças entre a biomassa recolhida nas parcelas de arranquio e de corte raso devem-se ao peso do rizoma (Figura 17). Enquanto no arranquio todo o material vegetal retirado do ambiente foi pesado, no corte raso recolheu-se apenas a biomassa epígea. Pode-se perceber que a maior parte da biomassa vegetal nesta espécie concentra-se nas partes hipógeas, especialmente porque as partes aéreas acumulam grandes quantidades de água, como pode ser visto através da diferença entre os valores de massa fresca e massa seca obtidos (Figuras 18 e 19). Figura 17 – Detalhe de um pedaço de rizoma de H. coronarium. Foto: Michelle Ribeiro 88 Figura 18 – Comparação entre os valores de massa fresca e massa seca encontrados nos diferentes tratamentos testados para a espécie Hedychium coronarium em áreas com baixas densidades populacionais. Figura 19 – Comparação entre os valores de massa fresca e massa seca encontrados nos diferentes tratamentos testados para a espécie Hedychium coronarium em áreas com altas densidades populacionais. Os dados apresentados evidenciam as diferenças entre as eficiências dos métodos de controle testados sobre a espécie H. coronarium no Parque Nacional da Serra dos Órgãos. Enquanto o arranquio das plantas forneceu resultados positivos, o simples corte de espécies rizomatosas parece não ser suficiente para enfraquecer seus indivíduos devido à sua eficiência em rebrotar e, deste modo, é ineficaz no controle destas. Como o lírio-do-brejo é 89 extremamente eficiente em rebrotar, existe o agravante de que no corte raso, como parte do caule do vegetal permanece no solo, as plantas chegam mais rapidamente ao estágio reprodutivo. Isto pode favorecer a dispersão da espécie invasora pela área do Parque. O efeito negativo da rebrota das plantas pode ser minimizado, entretanto, na associação com outro método de controle seqüencial. Por exemplo, o controle químico pode potencializar os efeitos do controle mecânico e fornecer bons resultados. Entretanto, em Unidades de Conservação não é permitido o uso de herbicidas. Por esta razão não foi testada essa alternativa. O plantio de espécies nativas de rápido crescimento pode ser uma alternativa no auxílio ao sombreamento da área e ocupação de espaços, dificultando desta forma a recolonização das áreas manejadas pelo lírio-do-brejo. Porém, em virtude do crescimento em altura bastante acelerado exibido pela espécie, é recomendado que sejam feitos repasses no arranquio do lírio-do-brejo após o plantio das mudas de espécies nativas até que estas estejam estabelecidas. Santos e colaboradores (2005) encontraram valores de crescimento em altura para populações de H. coronarium na Estação Ecológica do Tripuí, MG, variando entre 117,1 e 181,4 cm.mês-1. Com estas taxas de crescimento é possível que os indivíduos de lírio-dobrejo em pouco tempo cobrissem as mudas plantadas. Existe ainda a possibilidade de serem obtidos resultados diferentes dos apresentados neste estudo em áreas diferentes, com condições edafo-climáticas distintas. Resultados semelhantes aos encontrados neste estudo foram relatados por Ribeiro et al. (2006), ao testarem o corte raso como alternativa ao manejo de populações da espécie exótica invasora Dracaena fragrans em áreas do Parque Nacional da Tijuca. Para esta espécie também o corte raso não forneceu resultados satisfatórios. As figuras 20, 21, 22 e 23 permitem avaliar de maneira visual os efeitos da aplicação dos métodos de controle da espécie H. coronarium, por meio da ocupação das áreas manejadas antes e 120 dias após as intervenções. Nas áreas em que o arranquio foi aplicado para controle de H. coronarium percebeu-se também uma demora na recolonização por espécies nativas. Da mesma forma que nas áreas manejadas em virtude da infestação por I. walleriana, estas áreas vazias ficam expostas à novas invasões e à outros impactos, já anteriormente mencionados. Por estas razões é recomendado também o plantio de espécies nativas de rápido crescimento nas áreas manejadas, a fim de acelerar a recuperação do ambiente. 90 a b c Figura 20 – Área com baixa densidade da espécie Hedychium coronarium em que foi testado o arranquio das plantas. (a) antes da aplicação do tratamento; (b) logo após a intervenção e (c) 120 dias após a intervenção. Fotos: Michelle Ribeiro a b c Figura 21 – Área com alta densidade da espécie Hedychium coronarium em que foi testado o arranquio das plantas. (a) antes da aplicação do tratamento; (b) logo após a intervenção e (c) 120 dias após a intervenção. Fotos: Michelle Ribeiro 91 a b c Figura 22 – Área com baixa densidade da espécie Hedychium coronarium em que foi testado o corte raso das plantas. (a) antes da aplicação do tratamento; (b) logo após a intervenção e (c) 120 dias após a intervenção. Fotos: Michelle Ribeiro a b c Figura 23 – Área com alta densidade da espécie Hedychium coronarium em que foi testado o corte raso das plantas. (a) antes da aplicação do tratamento; (b) logo após a intervenção e (c) 120 dias após a intervenção. Fotos: Michelle Ribeiro 92 3.3. Demais espécies exóticas Os resultados do capítulo I mostraram que as espécies exóticas mais agressivas presentes nas áreas estudadas do Parque Nacional da Serra dos Órgãos são Hedychium coronarium e Impatiens walleriana. As populações das demais espécies são compostas por poucos indivíduos isolados e não causam alterações na estrutura da comunidade, não sendo, portanto, consideradas invasoras nesta área. Mesmo havendo raros indivíduos destas espécies, a recomendação mais freqüente é a remoção imediata de qualquer espécie exótica que apresente algum risco de invasão, que pode ser avaliado através da presença desta espécie como organismo invasor em outras áreas (AZEVEDO e ARAÚJO, 2005). Comparando a lista de espécies geradas por este trabalho com o banco de dados do Instituto Hórus (www.institutohorus.org.br), foram encontrados registros de invasão de outras áreas apenas para as espécies Eriobotrya japonica, Eucalyptus sp., Morus nigra e Dracaena fragrans. As espécies I. walleriana e H. coronarium também constam no referido banco de dados como invasoras em outras áreas do Brasil. Levando em consideração o Plano de Manejo do PARNASO, que determina que sejam realizados estudos e ações de controle das espécies exóticas e o SNUC, que proíbe a introdução de espécies exóticas nas Unidades de Conservação, recomenda-se realizar a remoção de todos os indivíduos pertencente a espécies exóticas. Esta recomendação pode parecer exagerada já que estes indivíduos não mostram ter potencial invasor nem parecem estar se reproduzindo nas áreas estudadas do Parque. No entanto, como foi ressaltado, a remoção de todas as espécies exóticas busca o cumprimento da legislação e também a prevenção de que as espécies que estão em baixas densidades se propaguem e se tornem invasoras, causando prejuízos. Os indivíduos menores podem ser cortados ou arrancados pela raiz, mas para os indivíduos arbóreos adultos recomenda-se o anelamento de seu tronco. Este método exerce menor impacto sobre a flora nativa, uma vez que os galhos caem gradativamente, impedindo a abertura de grandes clareiras. Entretanto, caso as árvores estejam localizadas próximas a construções do Parque ou dispostas ao longo de estradas ou trilhas deve ser realizado o corte direcionado destas, a fim de evitar acidentes com pedestres e veículos que transitem pelo local. Se não houver espaço para que a árvore caia ao solo sem causar grandes prejuízos, o corte deve ser feito seccionando-as e direcionando a queda de seus pedaços. Devem ser tomados cuidados para, durante a aplicação de todas as técnicas, causar o menor impacto possível ao ambiente. 93 A remoção das espécies exóticas como medida preventiva é aconselhável, pois ainda não há como prever o comportamento de uma espécie introduzida em um ambiente nativo. Isto quer dizer que estas espécies podem não se tornar invasoras e serem eliminadas do sistema sem a intervenção humana, mas podem também começar a se reproduzir e se tornarem pragas no ambiente. Podem ainda, segundo Myers e colaboradores (2000), permanecer em baixas densidades por longos períodos (anos ou até décadas) e, proliferar quando encontrarem as condições ambientais mais favoráveis. É importante mencionar também que, como as espécies possuem pequenas populações, a fauna nativa não desenvolveu ainda uma relação de dependência com estas espécies. Isto é mais forte em se tratando das espécies frutíferas, já que não há produção de frutos suficiente para alimentar a fauna. Este detalhe é especialmente importante, pois quando as espécies nativas e as exóticas desenvolvem relações de inter-dependência deve-se ter mais cuidado na realização do manejo das exóticas para não causar prejuízos às espécies nativas. Pode-se optar ainda por fazer a marcação e monitoramento dos indivíduos encontrados de todas as espécies a fim de verificar o seu potencial invasor, ou seja, se a espécie está se estabelecendo e pode se alastrar pela área. Se forem detectados sinais de dispersão, estes espécimes devem ser removidos do sistema tomando-se sempre cuidado para causar o menor impacto possível ao ecossistema. Esta medida pode ser adotada caso entenda-se que a interferência na mata para remoção de um único indivíduo que porventura sequer tivesse condições de se tornar invasor naquele local possa causar mais impactos à biota nativa do que não intervir. 94 5. CONCLUSÕES GERAIS O presente estudo resultou no registro de 34 espécies exóticas vegetais para o Parque Nacional da Serra dos Órgãos. Estas estão distribuídas por 24 famílias, sendo 13 espécies arbóreas, 10 arbustivas e 11 herbáceas. Levando-se em consideração apenas os trabalhos de campo realizados, foram identificadas nas áreas estudadas do PARNASO 24 espécies vegetais exóticas, pertencentes a 20 famílias. Destas, 10 espécies são de hábito arbóreo, 9 arbustivas e 5 herbáceas. Dentre as espécies exóticas encontradas, Hedychium coronarium (lírio-do-brejo) e Impatiens walleriana (beijinho) são as que ocorrem em maior freqüência nas áreas de estudo. As demais espécies são compostas de indivíduos isolados. O estudo da estrutura da vegetação mostrou que as espécies exóticas se concentram nas áreas de borda florestais, numa distância de 0 a 10m a partir da estrada em direção ao interior da mata. Nas áreas mais internas da floresta não foram encontradas espécies exóticas. Na faixa de mata mais próxima à estrada, as espécies exóticas foram representadas apenas por Hedychium coronarium e Impatiens walleriana, que juntas apresentaram valores de densidade, freqüência, vigor, índice de cobertura e valor de importância superiores aos valores de todas as espécies nativas somadas. Os resultados obtidos levam a crer que as altas taxas de ocupação das áreas estudadas pelas espécies H. coronarium e I. walleriana são indicativos de que estas espécies se adaptaram bem ao ambiente e obtiveram sucesso em sua colonização. A dominância das espécies H. coronarium e I. walleriana sobre as nativas mostra que estas possuem alto poder competitivo, deslocando as espécies nativas nas áreas em que ocorrem e causando alterações no ambiente. Estas espécies, nas áreas em que ocorrem, podem ter modificado a paisagem e causado prejuízos à biota nativa. Estas espécies apresentam padrões de distribuição agregados. Este tipo de padrão pode ocorrer em decorrência das síndromes de dispersão de sementes destas espécies, mas também por nestas espécies a dispersão clonal ser mais importante que a por sementes. Com esta estratégia, estas espécies se tornam mais competitivas e conseguem facilmente se estabelecer e se expandir pelo ambiente. A dispersão agregada ocorre também quando os indivíduos têm maiores chances de sobreviver em sítios específicos do ambiente. A avaliação de fatores relacionados ao microclima que possam explicar porque as espécies exóticas ocorrem nas bordas florestais das áreas de estudo mostrou que o beijinho e o 95 lírio-do-brejo ocorrem em (ou tem maior facilidade em colonizar) áreas mais quentes, com menor umidade relativa do ar e menor grau de sombreamento. A estrada funciona como um conduto para a chegada de espécies exóticas e as alterações provocadas pelos efeitos de borda em suas margens facilitam o estabelecimento destas espécies. Por estarem afetando de maneira negativa a comunidade nativa, tornam-se necessárias ações de gestão das espécies H. coronarium e I. walleriana no Parque Nacional da Serra dos Órgãos. Com base nos resultados dos experimentos de manejo para estas espécies pode ser dito que, para Impatiens walleriana, o arranquio forneceu bons resultados no controle da população desta espécie. Para Hedychium coronarium, o corte raso das plantas se mostrou totalmente ineficiente como método de manejo, mas o arranquio proporcionou resultados positivos. Pode-se então concluir que, tendo o arranquio fornecido bons resultados, a aplicação deste tratamento é adequada para a gestão das espécies exóticas invasoras. Mas devem ser tomados cuidados para que o arranquio não provoque impactos no ecossistema local. Como o ato de arrancar as plantas com raiz tende a revolver o solo (especialmente em se tratando do lírio-do-brejo, pois esta espécie apresenta rizomas difíceis de serem retirados), os processos erosivos são ampliados, podendo culminar no assoreamento dos córregos próximos. A ação de arranquio das plantas pode prejudicar as espécies nativas também pelo revolvimento do solo e pelo arranquio ocasional de plantas nativas e plântulas. Além disso, as áreas manejadas ficam expostas à novas invasões em razão da lenta recolonização das áreas pelas espécies nativas. As grandes densidades encontradas para estas espécies, associadas a uma vasta área de ocorrência resulta em grandes quantidades de biomassa a serem removidas. Isso significa um aporte de nutrientes do sistema significativo. Por isso, recomenda-se que a biomassa retirada seja devolvida ao sistema em forma de composto orgânico. As demais espécies exóticas encontradas nas áreas de estudo, mesmo em pequenas populações, devem ter seus indivíduos removidos do sistema também, seja por arranquio, seja por corte. Esta medida busca atender a legislação vigente que trata sobre o assunto e determina que não haja espécies exóticas em Unidades de Conservação. A adoção desta medida serve também como prevenção para que estas espécies não alcancem o status de invasoras através de sua reprodução e dispersão pelo Parque. 96 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS E RECOMENDAÇÕES Diante da importância da diversidade biológica e da evidente dependência humana dos recursos por ela gerados, as atividades antrópicas que vêm causando prejuízos a esta devem ser revistas. Conservar os ecossistemas e sua biodiversidade é uma questão de responsabilidade com as futuras gerações humanas e com um ambiente que têm valor em si próprio. Neste contexto, a contaminação biológica deve ser tratada com seriedade em virtude dos diversos impactos que causa. Impactos estes que podem ser sinergéticos, ou seja, combinados a impactos causados por outras fontes podem ter seus efeitos multiplicados. Ações de gestão da contaminação causada pelas espécies exóticas invasoras se tornam fundamentais, especialmente quando se trata do Brasil, que contêm uma das maiores biodiversidades do mundo. Entretanto, para que estas ações sejam bem sucedidas, devem ser baseadas em estudos prévios. Por estarem afetando a biota nativa negativamente, tornam-se necessárias, portanto, intervenções de manejo das espécies exóticas, em especial de H. coronarium e I. walleriana, no Parque Nacional da Serra dos Órgãos para que o equilíbrio local seja restabelecido. Com isto buscar-se-á o enfraquecimento da população invasora para que as espécies nativas sejam favorecidas. O tratamento que se mostrou mais eficiente para manejo destas espécies foi o arranquio. Entretanto, esse tipo de intervenção requer alguns cuidados para que não sejam causados danos à comunidade local. É interessante que no plano de gestão para estas espécies exóticas no Parque Nacional da Serra dos Órgãos esteja contemplado o arranquio das plantas com repasses periódicos caso sejam necessários. Associada à esta técnica recomenda-se o plantio de mudas de espécies nativas de rápido crescimento ou o incremento do banco de plântulas e sementes, com vistas à aumentar o sombreamento das áreas manejadas, controlar o processo erosivo do solo e ocupar rapidamente os espaços vazios na mata, reduzindo as áreas que possam ser recolonizadas pelas exóticas. Em relação à biomassa morta resultante da implementação das ações de gestão nas áreas afetadas pelas espécies exóticas, é aconselhada a produção de um composto orgânico que possibilite a reincorporação das nutrientes ao sistema. Este composto pode ser produzido com a trituração e posterior compostagem das plantas removidas, tomando-se o cuidado de 97 remover da massa que será submetida ao processo de compostagem frutos, sementes e gemas que possam germinar posteriormente. Para as demais espécies exóticas encontradas nas áreas estudadas do Parque Nacional da Serra dos Órgãos e que apresentaram populações pequenas, é recomendada a remoção de seus exemplares como medida preventiva. Esta é a medida mais indicada por se tratar de uma unidade de conservação de proteção integral, em que a legislação é clara quando proíbe a introdução de espécies exóticas. A ausência de meios para prever com certeza o potencial invasivo das espécies e os danos que estas podem causar é outra razão para agir na erradicação destas espécies. É importante ressaltar que conseguir a erradicação de uma espécie exótica é uma tarefa que se torna mais difícil à medida que a espécie se estabelece e espalha pelo ecossistema. As técnicas recomendadas são o arranquio ou corte para os indivíduos de menor porte e o anelamento para os indivíduos arbóreos adultos, por esta técnica causar menos impactos à biota que a derrubada direta da árvore, além de ser menos onerosa e de mais fácil aplicação. Deve também ser realizado o monitoramento das áreas atingidas a fim de acompanhar a nova dinâmica do ambiente. Além do adequado manejo das espécies problemáticas, o plano de gestão das espécies exóticas no Parque Nacional da Serra dos Órgãos deve contemplar medidas de prevenção da introdução de novas espécies, como por exemplo, evitar o uso de espécies exóticas nos jardins públicos e nas casas funcionais. Cabe dizer que agir de modo preventivo é mais fácil e menos oneroso do que realizar o controle das espécies exóticas quando estas já estão disseminadas pelo ambiente. Ações de gestão de espécies exóticas invasoras não abrangem apenas a dimensão técnico-científica da questão, mas também aspectos sociais, éticos e legais que precisam ser considerados. Os Parques Nacionais têm como objetivos básicos definidos pelo SNUC A preservação de ecossistemas naturais de grande relevância ecológica e beleza cênica, possibilitando a realização de pesquisas científicas e o desenvolvimento de atividades de educação e interpretação ambiental, de recreação em contato com a natureza e de turismo ecológico (SNUC, 2003: 16). Por esta razão, a gestão das espécies exóticas invasoras deve incluir também os aspectos sociais relacionados. A introdução de espécies exóticas pelo homem é um processo cultural. As pessoas transportam espécies vegetais consigo por seu valor ornamental ou porque delas se tem algum conhecimento que justifique seu cultivo (medicinal ou econômico). O fato é que, culturalmente falando, a introdução de espécies exóticas é um 98 processo natural e economicamente necessário. Cabe dizer que a economia brasileira é fortemente baseada em espécies exóticas, sendo 64% das colheitas nacionais constituídas de materiais genéticos exógenos (ALBAGLI, 1998). Quando as pessoas não têm conhecimento sobre as conseqüências da introdução deliberada de espécies exóticas, parece um absurdo aos olhos delas que se tente exterminar uma espécie de uma unidade de conservação. Se as espécies a serem removidas da paisagem forem ornamentais ou frutíferas parece ser uma injustiça ainda maior tal “matança”. As práticas de manejo podem causar fortes impactos visuais devido à remoção das plantas de áreas extensas, que ficam temporariamente vazias. O visitante que não tem informações sobre os impactos que as espécies exóticas causam no ambiente pode ficar chocado com as práticas de manejo e agir de modo a tentar impedir a supressão das espécies manejadas, retardando os programas de gestão. No Parque Nacional da Tijuca, o programa de manejo da espécie Artocarpus heterophyllus (jaqueira) enfrentou problemas com a opinião pública. O projeto teve que ser abortado em virtude de denúncias feitas por visitantes ao Ministério Público e à Polícia Federal, após divulgação negativa do programa de manejo na internet, contra o anelamento e morte das jaqueiras no Parque (MENEZES, 2006). O aumento da informação em todos os setores da sociedade sobre as espécies exóticas invasoras é fundamental para reduzir os riscos de introduções acidentais e para estabelecer regras para introduções intencionais. O controle e erradicação de espécies exóticas invasoras têm maior possibilidade de sucesso se forem apoiados pelas comunidades locais e demais atores sociais envolvidos. Assim, o plano de gestão deve contemplar programas de educação ambiental para a conscientização do público sobre o que são espécies exóticas, quais os problemas causados pelas invasões biológicas e a importância das ações de manejo destas na unidade de conservação. Existe a necessidade de realização de mais estudos que esclareçam algumas questões levantadas a partir dos resultados deste trabalho. Muitos pontos ainda devem ser esclarecidos para melhorar o nível de conhecimento atual acerca do processo de invasão biológica e para o desenvolvimento de técnicas de manejo eficazes e seguras. A continuidade dos experimentos de manejo para determinar, no longo prazo, os padrões de resposta das espécies às intervenções e entender a dinâmica de suas populações é fundamental. Várias outras questões devem ainda ser respondidas, como o conhecimento das espécies vegetais que ocorrem em áreas de borda que não sofreram contaminação por espécies 99 exóticas. Estas são as espécies que estão sendo eliminadas do sistema pelas invasoras e que devem ser plantadas em associação às técnicas de remoção das exóticas, especialmente aquelas de crescimento acelerado. Nestas áreas não invadidas, mas que se localizam também nas bordas florestais (áreas preferenciais para a ocorrência das invasoras encontradas) são encontradas as mesmas condições de sombreamento, temperatura e umidade relativa que nas áreas em que as invasoras ocorrem? Outras variáveis edafo-climáticas podem ainda ser testadas com a finalidade de explicar os padrões de ocorrência encontrados. Além de buscar um conhecimento mais aprofundado sobre o processo de invasão biológica, as características das espécies exóticas e as técnicas mais adequadas para lidar com essa problemática, outras vertentes devem ser também levadas em consideração nas pesquisas. Estimativas dos custos para realização do controle das populações de espécies exóticas invasoras devem ser feitas, bem como insumos e mão-de-obra necessária. Planos de ação para prevenção da chegada de espécies exóticas também devem ser pensados, bem como políticas públicas e educação ambiental. 100 LITERATURA CITADA ABREU, M. A. (Org.). Natureza e sociedade no Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Biblioteca Carioca. Secretaria Municipal de Cultura, Turismo e Esporte, 1992. ABREU, R. C. R.; IGUATEMY, M. A.; RODRIGUES, P. J. F. P. Espécies vegetais exóticas e invasoras: problemas e soluções. In: CONGRESSO DE ECOLOGIA DO BRASIL, 6., 2003, Fortaleza. Anais... Fortaleza, CE: Editora da UFCE, 2003. ABREU, R. C. R. 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Tese de doutorado – Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2000. 112 ANEXO 1 REUNIÃO DE TRABALHO SOBRE ESPÉCIES EXÓTICAS INVASORAS: PROMOVENDO COOPERAÇÃO NA AMÉRICA DO SUL Promovida pelo Governo do Brasil, por meio do Ministério do Meio Ambiente e da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA) do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, em colaboração com o Governo dos Estados Unidos da América, por meio do Departamento de Estado e da Embaixada dos Estados Unidos no Brasil, e com o Programa Global para Espécies Exóticas Invasoras (GISP). DECLARAÇÃO Reunidos na cidade de Brasília, de 17 a 19 de outubro de 2001, especialistas representando Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Equador, Guiana Francesa, Paraguai, Peru, Suriname, Uruguai e Venezuela resolveram emitir a seguinte declaração: RECONHECEM QUE: 1. As espécies exóticas invasoras, que incluem pragas, doenças e ervas daninhas, além de causarem enormes prejuízos econômicos, principalmente à agricultura, constituem uma das principais ameaças à biodiversidade e aos ecossistemas naturais, além dos riscos à saúde humana. 2. A crescente globalização, com o incremento do transporte, do comércio e do turismo internacional, o início das mudanças climáticas causadas pelo efeito estufa e mudanças no uso da terra, tendem a ampliar as oportunidades de introdução e expansão de espécies exóticas invasoras na região. 3. A América do Sul abriga metade das florestas tropicais e mais de um terço de toda a biodiversidade do mundo, imenso e valioso patrimônio natural em grande parte compartilhado por 13 países, muitos deles megadiversos; biodiversidade que é a base da sustentabilidade dos serviços ambientais, dos recursos florestais e pesqueiros, da agricultura e da nova indústria da biotecnologia. Cerca de 50% do Produto Interno do Brasil, por exemplo, vem do uso direto da biodiversidade e seus recursos genéticos. 4. Os prejuízos causados por espécies exóticas invasoras à produção agrícola na América do Sul excedem a muitos bilhões de dólares ao ano. A título de exemplo, na Argentina a mosca das frutas custa US$ 10 milhões de dólares ao ano com programas de controle, mais 15-20% da produção em perdas anuais diretas, equivalentes a US$ 90 milhões de dólares por ano, e impactos econômicos e sociais indiretos incalculáveis com a redução da produção e perda de mercados de exportação. 113 5. Como integrantes de um mesmo continente, separados apenas por fronteiras políticas, os países sul-americanos compartilham o mesmo destino no caso de introdução de espécies exóticas invasoras – é essencial, portanto, a promoção de maior cooperação entre os países na região na prevenção e controle de um inimigo comum. CONCLUSÕES: 1. Apesar dos avanços recentes na prevenção e controle de espécies exóticas invasoras que ameaçam a agricultura, constata-se a necessidade de maior atenção para a prevenção e controle dos impactos de espécies exóticas invasoras sobre os ecossistema naturais e sobre a rica biodiversidade da região. 2. Se reconhece a importância de implementar plenamente na região a Decisão V/8 da 5a Conferência das Partes da Convenção sobre Diversidade Biológica que estabeleceu diretrizes para a prevenção e controle de espécies exóticas invasoras que ameaçam ecossistemas, habitats ou espécies. 3. Há necessidade de se promover maior intercâmbio de informação, começando pela elaboração de diagnósticos nacionais sobre o problema, pesquisa, capacitação técnica, fortalecimento institucional, conscientização pública, coordenação de ações e harmonização de legislações. 4. Sem prejuízo de outros temas identificados nos diagnósticos nacionais, merece atenção urgente o problema de introdução de espécies exóticas invasoras nas diferentes bacias hidrográficas da região e ecossistemas transfronteiriços. 5. Também existe a necessidade de se promover maior coordenação e cooperação entre os setores agrícolas, florestais, pesqueiros e ambientais nacionais no tratamento dessa questão, incluindo a criação de comissões nacionais sobre espécies exóticas invasoras, e envolver outros setores relacionados ao tema como saúde, turismo, transporte e comércio, bem como o setor privado. 6. É essencial, portanto, a promoção de maior cooperação entre os países na região na prevenção e controle de um inimigo comum, incluindo a elaboração de uma estratégia regional sul-americana para espécies exóticas invasoras, bem como cooperar com os demais países das Américas e com o esforço global para solucionar um problema comum liderado pela FAO, CDB e GISP. 7. Constata-se, entretanto, que existe falta de conscientização pública da importância desse tema, o que facilita a introdução acidental de espécies exóticas invasoras. 8. A efetiva prevenção e controle de espécies exóticas invasoras na América do Sul necessitará de apoio financeiro e técnico adequado. 114 ANEXO 2 Impatiens walleriana Hook. f. Sin.: Impatiens sultani Hook. f. Pertencente à família Balsaminaceae e de origem africana. Também conhecida como beijinho, beijo-turco e maria-sem-vergonha, esta espécie possui hábito herbáceo e ciclo de vida perene. Planta ereta, ramificada, suculenta e glabra, com altura de 30 a 50 cm. Apresenta caule geralmente ramificado, cilíndrico, carnoso e com coloração verde ou avermelhada. Possui folhas macias, alternas ou opostas, lanceoladas ou ovadas, com bordos crenados ou denteados e comprimento variando de 3 a 10 cm. As flores são solitárias ou em racemos terminais ou axilares e se mostram nas mais variadas cores, comumente vermelhas, laranjas, róseas, roxas ou brancas, produzidas ao longo de todo o ano. Forma frutos capsulares, verdes e suculentos, com muitas sementes, que explodem ao mais leve toque quando maduros. As sementes se dispersam autocoricamente. A espécie é largamente utilizada como ornamental e multiplica-se facilmente por sementes ou por estaquia. É cultivada em grupamentos a pleno sol ou meia-sombra, em solos ricos em matéria orgânica e umidade. Prefere o calor, mas é tolerante ao frio e não exige cuidados especiais. Adaptou-se tão bem ao Brasil que surge espontaneamente em jardins urbanos e matas nativas, sendo considerada daninha em algumas situações. Domina áreas sombreadas, em especial ambientes úmidos, deslocando espécies nativas de sub-bosque e infestando áreas de lavouras, causando prejuízos econômicos. Uma interessante curiosidade é que o primeiro nome científico dado à espécie, hoje em sinonímia, homenageia o Sultão de Zanzibar. Fontes: Instituto Hórus (2008) Lorenzi e Souza (2001) 115 Hedychium coronarium J. König Nativa da Ásia Tropical (do Himalaia até China e Madagascar), esta espécie é uma Angiospermae monocotiledônea pertencente à família Zingiberaceae. Possui muitos nomes vulgares, entre eles lírio-do-brejo, lágrima-de-moça, lírio-branco, borboleta, lágrima-de-vênus, gengibre-branco, jasmim e jasmim-borboleta. O termo Hedychium vem do grego e significa “neve doce” e a palavra coronarium deriva do latim corona e significa “coroa” (SANTOS et al, 2005b). É considerada por alguns autores como uma macrófita aquática pelo fato de vegetar áreas permanentemente molhadas (SANTOS et al, 2005b). Planta de forma biológica herbácea, perene, rizomatosa, entouceirada, com altura variando entre 1,5 a 2,0 metros. Possui raízes abundantes e fortes rizomas, com gemas a partir das quais emergem novos caules, formando clones. Apresenta caules eretos, não ramificados, vigorosos, cilíndricos, avermelhados na base e encobertos no restante da extensão por bainhas foliares, uma por entrenó. Suas folhas são simples, alternas, coriáceas, lanceoladas e tomentosas na face de baixo, de coloração verde intensa e brilhante. As lâminas possuem 30 a 80 cm de comprimento e 10 a 15 cm de largura, com margens inteiras, lisas e glabras em ambas as faces. Limbo com nervura central proeminente no dorso. Apresenta bainhas estriadas, às vezes pubescentes e longas, que cobrem os entrenós. As inflorescências ocorrem em espigas terminais, com flores de corolas brancas ou amarelo pálidas e estames petalóides, grandes e aromáticas, formadas praticamente o ano todo. Na inflorescência há uma seqüência de brácteas imbricadas, formando um arranjo estrobiliforme. As brácteas são ovaladas, de ápice agudo e com 4 a 5 cm de comprimento. Dentre as brácteas surgem as flores, duas a três por cada. A polinização é feita por mariposas. O fruto da espécie é do tipo baga, deiscente, de formato elíptico, liso e glabro. Sua cor passa de verde a alaranjada quando maduro. As sementes possuem forma ovalada e coloração avermelhada e são envoltas por um arilo 116 vermelho. Sua dispersão se dá por zoocoria. Ocorre preferencialmente em lugares brejosos, com solos ricos em matéria orgânica, a pleno sol. Apresenta crescimento agressivo, sendo considerada como planta invasora em solos agrícolas brejosos, além de ocorrer em áreas naturais, causando prejuízos. Nas áreas naturais esta espécie pode substituir a vegetação em áreas úmidas e sub-bosque das florestas. Pode invadir também canais, riachos e outras coleções d’água pouco profundas, mas o habitat ideal é o de baixadas úmidas com temperatura elevada durante todo o ano. Já foram relatados prejuízos econômicos também em lagos de hidrelétricas e em tubulações entupidas pela espécie. Tem uso ornamental, sendo cultivada em conjuntos, renques ou mesmo isoladamente. Multiplica-se facilmente por divisão de touceira contendo rizoma, sendo a reprodução vegetativa ou clonal a estratégia de dispersão mais eficiente para esta espécie. No passado, a espécie era utilizada na fabricação de papel em Morretes (PR). Das flores extrai-se uma essência utilizada na fabricação de perfumes e dos rizomas pode-se extrair uma fécula comestível. Fontes: Instituto Hórus (2008) Lorenzi e Souza (2001) Livros Grátis ( http://www.livrosgratis.com.br ) Milhares de Livros para Download: Baixar livros de Administração Baixar livros de Agronomia Baixar livros de Arquitetura Baixar livros de Artes Baixar livros de Astronomia Baixar livros de Biologia Geral Baixar livros de Ciência da Computação Baixar livros de Ciência da Informação Baixar livros de Ciência Política Baixar livros de Ciências da Saúde Baixar livros de Comunicação Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE Baixar livros de Defesa civil Baixar livros de Direito Baixar livros de Direitos humanos Baixar livros de Economia Baixar livros de Economia Doméstica Baixar livros de Educação Baixar livros de Educação - Trânsito Baixar livros de Educação Física Baixar livros de Engenharia Aeroespacial Baixar livros de Farmácia Baixar livros de Filosofia Baixar livros de Física Baixar livros de Geociências Baixar livros de Geografia Baixar livros de História Baixar livros de Línguas Baixar livros de Literatura Baixar livros de Literatura de Cordel Baixar livros de Literatura Infantil Baixar livros de Matemática Baixar livros de Medicina Baixar livros de Medicina Veterinária Baixar livros de Meio Ambiente Baixar livros de Meteorologia Baixar Monografias e TCC Baixar livros Multidisciplinar Baixar livros de Música Baixar livros de Psicologia Baixar livros de Química Baixar livros de Saúde Coletiva Baixar livros de Serviço Social Baixar livros de Sociologia Baixar livros de Teologia Baixar livros de Trabalho Baixar livros de Turismo