Vamos brincar de ... Maria Angela Barbato Carneiro1 Em um pátio de uma pequena escola de educação infantil, as crianças brincavam livremente. Algumas, com o calor, estavam dentro de uma pequena piscina deliciandose com um pouco de água fresca vinda do esguicho que estava nas mãos de uma professora, outras haviam se colocado debaixo de um guarda sol, fingindo estar na praia e algumas jogavam bola... De repente ouviu-se a pergunta vinda de duas meninas: _Você quer ser minha filhinha? Imediatamente, uma das meninas, que estava brincando com água, saiu sentando-se no carrinho empurrado pelas duas amiguinhas, mas não terminou aí a brincadeira. Um menino que jogava bola deixou o brinquedo, perguntando se poderia participar, pois também queria empurrar o carrinho, como sua mãe fazia com seu irmãozinho. Eis um belo exemplo do que é brincar. Brincar é imaginar, é fantasiar, é criar, é descobrir, é experimentar, é construir, é desconstruir, é acertar, é errar, é ousar e, acima de tudo, viver... Por que as crianças brincam? Elas o fazem naturalmente para compreender sua cultura, seu mundo, o contexto em que vivem. É assim que conhecem o que está à sua volta, dando significado às suas ações. Quando a criança protagoniza o brincar, ela tem a liberdade de escolher e experimentar diferentes papéis. Temos que ter clareza que as crianças não são esponjas e elas só podem conhecer e descobrir se puderem interpretar. É preciso abandonar a ideia de que elas absorvem estereótipos e deixá-las brincar livremente porque, só assim, poderão explorar as fronteiras impostas pela sociedade adulta, compreenderem melhor os papéis e construírem suas identidades. Infelizmente, são os adultos que, muitas vezes, criam os estereótipos para as crianças, quando, por exemplo, proíbem um menino de andar em uma bicicleta cor de rosa, porque ela é de menina. Afinal, ela é um meio de transporte e utilizá-la torna-se uma alegria para os pequenos. Além disso, em um mundo globalizado, muitos papéis são desempenhados por adultos de ambos os sexos. Por que a criança, então, não pode experimentar? 1 Maria Angela Barbato Carneiro é professora Titular da Faculdade de Educação da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, onde coordena o Núcleo de Cultura e Pesquisas do Brincar. Afinal, a brincadeira é importante pelas inúmeras possibilidades que oferece à criança, portanto se as escolas e a família permitirem que meninos brinquem com bicicletas corde-rosa, poderão contribuir para uma sociedade menos estereotipada, preconceituosa e, quiçá, mais justa.