ATA DA SESSÃO SOLENE EM HOMENAGEM AO MINISTRO
ARNALDO LOPES SUSSEKIND
Aos nove dias de agosto de dois mil e treze ás 18 horas realizou-se a
sessão solene em homenagem ao Ministro Arnaldo Lopes Sussekind,
na sede da Instituição, na cidade do Rio de Janeiro – Av. Marechal
Câmara, 210 – 5º andar. Aberta pelo Presidente Dr. Fernando
Fragoso a sessão dedicada a homenagear o Ministro ARNALDO
LOPES SUSSEKIND, que foi, durante toda sua vida, uma ativo
membro efetivo do Instituto dos Advogados Brasileiros, falecido em 9
de agosto de 2012, há exatamente um ano. Presentes à sessão, a
viúva Sra. Olga Sussekind, a filha Marisa Santos Sussekind, os netos
Flávio Sussekind Neto, Bernardo Sussekind, Renata Sussekind, bem
como o Presidente do TRT - 1º região, Desembargador do
Trabalho Carlos Alberto Drummond, o Presidente da Asssociação
Brasileira de Advogados Trabalhistas Dr. Antonio Fabricio de Matos
Gonçalves, a Presidente da Associação Carioca de Advogados
Trabalhistas Dra. Ana Beatriz Bastos Serafim, o Presidente do Colégio
de Presidentes de Institutos do Brasil, Dr. Antonio Luiz Calmon
Teixeira - Presidente do Instituto da Bahia e a Presidente da
Associação dos Magistrados Trabalhistas, Juíza Anna Britto da Rocha
Acker, todos convidados para compor a mesa dos trabalhos. Realçou
o Presidente Fernando Fragoso os laços pessoais de amizade com o
Ministro Sussekind e seus filhos, Arnaldo e Marisa, bem como a
trajetória do Ministro na vida pública e dentro do IAB, onde ocupava,
por seus elevados méritos, cadeira no Conselho Superior. Foi dada a
palavra ao Orador da tarde, Dr. Celso da Silva Soares, especialmente
designado pela presidência, que proferiu o seguinte discurso: Um
jurista militante - (Homenagem a Arnaldo Süssekind – IAB –
09/07/2013). O fato de Arnaldo Lopes Süssekind ter simbolizado a história
da legislação trabalhista no Brasil induziria a que a homenagem que o
Instituto dos Advogados Brasileiros presta à sua memória tivesse o caráter
de solenidade formal. Porém a formalidade trata da imagem, e isso traz
certo distanciamento da realidade. A imagem faz crer que a vida do
homenageado tenha sido retilínea, mas a vida é um caminho que se
percorre e esse caminho não é retilíneo. Julgamos mais importante
ressaltar a realidade viva de Süssekind, despida de formalismo. Essa
realidade sobressai das entrevistas que concedeu às organizadoras do
livro Arnaldo Süssekind, um construtor do Direito do Trabalho, da Editora
Renovar. A elas recorreremos para sentir como se estivéssemos conversando
com ele. Convivi com Süssekind no IAB, em reuniões da OAB, em
congressos locais e nacionais de advogados trabalhistas, em palestras e
painéis de debates. Nessa convivência, descobri um homem ativo, que
tratava os advogados como iguais, dotado de espírito crítico, de disposição
de lutar por seus pontos de vista, mas também da capacidade de rever
conceitos seus. Por exemplo: a comissão da OAB do Rio de Janeiro
encarregada de elaborar anteprojeto que assegurasse honorários de
sucumbência no processo trabalhista sustentava que passasse a ser
obrigatória a representação da parte por advogado, o que implicaria revogar
o artigo 791 da CLT, segundo o qual essa representação é facultativa.
Integrante da comissão, Süssekind reviu sua posição favorável a esse artigo
e apoiou a proposta de revogação. Nos anos 80 do século passado, foi
Presidente da Comissão Permanente de Direito do Trabalho do IAB e
enriqueceu o exercício da presidência não apenas por sua cultura jurídica,
mas acima de tudo por deixar que fluíssem livremente os debates. Quando
exerci a presidência desta Casa, Süssekind foi Diretor Adjunto e, embora se
tratasse de um cargo honorífico, frequentava as reuniões da diretoria,
opinava, fazia propostas, votava; não podendo comparecer, justificava a
ausência. No livro antes referido, Süssekind revela aspectos prosaicos da
sua juventude. Conta que gostava de futebol e de dançar, foi campeão de
atletismo pelo Fluminense, gostava também de cantar e quase seguiu a
profissão de cantor de rádio. Fazia parte de um grupo que se reunia na
Praça General Osório e um dia o locutor esportivo Oduvaldo Cozzi,
participante desse grupo, lhe comunicou que o havia inscrito num concurso
para promoção do filme Invisível trovador. Süssekind pensou em recusar,
mas acabou aceitando. Ganhou o concurso, na sessão de estreia do filme
cantou e recebeu prêmios, entre os quais um contrato de três meses com a
Rádio Nacional, que cumpriu. Não o renovou, atendendo a pedido do pai,
desembargador Frederico Süssekind. Não foi dançarino somente na
juventude. Conforme este orador testemunhou, não perdia os bailes das
festas de encerramento dos congressos da Associação Brasileira de
Advogados Trabalhistas, a ABRAT. Essa propensão juvenil ao esporte, ao
canto e à dança indicava que Süssekind não seria cultor de uma ordem
social inerte, estática, mas de uma sociedade em movimento, o que o
tornou um jurista militante. Seu pensamento não se guiava pelas abstrações
do mundo do direito, trazia a realidade social para seu interior. Defendia,
por exemplo, a limitação da autonomia da vontade patronal pela
intervenção do Estado na relação capital-trabalho e assim explicitou sua
posição: “Toda a discussão acerca da miséria, desencadeada a partir da
Revolução Francesa, e os ideais de igualdade perante a lei me conduziram a
uma visão crítica da igualdade contratual, da não intromissão do Estado nas
relações de trabalho e da enorme exploração que disso resultava.” (.........)
“Daí procedem as minhas posições favoráveis à intervenção do Estado nas
relações de trabalho.” Sempre se manifestou contrário à injustiça social.
Quando aluno da Faculdade Nacional de Direito, participou da política
estudantil, integrando um grupo que reunia alunos de esquerda e centroesquerda, conforme relatou: “Esse grupo, do qual só Souza Brasil não era
de esquerda ou centro-esquerda, granjeou tanto prestígio entre os colegas
que elegeu os representantes da turma em todas as eleições para o Diretório
Acadêmico e o Caco, derrotando os integralistas aliados aos monarquistas.”
“Sempre me considerei um social-democrata, de meia-esquerda, usando
uma linguagem do futebol. Do nosso lado, a maioria não era comunista,
mas de centro-esquerda, partidários de uma visão social-democrata, com a
qual eu me identificava.” “Doutrinariamente, desde os tempos da
faculdade, considero-me vinculado à filosofia social-trabalhista (.....).” Seu
grupo vencera em 1937 a eleição para o Diretório Acadêmico, e Süssekind,
na obra citada, assim se referiu a essa passagem: (........)“Também faziam
parte da chapa vitoriosa, entre outros, além de mim, que assumi pela
segunda vez o cargo de primeiro-secretário, Alfredo Tranjan, que se
notabilizou como advogado, Délio Maranhão e Gustavo Simões Barbosa,
que chegaram a presidir o Tribunal Regional do Trabalho.”
“ A
principal campanha política do Diretório Acadêmico foi pela reintegração
dos professores que haviam sido demitidos, acusados de comunistas. Eram
Leônidas Resende, Luís Carpenter, Castro Rebelo e Hermes Lima.” Um
episódio da biografia de Süssekind demonstra o quanto a vida nada tem de
retilínea. Esse passado e o fato de se considerar um social-democrata não o
impediram de aceitar convite para ocupar, no governo Castelo Branco, o
cargo de Ministro do Trabalho, tendo promovido intervenções em
sindicatos, afastando suas diretorias e nomeando juntas administrativas.
Tempos depois, indagado sobre essa questão, reconheceu a contradição de
sua atitude: “As intervenções em associações sindicais vieram contrariar
tudo o que eu sempre defendera na OIT, mas a verdade é que tive de reagir
a uma corrente que pretendia, simplesmente, fechar os sindicatos. Para
mim, isso representava uma certa complicação porque, durante toda a
minha vida, sustentei a necessidade da liberdade sindical, que naquele
momento estava sendo ferida. Mas, enfim, era para evitar um mal maior. À
frente do Ministério do Trabalho, meu objetivo e minhas ações visavam,
sobretudo, a impedir o desmonte da legislação trabalhista. Foram muitas as
pressões para o uso político dos institutos de pensão, e também contra a
estabilidade.” E conseguiu evitar esse desmonte. Resistiu à extinção da
estabilidade no emprego, relatando que a grande insistência de certas
entidades patronais visava ao seu fim, e apesar de intensas pressões para
que fizesse um comunicado, declarando que o artigo 7.º do Ato Institucional
suspendia o direito à estabilidade, esta foi mantida. Somente após Süssekind
ter deixado de ser Ministro do Trabalho, o Congresso aprovou a lei que
criou o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, ato que na prática
estimulou o fim da estabilidade.
Na presidência da Comissão
Interministerial instituída no governo Geisel, quando já não era mais
Ministro do Trabalho, inscreveu, no anteprojeto de reforma da CLT então
elaborado, o artigo 606, que admitia que os sindicatos, na qualidade de
substitutos processuais de seus associados, ajuizassem na Justiça do
Trabalho ação de cumprimento de convenção ou acordo coletivo de
trabalho, o que acabou não sendo transformado em lei. Inscreveu também a
estabilidade para empregados integrantes das Comissões Internas de
Prevenção de Acidentes de Trabalho, que resultou no artigo 165 da CLT.
Uma vez retomada a democracia no país, Süssekind formou entre os que se
opunham às tentativas de desestruturar o Direito do Trabalho, criticou o
apoio da grande imprensa ao neoliberalismo e exaltou a posição contrária
das entidades de advogados e magistrados. São palavras suas: “Os
neoliberais – assim chamados – são os que tentam desregulamentar o
Direito do Trabalho, admitindo uma ampla flexibilização. Para eles, os
direitos dos trabalhadores só decorreriam de convenções ou acordos
sindicais, como ocorre nos Estados Unidos ou no Canadá, por exemplo.
Sempre me opus a isso, baseado no fato de o Brasil ser um país de
dimensões continentais, com regiões plenamente desenvolvidas, outras em
vias de desenvolvimento, e algumas subdesenvolvidas, nas quais não se pode
aplicar o sistema jurídico de países ampla ou totalmente desenvolvidos. Em
cidades do interior de algumas unidades da federação, e mesmo em suas
capitais, os direitos trabalhistas não podem depender dos empregados, ou de
seus sindicatos, para um acordo coletivo. “O Direito do Trabalho visou ao
equilíbrio de forças, e suas normas imperativas tornaram o trabalhador
mais protegido em uma negociação. Os liberais têm apoio ostensivo da
mídia, que acompanha o movimento preservando os interesses dos
anunciantes. Em contrapartida, diversas associações de âmbito cultural,
como o IAB, a AMB, a OAB, a Anamatra, a Abrat, etc., sempre se
manifestaram em defesa do Estado Social.” Contestou o argumento de que
a flexibilização ou a desregulamentação da legislação do trabalho reduziria
o desemprego: “A verdade é que, nos países onde a legislação do trabalho
foi flexibilizada ou desregulamentada, o desemprego não foi reduzido. Para
tanto, como está provado, é imprescindível o desenvolvimento econômico.”
Foi um dos primeiros juristas a contestar o projeto de lei do governo
Fernando Henrique que introduzia três parágrafos ao artigo 618 da CLT
com a finalidade de que, se houvesse convenção coletiva ou acordo coletivo
de trabalho correspondente a um tema, a lei não fosse aplicada, o que na
época se chamou de prevalência do negociado sobre o legislado. Como um
dos autores do projeto que instituiu a Consolidação das Leis do Trabalho,
repeliu os ataques à CLT, os quais alegavam que seria fascista, cópia
da Carta del Lavoro de Mussolini: “A alegação de que a CLT é uma cópia
da Carta del Lavoro, repetida por quase 99% de pessoas que nunca leram
esse documento de Mussolini, é absolutamente falsa. Desde logo convém
lembrar que a CLT tem 922 artigos; e a referida Carta apenas 30. Desses,
somente 11 diziam respeito aos direitos e à magistratura do trabalho. Quase
todos repetiam princípios e normas historicamente consagrados, tipo: o
trabalho noturno deve ter remuneração superior ao diurno; o empregado
tem direito ao repouso semanal, em regra coincidente com o domingo; após
um ano de serviço o trabalhador tem direito a férias remuneradas; a
despedida a que o empregado não deu causa lhe assegura direito de
indenização proporcional; a mudança na propriedade da empresa não
resolve os contratos de trabalho; o novo emprego pode ficar sujeito a um
período de prova, com direito recíproco de denúncia; o contrato coletivo se
aplica ao empregado a domicílio. “Mas pode-se dizer que o monopólio da
representação da categoria pelo sindicato e seus corolários, estatuídos pela
Constituição de 1937, e mantidos pela de 1988, foram copiados da Carta
italiana de 1927. Acontece que a unicidade sindical compulsória e o
respectivo registro no órgão público foram instituídos dez anos antes, em
1917, na União Soviética. Como bem recordou Evaristo de Moraes Filho,
esse princípio era defendido por Máxime Leroy em 1913.” (Jurista francês,
autor de obras sobre sindicalismo.)A imputação de fascista à CLT decorria
da deliberada confusão do corporativismo com o fascismo. Süssekind
contestou essa confusão, argumentando que o fascismo “conspurcou o
corporativismo”, que não fora criação de Mussolini, mas do jurista romeno
Manoïlesco, segundo o qual o Legislativo devia ter supremacia, a qual seria
assegurada pela formação de representações das corporações. O governo
Vargas pautava-se pelo projeto político corporativista e prova disso foi a
inclusão, na Justiça do Trabalho, da representação classista. Manifestou-se
em defesa da Justiça do Trabalho, que na década de 90 do século passado,
de acordo com a pretensão neoliberal de eliminar a intervenção do Estado
nas relações de trabalho, se pretendeu extinguir sob o pretexto de acabar
com o poder normativo e a representação classista. Süssekind entendia que
o poder normativo não deveria ser extinto e sim revisto, tornando-se um
poder arbitral, conforme ocorre em outros países. Quanto à representação
de empregados e empregadores na Justiça do Trabalho, justificou o seu fim
por ter acabado desmoralizada pelos próprios sindicatos, pois muitos
passaram a ser criados com a única finalidade de eleger juízes classistas e
receber o imposto sindical.
Participou de manifestação de juízes e
advogados contra a extinção da Justiça Trabalhista, em frente ao prédio do
Tribunal Regional do Trabalho, que leva seu nome, e rejeitou com
veemência o argumento de que só no Brasil havia Justiça do Trabalho:
“Isso é uma mentira deslavada! Existe Justiça do Trabalho em inúmeros
países. A Justiça do Trabalho na Alemanha e Israel é igual à do Brasil. Foi
feita depois, usando a experiência brasileira. A Alemanha, inclusive, até
hoje tem representação classista, embora não haja o chamado poder
normativo. Mas no México a Justiça do Trabalho tem um poder normativo
mais amplo do que a do Brasil. Na África, quase todos os países têm Justiça
do Trabalho. E a Espanha também tem, e assim por diante.” Sussekind,
deixou-nos num dia 9 de julho, quando estaria comemorando mais um
aniversário. O doloroso fato da morte, único certeza dos vivos,
sempre me lembra Fernando Pessoa. Morrer – dizia ele – é vir
caminhando pela rua e de repente virar uma esquina para nunca mais
aparecer. Quando alguém vira a esquina, apenas termina sua
convivência com os demais; o desaparecido continua a existir na
memória dos que com ele conviveram. Tendo-se encerrado sua vida,
encerrou-se apenas a convivência de Süssekind conosco. Ficará a
memória, e a memória é a continuidade da existência. Hoje o IAB,
recordando a caminhada de Süssekind pela vida, contribui para tornálo imorredouro. Findo o discurso do Dr. Celso da Silva Soares, pediu a
palavra o Dr. Augusto Haddock Lobo referindo-se à amizade e labor
comum de seu pai, o ex-presidente da Casa, Dr. Eugenio Roberto
Haddock Lobo, com o homenageado, e os contatos permanentes de
todos os advogados que integraram nestes anos a Comissão
Permanente de Direito Trabalhista do IAB. Por fim, agradeceu em
nome da família, a Sra. Marisa Santos Sussekind. Antes de encerrar,
o Presidente franqueou a palavra, não havendo mais outra solicitação
por parte dos muitos advogados e juízes trabalhistas presentes. Por
fim, nada mais havendo a tratar, foi encerrada a sessão da qual eu,
Ubyratan Cavalcanti – Secretário-Geral, lavrei a ATA, que vai assinada
por mim e pelo Presidente.
Dr. Fernando Fragoso
Presidente
Dr. Ubyratan Cavalcanti
Secretário-Geral
Download

ATA DA SESSÃO SOLENE EM HOMENAGEM AO MINISTRO