Introdução de Isabel Meyrelles
Introduction de Isabel Meyrelles
Nota de António Cândido Franco
Notes de António Cândido Franco
Apresentação de Jean Clarence Lambert
Présentation de Jean Clarence Lambert
Poemas de
Poèmes par
António Maria Lisboa
Artur de Cruzeiro Seixas
Carlos Eurico da Costa
Carlos Calvet
Fernando Alves dos Santos
Henrique Risques Pereira
Mário Cesariny de Vasconcelos
Mário Henrique Leiria
Pedro Oom
Cadavres Exquis
Manifestos e Comunicados
Manifestes et Communiques
Diálogos Automáticos
Dialogues Automatiques
Biografias
Biographies
Primeira nota sobre o
SURREALISMO PORTUGUÊS
a partir do trabalho antológico de
ISABEL MEYRELLES
Premieres notes sur
LES « SURREALISTES » a partir
de l´anthologie de la poesie surrealiste
de ISABEL MEYRELLES
O título que acima se lê foi atirado ao papel sem preocupação
ensaística, ou de qualquer outra ordem, a não ser corresponder a um
pedido de Isabel Meyrelles, pessoa que me merece um imenso respeito
e muita admiração, pela idade que tem, pelo trabalho que desenvolveu,
pelas amizades em que desde muito nova se envolveu, pelo que deu
a tantos de tantos e tão variados modos, pelo longo afastamento em
que tem vivido desde há mais de sessenta anos, mais francesa hoje que
muitos franceses, isto sem um queixume de amargura ou um ranger
de ressentimento, pedido esse que foi depois reforçado por Carlos
Cabral Nunes, galerista e editor da obra que o leitor tem nas mãos.
Mas se um pedido de Isabel Meyrelles, por todas as razões atrás
indicadas e ainda por muitas outras que aqui ficam por expressar,
todas porém de muita adesão, não pode senão merecer da minha
parte um assentimento imediato e entusiástico, sem a mais leve
evasiva ou hesitação - e o título acima é a minha forma de dizer sem
tergiversar um tal sim -, isso não quer dizer que eu saiba à partida
como desembaraçar a meada que ela me deixou entre mãos. Parto
pois para este texto sem a mínima certeza do que vou dizer nem até
do que seria conveniente dizer, se alguma coisa seria, e decerto que
sim, na situação em que me vejo depois do pedido dela, isto é, falar do
surrealismo em Portugal para os leitores do trabalho dela, que espero
desde já numerosos e de qualidade, o que só pode acrescentar ao meu
embaraço, com a responsabilidade, algum incómodo e desnorte.
Vamos por partes. Isabel Meyrelles nasceu em 1929 em Matosinhos
e veio do Porto para Lisboa no final da década de quarenta para
fazer estudos artísticos. Ligou-se nessa época por amizade ao grupo
de jovens que se reunira em torno de Mário Cesariny para dar
continuidade, ou nascimento, ainda hoje não se sabe muito bem, às
atividades surrealistas em Portugal. A Escola de Belas Artes de Lisboa
ficava, como ainda fica, no Chiado, centro nevrálgico, na época, não
hoje, da vida cultural lisboeta. Isabel Meyrelles, além de frequentar a
escola, tinha oficina por perto, na Rua do Ferragial de Baixo, paredes
meias com o Cais do Sodré e com a Rua do Alecrim, que liga o Chiado
ao Tejo. Por certo o encontro entre Isabel Meyrelles e a meia dúzia
de jovens que se agrupava em torno de Cesariny - o mais velho, se
deixarmos de lado Cruzeiro Seixas, nascido em 1920 e três anos
mais adiantado do que ele, e não entrarmos em contas com António
Domingues - se deu nas artérias e nos cafés daquela área, onde por
então acontecia qualquer manifestação da vida artística, literária
e mundana de Lisboa, no rasto aliás admirável de muitas gerações
anteriores, de Camilo a Aquilino, passando por Eça, Fialho, Teixeira
Gomes, Brandão, Pascoaes, Pessoa, Almada e Botto, estes dois últimos
ainda muito ativos e presentes na década de quarenta, pelo menos
no primeiro lustro, nos cafés da zona, em especial na Brasileira do
Chiado, que vinte anos antes haviam frequentado na companhia de
Pessoa. Falo aqui do ano de 1949, altura em que Botto já partira para
o Brasil e em que aconteceu, no final de Junho, mais exatamente entre
18 de Junho e 2 de Julho, e na antiga sala de projeções Pathé-Baby,
na Rua Augusto Rosa, nas imediações inevitáveis da Baixa lisboeta, a
primeira “Exposição dos Surrealistas”.
Do encontro entre Isabel Meyrelles e o grupo ou anti-grupo, assim
lhe chamou Cesariny, “Os Surrealistas” ficou muito mais do que a
História conta e que é em verdade nada, talvez porque ela não tenha
tido a sorte ou o cuidado de se fazer representar em nenhuma das duas
exposições com que o grupo se deu a público, a primeira porventura
Le titre ci-dessus a été écrit au courant de la plume sans aucune
intention ou un ordre quelconque, si ce n’est correspondre à un
souhait de Isabel Meyrelles, personne qui mérite un immense
respect et une grande admiration par son âge, le travail qu’elle
a développé, les amitiés qu’elle a su nouer dans sa jeunesse,
l’éloignement où elle a vécu depuis plus de soixante ans, plus
française aujourd’hui que beaucoup de français, tout cela sans la
moindre amertume ou ressentiment, souhait qui a été renforcé
par Carlos Cabral Nunes, galeriste et éditeur de l’œuvre que le
lecteur a en main.
Mais si un souhait de I. M., pour toutes les raisons indiquées
plus loin et celles qui restent à exprimer ne peuvent montrer de
ma part qu’une approbation immédiate et enthousiaste sans la
moindre excuse ou hésitation – et le titre ci-dessus est une manière
d’accepter sans tergiverser – ce qui ne veut pas dire que je savais
la manière dont j’allais me débrouiller au milieu des éléments
qu’elle a remis entre mes mains. Je commence donc ce texte sans
la moindre certitude de ce que je vais dire ni même de ce qui sera
pertinent de dire, si ce sera quelque chose de sérieux, dans la
situation dans laquelle je me trouve selon le souhait de I. M., de
parler du Surréalisme au Portugal, pour les lecteurs de son travail,
que j’espère déjà qu’ils seront très nombreux et de qualité, ce qui
peut seulement accroître mon embarras et ma responsabilité, ma
gêne et mon désarroi.
I. M. est née en 1929 à Matosinhos et est partie de Porto pour
Lisbonne à la fin de la décade des années quarante pour faire des
études artistiques. Elle s’est liée d’amitié à un groupe de jeunes
qui se réunissaient autour de Mário Cesariny afin de donner
une continuité ou une naissance, à ce jour on ne sait toujours
pas très bien, aux activités surréalistes. Elle avait son atelier dans
le quartier du Chiado, centre névralgique et décisif à l’époque
(plus de nos jours), Rue do Ferragial de Baixo, entre le Quai do
Sodré et la rue do Alcrim, qui relie le Chiado au Tage. Ce qui est
certain, c’est que de la rencontre de I. M. avec la demi-douzaine de
jeunes qui se groupaient autour de Mário Cesariny, le plus vieux,
si on met de côté Cruzeiro Seixas, né en 1920, son aîné de trois
ans, et si on ne tient pas compte de António Domingues, dans
ces artères et ses cafés alentour où avaient lieu des manifestations
artistiques, littéraires ou mondaines de Lisbonne, dans le sillage
admirable de bien des générations antérieures, de Camilo Castelo
Branco à Aquilino Ribeiro, en passant par Eça de Queiros, Fialho
de Almeida, Teixeira Gomes, Raul Brandão, Teixeira de Pascoais,
Fernando Pessoa, Almada Negreiros et António Botto, ces deux
derniers encore très actifs et présents dans la décade de mille neuf
cent quarante tout au moins dans le premier lustre, dans les cafés
de cette zone, spécialement la Brasileira do Chiado, que vingt ans
plutôt ils avaient fréquenté en compagnie de Fernando Pessoa.
Parlons de l’année 1949, alors que Botto était déjà parti pour le
Brésil, et ce qui arriva à la fin juin, plus précisément entre le 18
juin et le 2 juillet dans l’ancienne salle de projection Pathé-Baby,
rue Augusto Rosa, tout près de l’inévitable «Baixa» lisboète, la
première «Exposition des Surréalistes».
De la rencontre entre I. M. et le groupe ou anti-groupe, c’est
ainsi que Cesariny le nommait, des Surréalistes il ne reste plus
que ce que raconte l’Histoire et qui en vérité n’est rien ou presque
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por simples deixar andar e a segunda, em Junho de 1950, por já ter
batido asa para Paris ou estar então a bater, o que é escandalosamente
injusto para com ela, que está pela idade - é apenas um ano mais nova
do que António Maria Lisboa, Carlos Calvet, Carlos Eurico da Costa e
Fernando Alves dos Santos e até um ano mais velha do que Henrique
Risques Pereira - e pelo que então e depois sucedeu soldada de forma
sólida e até definitiva ao grupo e às atividades que dele saíram na
Lisboa encantada que transita da primeira metade do século XX para
a segunda.
Basta nesse sentido revelar que duas das fotografias míticas do
grupo, em que alguns dos magníficos (Cesariny, Mário-Henrique
Leiria, António Maria Lisboa e Cruzeiro Seixas) se preparam para
sacar voo nos telhados de Lisboa, mostrando que o encanto da cidade
estava lá, ainda que em cima e não em baixo, e que qualquer um
tem hoje gosto em apresentar como ex-libris desse grupo de rapazes
nascidos entre 1920 (Cruzeiro Seixas) e 1930 (Risques Pereira), foram
tiradas no telhado da oficina de Isabel Meyrelles, o que deixa entender
à saciedade para quem queira ver quanto o destino dessa rapariguinha
nortenha estava ligado ao dos surrealistas portugueses. Chego mesmo
a interrogar-me, sem mais, quer dizer, sem preocupações probatórias,
se uma das fotografias, a dos quatro magníficos prontos a partir para
o azul do céu, não terá sido tirada pelo olho de tigre dela, já que a
segunda, em que Lisboa brinca teatralmente com Leiria à beira do
abismo, como dois invisíveis de asas, garras e bico adunco o podem
fazer, foi captada, assim ele mo disse, pelo olho de lince de Cruzeiro
Seixas.
Como se as fotografias não bastassem, e bastam, pois quis o acaso
que Meyrelles estivesse dalgum modo presente num dos momentos
mais representativos do grupo, já que a Vida em agrupamento de
surrealistas importa o mesmo ou até mais do que a manifestação
escrita, pintada ou moldada, há ainda as fartas e generosas alusões
que Cesariny lhe faz em vários passos da sua obra, algumas delas
em lugares estratégicos, quer do ponto de vista da história coletiva
do movimento, que ele fez melhor do que ninguém, posto que os
historiadores de ofício não lhe dando ouvido o remetam broncamente
para as quinquilharias da ortodoxia, modo seguro e fácil de se
desembaraçarem dum incómodo, e que foi aquilo que por exemplo
sempre um Jorge de Sena fez, quer do ponto de vista do seu itinerário
pessoal, ou pelo menos daquilo que neste percurso Cesariny quis dar
a conhecer aos outros e a si e que tanto e tão íntimo afinal foi.
Exemplo do primeiro caso, e exemplo maior, que chegaria para ligar
para sempre o nome de Isabel Meyrelles ao surrealismo em Portugal,
não fosse a distração geral de porcelana, encontra-se no texto capital
“Para uma Cronologia do Surrealismo em Português” (veio a lume,
em tradução, na revista “Phases”, 1973 e foi reproduzido, na língua
original, no livro “As Mãos na Água a Cabeça no Mar”, 1985), de longe
o mais importante texto que algum dia se escreveu no que à história do
surrealismo em Portugal tange, e que de resto veio pela primeira vez a
público, em língua francesa, em versão de Meyrelles. Eis o parágrafo
que Mário Cesariny lhe dedica: “Isabel Meyrelles, velha companheira
das primeiras acelerações do aparelho respiratório, Francisco Aranda,
vindo do surrealismo espanhol e que viveu em Lisboa alguns anos
alucinogénios, e António Barahona da Fonseca e Luiza Neto Jorge
entre os mais jovens, serão ainda pontos de referência no isolamento
em que escolhemos viver aqui.” (1985: 281)
Meyrelles ponto de referência, centro sem meta, motivo de inspiração
para os surrealistas portugueses e logo ao lado de Francisco Aranda,
um dos confidentes de tirocínio do grande Buñuel, que aterrou pouco
menos do que por acaso em Lisboa.
Exemplo de segundo nível, relativo ao itinerário pessoal de Mário
Cesariny, encontro-o eu, e quase por acaso, sem inquietações de busca
e menos ainda de sistematização, no “Diário de Composição”, escrito
em Paris entre 27 de Maio e 11 de Julho de 1964, e incluído no livro “A
rien, peut-être parce qu’elle eut la « chance » ou la précaution
de ne pas se faire représenter dans aucune des deux expositions
que le groupe montra au public, la première, peut-être par simple
laisser aller et la seconde en juin 1950 parce qu’elle avait déjà
pris son envol pour Paris, ou sur le point de le faire, ce qui est
scandaleusement injuste envers elle, à cause de son âge – elle est
seulement une année plus jeune que António Maria Lisboa, Carlos
Calvet, Carlos Eurico da Costa et Fernando Alves dos Santos et
un an plus âgée que Henrique Risque Pereira – et aussi pour au
bout du compte de forme solide et même définitive proche au
groupe et aux activités qui eurent lieu dans la Lisbonne enchantée
qui transite de la première moitié du XXe siècle pour la seconde
moitié.
Il suffit de révéler que deux des photographies mythiques
du groupe où l’on peut contempler quelques uns des membres
les plus célèbres du groupe (Cesariny, Mário-Henrique Leiria,
António Maria Lisboa et Cruzeiro Seixas) se préparant à s’envoler
des toits de Lisbonne, révélant que l’enchantement de la ville
est là, en haut, et non pas en bas et que chacun d’eux a plaisir
aujourd’hui à ce servir de ces clichés comme ex-libris témoin de
ce groupe de jeunes gens nés entre 1920 (Cruzeiro Seixas) et 1930
(Risques Pereira). Ces photographies ont été prises du haut du
toit de l’atelier de I. M. ce qui laisse entendre combien cette jeune
fille venue du nord était liée par le destin à celui des surréalistes
portugais. Je me suis même interrogé, sans plus, si une de ces
photographies, celle des quatre grands prêts à s’envoler pour
l’azur du ciel, n’avait pas été faite par son œil de tigre, alors que
la seconde, celle où António Maria Lisboa s’amuse théâtralement
avec Mário-Henrique Leiria au bord de l’abîme comme seuls deux
êtres invisibles pourvus d’ailes, griffes et becs crochus a été captée
par l’œil de lynx de Cruzeiro Seixas.
Et comme si cela n’était pas suffisant, il semble que le hasard
a voulu que I.M ait été présente lors des moments les plus
représentatifs du groupe, car la Vie du groupe des surréalistes
est parfois plus importante que la manifestation écrite, peinte
ou sculptée. Il y a aussi les nombreuses allusions que Cesariny
fait à son encontre dans divers passages de son œuvre, quelques
fois dans des places stratégiques, que ce soit du point de vue de
l’histoire collective du mouvement, qu’il fait mieux que personne,
vu que les historiens officiels l’ont écarté sans ménagement pour
faire place à l’orthodoxie, moyen plus facile pour se défaire de
ce qui incommode, c’est le cas par exemple de Jorge de Sena
du point de vue de son itinéraire personnel ou tout au moins le
parcours que Cesariny a voulu montrer aux autres et à lui-même
et qui finalement est si intime.
L’exemple du premier cas en est le meilleur, et qui serait
suffisant pour lier le nom de I. M. pour toujours au Surréalisme
au Portugal si les intellectuels n’étaient pas si distraits… On
peut trouver confirmation dans le texte capital « Pour une
chronologie du Surréalisme en Portugais » (qui voit le jour, en
traduction dans la revue Phases, 1973 et qui a été reproduit, dans
la langue originale, dans le livre “As Maos na Agua a Cabeça no
Mar”, 1985). C’est de loin le texte le plus important qui jusqu’à
ce jour a été écrit sur l’histoire du surréalisme au Portugal et
qui a été présenté au public pour la première fois en français,
version de I. M. Voici le paragraphe que Mário Cesariny lui dédie:
«Isabel Meyrelles, vieille compagne des premières accélérations
respiratoires, Francisco Aranda, venu du surréalisme espagnol et
qui a vécu à Lisbonne quelques années hallucinogènes, António
Barahona da Fonseca et Luiza Neto Jorge, parmi les plus jeunes,
seront des points de référence au milieu de l’isolement dans
lequel nous avons choisi de vivre ici.» (1985: 281) Meyrelles,
«point de référence», centre sans but, motif d’inspiration pour les
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surréalistes portugais et tout de suite au côté de Francisco Aranda,
un des confidents et élève du grand Bunuel qui a atterri peu de
temps après, par hasard, à Lisbonne.
Un exemple au second niveau relatif à l’itinéraire personnel de
Mário Cesariny, que je trouve par hasard, sans recherches précises
et encore moins systématiques, dans le «Journal de Composition»
écrit à Paris entre le 27 mai et le 11 juin 1964 et inclus dans «La
Ville Brûlée» (1965). L’allusion se trouve tout de suite au début du
«journal», quand le narrateur découvre «l’appel» de la Tour SaintJacques. On est informé que durant ce séjour à Paris, pour lequel
il avait une bourse de la Fondation Gulbenkian pour recueillir
sur le vif des éléments afin d’écrire un livre sur Vieira da Silva et
qui verra le jour vingt ans plus tard avec une certaine renommée
de cathédrale et de beaucoup de choses éparses, «Vieira da Silva,
Arpad Szenes ou le château Surréaliste» (1984), Cesariny a trouvé
comme point de chute l’appartement minuscule de I. M. dans un
immeuble situé tout près du domicile d’Henri Michaux qui peu
de temps après, en 1972, par l’intermédiaire de I.M., Cruzeiro
Seixas, étant alors consultant artistique, montera une exposition
à la Galerie São Mamede.
Un autre exemple se trouve dans le texte des «19 Projectos de
Prémio Aldonso Ortigão» (1971), «Passagem dos Sonhos», un des
rares moments, et sans doute unique, mais absolu et exemplaire
dans lequel Cesariny raconte et écrit ses rêves, entre autres le
cauchemar vécu peu après la mort de António Maria Lisboa,
délires qui tuent s’ils ne sont pas évacués à temps et le rêve avec
I. M. à Paris où elle surgit au croisement du Bd Saint-Michel et
du Bd Saint-Germain chevauchant une moto, un rêve très serein
et inoffensif et qui sert de prétexte à des métamorphoses dans
l’univers du délire sans nécessité de coupe ou de tromperie. Aussi
bien dans un cas comme dans l’autre, le «Journal» ou bien le rêve
ouvre l’un comme l’autre une fenêtre sur l’intimité du narrateur et
du rêveur, le fondement secret de son âme, I. M. est là, vivant dans
le plasma psychique de Cesariny la vie imaginaire des invisibles, et
encore une fois comme point de référence d’une borne millénaire.
Je m’abstiens ici de commenter ou bien de parler de la longue
et significative activité de I. M. comme sculpteur, adepte des
métamorphoses, qui a conduit Benjamin Marques et Cruzeiro
Seixas à explorer au sens propre et innovant le procédé ludique
et collectif du cadavre exquis en sculpture. Je m’abstiens aussi
de faire référence à son œuvre poétique dont Natália Correia a
traduit en portugais les poèmes écrits en français du livre «O Rosto
Deserto» (1966), ou bien encore, l’approche fraternelle de Mário
Cesariny qui a bien voulu publier pour la première fois le poème
«Ode à d‘autres et à Maria Helena Vieira da Silva» en guise de
préface, peut-être parce que ces poèmes furent écrits à l’époque et
que Mário Cesariny privilégiait le hasard, période durant laquelle
Cesariny a vécu sous le paratonnerre de I. M. Ici je m’abstiens
de développer ces deux importants articles parce que le lecteur
a déjà compris la forte et indissoluble relation de Meyrelles au
Surréalisme en général et particulièrement avec les protagonistes
de celui qui a gagné et poursuivi au Portugal son cheminement. Et
pour le moment c’est tout ce que j’ai à dire.
Un jour, d’autres aborderont avec l’attention qu’il convient
l’univers onirique de cette action écrite, où souffle le feu incréé
de l’amour incendiaire et de cette destruction sculptée qui fonde
en formes sinueuses et musicales la culture mythique et la nature
sauvage, celle qui manque cruellement à l’humanité d’aujourd’hui,
aseptisée et lessivée, paralysée en un râle que la verve chamaniste
de I. M. sait si bien évoquer et rendre hommage.
Après un si long éloignement du Portugal – elle est parti en
1950 – et une si intense communion avec le Surréalisme, on ne
sera pas surpris qu’en elle est germé l’idée de créer et de construire
Cidade Queimada” (1965). A alusão encontra-se logo no primeiro dia
do “Diário”, quando o anotador descobre a “solicitação” da Torre de
Saint Jacques. Por aí se fica a conhecer que nessa estadia em Paris, onde
está com uma bolsa da Fundação Gulbenkian para recolher ao vivo
elementos para um livro sobre Vieira da Silva, que só virá a lume vinte
anos depois, aí como magna catedral e feixe de síntese de muita coisa
antes dispersa, “Vieira da Silva, Arpad Szenes ou o Castelo Surrealista”
(1984), Cesariny tomou como abrigo, teto ou poiso de recolhimento e
trabalho o apartamento, parece que pequeno ou mesmo minúsculo, de
Isabel Meyrelles, no mesmo prédio onde então vivia Henry Michaux,
que pouco depois, em 1972, por intermédio dela e de Cruzeiro Seixas,
então consultor artístico, exporá em Lisboa, na Galeria São Mamede.
Outro exemplo de segundo nível está num dos textos de “19 Projetos
de Prémio Aldonso Ortigão” (1971), “Passagem dos Sonhos”, um dos
raros momentos, se até não for o único, mas esse absoluto e exemplar,
em que Cesariny conta e escreve sonhos seus, entre eles o pesadelo
tremendo que teve e viveu pouco depois da morte de António Maria
Lisboa, um daqueles delírios que matam afirma ele se não forem
ilaqueados a tempo, e o sonho com Isabel Meyrelles em Paris, em
que esta surge numa encruzilhada como a de S. Michel-S. Germain
escarranchada numa moto, muito mais sereno e inofensivo e que serve
de pretexto para aquilo que recorre em metamorfose no universo do
delírio sem que haja necessidade de corte ou de ilaqueação. Tanto num
caso como noutro, tanto no passo do “Diário” como no do sonho,
abrindo ambos a janela da intimidade do anotador e do sonhador, o
fundo secreto da sua alma, Isabel Meyrelles está lá, vivendo no plasma
psíquico de Cesariny a vida imaginária dos invisíveis, de novo como
ponto de referência ou marco miliário.
Abstenho-me aqui de comentar, ou até só de aludir com o espaço
que me seria de obrigação, à longa e significativa atividade que
Meyrelles tem feito como escultora, numa desordem animalística
que já foi aproximada de Leonora Carrington, e que a levou com
Benjamim Marques e Cruzeiro Seixas a explorar em sentido próprio
e inovador o processo lúdico e coletivo do cadáver esquisito, tal como
me abstenho de referir aqui como afinal devia o trabalho poético
dela, este em estreita relação com Natália Correia, que lhe traduziu
para português vários poemas originalmente escritos em francês,
e nessa situação está o livro “O Rosto Deserto” (1966), ou até em
compreensível aproximação fraterna a Mário Cesariny, que deu à
estampa pela primeira vez um importante poema seu, “Ode a outros
e a Maria Helena Vieira da Silva” num livro da amiga e em tradução
francesa dela, decerto porque os versos foram captados, o que não é
para desprezar em amador de acasos, no período em que Cesariny
viveu debaixo do seu pára-raios. Aqui me abstenho de desenvolver
estes dois artigos da maior importância porque o leitor deste introito
já percebeu por certo a fortérrima e indissolúvel ligação de Meyrelles
ao Surrealismo em geral e em especial aos protagonistas daquele que
vingou e singrou em Portugal e que é tudo o que por ora pretendo.
Outros um dia abordarão com espaço e atenção como convém
o universo onírico desta ação escrita, onde sopra o fogo incriado
do amor incendiário, e desta consumpção esculpida, que funde em
formas coleantes e musicais a cultura mítica e a natureza selvagem,
esta última a fazer tanta falta ao mundo humano de hoje, asséptico e
lixivioso, paralisado no estertor, e que a verve xamanística de Meyrelles
tão bem sabe evocar e preitear.
Depois de tão grande afastamento de Portugal - partiu para
Paris em 1950 - e de tão intenso convívio com o surrealismo, não
surpreende que dentro de Isabel Meyrelles tenha germinado a ideia de
montar e construir uma grande e representativa antologia da poesia
surrealista portuguesa, que pudesse funcionar como homenagem dela
à palavra escrita do movimento e que ela mesma se encarregaria de
traduzir para a língua de Rabelais na esperança de que a antologia não
prestasse serviço apenas dentro de portas mas também fora delas, e
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não lhe prestasse apenas a ela o favor de a ter feito mas fosse também
ela a fazer alguma coisa pela antologia, traduzindo-a e dando-a a
conhecer a uma Europa desnatada e insossa, já que a força, a solidez
e a universalidade da poesia surrealista escrita em Portugal, em tesa
língua, lhe pareciam a ela, antóloga, ponto assente, sem discussão
possível, e ainda de muito proveito a essa mesma Europa sem nata e
sem pedra de sal na alma.
Não posso dizer com exatidão quando nasceu dentro de Isabel
Meyrelles o modelo duma tal compilação poética mas é seguro que
desde o desabrochar da ideia até o dia de hoje passaram muitos e
muitos sopros de oiro e de Primavera.
Já em 1998, há cerca pois de quinze anos, arco de tempo nada curto,
Perfecto E. Cuadrado no exórdio de abertura que escreveu para a edição
portuguesa da antologia dele da poesia surrealista portuguesa, “A
Única Real Tradição Viva” (1998), trabalho vivo que aqui de passagem
se homenageia, referindo o labor de Isabel Meyrelles, dizia o seguinte:
“Sabemos que Isabel Meyrelles tem preparada uma magna antologia
de poetas surrealistas e surrealizantes portugueses que completará,
sem dúvida, com mais inteligência e sensibilidade – e desde o interior
– os nossos esforços de divulgação-intervenção.” (1998: 64)
Neste informe do ano de 1998 percebe-se que a origem duma
compilação de poetas surrealistas portugueses a organizar por
Meyrelles era já na época antiga o bastante para Perfecto dar nesse
momento a peça como concluída e pronta a ver a luz, o que, tendo
em atenção o volume de aplicação que um tal labor requer, implica
um lapso de tempo, entre o momento da partida e o da chegada ou
conclusão, nada desprezível, de vários ou mesmo muitos anos.
Atenção: o facto do autor do proémio dar a antologia de Meyrelles por
rematada em 1998 não quer dizer que nos catorze anos que entretanto
passaram o volume não tenha sofrido desvios e transformações,
sobretudo à procura de maior representação, naquele que parece ter
sido o critério de eleição mais acarinhado pela autora, que a ninguém
quis deixar de fora desde que esse alguém tivesse matéria poética escrita
e tocasse dalgum modo o surrealismo e os seus grupos portugueses.
Por tal motivo Perfecto falará na sua nota introdutória duma magna
antologia, a completar a sua, nada magra porém, quatrocentas páginas
bem cheias.
É essa antologia que o leitor tem agora entre mãos. Tratando-se
duma compilação exaustiva dentro da criação poética surrealista em
Portugal, naquele que é por certo o maior esforço feito até hoje para
reunir num único trabalho tudo, ou quase tudo, o que respeita à matéria
em causa, e sob esse aspeto afastando-se do conselho de Cesariny
quando afirma que antologias só tendenciosíssimas, impraticável pois
será dar o fruto duma tal coleta num único volume. A volição de Isabel
Meyrelles foi dar a visão geral do edifício, sem deixar de lado nenhum
dos andares e em cada um deles nenhum dos nichos em que ele se
compartimenta, sendo os andares as gerações e os alvéolos os grupos
ou até as personalidades com habitação em separado, o que alongou
necessariamente muito o número de páginas do seu trabalho.
A antologia que resultou da realização do projeto organiza-se assim
em quatro volumes, a serem vistos como andares diferentes, no caso
três, ficando o último a ser uma espécie de arrecadação na cave ou e no
sótão. O primeiro volume, este que o leitor folheia e agora lê, respeita
à criação poética de “Os Surrealistas” (1949-51) e do qual já dissemos
o seu tanto, pois Meyrelles pertence-lhe por idade e afinidade, o que
justifica Perfecto quando este adianta que a antologia de Meyrelles,
ao inverso da dele, saía das entranhas do movimento, no que foi
injusto com o trabalho dele, em verdade muito mais apaixonado do
que académico; o segundo, a editar a par deste, toca a ação poética
do Grupo Surrealista de Lisboa (1948-49), que em termos de estreita
cronologia é o ponto de partida da ação poética surrealista em Portugal
mas que é quase contemporâneo do grupo dissidente e que com ele
se cruza, como se verá, em muitos aspetos; o terceiro, que há de vir,
une grande et représentative anthologie de la poésie surréaliste
portugaise qui puisse fonctionner comme un hommage personnel
à la parole écrite du mouvement et qu’elle s’est elle-même chargée
de traduire dans la langue de Rabelais, en espérant que cette
anthologie ne soit pas réservée seulement aux initiés portugais
mais aussi aux autres pays. Alors que la force, la solidité et
l’universalité de la poésie surréaliste écrite au Portugal dans une
langue pleine de sève, lui paraissait en tant que lectrice, un point
de base, sans discussion possible et aussi d’un grand profit pour
cette Europe indifférente et déconnectée dans l’âme. Je ne peux
pas dire avec certitude quand I. M. a commencé la compilation
poétique mais ce qui est sûr c’est que depuis et jusqu’à ce jour bien
des printemps ont éclos.
Déjà en 1998, il y a donc quinze ans, Perfecto Cuadrado dans
sa préface, a écrit pour l’édition portugaise de son anthologie de
la poésie surréaliste portugaise, «A Única Real Tradição Viva»
(1998), excellent travail très vivant, dans un passage auquel il rend
hommage à I. M. en se référant à son labeur et dit ceci: «nous
savons que I. M. prépare une importante anthologie de poètes
surréalistes et surréalisants portugais qui complètera sans aucun
doute avec intelligence et sensibilité – et de l’intérieur – nos efforts
de divulgation-intervention.» (1998: 64) A cette époque, en 1998,
on comprend que l’origine de la compilation de poètes surréalistes
portugais organisée par I. M. est déjà à cette époque suffisamment
ancienne pour être prête à être publiée, et que vu la taille et le
travail effectués, puisque Perfecto laisse entendre qu’elle est prête
à voir le jour et qu’il reste attentif par rapport au travail que
proportionne une telle entreprise et qui implique naturellement
un laps de temps entre le démarrage et l’aboutissement ou la
conclusion, rien d’étonnant que cela s’étale sur plusieurs années.
Attention: le fait que Cuadrado, dans sa préface croit que
l’Anthologie de I. M. est terminée 1998, ne veut pas dire que
durant ces quatorze années elle ne l’a pas modifiée et transformée,
recherchant surtout une meilleure représentation, ne voulant
laisser personne de côté qu’ils aient touché de prés ou de loin
la matière poétique écrite. C’est pourquoi, Perfecto parle d’un
«magma anthologique» qui complètera la sienne, qui n’est
cependant n’est pas mince, quatre cents pages bien remplies.
C’est cette anthologie que le lecteur a en main. Il s’agit de
la compilation la plus exhaustive possible de la création poétique
surréaliste au Portugal, certainement le plus gros travail entrepris
jusqu’à présent pour réunir tout ou presque tout ce qui se rapporte
au sujet en cause tout en écartant le conseil de Cesariny quand il
affirme que «les anthologies sont toujours tendancieuses», labeur
qui serait infaisable quant au résultat de cette collecte impossible à
faire en un seul volume. L’idée de I. M. a été de montrer une vision
générale de l’édifice, sans laisser de côté aucun étage ni nul recoin
inexploré en suivant les générations, les lieux secrets des groupes,
et même les personnalités qui n’entrent pas nécessairement dans
ce cadre lequel aurait allongé de beaucoup le nombre de pages de
ce travail.
L’anthologie donne lieu a la réalisation d’un projet organisé
ainsi en quatre volumes, qui peuvent être vus comme quatre
étages différents ou bien trois, si on considère le dernier comme
une sorte de remise ou de cave: le premier volume, celui que le
lecteur feuillette ou lit maintenant, représente la création poétique
du «Groupe Surréaliste de Lisbonne» (1948-49), que Meyrelles
prend comme point de départ de l’action poétique surréaliste au
Portugal; le second, à éditer, touche l’action poétique du groupe
dissident et presque contemporain du premier et qui s’est présenté
au public comme «Les Surréalistes» (1949-51) et duquel nous
avons déjà parlé, puisque Meyrelles appartient par son âge et par
affinité à ce groupe, ce qui fait dire à Perfecto que l’anthologie de
7
toma por matéria o grupo do café Gelo (segundo lustro da década de
cinquenta), naquilo que é pela idade e até pelos interesses, com muito
mais unhaca política, uma segunda leva do surrealismo em português;
por fim, o quarto e último, também a chegar mais tarde, que Meyrelles
chamou de “deriva surrealista”, e onde aparecem os pósteros ou afins,
os colaterais ou a progénie, que ontem ou hoje foram tocados pela
aura e pelo calor da chama surrealista.
Não era obrigatório que a antologia de Meyrelles se estruturasse
deste modo, em andares cronológicos, através de três gerações e de
três grupos, três compartimentos diferenciados mas não estanques,
reservando ainda um sótão e uma cave, mais aquela do que esta, pois
a caboucos e precursores o trabalho de Meyrelles diz não, naquilo que
parece jogar com a opção de tomar a ação inicial do Grupo Surrealista
de Lisboa e de “Os Surrealistas”, entre 1947 e 1949, como ponto de
partida e exclusivo, com o qual não se transige, do surrealismo em
Portugal. Natália Correia por exemplo organizou uma antologia sobre
idêntica matéria que batizou “O Surrealismo na Poesia Portuguesa”
e em que decidiu incluir poetas tão desencontrados do tempo da
fundação visível do surrealismo, ou da sua chegada a Portugal, como
os trovadores das cortes de Afonso III e de Dinis ou os quinhentistas
e seiscentistas dos florilégios maneiristas e barrocos. O que Natália
Correia pretendeu agarrar na coleta que fez foi a parcela eterna,
não histórica, a parte essencial, ou ideal, do surrealismo escrito em
português; tal componente intemporal existiu sempre e para sempre
existirá na linguagem verbal humana, portuguesa ou não, e até em
última visão, que porventura já não interessa aqui, existiu e existirá
sempre, antes ou depois do homem e do seu verbo, na génese da
própria Vida.
Não foi essa, e a opção é muito respeitável, posto que discutível,
a aproximação de Isabel Meyrelles ao surrealismo, como não foi essa
de resto a de Perfecto na antologia referida. Para reunir a sua coleção
de poemas, ela aceitou o surrealismo como movimento temporal,
manifestação existencial, inserida na História e no Tempo, com datas
e marcas de nascimento, crescimento, expansão, declínio e retração.
Foram estas e não outras que lhe ditaram a construção do “magma
antológico”, cujo primeiro estrato, respeitante ao primeiro de quatro
patamares, não seguindo o fio da cronologia, está agora nas mãos do
leitor.
E aqui volto eu ao meu embaraço. Para além desta introdução
geral, apresentando os fios do trabalho e da pessoa de Isabel Meyrelles,
como julgo ter feito, bem ou mal, não vem aqui ao caso, perguntome o que se pretende de mim. Ao que me dizem, uma nota também
geral sobre cada um dos quatro andares que por dentro organizam o
edifício antológico, de modo a que cada um dos volumes se apresente
ao leitor enquadrado e até se possível estudado.
Nesse sentido cabe aqui no pórtico de entrada do primeiro deles
dizer algo sobre aquele grupo que para efeitos do que mais importa, o
surrealismo mesmo, será sempre na quadrícula portuguesa o primeiro
entre todos, se bem que cronologicamente não seja isso assim pois se
formou ele no final de 1948 ou princípios de 1949, quando se dava
já notícia em Portugal duma intervenção surrealista anterior. Falo do
grupo que ganhou corpo em torno de Mário Cesariny e de António
Maria Lisboa, que protagonizou duas exposições públicas, a primeira
em Junho-Julho de 1949, já acima citada, e a segunda um ano depois,
em Junho-Julho de 1950, na galeria da livraria lisboeta “A Bibliófila”,
e que manteve atividade regular entre 1949 e 1953, ano da morte de
António Maria Lisboa, a coincidir com o afastamento de outros dois
membros do grupo, Carlos Eurico da Costa e Mário Henrique Leiria,
talvez por razões de política partidária e com a primeira exposição
de Cruzeiro Seixas na cidade de Luanda, onde há pouco se instalara
e onde ficaria por mais duma longa década, só regressando a Lisboa
em 1964.
Desse grupo saiu o legado de maior valor no que respeita à ação
Meyrelles, à l’inverse de la sienne, sera un travail vécu de l’intérieur
du mouvement, mais il se montre injuste envers lui-même, car son
travail est plus passionné qu’académique.
Le troisième, à paraître, a pour matière le groupe du «Café
Gelo» (deuxième lustre de la décade de mille neuf cent cinquante),
du fait de l’âge et des intérêts ayant une tournure plus politique,
une seconde vague du Surréalisme portugais; enfin le quatrième
et dernier qui paraîtra plus tard et que Meyrelles a appelé « la
dérive surréaliste », apparaissent les proches ou les collatéraux,
les compagnons de route, les descendants de ceux qui hier ou
aujourd’hui ont été touchés par l’aura et par la chaleur de la flamme
du surréalisme, etc….
Il n’était pas nécessaire que l’anthologie de Meyrelles se
structure de cette façon, les étages chronologiques à travers trois
générations et trois groupes très compartimentés différenciés mais
étanches, réservant encore un grenier et une cave à d’autres, car le
travail de I. M. dit non aux fondateurs lointains et aux précurseurs
préférant choisir l’option de commencer l’anthologie par le «
Groupe Surréaliste de Lisbonne » 1947-1948 comme point de
départ unique et sur lequel elle ne transige pas. Natália Correia
par exemple a organisé une anthologie sur une matière identique
qu’elle baptisa «Les Surréalisme dans la Poésie Portugaise» où elle
décida d’inclure des poètes lointains du temps de la fondation
visible du Surréalisme ou de son arrivée au Portugal, comme les
troubadours des cours de Alphonse III et de Dinis ou bien encore
ceux du XV ou XVI siècle des florilèges maniéristes ou baroques.
Ce que Natália Correia prétendait saisir dans cette quête c’était la
parcelle éternelle, et non historique, la part essentielle ou idéale du
Surréalisme; de tels composants intemporels ont toujours existé et
existeront toujours dans le langage verbal humain et même dans
une dernière vision, qui peut-être ne présente pas un grand intérêt
ici, le verbe qui exista et existera avant et après l’homme, dans la
genèse de la Vie.
Ce ne fut pas celle-là, et l’option choisie est très respectable,
quoique discutable, l’approche que I. M. choisit comme approche
du Surréalisme, comme d’ailleurs celle de Perfecto Cuadrado dans
son anthologie. Pour réunir son choix de poèmes, elle a choisi le
Surréalisme comme un mouvement temporel, une manifestation
existentielle, insérée dans l’Histoire et le Temps, avec des dates et
traces de naissance, croissance, expansion, déclin et repli. Ce furent
celles-ci et non d’autres raisons qui lui ont dicté la construction
du magma anthologique, dont le premier étage, qui concerne le
premier des quatre, est maintenant entre vos mains.
Je reviens ici à mon désarroi initial. Au-delà de l’introduction
générale, où je présente le travail et la personnalité de Isabel
Meyrelles, comme je pense l’avoir fait, bien ou mal, n’importe,
je me demande ce qu’elle désire que je fasse. A ce qu’on m’a dit,
ce serait une note générale sur chacun des quatre volumes de
l’anthologie, de façon à que chaque volume présente au lecteur un
texte encadré et même si possible étudié. Pour commencer, il faut
d’abord dire quelque chose sur ce groupe que pour des raisons
importantes, le surréalisme lui-même, sera toujours dans le pré
carré portugais le premier entre tous, même si chronologiquement
cela ne s’est pas passé pas comme ça, car le groupe fut formé à la fin
de 1948 ou début de 1949, quand on connaissait déjà au Portugal
une intervention surréaliste antérieure. Je parle du groupe qui s’est
formé autour de Mário Cesariny et de António Maria Lisboa, qui
firent deux expositions publiques, la première en juin-juillet 1949
et la deuxième un an plus tard, en juin-juillet 1950, dans la galerie
de la librairie lisboète «A Bibliofila». Le groupe a poursuivi ses
activités entre 1949 et 1953, l’année de la mort de António Maria
Lisboa, qui a coïncidé avec l’éloignement de deux autres membres
du groupe, Carlos Eurico da Costa et Mário Henrique Leiria, peut8
surrealista em Portugal e só por isso merece ele a primazia em
qualquer antologia, até porque o desfasamento cronológico em relação
às atividades anteriores é insignificante e alguns dos protagonistas
atravessam ambos os grupos. É ele também o grupo a que Isabel
Meyrelles aparece ligada na sua chegada a Lisboa, aos vinte anos, com
as estupendas fotografias dos telhados da Rua do Ferragial de Baixo,
e a que, quando se passa no crivo a longa história dela e se vê em
perspetiva o seu trabalho criativo, por direito ela pertence, o que é
um motivo acrescido para lhe dar aqui, a ele, grupo “Os Surrealistas”,
antecedência.
Esse grupo que Meyrelles escolhe, com o assentimento do editor,
para abrir esta escolha poética, expôs pela primeira vez em Junho de
1949 - estiveram presentes na mostra da Rua Augusto Rosa, Henrique
Risques Pereira, Mário Henrique Leiria, Fernando Alves dos Santos,
Carlos Eurico da Costa, Cruzeiro Seixas, Pedro Oom, Mário Cesariny,
António Maria Lisboa, António Paulo Tomaz, João Artur Silva e Carlos
Calvet (na segunda mostra, de 1950, junta-se Fernando José Francisco
e Alexandre O’Neill) - mas a sua atividade pública arranca antes, pois
a 6 de Maio do mesmo ano o grupo promoveu no Jardim Universitário
de Belas Artes (J.U.B.A.), em Lisboa, um debate, “O Surrealismo e o
seu Público”, que pode talvez ser tomado como a primeira ação pública
do grupo, e nela se apresentou o texto fundador do grupo “Afixação
Proibida”, que resultou da colaboração de António Maria Lisboa,
Henrique Risques Pereira, Mário Cesariny e Pedro Oom. O núcleo
central do agrupamento - António Maria Lisboa, Mário Cesariny,
Cruzeiro Seixas, Pedro Oom, Fernando Alves dos Santos, Carlos
Eurico da Costa, Henrique Risques Pereira - estava formado, a que
logo se juntou, no debate de Maio, Mário-Henrique Leiria, presente já,
com cachimbo e tudo, na exposição de Junho seguinte. E talvez tenha
sido Leiria a trazer para o grupo Carlos Calvet e João Artur Silva,
também expostos na mostra da Rua Augusto Rosa do mês seguinte, já
que em “Antologia Surrealista do Cadáver Esquisito” (1961) há textos
coletivos dos três em 1948. António Paulo Tomaz, por sua vez, chega
pela mão de Cruzeiro Seixas à mostra de 1949 e dele nada mais se sabe
ou conhece; Fernando José Francisco, presente também na mostra da
Rua Augusto Rosa, vem das cegadas da escola António Arroio e nada
deixou escrito.
Tendo em atenção a ida de António Maria Lisboa para Paris no
início desse ano (talvez Fevereiro) e as cartas que trocou com os que
estavam em Lisboa (Março-Abril), e que foram dadas a lume por
Cesariny na edição “Poesia de António Maria Lisboa” (1977), onde se
fica a saber que essa ida foi de modo largo motivada pela necessidade
de dar a conhecer o grupo junto de André Breton e de Benjamim
Péret, é possível avançar sem grande margem de erro que a formação
de “Os Surrealistas” aconteceu no final de 1948, mesmo que as ações
públicas só tenham aberto depois do debate no J.U.B.A. e só nessa
altura o agrupamento se desse a conhecer enquanto tal.
A favor dessa data entra ainda o facto de Mário Cesariny, que
nisto como em muito mais jogou um papel decisivo, ter cortado no
dia 8 de Agosto de 1948, por curta carta dirigida a António Pedro,
com o Grupo Surrealista de Lisboa, ficando assim de braços livres
para mais altos voos - e com ele saiu António Domingues, filho do
escritor e jornalista anarco-sindicalista Mário Domingues, que ainda
acompanhou de entrada “Os Surrealistas”. Uma carta de António
Maria Lisboa enviada de Paris, com a data de Março de 1949, também
lhe é dirigida a ele, António Domingues, o que mostra como este fez
parte do redemoinho inicial do grupo.
“Os Surrealistas” resultam assim do cruzamento de dois veios
distintos, o de Mário Cesariny, que com ele traz Cruzeiro Seixas,
António Domingues e Carlos Eurico da Costa, os dois primeiros
próximos desde a adolescência na escola António Arroio, e o de
António Maria Lisboa, que junta em seu redor Henrique Risques
Pereira, seu vizinho de criança, e Fernando Alves dos Santos, colega
être pour des raisons politiques. Puis a eu lieu la première exposition
de Cruzeiro Seixas à Luanda (Afrique) où il résidait et où il restera
pendant une longue décennie, ne revenant à Lisbonne qu’en 1964.
C’est dans ce groupe qu’est née la vocation d’être le premier acteur
de l’action surréaliste au Portugal et uniquement pour ça, il mérite
la primauté dans n’importe quelle anthologie, même si le déphasage
chronologique en relation aux activités antérieures est insignifiant
et que quelques uns des protagonistes ont participé aux deux
groupes. C’est aussi le groupe duquel Isabel Meyrelles semble la plus
proche lors de son arrivée à Lisbonne, âgée de 20 ans, et à laquelle
on doit les superbes photos faites sur le toit de la rue Ferregial de
Baixo; lorsqu’on passe au crible sa longue histoire, on peut voir en
perspective son travail créateur qui lui appartient de droit, ce qui est
une raison pour donner une place prépondérante au groupe « Os
Surrealistas».
C’est ce groupe que Meyrelles a choisi, avec l’accord de l’éditeur,
pour débuter ce choix poétique; le groupe a exposé pour la première
fois en juin 1949, rua Augusto Rosa, étaient présents: Henrique
Risques Pereira, Mário Henrique Leiria, Fernando Alves dos Santos,
Carlos Eurico da Costa, Cruzeiro Seixas, Pedro Oom, Mário Cesariny
de Vasconcelos, António Maria Lisboa, António Paulo Tomaz, João
Artur Silva et Carlos Calvet (lors de la deuxième exposition, en 1950
exposèrent aussi Fernando José Francisco et Alexandre O’Neill),
mais leur activité publique avait commencé avant, car le 6 mai de
la même année, le groupe avait animé au «Jardim Universitário das
Belas Artes» à Lisbonne un débat, «Le surréalisme et son Public»,
qui peut être considéré comme sa première action publique; dans ce
débat fut présenté le texte fondateur du groupe «Afixação Proíbida»
(Affichage Interdit), résultat de la collaboration auquel ont participé
António Maria Lisboa, Henrique Risques Pereira, Mário Cesariny et
Pedro Oom. Le noyau central du groupe, – António Maria Lisboa,
Mário Cesariny, Cruzeiro Seixas, Pedro Oom, Fernando Alves dos
Santos, Carlos Eurico da Costa, Henrique Risques Pereira – s’était
formé auquel s’est joint, lors du débat de mai, Mário Henrique Leiria,
présent déjà avec sa pipe et tout, dans l’exposition de juin. C’est
peut-être Leiria qui a présenté au groupe Carlos Calvet et Joao Artur
Silva, présents aussi dans l’exposition de la rue Augusto Rosa du
mois suivant, puisque déjà dans «l’Antologia Surrealista do Cadaver
Esquisito» (1961) il y a des textes collectifs des trois datés de 1948.
António Paulo Tomaz est arrivé par la main de Cruzeiro Seixas à
l’exposition de 1949 et on ne sait rien de lui. Fernando José Francisco
qui participe aussi à l’exposition de 1949, lui, vient de la chienlit de
l’École António Arroio et n’a rien laissé d’écrit.
Il faut mentionner le voyage cette même année de António Maria
Lisboa à Paris, peut-être en février, car dans les lettres qu’il a écrites
à ceux qui restaient au Portugal (mars avril), et qui ont été publiées
par Mário Cesariny dans l’édition «Poesia de António Maria Lisboa»
(1977) on apprend que ce voyage a été largement motivé par le
besoin de faire connaître à Breton et à Benjamin Péret l’existence de
ce nouveau groupe; il est possible de dire, sans trop s’avancer, que
la formation de «Os Surrealistas» a eu lieu à la fin de 1948, même si
son action publique n’a commencé qu’après le débat de la JUBA, et
ce fut alors seulement que le groupe se fit connaître en tant que tel.
Pour confirmer cette date il faut citer Mário Cesariny qui a joué
là, comme ailleurs, un rôle décisif, puisque dans une lettre adressée
à António Pedro, le 8 août 1948, il rompt toute relation avec le
Groupe Surréaliste de Lisbonne. Alors, se sentant les bras libres pour
s’envoler plus haut et plus loin – et avec lui s’en alla aussi António
Domingues, fils de l’écrivain et journaliste anarcho-syndicaliste
Mário Domingues qui a suivit avec intérêt et même participé au
début de «Os Surrealistas». Une lettre de António Maria Lisboa
envoyée de Paris, datée de mars 1949, est dirigée aussi à António
Domingues, ce qui montre qu’il fit partie des remous initiaux du groupe.
9
este nos bancos da escola técnica. No meio, fazendo a ponte entre os
dois braços, vê-se Pedro Oom, que por um lado frequenta a António
Arroio, onde acamarada com Cesariny, Seixas, Domingues e Fernando
José Francisco, e por outro, em época tudo ou nada ulterior a essa, ano
de 1944, encontra no café Lisboa Moderna(?) António Maria Lisboa,
Fernando Alves dos Santos e Henrique Risques Pereira, este com 14
anos e os outros com 16.
Quer o primeiro veio, quer o segundo, na proto-história da primeira
metade dos anos quarenta, quando a Europa se metia na prisão da
maior carnificina da sua história, não eram ainda surrealistas. Pedro
Oom diz que no momento em que conheceu António Maria ele era
neo-realista, o que Risques Pereira confirma, por leituras da Seara
Nova e da Vértice, e tudo isto dizem nas notas da edição de “Poesia
António Maria Lisboa” (1977: 386); por sua vez, o mesmo Oom adianta
e nas mesmas notas que por volta dessa mesma época se iniciou a
adesão do grupo da António Arroio, ou o que dele restava pelos cafés
da Almirante Reis e da Baixa lisboeta, ao neo-realismo, o que Cesariny
não desmente e até confirma em vária bibliografia sua, logo na nota
biográfica que escreveu para Mário Cesariny (Lisboa, Secretaria de
Estado da Cultura, 1977).
A adesão ao neo-realismo coincidiu com a participação, ao menos
de Cesariny, por influxo direto no seu caso de Fernando Lopes Graça,
no Movimento de Unidade Democrática, nascido em Outubro de
1945, com certidão legal de vida, um mês antes das eleições de 18 de
Novembro para a Assembleia Nacional – o movimento não concorreu
porém às eleições, alegando falta de condições; no ano seguinte recolhe
numerosas adesões, sobretudo entre os jovens, sendo ilegalizado no
ano seguinte. Cesariny fará até conferência no Barreiro, “A Arte em
crise”, repetida em Évora com a participação de Mário Ruivo e de Júlio
Pomar, e chegará a dirigir no quadro dessa dupla filiação políticoartística o grupo coral de Lopes Graça em visitas a fábricas e sociedades
de recreio (inclusive na primeira audição do hino do MUD). Publica
artigos – que mais tarde classificará de bastante maus – no jornal “A
Tarde”, do Porto, onde colaboram também Fernando José Francisco,
José Leonel, Vespeira, Pomar, Aníbal Alcino, Victor Pala e outros, a
maioria antigos alunos da escola António Arroio; colabora ainda nas
revistas “Seara Nova” e “Aqui e Além”. Os textos esperam ainda um
investigador que os recolha e comente.
É nesse período que conhece José Cardoso Pires, Luiz Pacheco
e Alexandre O’Neill, os dois primeiros vindos do Liceu Camões,
nas imediações da António Arroio e do café Herminius, no bairro
de Arroios, poiso mítico desta proto-história, o terceiro talvez das
reuniões do M.U.D. e das manifestações de rua relativas ao fim da
guerra e da derrota do nazi-fascismo.
Do lado de António Maria Lisboa a história da sua passagem pelo
neo-realismo é muito mais vaga e muito menos ativa. Tudo o que se
sabe, por testemunho de Henrique Risques Pereira, seu companheiro
próximo, é que por volta do ano de 1944-45 frequentou duas rodas
oposicionistas, a de Alves Redol e a de Irene Lisboa, que reuniam
decerto em cafés da Baixa lisboeta, e que por essa época lia com
alguma aplicação a “Seara Nova” e a revista coimbrã “Vértice”, órgão
informal, ou talvez não, do neo-realismo. Ao invés de Cesariny, que
fez conferências, aderiu com inscrição a um movimento, participou
em recitais e deixou uma produção poética associada a esses anos
(“Nobílissima Visão” e poemas “Nicolau Cansado Escritor”; a que se
pode juntar “Um Auto para Jerusalém” e até “Louvor e Simplificação
de Álvaro de Campos”), António Maria Lisboa, ao que se sabe, nada
escreveu nesses anos, ou tendo escrito deitou fora. Cesariny, na nota
prévia da sua magna edição de “Poesia de António Maria Lisboa”(1977:
9-10), já citada, relata que Lisboa, na casa de família de Loures, antes
da primeira partida para Paris, Fevereiro de 1949, tinha ele vinte anos
certos, não mais, passou toda uma tarde, ante o protesto da mãe, a
destruir papéis de autoria sua. Que papéis? Não se sabe. É legítimo
«Os Surrealistas» résultent de la rencontre de deux courants
distincts, celui de Mário Cesariny, qui amène dans son sillage
Cruzeiro Seixas, António Domingues et Carlos Eurico da Costa, les
deux premiers proches depuis leur adolescence à l’École António
Arroio, et l’autre, proche de António Maria Lisboa, entouré par
Henrique Risques Pereira, son ami d’enfance et Fernando Alves dos
Santos, un camarade de l’école technique.
Au milieu, jouant l’intermédiaire entre les deux courants, Pedro
Oom, qui d’un côté a fréquenté l’École António Arroio où il a fait
la connaissance de Cesariny, Cruzeiro Seixas, António Domingues
et Fernando José Francisco. Par ailleurs, à une époque quelque peu
antérieure à celle-là (1944) il fait la connaissance au café Lisboa
Moderna(?) de António Maria Lisboa, Fernando Alves dos Santos
et Henrique Risques Pereira, celui-ci âgé de 14 ans et les autres 16 ans.
N’importe comment que ce soit le premier courant comme le
deuxième, dans la protohistoire de la première moitié des années
quarante, lorsque l’Europe participait au plus grand carnage de
l’Histoire, ils n’étaient pas encore surréalistes. Pedro Oom dit
que lorsqu’il connu António Maria Lisboa, il était néoréaliste, ce
que confirme Henrique Risques Pereira, il lisait la «Seara Nova»
et «Vertice». Tout cela est confirmé dans les notes de l’édition de
«Poesia de António Maria Lisboa » (1977:386); Pedro Oom dit
encore dans les mêmes notes que c’est vers cette époque que le
groupe de l’École António Arroio ou ce qu’il en restait dans les cafés
du centre de Lisbonne, adhérait au néoréalisme, ce que Cesariny ne
dément pas et même le confirme dans sa vaste bibliographie, voir
ce qu’il dit dans la note bibliographique qu’il a écrit pour Mário
Cesariny (Lisboa, Secretaria de Estado da Cultura, 1977).
L’adhésion au néoréalisme a coïncidé, tout au moins pour
Mário Cesariny, par le biais du Maestro Fernando Lopes Graça,
au Movimento de Unidade Democrática (Mouvement d’Union
Démocratique), né au mois d’octobre 1945 et qui avait sa carte
d’Identité Nationale un mois avant les élections du 18 novembre
pour l’Assemblée Nationale - toutefois le mouvement n’a pas
participé aux élections, objectant le manque de conditions; après
les élections, il recueillit de nombreuses adhésions, surtout parmi
les jeunes, il fut déclaré hors la loi l’année suivante. Cesariny fera
une conférence Au Barreiro, «A Arte em Crise», reprise à Évora
avec la participation de Mário Ruivo et de Júlio Pomar, et dans le
cadre de cette double filiation politique et artistique, il dirigera le
groupe choral de Lopes Graça lors des visites dans les usines et les
associations récréatives, y compris lors de la première audition de
l’hymne du MUD. Il publia des articles – que plus tard il qualifiera
d’assez mauvais – dans le journal «A Tarde», publié à Porto et où
ont collaboré aussi Fernando José Francisco, José Leonel, Vespeira,
Pomar, Anibal Alcino, Victor Pala et d’autres, la grande majorité
sortie de l’École António Arroio. Il collabora aussi dans les revues
«Seara Nova» et «Aqui e Além». Ces textes attendent toujours qu’un
chercheur les recueille et les commente.
C’est à cette époque qu’il rencontre José Cardoso Pires, Luiz
Pacheco et Alexandre O’Neill, les deux premiers venus du Lycée
Camoes, situé à proximité de l’École António Arroio et du café
Herminius, dans le quartier de Arroios, nichoir mythique de cette
protohistoire, peut-être la troisième des réunions du MUD et des
manifestations de rue relatives à la fin de la guerre et de la défaite
du nazisme.
Du côté de António Maria Lisboa, l’histoire de son passage
par le néoréalisme est très vague et beaucoup moins active. Tout ce
qu’on sait, grâce au témoignage de Henrique Risques Pereira, son
ami le plus proche, c’est qu’entre 1944 et 1945, il fréquenta deux
cercles d’opposants au régime, celui de Alves Redol et celui de Irène
Lisboa, qui se réunissaient dans les cafés du Centre, et il lisait avec
intérêt la «Seara Nova» et la revue de Coimbra «Vertice», organe
10
informel, ou peut-être pas, du néoréalisme. Au contraire de Mário
Cesariny qui faisait des conférences, s’était inscrit à un parti de
l’opposition, participait à des récitals et a laissé une production
poétique associée à ces années là comme “Nicolau Cansado,
escritor,” auxquels on peut joindre «Um Auto para Jerusalém» et
même «Louvor e simplicação de Alvaro de Campos».
António Maria Lisboa, a ce que l’on sait, n’a rien écrit lors de
ces années-là, ou a écrit et tout jeté. Cesariny, dans son importante
note préalable à son édition de la «Poesia de António Maria
Lisboa» (1977: 9 et 10), raconte que dans la maison familiale avant
de partir pour Paris en février 1949, il avait tout juste 20 ans, il
passa tout un après-midi à détruire des papiers personnels, sans
écouter les protestations de sa mère. Quels papiers? On l’ignore. Il
est naturel que l’on puisse soupçonner que le « nettoyage » tomba
sur des écrits de la période à laquelle il fréquentait les cercles de
l’opposition proches du néoréalisme, et qui ne présentaient plus
aucun intérêt à la fin de 1948, moment de la formation du groupe
«Os Surrealistas».
La rupture avec le néoréalisme, que ce soit du côté de Mário
Cesariny comme du côté de António Maria Lisboa, a eu comme
résultat la fusion du groupe qui importe ici. Il a dû avoir lieu lors
de la deuxième moitié de 1946, au temps où Mário Cesariny a
réalisé le collage dédié au Général de Gaulle, qui est tombé comme
un bloc de glace dans le lit tout fait du néoréalisme.
C’est l’année où Breton revient en France, au mois de mai,
après un exil qui avait commencé en 1941, et qu’il réorganise les
activités surréalistes en même temps qu’il regroupe et édite pour
la première fois l’ensemble des Manifestes Surréalistes. L’année
suivante sera un moment exceptionnel, les maillons du groupe
se retrouvent et montrent la puissance de leur réapparition: les
défis en février, à propos d’Aragon et de Lefèvre, avec l’organe
du Parti Communiste Français, l’Humanité; les huées en avril
lors de la conférence de Tzara à la Sorbonne; polémique en mai
avec Sartre dans la revue Les Temps Modernes; prise de position
de Georges Bataille en juillet en faveur de Breton; formation
du groupe « Surréalistes Révolutionnaires » de Noël Arnaud et
de Edouard Jaguer, publication en juin de Arcane 17,où Breton
fait l’apologie des drapeaux noirs de l’anarchisme (1); pamphlet
collectif de Breton en juin, «Rupture Inaugural», qui rompt une
fois pour toutes avec le marxisme et reprend la ligne créatrice
des mythes que l’on voit dans le texte de 1942, Prolégomènes à
un troisième «Manifeste du Surréalisme ou non»; finalement, la
grande exposition internationale Le Surréalisme en 1947, à la
galerie Maegt, Paris, avec la participation de 25 pays. Et dont les
commissaires de l’exposition furent Marcel Duchamp et Frederick
Kiesler. Dans «Éphémérides Surréalistes», publiées en 1955 dans la
réédition des Manifestes, Breton ajoute encore en 1947: fondation
du groupe «Cause», dont le secrétariat était assuré par Sarane
Alexandrian, Henein et Henri Pastoreau.
L’année dont on parle, 1947, est aussi le moment où Mário
Cesariny part l’été pour Paris, attiré certainement par l’exposition
de la galerie Maeght et disposé à entrer en contact avec André
Breton, ce qui a pu se faire dans l’appartement de celui-ci. Estce
pendant ce séjour que Mário Cesariny décide de débuter l’action
surréaliste au Portugal, moyennant un groupe organisé, capable
d’intervenir auprès du public et de la société? Pour réaliser son
désir, il y avait des facteurs importants: le choc de l’exposition
internationale (où aucun portugais n’avait participé); l’exposition
parallèle de Matta dans la galerie René Drouin; la nouveauté
du pamphlet «Rupture Inaugurale» qui venait de paraître; la
nombreuse littérature surréaliste à laquelle il a eu accès et qui joua
un rôle capital dans l’édition de l’année d’avant de la publication des
Manifestes Surréalistes (éd. Sagittaire); et finalement, l’attraction
porém pensar que a purga incidiu sobre escritos do período em que
conviveu com os círculos oposicionistas próximos do neo-realismo e
que nenhum interesse apresentavam já nos finais de 1948, momento
da formação do grupo “Os Surrealistas”.
A rutura com o neo-realismo, quer do braço representado por
Cesariny, quer do consignado por Lisboa, de cujo cruzamento sairá o
grupo que aqui importa, deve ter acontecido na segunda metade do
ano de 1946, tempo em que Cesariny realiza a colagem dedicada ao
General De Gaulle, que tombou como pedra de gelo na cama feita do
neo-realismo. É o ano em que Breton regressa em Maio a França, depois
dum exílio que começara em 1941, e reorganiza em Paris as atividades
surrealistas, ao mesmo tempo que reagrupa e edita pela primeira vez
em conjunto de “Os Manifestos do Surrealismo”. O ano seguinte será
momento cheio, com elos fortes e seguidos, que mostram a pujança
do reaparecimento: despiques em Fevereiro, a propósito de “Aragon”
e “Lefebre”, com o órgão de imprensa do partido comunista francês,
“L’Humanité”; pateada em Abril na conferência de Tzara na Sorbonne;
polémica em Maio com Sartre na revista Les Temps Modernes; tomada
de posição de Georges Bataille em Julho a favor de Breton; formação
do grupo “Surrealistas Revolucionários” de Noël Arnaud e de Édouard
Jaguer; publicação francesa em Junho de Arcano 17, em que Breton faz
a apologia das bandeiras negras do anarquismo (1); panfleto coletivo
do grupo de Breton em Junho, “Rupture Inaugural”, que corta com o
marxismo e retoma a linha criadora de mitos que se vê no texto de
1942, Prolegómenos a um Terceiro Manifesto do Surrealismo ou Não;
por fim, em Julho, a grande exposição internacional “Le Surréalisme”
em 1947, na galeria Maeght, Paris, com a participação de 25 países, e
cujo arranjo espacial e geral pertenceu a Marcel Duchamp e a Frederick
Kiesler.
Nas “Efemérides Surrealistas”, vindas a lume em 1955 na reedição
desse ano de “Os Manifestos”, Breton junta ainda para 1947: fundação
do grupo “Causa”, secretariado por Sarane Alexandrian, Henein e
Henri Pastoreau.
O ano em causa, 1947, é também o momento em que Mário Cesariny
parte no Verão para Paris, atraído por certo pela exposição da galeria
Maeght, e disposto a chegar à fala com André Breton, o que aconteceu
no apartamento deste. Será durante esta estadia que Cesariny decide
abrir ou iniciar a ação surrealista em Portugal, através dum grupo
organizado, capaz de intervir junto do público e da sociedade. Para
a sua motivação concorriam fatores fortes: o choque da exposição
internacional (em que nenhum português participou); a mostra
paralela de Matta na galeria René Drouin; a novidade do panfleto
“Ruptura Inaugural”, acabado de aparecer; a abundante literatura
surrealista a que então tece acesso, com papel capital para a edição do
ano anterior dos “Manifestos do Surrealismo (sagittaire); por fim, a
atração pessoal de André Breton, poderoso íman solar a que Cesariny
ficou sempre, com tudo o que o podia afastar dalguém que muitos
insistiam em acusar de homofobia, fidelíssimo.
Dessa motivação temos hoje prova pública, a correspondência
cruzada nesse Verão entre Cesariny e O’Neill, em que se intromete
também João Moniz Pereira, e que foi pela primeira vez dada a lume,
numa altura em que Cesariny estava já preocupado com a história da
ação do movimento em Portugal, no folheto “Contribuição ao registo
de nascimento existência e extinção do grupo surrealista de Lisboa
com uma carta acrílica do mês de Agosto de mil novecentos e 66 /
número da besta / editado em trezentos exemplares por mário cesariny
e cruzeiro seixas no quinquagésimo aniversário da recusa de duchamp
em terminar o grande vidro e no do nascimento sempre possível ainda
que sempre improvável de sete novos justos ignorados” (1973; haverá
uma edição do mesmo volume, no ano seguinte, com referência ao 50º
Aniversário do Primeiro Manifesto Surrealista; o texto está hoje na
edição de 1985, “As Mãos na Água a Cabeça no Mar”).
Do Grupo Surrealista de Lisboa, que foi o resultado da exaltação
11
desse Verão de 1947, das suas ações e protagonistas, se falará em nota
ulterior, no segundo patamar desta antologia. Por ora retenha o leitor
que Cesariny, que tanto fez pela formação do G.S.L., não se agradou da
companhia que por lá encontrou, resultado da chegada ao grupo, por
volta do Outono de 1947, de António Pedro, que andara por Londres
uns anos antes e alguma coisa soubera de surrealismo, talvez por
Herbert Read, que com ele trouxe o pintor António Dacosta, então
em Paris, e um jovem valete, José-Augusto França, nulo em termos de
surrealismo. Do desagrado resultou o corte com o grupo em Agosto de
1948 e a sua passagem ao núcleo de Pedro Oom e de António Maria
Lisboa. Também eles haviam aderido ao surrealismo no ano de 1947
e desenvolviam pelos cafés de Lisboa algum trabalho em conjunto.
Segundo o testemunho de Risques Pereira nas notas da edição de
“Poesia de António Maria Lisboa” (1977:389) o núcleo, integrado
ainda por Fernando Alves dos Santos e por ele, Risques Pereira, foi
convidado a integrar o Grupo Surrealista de Lisboa e chegou a ter
algumas reuniões de adesão, acabando por recusar devido ao espaço
que António Pedro começava a ocupar.
Natural pois que Cesariny quando se desgostou de França e de
Pedro, perdendo neles em termos de surrealismo qualquer esperança,
se tenha juntado a este núcleo desgarrado, ao qual o ligavam relações
antigas e próximas com Pedro Oom.
Disse atrás que o legado mais autêntico do surrealismo português
foi aquele que resultou do cruzamento entre os dois dissidentes do
Grupo Surrealista de Lisboa, Mário Cesariny e António Domingues,
que trazem ainda com eles Cruzeiro Seixas e Fernando José Francisco,
e o núcleo de Oom e de Lisboa. Não é esta a ocasião para avaliar em
pormenor a obra de cada um dos participantes no grupo mas ainda
assim se pode dizer que a obra poética de Mário Cesariny escrita e
publicada entre 1948 e 1961, altura em que se antologiou pela primeira
vez, é do mais raro que se fez na poesia portuguesa do século XX e
que a obra pictórica de Cruzeiro Seixas, quer na fase de Luanda, 19521964, quer na posterior, tem no domínio que lhe é próprio o mesmo
vigor de raridade. Até um poeta como Fernando Alves dos Santos,
tão arredado de apreciações e balanços literários, que de resto não o
parecem ter preocupado, e que tão pouco deu à estampa, apenas dois
livros em vida, “Diário Flagrante” (1954) e “Textos Poéticos” (1957)
(2) se mostra, para só falar da década em que se deu a conhecer, um
dos mais importantes criadores poéticos desse período. E o mesmo se
dirá, até com mais propriedade, para um poeta como Carlos Eurico da
Costa, que viu o seu livro de estreia, “Sete Poemas da Solenidade e um
Requiem” (1952), prefaciado por Mário Cesariny em quatro parágrafos
excelsos, “A Volta do Filho Prólogo”, do mais elogioso que é possível
atribuir a homem que nestas matérias era mais de cortar do que de dar.
Guardo para o fim o caso de António Maria Lisboa, por me parecer
que aí se encontra o pico duma orografia que, sendo poética, talvez não
seja já literária. A descoberta do Eu interior, tal como o surrealismo a
propunha desde que Breton definira em 1924 o automatismo psíquico,
fornecendo casos e exemplos para o transformar em instrumento de
exploração do continente psíquico, encontra neste António Maria uma
avançada das mais largas que se conhece. Não é aqui também o lugar
para apreciar a rota deste expedicionário da alma humana mas paga
a pena dizer que a cartografia dos três curtos livros que ele publicou
em vida, entre 1952 e 1953, “Erro Próprio”, “Ossóptico” e “Isso Ontem
Único”, representa dentro do surrealismo poético internacional um
ponto de avanço, que o põe lado a lado com a grande obra final de
Breton, “L’Art Magique” (1957). Sem o que dele nos ficou e sem aquela
parte da obra de Cesariny que atrás referi, com destaque para livros
como “Manual de Prestidigitação” (1956), “Pena Capital” (1957) e
“Alguns Mitos Maiores, Alguns Mitos Menores Propostos à Circulação
pelo Autor” (1958), o surrealismo português, em termos escritos e
poéticos, não iria além duma insignificância, a não merecer, isto se
merecesse, o que não é líquido, mais do que uma nota curtíssima de
personnelle d’André Breton, puissant iman solaire auquel Cesariny
est toujours resté fidèle, sachant tout ce qui pourrait l’éloigner de
quelqu’un qui avait la réputation d’être homophobe.
Nous connaissons aujourd’hui ses motivations et nous avons
une preuve publique dans la correspondance échangée cet été-là
entre Mário Cesariny et Alexandre O’Neill, à laquelle s’est mêlé
occasionnellement João Moniz Pereira, et qui a été publiée à
l’époque. Mário Cesariny était accaparé avec l’histoire de l’action
du mouvement surréaliste au Portugal, écrivant une plaquette
nommée Contribução ao registo de nascimento existência e
extinção do grupo surrealista de Lisboa com uma carta acrílica do
mês de Agosto de mil novecentos e 66 / número da besta / editado
em trezentos exemplares por Mário Cesariny e Cruzeiro Seixas no
quinquagésimo aniversário da recusa de Duchamp em terminar o
grande vidro e no do nascimento sempre possível ainda que sempre
improvável de sete novos justos ignorados (1973) (contribution à
l‘extrait de naissance, existence et fin du groupe surréaliste de
Lisbonne, avec une lettre acrylique du mois d‘août mille neuf cent
/ 66 / nombre de la bête / édité à trois cents exemplaires par mário
cesariny et cruzeiro seixas pour le cinquantième anniversaire du
refus de Duchamp de terminer le grand verre et de la naissance
toujours possible, quoique improbable de sept nouveaux justes
(1973); l’année suivante il y aura une édition du même volume lors
du 50 ème anniversaire du Premier Manifeste Surréaliste; le texte
se trouve aujourd’hui dans l’édition de 1985, «As Mãos na Água a
Cabeça no Mar».
Du «Grupo Surrealista de Lisboa» et le résultat de l’exaltation
de cet été 1947, de ses actions et de ses protagonistes, on en
reparlera lors de l’édition du deuxième volume de cette anthologie.
En attendant, que le lecteur garde en mémoire que Cesariny,
qui a tant fait pour la formation du groupe G L, fut déçu par
la compagnie qu’il y trouva, résultat de l’arrivée dans le groupe
vers l ‘automne 1947 de António Pedro, qui avait vécu à Londres
quelques années auparavant et avait appris des choses sur le
surréalisme, peut-être à travers Herbert Read, il amena avec lui
le peintre António Dacosta, qui vivait alors à Paris, et un jeune
factotum, José Augusto França, nul en termes de surréalisme. Le
mécontentement de Mário Cesariny lui fit rompre les ponts avec
le groupe en août 1948 et adhérer au groupe de Pedro Oom et de
António Maria Lisboa. Eux aussi avaient adhéré au surréalisme en
1947 et développaient dans les cafés de Lisbonne quelques travaux
ensemble. Selon le témoignage de Risques Pereira dans ses notes
de l’édition de la Poesia de António Maria Lisboa (1977:389), le
noyau du groupe était encore fréquenté par Fernando Alves dos
Santos et par lui, Risques Pereira. Celui-ci fut invité à intégrer
le «Grupo Surrealista de Lisboa» et il y eut même quelques
rencontres, puis il refusa l’invitation en raison de la large place
que António Pedro commençait à occuper. Il est donc naturel que
Mário Cesariny, rebuté par França et par Pedro, perdant avec eux,
en termes de surréalisme tout espoir il est naturel qu’il ait rejoint
le groupe encore dispersé, à travers Pedro Oom qui connaissait
tout le monde.
J’ai déjà dit auparavant que l’événement le plus authentique
du surréalisme portugais fut celui qui a découlé de la rencontre
entre les deux dissidents du «Grupo Surrealista de Lisboa», Mário
Cesariny et António Domingues, qui amenèrent avec eux Cruzeiro
Seixas, Fernando José Francisco, et le noyau d’amis de Pedro Oom
et de Lisboa. Ce n’est pas ici le moment d’évaluer en détail l’oeuvre
de chacun des participants, mais on peut quand même dire que
l’oeuvre poétique de Mário Cesariny, écrite et publiée entre 1949 et
1961, date où il figura dans une anthologie pour la première fois,
est de la qualité la plus rare et que l’œuvre picturale que Cruzeiro
Seixas réalisa dans sa phase de Luanda, entre 1952 et 1964 et les
12
rodapé numa história do surrealismo internacional. Assim, com a
obra de Cesariny e a de Lisboa, ele toma lugar na parte nobre do texto,
constituindo até nos aspetos que se referem à década de quarenta,
marcados pelos dois livros atrás referidos, “Prolegómenos” e “Arcano
17”, parte importante do seu núcleo propulsor.
Ao grupo “Os Surrealistas” se voltará de forma inevitável quando se
fizer a apresentação do segundo volume desta antologia, dedicado ao
coletivo que se formou depois Cesariny se encontrar com Breton em
Paris no Verão de 1947 e que tomou por nome Grupo Surrealista de
Lisboa. E digo que não há forma de evitar o regresso, dada a sobreposição
de algumas das atividades, e até aqui e ali algum cruzamento, raro
todavia, dos dois grupos, que chegaram a ser contemporâneos e saíram
ambos do mesmo viveiro de ideias, por vezes até pela mão dos mesmos
protagonistas. Foi o que sucedeu por exemplo na segunda mostra de
“Os Surrealistas”, Junho-Julho de 1950, que contou com a colaboração esporádica diz Cesariny nas notas da edição “Poesia de António Maria
Lisboa” (1977: 392) - de Alexandre O’Neill, mas que não terá sido
assim tão acidental, tão de fugida, pois dela resultou até um dos textos
consagrados do movimento, “O Cadáver-Esquisito à Mesa Pé-deGalo”, que mais tarde Cesariny incluiu na secção sétima de Antologia
Surrealista do Cadáver Esquisito.
années suivantes, possède dans son propre domaine, la même
force extraordinaire. Même un poète comme Fernando Alves dos
Santos, si éloigné des critiques et des bilans littéraires, ce dont
apparemment il ne s’est pas soucié, ne publia que deux livres
dans toute sa vie: «Diário Flagrante» (1954) et «Textos Poéticos»
(1957) (2) il montre, cependant que pendant la décennie où il se
fit connaître, l’un des poètes des plus créatifs de cette période.
Et l’on peut dire la même chose, avec même plus de justesse, de
Carlos Eurico da Costa qui a vu son premier livre, «Sete Poemas
da Solenidade e um Requiem» (1952), préfacé par Mário Cesariny
qui dans quatre paragraphes sublimes, «A Volta do Filho Prologo»
(Retour du Fils Prologue) fait les plus grands éloges à l’auteur.
Je garde pour la fin le cas de António Maria Lisboa, d’autant plus
qu’il me semble que chez lui se trouve le sommet d’une orographie
qui, tout en étant poétique, n’est peut-être pas littéraire.
La découverte du Moi intérieur, tel que le surréalisme le proposait
depuis que Breton l’avait défini en 1924, l’automatisme psychique,
en fournissant des cas et des exemples pour le transformer en
instrument de l’exploration du continent psychique, trouve chez
António Maria Lisboa l’une des plus grandes avancées que l’on
connaisse. Ce n’est pas le moment propice pour apprécier le
chemin w parcouru par cet explorateur de l’âme humaine, mais
c’est important de dire que la cartographie des trois minces
plaquettes qu’il publia en vie, entre 1952 et 1953, «Erro Proprio»,
«Ossóptico» et «Isso Ontem Único», représentent dans le cadre du
surréalisme poétique international un point d’avance, ce qui le met
côte à côte avec le grand ouvrage d’André Breton, L’Art Magique
(1957). Sans ce qu’il nous a laissé et surtout sans la part de l’oeuvre
de Mário Cesariny que j’ai déjà citée, il a écrit bien d’autres livres:
«Manual de Prestidigitação» (1956), «Pena Capital» (1957) et
«Alguns Mitos Menores Propostos à Circulação pelo Autor» (1958),
etc… le surréalisme portugais, en termes écrits et poétiques, serait
insignifiant, ne méritant pas, ce qui n’est pas évident, plus qu’une
très courte note de bas de page dans l’histoire du surréalisme
international. Mais maintenant avec l’oeuvre de Cesariny et celle
de Lisboa, il prend place dans la partie noble du texte, constituant
même dans les aspects qui se rapportent à la décennie de quarante
marquée par les deux livres cités plus haut, «Prolegómenos» et
«Arcane 17», une partie importante de son noyau propulseur.
Quant au groupe «Os Surrealistas», on y reviendra inévitablement
lorsqu’on fera la présentation du deuxième volume de cette
anthologie, dédié au collectif qui se forma après que Cesariny
ait rencontré Breton à Paris pendant l’été 1947 et qui a pris pour
nom «Grupo Surrealista de Lisboa». Et je dis qu’il n’y a pas moyen
d’éviter ce retour, étant donné la superposition de quelques unes
de leurs activités, et ici et là, des rencontres, rares cependant, entre
les deux groupes qui ont été à un moment donné contemporains,
étant sortis ensemble du même vivier d’idées, parfois par la main
des mêmes protagonistes. C’est ce qui arriva, par exemple, lors de
la deuxième exposition de «Os Surrealistas» (juin juillet 1950) qui
compta avec la collaboration sporadique, - dit Mário Cesariny
dans les notes de l’édition de «Poesia de António Maria Lisboa»
(1977: 392) – de Alexandre O’Neill, mais qui n’aurait pas été si
accidentelle que ça, car de ces retrouvailles est sorti l’un des textes
célèbres du mouvement, «O Cadaver-Esquisito à Mesa-Pé-deGalo», que Mário Cesariny a inclus dans la septième section de
«Antologia Surrealista do Cadaver Esquisito».
António Cândido Franco
Agosto e Novembro de 2012
(1) A edição original deste importante texto, escrito entre Setembro de 1944 e Janeiro
de 1945, edição de luxo ilustrada por quatro arcanos do Tarot da autoria de Matta, o
mesmo que em 1942 ilustrara com uma composição “Prolegómenos a um Terceiro
Manifesto do Surrealismo ou Não”, outro importante escrito aparecido no exílio de
Nova Iorque, é de Março de 1945 (Nova Iorque, livraria Brentano’s).
(2) Perfecto E. Cuadrado reuniu com muito proveito tudo o que deste importante poeta
se conhece, em livro ou disperso, édito ou inédito, num único volume, disponível hoje,
“Diário Flagrante - Poesia” (Assírio & Alvim, 2005).
(1) L ’édition originale de ce texte important, écrit entre septembre 1944 et juillet
1945, édition de luxe illustrée par quatre arcanes du Tarot faits par Matta, le même
qui, en 1942, avait illustré avec une composition, Prolégomènes à un troisième
Manifeste du Surréalisme ou non, un texte important paru pendant l’exil new yorkais
de Breton en mars 1945 (New York, librairie Brentano’s).
António Cândido Franco
août et novembre 2012
Traduction Isabel Meyrelles, février 2013
(2) Perfecto E. Cuadrado a réuni, avec profit, tout ce qu’on connaît de lui, en livres ou
épars, édité ou inédit, en un seul volume aujourd’hui disponible, Diario Flagrante –
Poesia – Assirio & Alvim, 2005.
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Antologia poetica Surrealistas_Antonio_Candido_Franco[1]