1 ESCOLA SUPERIOR NACIONAL DE SEGUROS FUNENSEG MBA EXECUTIVO EM SEGUROS E RESSEGURO Direito do Consumidor Professora Angélica Carlini O Aspecto Restritivo da Cobertura de Invalidez Funcional Permanente por Doença nos Contratos de Seguros de Pessoas Frente ao Código de Defesa do Consumidor Maria Carolina Carneiro Balestra Santos Tarcilla Pereira Faria GOIÂNIA, MAIO - 2015. 2 1. Introdução Considerando as atuais perspectivas da legislação consumerista, aplicada juntamente ao Código Civil, o presente trabalho visa apresentar a atual interpretação dada às cláusulas contratuais relativas à cobertura de Invalidez Funcional Permanente por Doença, dos contratos de seguro de vida. Isso, baseado no atual entendimento do Colendo Superior Tribunal de Justiça, enfatizando os princípios que regem o contrato de seguro, alinhados com os ditames consumeristas e civis. 3 2. Desenvolvimento O Código Civil define o contrato de seguro em seu Art. 757. Converge a doutrina com o entendimento de que a contraprestação do segurador é a garantia, a segurança em relação aos riscos1. Frise-se que é permitido às Seguradoras ampliarem ou restringirem quaisquer cláusulas contratuais, tais como o início da cobertura, os valores dos seguros, as coberturas concedidas e outras que são estabelecidas expressamente na apólice de seguro, conforme artigo 760 do Código Civil. Desta forma, o contrato de seguro contém cláusulas que são limitativas dos riscos para viabilizar suas contratações e indenizações, bem como definir as extensões de suas responsabilidades. Em outras palavras, a responsabilidade da Seguradora não extravasa os riscos assumidos no contrato de seguro. Salienta-se que todo contrato de seguro, independentemente de sua destinação, possui cláusulas específicas que são previamente submetidas à análise rigorosa e aprovação do órgão competente, qual seja, a Superintendência de Seguros Privados (SUSEP), antes de serem postos em comercialização. Assim a SUSEP, ao aprovar o produto e suas respectivas cláusulas, o faz por considerar o produto viável e com cláusulas lícitas e praticáveis na melhor forma do direito, em total harmonia com o Código Civil Brasileiro, Código de Defesa do Consumidor, e demais disposições legais pertinentes. Nesse contexto, a seguradora não poderá ser responsabilizada por riscos não contratados na apólice. Nos seguros em grupo, surgem três figuras relevantes, quais sejam a seguradora, que garante o risco, após prévia análise da proposta que lhe foi formulada, mediante a paga do prêmio correspondente; o segurado, que é o titular do contrato, que dependendo das coberturas contratadas, poderá ser indenizado nos casos de invalidez por doença, ou por acidente, dentre outras; o beneficiário, indicado 1 Pontes de Miranda, Francisco Cavalcanti. Tratado de direito privado. Atual. Bruno Miragem. São Paulo: Ed. RT, 2012. Vol.45, p.463. 4 pelo segurado, no ato da contratação, e que receberá a indenização correspondente, por morte do segurado, sendo que nos casos de invalidez total por acidente ou por doença, o segurado e o beneficiário se confundem. Ainda, nos termos do art. 21, § único, do Decreto Lei 73/66 c/c com os artigos 789 e 801, § 1º, ambos do Código Civil, o Estipulante2, figura essencial nos contratos em grupo, constitui-se o representante dos componentes do grupo segurado, assumindo ele a representação obrigatória dos mesmos durante a vigência da relação contratual. O renomado Adilson José Campoy, in obra citada, p. 169 e 170, ensina que: “Ao analisarmos o papel do estipulante no seguro coletivo, vimos que ele é o responsável por fornecer, ao segurador, todas as informações necessárias à análise do risco e ao cálculo do prêmio. (...) Como vimos, o estipulante é representante legal dos segurados, e, evidentemente, o legislador estabeleceu essa representação legal sob a premissa de que a relação entre estipulante e segurados será próxima o bastante para inspirar segurança a confiança que uma relação de mandato exige. É o estipulante quem busca o melhor contrato para aquele grupo segurável, propondo as coberturas adequadas e avaliando o prêmio correspondente. Portanto é obrigação dele, após o fechamento do contrato, realizar o esclarecimento prévio aos segurados sobre os produtos que oferece e os existentes no mercado, prestando informações claras sobre o tipo de cobertura contratada e suas consequências, pois a atuação do estipulante deve sempre ser rigorosa no que diz com o atendimento dos interesses do grupo que representa. Não pode ser de outra forma, pois os contratos de seguro em Grupo sempre terão a figura do Estipulante, o qual responderá por todos os segurados perante a 2 CAMPOY, Adilson José. Contrato de Seguro de Vida, p. 168-169. São Paulo: Ed. RT, 2014. 5 Seguradora, bem como terá a obrigação de cobrar o respectivo prêmio de cada funcionário ou associado e se responsabilizar pelo devido repasse à Seguradora, através de pagamento de fatura mensal, ou pagamento integral do prêmio por ele próprio. Isso em respeito ao mútuo formado por meio de todos os prêmios pagos. O mutualismo pode ser considerado como uma união de esforços entre as partes a fim de formar um fundo comum para a mitigação de riscos. Isto é, ao contrário do que grande parte dos consumidores acreditam, as indenizações securitárias não são pagas pelos lucros das Companhias de Seguro, e sim pelo fundo formado pelo pagamento dos prêmios de toda a base de segurados. Acerca do tema, Adilson José Campoy, in obra citada, p. 20, ressalta que cabe à empresa de seguros angariar segurados, cobrar e receber deles prêmios devidos, organizar a mutualidade de acordo com as mais refinadas técnicas e determinações oficiais, de tal sorte que os azares que golpearem alguns dos segurados sejam suportados pela coletividade por ela administrada. Quer isto dizer que o segurador realiza o pagamento de indenizações ou de capitais com o fundo constituído pelos prêmios pagos pelo conjunto de segurados que compõem a mutualidade. O Segurador administra o fundo constituído por todos os segurados, sendo um direito-dever de regular o sinistro e pagar os eventos cobertos, sob pena de prejudicar toda a massa de segurados. A Seguradora, por sua vez, nas hipóteses de evento coberto, deverá pagar a indenização ao segurado. Trata-se de um dever secundário, visto que o principal está diretamente ligado à garantia do interesse legítimo do segurado, do início ao fim do contrato, o que engloba a formação de reservas e a liquidez da companhia, antes mesmo da ocorrência de qualquer sinistro (que é incerto que ocorra).3 Angélica Carlini e Maria da Glória Faria, entendem que o mutualismo é princípio fundamental da operação técnica de seguros e por essa razão, o contrato de 3 Em debate, 8, Sanção direta, regulação, seguro de re call, arbitragem e sinistro, Escola Nacional de Seguros Privados, Funenseg, 2014. 6 seguros quando se torna a vestimenta jurídica da operação técnica, se preocupa tanto em proteger o mutualismo por meio das cláusulas que identificam as coberturas e as exclusões de risco, bem como por meio das cláusulas restritivas de direitos. Seguem fundamentando que a finalidade do seguro é justamente pulverizar, fragmentar o risco, diluindo suas consequências econômicas no seio de um agrupamento (mutualidade), formado pelos titulares de interesses submetidos aos mesmos riscos, ou seja, o mutualismo é, portanto, um fundamento essencial da atividade de seguros, e, por essa razão, deve ser protegido pelo contrato de seguro.4 Logo, nos contratos de seguro de vida, com cobertura para Invalidez Funcional Permanente por Doença (IFPD), a Seguradora, por meio da cobrança de prêmio, garante ao segurado o pagamento do valor da importância segurada em caso de ocorrência de evento coberto, isto é, para casos de invalidez, onde o mesmo perdeu a sua existência independente. Importante esclarecer que os contratos de seguro são regidos pela SUSEP, órgão responsável pelo controle e fiscalização dos mercados de seguro, previdência privada aberta, capitalização e resseguro. Trata-se de Autarquia vinculada ao Ministério da Fazenda, que foi criada pelo Decreto-lei n. 73, de 21 de novembro de 1966. A SUSEP é a responsável por legislar, por meio de Normativos, Circulares delimitando as coberturas de todos os ramos de seguros. Assim ocorre nos casos de contratos de seguro de vida, inclusive em relação à cobertura de IFPD, pois por meio da Circular n. 302 de 19/09/2005, a SUSEP dispôs sobre as regras complementares de funcionamento e os critérios para operação das coberturas de risco oferecidas em plano de seguro de pessoas. Conclui-se que o contrato de seguro não está baseado em cláusulas esparsas, e sim em ditames regidos por órgão governamental que prima pela estabilidade do mercado de seguro. A inobservância das cláusulas contratuais regidas 4 Organizadores Bruno Miragem, Angélica Carlini. Direito dos Seguros. Fundamentos de Direito Civil, Direito Empresarial e Direito do Consumidor, p. 65-74. São Paulo: Ed. RT, 2014. 7 pela SUSEP, como é o caso da cobertura de IFPD, desequilibra o mútuo, prejudicando não só o fundo comum criado, mas também os próprios segurados, que terão que arcar com prêmios cada vez mais altos. A fim de cessar com as aplicações equivocadas das coberturas de invalidez previstas nos contratos de seguro, a SUSEP editou a Circular n. 302/2005, que dentre outras definições, proibiu em seu Art. 9º a comercialização de cobertura em que pagamento do capital estivesse condicionado à impossibilidade de qualquer atividade laborativa do segurado, eis que gerava confusão entre o seguro privado e o seguro social. A partir de então foram definidas duas novas coberturas, quais sejam a IFPD e a Invalidez Laborativa Permanente por Doença, a fim de minimizar as controvérsias. A Invalidez Laborativa Permanente Total por Doença (ILPD), garante o pagamento de indenização em caso de invalidez laborativa permanente total, advinda de doença para a qual não se pode esperar recuperação ou reabilitação com os recursos terapêuticos disponíveis no momento de sua constatação, para a atividade laborativa principal do segurado (aquela através da qual o segurado obteve maior renda, dentro de determinado exercício anual definido nas condições contratuais). Por outro lado, a Invalidez Funcional Permanente Total por Doença (IFPD), garante o pagamento da indenização no caso de invalidez consequente de doença que cause a perda da existência independente do segurado, ocorrida quando o quadro clínico incapacitante inviabiliza de forma irreversível o pleno exercício das suas relações autonômicas, comprovado na forma definida nas condições gerais e/ou especiais do seguro. Referida cobertura, prevista no Art. 17 da Circular SUSEP n. 302/2005 e nas Condições Gerais, delimita as doenças que realmente se enquadram no conceito de invalidez funcional, e ainda demonstra que para a sua caracterização a invalidez deve ser proveniente exclusivamente de doença: 8 a) doenças cardiovasculares crônicas enquadradas sob o conceito de "cardiopatia grave"; b) doenças neoplásicas malignas ativas, sem prognóstico evolutivo e terapêutico favoráveis, que não mais estejam inseridas em plano de tratamento direcionados à cura e ou controle clínico; c) doenças crônicas de caráter progressivo, apresentando disfunções e ou insuficiências orgânicas avançadas, com repercussões em órgãos vitais (consumpção), sem prognóstico terapêutico favorável e que não mais estejam inseridas em planos de tratamento direcionados à cura e ou ao seu controle clínico; d) alienação mental total e permanente, com perda das funções cognitivas superiores (cognição), única e exclusivamente em decorrência de doença; e) doenças manifestas no sistema nervoso com sequelas encefálicas e ou medulares que acarretem repercussões deficitárias na totalidade de algum órgão vital e ou sentido de orientação e ou das funções de dois membros, em grau máximo; f) doenças do aparelho locomotor, de caráter degenerativo, com total e definitivo impedimento da capacidade de transferência corporal; g) deficiência visual, decorrente de doença: · cegueira, na qual a acuidade visual é igual ou menor que 0,05 no melhor olho, com a melhor correção óptica; · baixa visão, que significa acuidade visual entre 0,3 e 0,05 no melhor olho, com a melhor correção óptica; casos nos quais o somatório da medida do campo visual em ambos os olhos for igual ou menor que 60 graus ou, ocorrência simultânea de quaisquer das condições anteriores. h) doença evoluída sob um estágio clínico que possa ser considerado como terminal (doença em estágio terminal), desde que atestado por profissional legalmente habilitado; i) estados mórbidos, decorrentes de doença, a seguir relacionados: · perda completa e definitiva da totalidade das funções de dois membros; ou · perda completa e definitiva da totalidade das funções das duas mãos ou de dois pés; ou perda completa e definitiva da totalidade das funções de uma das mãos associada à de um dos pés. Não obstante o rol acima, outros quadros clínicos incapacitantes poderão ser reconhecidos como riscos cobertos, desde que avaliados por meio de instrumento de avaliação funcional (IAIF), e atinjam a marca mínima exigida de 60 pontos, em um total de 80 pontos previstos como possíveis. 9 Acerca do tema o Colendo Superior Tribunal de Justiça, em decisões recentes, entendeu que: RECURSO ESPECIAL. CIVIL. SEGURO DE VIDA EM GRUPO COM ADICIONAL DE COBERTURA POR INVALIDEZ FUNCIONAL PERMANENTE TOTAL POR DOENÇA - IFPD. PATOLOGIA DA COLUNA LOMBAR CONTROLADA POR CIRURGIA. INCAPACIDADE TOTAL E PERMANENTE PARA A PROFISSÃO. DESEMPENHO DE ATIVIDADES LABORAIS LEVES. DEFINIÇÃO DA APÓLICE: INVALIDEZ FUNCIONAL. ATIVIDADES AUTONÔMICAS DA VIDA DIÁRIA. PRESERVAÇÃO. INDENIZAÇÃO SECURITÁRIA INDEVIDA. 1. A Circular SUSEP nº 302/2005 vedou o oferecimento da cobertura de Invalidez Permanente por Doença (IPD), em que o pagamento da indenização estava condicionado à impossibilidade do exercício, pelo segurado, de toda e qualquer atividade laborativa, pois era difícil a sua caracterização ante a falta de especificação e de transparência quanto ao conceito de "invalidez" nas apólices, havendo também confusão entre o seguro privado e o seguro social, o que gerou grande número de disputas judiciais. Em substituição, foram criadas duas novas espécies de cobertura para a invalidez por doença: Invalidez Laborativa Permanente Total por Doença (ILPD ou IPD-L) e Invalidez Funcional Permanente Total por Doença (IFPD ou IPD-F). 2. Na Invalidez Funcional Permanente Total por Doença (IFPD), a garantia do pagamento da indenização é no caso de invalidez consequente de doença que cause a perda da existência independente do segurado, ocorrida quando o quadro clínico incapacitante inviabilizar de forma irreversível o pleno exercício das relações autonômicas do segurado. Já na cobertura de Invalidez Laborativa Permanente Total por Doença (ILPD), há a garantia do pagamento de indenização em caso de invalidez laborativa permanente total, consequente de doença para a qual não se pode esperar recuperação ou reabilitação com os recursos terapêuticos disponíveis no momento de sua constatação, para a atividade laborativa principal do segurado. Logo, a garantia de invalidez funcional não tem nenhuma vinculação com a invalidez profissional. 3. Embora a cobertura IFPD (invalidez funcional) seja mais restritiva que a cobertura ILPD (invalidez profissional ou laboral), não há falar em sua abusividade ou ilegalidade, tampouco em ofensa aos princípios da boa-fé 10 objetiva e da equidade, não se constatando também nenhuma vantagem exagerada da seguradora em detrimento do consumidor. De qualquer modo, a seguradora deve sempre esclarecer previamente o consumidor e o estipulante (seguro em grupo) sobre os produtos que oferece e existem no mercado, prestando informações claras a respeito do tipo de cobertura contratada e as suas consequências, de modo a não induzi-los em erro. 4. Recurso especial não provido. (REsp n. 1.449.513 –SP – 19/03/2015) (grifamos) SEGURO DE VIDA. INVALIDEZ FUNCIONAL PERMANENTE TOTAL POR DOENÇA. CARACTERIZAÇÃO COMO RELATIVA A PERDA DE ATIVIDADE LABORATIVA INDEPENDENTE. DISTINÇÃO DE INVALIDEZ LABORATIVA, REFERENTE A DETERMINADA ATIVIDADE. ATIVIDADE MILITAR. IMPOSSIBILIDADE DE EXERCÍCIO, MAS POSSIBILIDADE DE PRESTAÇÃO DE OUTRA ATIVIDADE. RECURSO ESPECIAL DO SEGURADO IMPROVIDO. 1.- Na Invalidez Funcional Permanente Total por Doença (IPD) a incapacidade para “função” interpreta-se no sentido físico ou mental geral, de modo a implicar a perda de atividade independente, não exigido, contudo, estado vegetativo, e não para a “função” laborativa que vinha exercendo o segurado, podendo ele exercer outras atividades, que não a para a qual incapacitado, ainda que em outro emprego. 2.- Situação fática e interpretativa de contrato prevalecente tal como realizada pelo Tribunal de origem (Súmulas 7 e 5/STJ), em que a incapacidade para o serviço no Exército não implica incapacidade para outras atividades laborativas. 3.- Inexistência de óbice no Código de Defesa do Consumidor e no princípio da boa-fé objetiva. 4.- Recurso Especial improvido. (Resp. n. 1.259.628 – SE – 19/08/2014). (grifamos) Portanto, tem-se que o contrato de seguro não admite interpretação extensiva ou analógica, conforme reza o Art. 757 do CC, já mencionado. Isto é, se a apólice limitou ou particularizou os riscos do seguro, o segurador não responderá por outros. No caso da cobertura de IFPD, embora a mesma tenha um cunho mais restritivo, não há que se falar em abusividade ou ilegalidade, muito menos em ofensa 11 aos princípios da boa-fé objetiva e da equidade. Assunto este já objeto de decisão do Colendo STJ (REsp n. 1.449.513 –SP – 19/03/2015). Quanto ao princípio da boa-fé, previsto de forma geral no artigo 422 do Código Civil, e especialmente sobre o contrato de seguro nos artigos 765 e 766, é certo que também foi acolhido pelo Código de Defesa do Consumidor em seus artigos 4º, inciso III e 51, inciso IV, as partes são obrigadas a guardar a mais estrita boa-fé contratual desde a fase pré-contratual até o encerramento deste. Por outro lado, o princípio do equilíbrio econômico obriga uma interpretação contratual à luz das consequências da obrigação imposta em decorrência do contrato, em razão de onerosidade excessiva a qualquer das partes. Ainda, tem-se o princípio da função social, previsto pela Constituição Federal que visa justamente manter o equilíbrio nas relações, o qual deve ser garantido pela aderência das normas pactuadas pelas partes. Verifica-se que este princípio da função social em que pese tornar-se um princípio de direito contratual, a sua interpretação não pode ser isolada, pois está intimamente ligado aos princípios da boa-fé (artigo 422 do Código Civil e 765/766 do Código Civil) e do equilíbrio econômico (artigos 157, 478/480 do Código Civil). Diante dessa relação bilateral, uma vez pago pelo segurado o prêmio ajustado, a obrigação do segurador só surge quando e se sobrevier o acontecimento previsto no contrato, ou seja, se ocorrer o risco previsto. Importante a fixação desse conceito, para não se olvidar que a bilateralidade contratual se desenvolve na adequação prêmio/risco coberto: o prêmio é fixado exatamente em função do risco garantido. Tendo presente essa realidade, quando a apólice limitar ou particularizar os riscos do seguro, não responderá por outros o segurador.5 Desse modo, utilizando-se de tais preceitos norteadores dos contratos, inclusive do contrato de seguro, constata-se que o segurador recebe o prêmio dos 5 Apelação com revisão n.º 0011164-27.2012.8.26.0006 - 35ª CÂMARA DE DIREITO PRIVADO - TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO. - 26 de janeiro de 2015 12 seus segurados de acordo com a cobertura contratada e garantida, eis que as coberturas e cláusulas são previamente estabelecidas pela SUSEP, não se constatando, portanto, nenhuma vantagem exagerada em detrimento do consumidor. O fato é que o Código de Defesa do Consumidor admite cláusulas restritivas de direito (art. 54, §4º), apenas impondo que elas sejam redigidas com o devido destaque de modo a não deixar qualquer margem de dúvida. Nesse sentido, considerando que nos contratos de seguro de vida em grupo, o segurado, por meio do estipulante, tem acesso aos termos da avença, não havendo que se falar em incompatibilidade entre o conceito contratual da cobertura de IFPD e a legislação consumerista. Ressalta-se que ao analisarmos o papel do estipulante vimos que ele é o responsável por fornecer ao segurado todas as informações necessárias, com base no disposto no art. 801, § 1º do CC e do art. 21, § único, do Decreto Lei 73/66, inclusive devendo colher as assinaturas dos seus representados nos contratos celebrados. Destarte, a cláusula de IFPD não se trata de cláusula abusiva (art. 51), mas de cláusula restritiva de direito, nos claros e precisos termos do art. 54, § 4º, do mesmo Código de Defesa do Consumidor, não há que se falar em ofensa por parte da Seguradora. 13 3. Conclusão Por meio do presente artigo buscamos abranger a visão dos segurados, bem como do Poder Judiciário, diante da nova e positiva interpretação do Colendo Superior Tribunal de Justiça ao tema, visando a aplicação correta das cláusulas contratais, e evitando prejuízos ao próprio mútuo, e consequentemente aos segurados. Isso porque as companhias de seguro são fiscalizadas e regidas pela SUSEP, órgão federal com competência para tanto. Logo, não há que se falar em abusividade de cláusula, e sim aplicação da disposição prevista no contrato, não causando qualquer desvantagem ao segurado/consumidor. Portanto, conclui-se que é de grande valia a perpetuação do entendimento acima demonstrado, a fim de que os contratos sejam respeitados, trazendo benefícios a toda coletividade, inclusive aos segurados, que participam ativamente do mútuo.