Com a devida vénia transcrevemos artigo publicado na edição do Jornal de Negócios
Família Espírito Santo afastada do banco
Helena Garrido | [email protected], Maria João Gago | [email protected]
A nova administração do BES terá de excluir quase toda a actual equipa. A falta de
consenso na família sobre a sucessão obrigou o Banco de Portugal a intervir. O fim do dia
de quinta-feira foi de reunião com o supervisor.
Ricardo Salgado vai renunciar à presidência do Banco Espírito Santo, dando o passo que faltava
para a renovação da administração da instituição. Um processo que vai levar à saída de quase
todos os membros da família Espírito Santo do conselho da instituição. E que resulta da
intervenção desencadeada há vários meses pelo Banco de Portugal (BdP).
A entidade de supervisão liderada por Carlos Costa tomou as rédeas do processo de
mudança da administração do BES esta quinta-feira. Face à demora da família Espírito Santo em
encontrar uma solução consensual para a liderança do banco, a actuação do BdP funcionou como
um ultimato ao grupo familiar que, com 25%, continua a ser o maior accionista do BES.
Ao que o Negócios apurou, ao início da noite desta quinta-feira, a cúpula dos Espírito Santo
estava reunida com o governador do BdP, na sede do supervisor, na Rua do Comércio, na baixa de
Lisboa. Carlos Costa terá insistido na necessidade de os Espírito Santo encontrarem um gestor
independente para liderar o banco. E afastarem a quase totalidade dos membros do clã que têm
assento na administração.
O BdP pretende afastar da instituição gestores que correm o risco de vir a ser
responsabilizados pelas irregularidades contabilísticas detectadas na Espírito Santo International,
"holding" de topo do Grupo Espírito Santo. Por esta razão, Ricardo Salgado nem sequer ficará
como presidente não executivo, como chegou a ambicionar o banqueiro.
Também os restantes gestores do BES que integravam a administração da ES International
poderão vir a ser visados pela justiça do Luxemburgo, país onde estão sedeadas as "holdings" de
controlo do grupo, depois de a Procuradoria luxemburguesa ter aberto um inquérito a três destas
sociedades. Assim, também José Manuel Espírito Santo, Ricardo Abecassis Espírito Santo e José
Maria Ricciardi poderão ser afastados.
A saída de todos os administradores com ligação à família foi desde logo indiciada com as
declarações de Ricardo Salgado quando afirmou "somos todos responsáveis" pelas irregularidades
na ES International. Além desta sociedade, estão na mira da justiça do Luxemburgo a Espírito
Santo Control, onde estão concentradas as posições dos cinco ramos da família que controlam o
grupo, e a Espírito Santo Financial Group (ESFG), "holding" para a área financeira.
Falta de consenso pode levar BdP a nomear gestão
A pressão do supervisor sobre o BES levou a administração a desconvocar todas as reuniões que
estavam previstas para esta semana, à excepção da reunião do próprio conselho, agendada para
esta sexta-feira. O objectivo do encontro é a convocação de uma assembleia-geral (AG), a decorrer
em meados de Julho, para eleger o novo conselho de administração do banco.
Ao final da tarde de quinta-feira, ainda não havia acordo dos diferentes ramos familiares
sobre o nome do próximo líder do BES. Nem na forma de pôr em marcha a sucessão.
Os ramos afectos a Ricardo Salgado insistiam na necessidade de a administração renunciar,
abrindo a porta a uma solução programada e conversada com o supervisor. No entanto, José
Maria Ricciardi e outros administradores do BES recusavam sair da administração, negando
responsabilidades nas irregularidades cometidas na ES International.
Nas últimas semanas, o braço-de-ferro na cúpula familiar intensificou-se depois de Ricardo
Salgado ter responsabilizado todos os ramos familiares pelas infracções na "holding" de topo do
grupo, em entrevista ao Negócios. E a sucessão de notícias sobre os problemas do grupo foram a
confirmação pública da guerra que se fazia nos bastidores.
Foi para pôr um ponto final ao braço-de-ferro que o Banco de Portugal chamou a cúpula dos
Espírito Santo. Carlos Costa terá recordado aos responsáveis da família que, no limite, em caso de
desentendimento entre accionistas, o próprio supervisor poderá nomear uma nova administração
para o BES, como prevê a lei bancária.
Nos últimos meses, a pretexto da necessidade de isolar o banco dos problemas da área não
financeira, o Banco de Portugal foi impondo diversas mudanças no BES. Primeiro, o ESFG, que
controla o banco, foi obrigado a registar uma provisão especial de 700 milhões de euros para
garantir o reembolso do papel comercial da ES International subscrito por clientes de retalho do
BES, além de outras exposições - no total, a exposição do ESFG àquela "holding" chegou a superar
os 6.000 milhões. Depois, o BES realizou um aumento de capital que garante a sua solidez. E
agora falta mudar a administração do banco, deixando os Espírito Santo de fora.
20-Jun-14
Download

Família Espírito Santo afastada do banco