4.5 – COMPENSAÇÃO A compensação consiste em forma especial de extinção da obrigação, a qual ocorre quando as partes de uma relação obrigacional são ao mesmo tempo credoras e devedoras uma da outra. Dois débitos contrapostos são compensados com o fito de se alcançar o adimplemento. A eficácia da compensação consiste em liberar e satisfazer as partes. Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald. CC, Art. 368. Se duas pessoas forem ao mesmo tempo credor e devedor uma da outra, as duas obrigações extinguem-se, até onde se compensarem. A compensação pode ser total ou parcial: A é credor de B de R$ 10 mil. B é credor de A de R$ 10 mil. Ocorrerá a compensação TOTAL. A é credor de B de R$ 10 mil. B é credor de A de R$ 5 mil. Ocorrerá a compensação PARCIAL, extinguindo a obrigação até onde se compensarem. Compensação X Novação: COMPENSAÇÃO Modo extintivo pagamento. satisfatório NOVAÇÃO do Extingue vínculos obrigacionais sem o pagamento. Compensação X Confusão: COMPENSAÇÃO CONFUSÃO Duas pessoas são reciprocamente A mesma pessoa é credora e credora e devedora uma da outra. devedora de certa relação jurídica. Exemplo: A é credor de B de R$ 10 mil. B é o único herdeiro de A. A falece deixando todo seu patrimônio para B. B passa a ser credor de si mesmo. ESPÉCIES DE COMPENSAÇÃO: 1 – Compensação CONVENCIONAL 2 – Compensação JUDICIAL ou PROCESSUAL 3 – Compensação LEGAL 1 – Compensação CONVENCIONAL: Decorre da autonomia privada, do princípio da liberdade negocial. Independe dos requisitos do Art. 369 e 370, CC. Pela compensação convencional, pode-se compensar dívidas ilíquidas, inexigíveis e de coisas infungíveis por vontade das partes, contanto que com isso não sejam violadas normas de ordem pública. 2 – Compensação JUDICIAL ou PROCESSUAL: Decorre de reconhecimento judicial em devido processo legal. Independe de provocação. Cuidado! A compensação judicial não recebe esse nome apenas por ser pronunciada por juiz. A compensação convencional e legal também podem ser pronunciadas por juiz. Ocorre que nesses casos (convencional e legal) o juiz apenas declara a compensação, enquanto que na compensação judicial o juiz a constitui, mesmo não havendo a liquidez dos créditos envolvidos. Exemplo: CPC, art. 21. Juiz julga a ação parcialmente procedente – As partes serão ao mesmo tempo vencidas e vencedoras. O juiz pode determinar a compensação dos honorários e das despesas. CPC, Art. 21. Se cada litigante for em parte vencedor e vencido, serão recíproca e proporcionalmente distribuídos e compensados entre eles os honorários e as despesas. Parágrafo único. Se um litigante decair de parte mínima do pedido, o outro responderá, por inteiro, pelas despesas e honorários. 3 – Compensação LEGAL: Ocorre automaticamente extinguindo as dívidas recíprocas. Independe da vontade das partes, segundo Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald. Obs: Para Pablo Stolze Gagliano, a provocação do interessado é necessária, não podendo o juiz determinar a compensação legal de ofício. Em regra, ocorre como defesa indireta de mérito, o que não deve ser reconhecido de ofício pelo juiz. Deve respeitar os requisitos objetivos e subjetivos do Art. 369, CC. CC, Art. 369. A compensação efetua-se entre dívidas líquidas, vencidas e de coisas fungíveis. Requisitos: A - Reciprocidade das Obrigações As partes devem ser reciprocamente credoras e devedoras uma da outra. Essa regra é flexibilizada no caso do FIADOR, que mesmo não sendo parte recíproca na relação obrigacional, pode compensar, conforme CC, art. 371. CC, Art. 371. O devedor somente pode compensar com o credor o que este lhe dever; mas o fiador pode compensar sua dívida com a de seu credor ao afiançado. Isso respeita a idéia da fiança pela qual o fiador se vale de todas as exceções e defesas do devedor (CC, art. 837). Segundo Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona, o fiador pode opor um crédito próprio ou um crédito do devedor. Exemplo: A é credor de B de R$ 10 mil. B é credor de A de R$ 10 mil. A executa o fiador C. C pode compensar os débitos. Como são da mesma monta, extingue-se a obrigação principal, extinguindo-se também a fiança (Obrigação acessória). Se a dívida do credor (crédito do devedor) fosse menor que a dívida do devedor, ocorreria a compensação parcial e o fiador continuaria como garantidor do restante. O mesmo poderia ocorrer se o fiador C fosse credor de R$ 10 mil do credor A (crédito próprio). Diz Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald: Enuncia o art. 376, do Código Civil: “Obrigando-se por terceiro uma pessoa, não pode compensar essa dívida com a que o credor dele lhe dever”. A truncada redação da norma pode ser facilmente superada. A pessoa que se obrigou por terceiro não poderá compensar essa dívida com a que o credor lhe deve pessoalmente. Assim, sendo A credor de B, caso C, na qualidade de garante de B deseje compensar o débito de B com o crédito que ele (C) titularize contra A, não poderá fazê-lo. Podemos daí inferir que é facultado ao terceiro desinteressado pagar o débito em nome do devedor (art. 304, parágrafo único, CC), mas inviável resta a possibilidade de compensar o débito alheio com aquilo que porventura o credor esteja lhe devendo. B – Liquidez das dívidas Só se pode compensar por compensação legal as dívidas líquidas, ou seja, as dívidas certas quanto à existência e determinadas quanto ao objeto. São líquidas as dívidas cujo objeto é determinado, sendo específicas a sua quantidade, espécie ou gênero e a sua qualidade. Também é líquida a dívida cuja quantidade do objeto possa ser encontrada por simples cálculo matemático, independente de perícia ou prova testemunhal. C – Exigibilidade das dívidas Para que haja a compensação, as dívidas recíprocas devem ser exigíveis, ou seja, devem estar vencidas. Em regra, as dívidas se tornam exigíveis no momento do vencimento, se possuírem prazo; no momento em que forem cobradas, se não possuírem prazo (algumas dívidas possuem prazo determinado pela lei, como o mútuo – 30 dias); e, se possuírem termo inicial ou condição suspensiva, no momento em que estes forem implementados. D – Fungibilidade das prestações e homogeneidade dos débitos. CC, Art. 370. Embora sejam do mesmo gênero as coisas fungíveis, objeto das duas prestações, não se compensarão, verificando-se que diferem na qualidade, quando especificada no contrato. Para que haja a compensação legal, necessário se faz que as dívidas recíprocas sejam fungíveis, ou seja, que sejam passíveis de substituição, como diz o art. 85, CC. CC, Art. 85. São fungíveis os móveis que podem substituir-se por outros da mesma espécie, qualidade e quantidade. Mas não basta apenas a simples fungibilidade. É necessário que tais prestações sejam FUNGÍVEIS ENTRE SI, sejam HOMOGÊNEAS, da mesma natureza (Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald). Necessária é a identidade das suas quantidades (podendo ocorrer a compensação parcial), gêneros/espécies e das suas qualidades. Por compensação legal, dinheiro só se compensa com dinheiro, cavalos da raça X só se compensam com cavalos da raça X. Arroz do tipo Y não se compensa com arroz do tipo Z, gado nelore não se compensa com gado holandês, pois, mesmo sendo bens fungíveis, não são fungíveis entre si. Lembre-se que estamos estudando a compensação LEGAL. Nesta, uma das partes de uma possível ação opõe a compensação legal e o juiz deve acolhê-la se presentes todos os seus requisitos, dentre os quais está a homogeneidade dos débitos. Assim, por compensação LEGAL, os débitos devem ser homogêneos, mas por compensação CONVENCIONAL (liberdade negocial, autonomia provada), as partes poderão compensar débitos não homogêneos. Segundo Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald, as obrigações de fazer são incompensáveis, conforme determinação do Art. 369 do Código Civil que fez referência às dívidas líquidas, vencidas e de coisas fungíveis. Assim, a compensação se restringe à oferta recíproca de bens, atividades e comportamentos humanos são incompensáveis. CASOS EM QUE NÃO SE PODE COMPENSAR: 1 – CC, Art. 375 CC, Art. 375. Não haverá compensação quando as partes, por mútuo acordo, a excluírem, ou no caso de renúncia prévia de uma delas. As partes podem livremente, por comum acordo, abrir mão do direito de compensar e podem também renunciá-lo previamente. Tais acordos ou renúncias podem configurar abuso de direito, como, por exemplo, a imposição prévia de renúncia ao direito de compensar imposta pelo fornecedor ao consumidor em um contrato de consumo. A liberdade nesse acordo ou renúncia deve ser analisada no caso concreto, prevalecendo apenas se não trouxer consigo violações aos princípios da boa-fé, da função social do contrato ou dano a terceiros. 2 – Casos do Art. 373, CC: CC, Art. 373. A diferença de causa nas dívidas não impede a compensação, exceto: I - se provier de esbulho, furto ou roubo; II - se uma se originar de comodato, depósito ou alimentos; III - se uma for de coisa não suscetível de penhora. Em regra, as dívidas recíprocas, líquidas, exigíveis e fungíveis entre si podem ser compensadas, independentemente de suas causas. Assim, se A é credor de B de R$ 20 mil por ter pintado um quadro e B é credor de A de R$ 20 mil por ter pintado a sua casa, se essas dívidas forem recíprocas, líquidas, exigíveis e fungíveis entre si, poderão ser compensadas, mesmo que possuam causas distintas. O Art. 373 do Código Civil traz, portanto, as exceções nas quais a causa da dívida ou a qualidade das partes impede a compensação. I – se provier de esbulho, furto ou roubo; Exemplo: A é credor de B de R$ 20 mil reais. Não recebendo o que lhe é devido, A furta ou rouba de B o montante de R$ 20 mil. B aciona A buscando a devolução do valor. A não pode alegar a compensação. Nesses casos é impossível a compensação por se tratar de dívida cujo objeto é ilícito, indo contra os requisitos de validade impostos pelo Art. 104, CC (Objeto lícito, possível, determinado ou determinável). Além da ilicitude do objeto, tal possibilidade de compensação seria também uma afronta à máxima de que ninguém poderá se beneficiar da própria torpeza. Haverá a impossibilidade da compensação tanto se uma apenas das dívidas for proveniente de esbulho, furto ou roubo, quanto se ambas. Não é possível a compensação da má-fé de uma das partes com a má-fé da outra, o que, segundo Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald, caracterizaria um absurdo jurídico e moral, pelo qual “ladrão que rouba ladrão tem compensação”. II - se uma se originar de comodato, depósito ou alimentos; Tanto o comodato quanto o depósito são espécies de contratos que tratam de bens INFUNGÍVEIS, individualizados, o que vai contra o requisito da fungibilidade dos débitos imposta pelo Art. 369, CC. Nesses dois casos a obrigação de restituir o bem é imperiosa não abrindo possibilidade à compensação. Exemplos: A empresta sua casa de praia para B (empréstimo gratuito de coisa infungível). B se nega a devolver alegando a compensação por A lhe dever R$ 100 mil. A deixa carro no estacionamento X (depósito). Dono do estacionamento X se nega a devolver o carro para compensar a dívida dos meses em que A não pagou o estacionamento. Atenção ao fato de que o inciso fala “se uma se originar...”, redação distinta do inciso I que diz “se provier de...”. Com base nessa diferença, Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald tecem posição distinta da maioria da doutrina: “Mas, se ambos os débitos possuem a mesma causa, isto é, as duas são provenientes de comodato ou de depósito, a homogeneidade entre elas permitirá a compensação.” Quanto à compensação de alimentos, o art. 1.707 do Código Civil corrobora a sua impossibilidade: CC, Art. 1.707. Pode o credor não exercer, porém lhe é vedado renunciar o direito a alimentos, sendo o respectivo crédito insuscetível de cessão, compensação ou penhora. O direito aos alimentos é direito estreitamente ligado ao Princípio da dignidade da pessoa humana na sua gênese de mínimo vital (Estatuto jurídico do patrimônio mínimo) não podendo ser reduzido à uma simples relação obrigacional passível de compensação. O STJ, excepcionalmente, admitiu a compensação de alimentos no REsp 982 857/RJ: EXECUÇÃO. PENSÃO ALIMENTÍCIA. COMPENSAÇÃO. Discute-se se as dívidas alimentícias podem ser objeto de compensação. No caso, as instâncias ordinárias reconheceram ser possível a compensação do montante da dívida de verba alimentar com o valor correspondente às cotas condominiais e IPTU pagos pelo alimentante, relativos ao imóvel em que residem os ora recorrentes, seus filhos e a mãe deles. Pois, embora o alimentante seja titular da nu-propriedade do referido imóvel e o usufruto pertença à avó paterna dos recorrentes, os filhos e a mãe moram no imóvel gratuitamente com a obrigação de arcar com o condomínio e o IPTU. Para o Min. Relator, apesar de vigorar, na legislação civil nacional, o princípio da não-compensação dos valores referentes à pensão alimentícia, em situações excepcionalíssimas, essa regra pode ser flexibilizada. Destaca que a doutrina admite a compensação de alimentos em casos peculiares e, na espécie, há superioridade do valor da dívida de alimentos em relação aos encargos fiscais e condominiais pagos pelo recorrido, que arcou com a despesa que os alimentandos deveriam suportar, para assegurar-lhes a própria habitação. Assim, concluiu que, de acordo com as peculiaridades fáticas do caso, não haver a compensação importaria manifesto enriquecimento sem causa dos alimentandos. Isso posto, a Turma não conheceu o recurso. Precedente citado: Ag 961.271-SP, DJ 17/12/2007. REsp 982.857-RJ, Rel. Min. Massami Uyeda, julgado em 18/9/2008. III - se uma for de coisa não suscetível de penhora. As coisas insuscetíveis de penhora não são judicialmente exigíveis. Para haver a compensação, necessariamente, o débito deve ser exigível. Compensação é uma forma de pagamento. Se a coisa não pode ser exigida em pagamento, também não pode ser objeto de compensação, pois estaria sendo usada para pagamento. Ex: Salário. A deve financiamento ao Banco X e recebe seu salário por este mesmo Banco. Banco não pode bloquear automaticamente o salário de A alegando compensação. Banco terá que cobrar a dívida pelas vias normais e poderia bloquear parte desse salário apenas com autorização judicial. DANO MORAL. RETENÇÃO. SALÁRIO. BANCO. É cabível a indenização por danos morais contra instituição bancária pela retenção integral de salário do correntista para cobrir saldo devedor da conta-corrente, mormente por ser confiado o salário ao banco em depósito pelo empregador, já que o pagamento de dívida de empréstimo obtém-se via ação judicial (CPC, art. 649, IV). Precedentes citados: REsp 831.774-RS, DJ 29/10/2007; Ag no Ag 353.291-RS, DJ 19/11/2001; REsp 492.777-RS, DJ 1º/9/2003, e REsp 595.006-RS, DJ 18/9/2006. REsp 1.021.578-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 16/12/2008. NOTAS DA REDAÇÃO: Carlos Eduardo Rosa ajuizou uma ação indenizatória contra o Banco do Brasil S.A., pela retenção indevida de sua aposentadoria, mensalmente depositada em sua conta-corrente. Esse exercício arbitrário das próprias razões teria início no fato do Autor ter solicitado vários empréstimos com esse banco, quitado tardiamente e não ter conseguido pagar os juros e a multa. Ocorre que, ao invés de interpor ação de cobrança, o banco procurou saldo na conta-corrente, mas por não encontrar saldo suficiente em conta, reteve, indevidamente, o valor de toda sua aposentadoria. Desta feita, requereu que o Banco do Brasil S.A. lhe restituísse os salários retidos indevidamente, bem como lhe indenizasse pelos danos morais sofridos. O juiz de primeira instância julgou procedente a demanda, condenando o banco a restituí-lo dos vencimentos indevidamente retidos, bem como indenizar pelos danos morais. (...) COMPENSAÇÃO E CESSÃO DE CRÉDITO CC, Art. 377. O devedor que, notificado, nada opõe à cessão que o credor faz a terceiros dos seus direitos, não pode opor ao cessionário a compensação, que antes da cessão teria podido opor ao cedente. Se, porém, a cessão lhe não tiver sido notificada, poderá opor ao cessionário compensação do crédito que antes tinha contra o cedente. Como já estudado, o devedor não precisa autorizar a cessão de crédito, mas deve ser NOTIFICADO, sob pena de ineficácia. Possuindo esse devedor crédito a ser compensado com seu credor, poderá, quando notificado da cessão, a ela se opor realizando a compensação dos créditos, desde que cumpridos os requisitos legais da compensação, como a exigibilidade do crédito no momento da compensação. Se o devedor possuir crédito a ser compensado, for notificado da cessão do crédito e não se manifestar, presumir-se-á que renunciou ao direito de compensar, não podendo impor a compensação ao cessionário. Se o devedor possuir crédito a ser compensado e ocorrer a cessão de crédito sem a sua notificação, poderá opor ao cessionário a compensação do crédito que antes possuía contra o cedente. VÁRIAS DÍVIDAS COMPENSÁVEIS CC, Art. 379. Sendo a mesma pessoa obrigada por várias dívidas compensáveis, serão observadas, no compensá-las, as regras estabelecidas quanto à imputação do pagamento. COMPENSAÇÃO TERCEIROS NÃO PODE OCORRER EM PREJUÍZO DE CC, Art. 380. Não se admite a compensação em prejuízo de direito de terceiro. O devedor que se torne credor do seu credor, depois de penhorado o crédito deste, não pode opor ao exeqüente a compensação, de que contra o próprio credor disporia. Não é possível compensar créditos se um deles estiver penhorado ou indisponível. Se o devedor-executado trouxer crédito cuja exigibilidade se aperfeiçoou após a penhora de seu débito por terceiro, perderá o poder de compensar. Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald. Exemplo: B é credor de A de R$ 10 mil A se tornou, posteriormente, credor de B de R$ 10 mil. Antes do crédito de A em face de B se tornar exigível, C penhorou o crédito de B. Não pode A compensar com C o crédito que teria em face de B.