Solange Menezes da Silva Demeterco
SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO
2.ª edição
2009
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CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO-NA-FONTE
SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ
D449s
2.ed.
Demeterco, Solange Menezes da Silva.
Sociologia da educação / Solange Menezes da Silva Demeterco. - 2.ed. - Curitiba, PR :
IESDE Brasil, 2009.
352 p.
Inclui bibliografia
ISBN 978-85-387-0265-8
1. Sociologia educacional. I. Inteligência Educacional e Sistemas de Ensino.
II. Título.
09-1973
CDD: 306.43
CDU: 316.74:37
Capa: IESDE Brasil S.A.
Imagem da capa: Jupiter images / DPI images
Todos os direitos reservados.
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Al. Dr. Carlos de Carvalho, 1.482. CEP: 80730-200
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Solange Menezes da Silva Demeterco
Doutora e Mestre em História do Brasil pela UFPR. Especialista em Currículo e
Prática (Tutoria a Distância) pela PUC-Rio. Graduada em Ciências Sociais pela
UFPR.
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Sumário
A sociologia e a educação...................................................... 13
O que é sociologia? .................................................................................................................. 14
A sociologia da educação e alguns conceitos básicos................................................. 19
A socialização e seus agentes................................................................................................ 20
A sociologia da educação....................................................... 33
Os primeiros grandes sociólogos:
a educação como tema e objeto de estudo..................................................................... 34
As teorias sociológicas e a educação.................................................................................. 43
A sociologia da educação no Brasil.................................... 51
Formação da sociedade brasileira:
economia agrário-exportadora e economia industrial................................................ 52
A sociologia continua seu caminho: dos anos 1970 aos dias atuais........................ 55
Educação e família.................................................................... 63
As transformações da família................................................................................................. 64
Educação e família no Brasil................................................................................................... 70
Concepções de infância e juventude................................. 81
O sentimento de infância – o trabalho de Ariès.............................................................. 82
O surgimento das escolas e as visões da infância.......................................................... 85
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A escola como instituição social.......................................... 99
A escola como organização..................................................................................................103
Algumas possibilidades.........................................................................................................105
A escola e o controle social..................................................113
Padrões sociais de comportamento..................................................................................116
A escola e o desvio social.....................................................133
Comportamentos desviantes..............................................................................................135
Conformidade versus conformismo...................................................................................137
A mudança social....................................................................151
Fatores que desencadeiam a mudança............................................................................154
A ação pedagógica e a mudança social...........................................................................157
A estratificação social............................................................169
Formas de estratificação social............................................................................................173
A educação e a estratificação social..................................................................................177
A mobilidade social................................................................189
Tipos de mobilidade social...................................................................................................190
Educação como fator de mobilidade social....................................................................193
Educação e movimentos sociais........................................203
As formas de luta e ação coletiva.......................................................................................206
Alguns tipos de movimentos sociais e educação.........................................................210
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A educação e o Estado..........................................................223
O conceito de Estado e suas funções................................................................................226
Estado e educação no Brasil.................................................................................................228
Educação e desenvolvimento.............................................241
As desigualdades sociais e o subdesenvolvimento.....................................................245
Origens históricas do subdesenvolvimento...................................................................247
As desigualdades sociais e o papel transformador da educação...........................248
Educação e cotidiano no Brasil...........................................259
O difícil cotidiano dos “menos iguais”...............................................................................263
Problemas da educação no Brasil......................................275
O fracasso escolar: uma tentativa de explicação..........................................................279
A profissão de professor.......................................................293
A questão da formação profissional..................................................................................295
O ofício de professor e seu papel na sociedade............................................................298
Perspectivas da educação no Brasil..................................311
A questão da diversidade cultural – o multiculturalismo..........................................315
A democratização da educação..........................................................................................317
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Apresentação
O que você espera dessa disciplina? Quais são suas expectativas em relação à sociologia? No que a sociologia se aproxima da educação? Essas e outras perguntas
nos acompanharão a partir daqui.
Mas, antes disso, seria interessante esclarecer algumas questões que nortearão
nosso trabalho. Inicialmente, deve-se destacar que o que se apresenta aqui é uma
síntese dos temas mais relevantes da sociologia enquanto Ciência Social, preocupada em tentar explicar a vida social e as questões relacionadas à vida do homem
em sociedade, em seus múltiplos aspectos. Não se pretendeu elaborar um manual
e muito menos um compêndio que pretendesse dar conta de todos os temas e/
ou conceitos relacionados a essa ciência. Optou-se por privilegiar alguns tópicos
que são considerados básicos e depois relacioná-los com a questão da educação.
A sociologia da educação tem como objetivo pesquisar e analisar a educação em
seus aspectos sociológicos, isto é, os fenômenos sociológicos.
O objetivo maior é procurar conhecer e analisar a inter-relação entre o homem, a
sociedade e a educação, à luz de diferentes teorias sociológicas, bem como das
práticas pedagógicas ratificadoras e/ou transformadoras dos contextos cultural,
social, político, econômico e ecológico.
A proposta é despertá-lo para discussões futuras a partir do embasamento teórico
que essa ciência oferece e, sempre que possível, trazer o debate para a realidade
educacional brasileira. Para tanto, sugere-se alguns textos de apoio, bem como
atividades para autoavaliação. Indicações de leituras complementares e filmes
acompanharão o texto-base, e são importantes para aprofundar algum assunto/
tema que se considere relevante.
Vale lembrar também que nada substitui a leitura dos próprios mestres, no caso
aqui, os “fundadores” da sociologia e da sociologia da educação. Portanto, não desanime em buscar na própria fonte as respostas às suas inquietações. Vá em frente!
A disciplina pretende desenvolver módulos que possibilitem a compreensão
da constituição da realidade social e sua relação com a educação, por meio do
estudo de aspectos dos processos sociais presentes na produção e configuração
do sistema educacional. Assim, o livro está estruturado em 18 unidades, em que
se propõe uma discussão sobre a relação entre a sociologia e a educação, apresentando as contribuições dos autores clássicos e sua percepção acerca das questões
relacionadas à educação (A Sociologia da Educação) e contextualizando a ciência
no Brasil (A Sociologia da Educação no Brasil).
A partir daí, tem-se a discussão de alguns temas/conceitos fundamentais para
a reflexão aqui proposta. Na unidade intitulada educação e família apresenta-se
uma síntese das transformações pelas quais passou a família ao longo do tempo
e sua importância quando se discute educação. Para tanto, também se faz necessário observar como o sentimento de infância surge e se modifica a partir do
que se tem, inclusive o surgimento dos colégios e novas visões da infância e da
juventude (concepções de infância e juventude).
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A discussão sobre a escola à luz de alguns conceitos sociológicos compõe as
próximas unidades: a escola como instituição social, a escola e o controle social e a
escola e o desvio social. Em seguida, são abordados outros conceitos também importantes para a sociologia da educação: a mudança social, a estratificação social,
a mobilidade social, educação e movimentos sociais e a educação e o Estado.
Finalmente, são apresentados alguns temas mais amplos que dizem respeito à realidade do país (educação e desenvolvimento, educação e cotidiano no Brasil e problemas da educação no Brasil), da escola e do professor (a profissão de professor),
além de chamar a atenção para questões que exigem muita reflexão por parte do
docente, no sentido de avaliar sua prática pedagógica (perspectivas da educação
no Brasil).
Vale ressaltar, enfim, que vivemos um momento privilegiado na história, uma vez
que a presença da sociologia no currículo está intimamente ligada à democratização do acesso ao conhecimento científico, com vistas ao incremento da discussão
consciente, racional e bem fundamentada do educador na realidade social.
Bom trabalho!
Solange Menezes da Silva Demeterco
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Concepções de infância e juventude
O desenvolvimento do conceito de família sofreu, ao longo do tempo,
várias modificações, de acordo com as mudanças que ocorreram na sociedade. Sabe-se, também, que mesmo sendo uma criação histórica e cultural, e não algo material, é um conceito que se relaciona com a sociedade e
sua estrutura econômica e política.
O século XXI trouxe a continuidade da discussão sobre a família, a
criança, a adolescência e a juventude e, por extensão, da educação e do
papel da escola no processo de socialização e controle social. Sabe-se que
é analisando as práticas sociais, inclusive as educativas, que se torna possível transformar/rever conceitos como indivíduo, sociedade, família etc.
É na modernidade que temas relacionados a essas questões tornam-se
relevantes e passam a ser objetos de estudo da sociologia e da sociologia
da educação. Assim, família e escola se estabelecem e se institucionalizam
como espaço por excelência do zelar, cuidar, educar e ensinar as crianças
e jovens.
Ao lado da evolução da família e do desenvolvimento do sentimento
de domesticidade, que se verificou no período compreendido entre o final
da Idade Média e o final do século XVIII, observam-se também algumas
mudanças nas formas de se perceber a criança, a infância e a juventude.
Enquanto a família vivia, ora em grandes espaços, ora em casas pequenas abarrotadas de gente, não era fácil encontrar sentimentos como amor
conjugal, amor filial ou a valorização dos laços afetivos entre seus membros. Isso se refletia na maneira de ver a criança. Ou melhor, refletia-se
no anonimato da criança: ela praticamente não existia, não era “vista”. De
certa forma, a promiscuidade reinava naqueles tempos e a criança crescia
nesse meio.
No momento em que se tem uma nova configuração espacial das casas,
com áreas especializadas, como a sala de jantar e o quarto de dormir, são
criadas as condições necessárias para o desenvolvimento de sentimentos
como aconchego e domesticidade, que antes não existiam.
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Domínio público.
Sociologia da Educação
A família começa a dispensar seus vários hóspedes e busca a privacidade do
“lar”, conceito que também não existia. A organização da família conjugal demanda novos rearranjos em termos de papéis sociais, bem como determina
novas funções para essa família. Surge, também, a disciplina dentro da vida familiar e, em relação à juventude, sua duração dependia do tempo que o indivíduo levaria para assumir novas responsabilidades (como trabalhar e manter sua
própria família). Destaca-se, a partir daqui, o progresso da domesticidade e o
surgimento da família conjugal, nuclear e doméstica, que passa a ser o modelo
predominante nas sociedades ocidentais até hoje.
O sentimento de infância – o trabalho de Ariès
Vamos esclarecer uma coisa: infância é uma concepção ou representação que
os adultos fazem sobre os primeiros anos da vida do homem, bem como a noção
de criança diz respeito ao sujeito real que vive essa fase. Portanto, pode-se dizer
que tem uma função analítica, isto é, para facilitar a discussão e análise dessas
questões.
O trabalho de Philippe Ariès, intitulado História Social da Criança e da Família,
trata da descoberta da infância na Renascença e do surgimento do que o autor
chamou de sentimento de infância. O valor de sua tese relaciona-se ao fato de
chamar a atenção para a importância da educação formal na própria elaboração
do conceito de infância, entendida por ele como sendo o tempo de preparação
moral do indivíduo. Quando analisa a iconografia da Idade Média e a compara
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Concepções de infância e juventude
com aquela produzida na Renascença, Ariès conclui que o sentimento de infância
era desconhecido na Idade Média, somente passando a ser expressivo no século
XVII. O autor procura demonstrar como a existência da criança passava quase
despercebida em função da brevidade do tempo que ela interagia com a família, uma vez que a mortalidade infantil era muito alta, assim como o número de
filhos por mulher, o que fazia com que ambas vivessem pouco tempo. As pessoas
procuravam nem se apegar às suas crianças, porque sabiam que as perderiam
de uma forma ou de outra, fosse porque iam para a casa das amas de leite, fosse
porque morreriam logo.
Mas como o autor define sentimento de infância?
Domínio público.
Fala em paparicação (um sentimento superficial ligado à criança nos seus primeiros anos de vida, quando ainda é “engraçadinha”) e a percepção da inocência
e fraqueza da infância.
Ao longo de todo o seu texto, Ariès destaca que a infância era vista como um
período muito curto, durando apenas o tempo em que a criança era mais frágil.
Logo, era misturada aos adultos e passava a vivenciar as mesmas experiências que
eles. Toda a socialização da criança se dava dessa forma e a educação era garantida pela aprendizagem na prática, isto é, a criança aprendia as coisas ajudando os
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Sociologia da Educação
adultos a fazê-las. O amor podia existir, mas não era determinante nas relações da
família com a criança. Não impedia, por exemplo, que ela fosse mandada embora
para viver longe dos pais, muitas vezes para aprender um ofício.
No final do século XVII é que se pode observar mudanças. De acordo com
Ariès, tem início o que se convencionou chamar de escolarização, quando a
escola substituiu a aprendizagem como meio de educação. Surgem os colégios,
local para onde as crianças são mandadas, mais uma vez sendo separadas da
família. A família havia se tornado um lugar de afetividade e isso repercutiu na
vida das crianças na medida em que começou a haver uma preocupação com
seu bem-estar e com a sua sobrevivência. Segundo Ariès (1981, p. 165), a história
da educação mostra que a vida escolástica revela
o progresso do sentimento da infância na mentalidade comum: como a escola e o colégio
que, na Idade Média, eram reservados a um pequeno número de clérigos e misturavam as
diferentes idades dentro de um espírito de liberdade de costumes, se tornaram, no início
dos tempos modernos, um meio de isolar cada vez mais as crianças, durante um período de
formação tanto moral como intelectual, de adestrá-las, graças a uma disciplina mais autoritária
e, desse modo, separá-las da sociedade dos adultos.
Domínio público.
A família começou a se organizar e a viver em torno da criança e das suas necessidades. Essa polarização em torno da família e da profissão será um traço das
sociedades ocidentais no século XIX e que se estenderia até o século XX.
A ideia de adolescência e de juventude é mais recente e remonta mais ou menos
ao século XVIII, a partir de toda a “descoberta” da criança. Mas o que é inegável é
que a cada época corresponde uma idade privilegiada. Segundo Ariès, a juventude é a idade privilegiada do século XVII, a infância do século XIX e a adolescência
do século XX. As mudanças podem ser observadas na forma como as crianças e os
jovens eram vestidos e quais os jogos e brincadeiras que eram mais comuns.
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Concepções de infância e juventude
Uma das mudanças mais importantes relaciona-se com a maneira como as
crianças e os jovens eram tratados pelos adultos, no que diz respeito à sexualidade. Elas deixam de ser “brinquedos” dos adultos, os quais percebem a inocência
infantil e procuram então preservar, sobretudo a criança, das “sujeiras da vida”.
Assumem também maiores cuidados com a higiene e com a saúde das crianças.
No final do século XIX, a criança efetivamente passa a ser o foco dos estudos
históricos,
acompanhados das descrições do comportamento e da mensuração da mente. O conhecimento
decorrente das observações e experimentações com as crianças é visto como elucidativos das
origens e dos processos de desenvolvimento humano, contribuindo para a noção de que a
criança explica o homem, a criança é o pai do homem. (SMOLKA, 2002, p. 114)
É nesse contexto que surgem os estudos de Henry Wallon, Jean Piaget ,Lev
Vygotsky e as teorias psicogenéticas. Apesar de explorarem o tema criança/infância de maneiras diferentes, têm em comum o fato de chamarem a atenção
para a relação entre compreender o desenvolvimento da criança, como se dão
as mudanças biológicas e os processos mentais, e de que maneira tudo isso se
reflete na educação.
Compreender o desenvolvimento físico e psicológico da criança passa a ser
quase que uma exigência para a escola e o professor. A partir daí, teria-se mais
condições de realizar análises que dessem conta de explicar a sociedade na qual
o aluno e o próprio professor estão inseridos.
O surgimento das escolas
e as visões da infância
Como se disse, os colégios surgem a partir da ideia de que a criança precisava “ser formada”, uma vez que nascia totalmente despreparada para a vida em
sociedade. Aliás, esses são os traços marcantes da infância: a falta. Falta de condições de sobreviver sozinha, de valores, de regras, de limites. Tudo precisa ser
ensinado. E, a partir daqui, não será apenas no seio da família que esse processo
de socialização acontecerá. O local adequado será a escola, que se transforma
e deixa de ser uma comunidade democrática que acolhia a todos que necessitavam, para se constituir numa instituição com uma hierarquia autoritária, submetida a um regime disciplinar extremamente severo. A própria necessidade de
disciplina é explicada pela noção de fraqueza da infância, aliada ao sentimento
de responsabilidade moral que os mestres assumem diante das famílias que lhes
confiam seus filhos.
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Sociologia da Educação
Ao analisar a trajetória do surgimento dos colégios, Ariès (1981, p. 169-170)
afirma que
no século XIII, os colégios eram asilos para estudantes pobres, fundados por doadores.
Os bolsistas aí viviam em comunidades, segundo estatutos que se inspiravam em regras
monásticas. Não se ensinava nos colégios. A partir do século XV, essas pequenas comunidades
democráticas tornaram-se institutos de ensino, em que uma população numerosa [...] foi
submetida a uma hierarquia autoritária e passou a ser ensinada no local. [...] Essa evolução
da instituição escolar está ligada a uma evolução paralela do sentimento das idades e da
infância.
Entre os séculos XVII e XVIII, observa-se uma laicização do pensamento e
nesse processo passam a ser mais reconhecidos alguns valores de caráter social,
tais como polidez, postura, civilidade, em contraposição à fé, à caridade (as chamadas virtudes cristãs).
É na Renascença que se pode encontrar uma tendência predominante da
educação humanista que
é a ênfase na prudência e no controle dos instintos, como preparação para a cidadania.
Contrariamente às normas da sociedade feudal, que valorizavam a impetuosidade do
jovem guerreiro, os Estados bem organizados [...] exigiam dos seus cidadãos o autocontrole
e a dissimulação. Os jovens precisavam ser educados na dura escola da disciplina. (CASEY,
1992, p. 187)
A busca da contensão dos impulsos e dos instintos por meio de uma rígida e,
por vezes, até cruel disciplina dá o tom do avanço do processo de escolarização.
Tem-se, também, uma nova percepção das idades, começando a haver então
uma separação das classes por faixa etária, procurando agrupar os alunos a partir
desse critério. Com um sistema disciplinar cada vez mais rigoroso, os colégios assumem uma estrutura que em muito se aproxima da atual. Agora, a duração da
infância equivale à duração da escolaridade, que no fim do século XVIII chega a
quatro ou cinco anos. Os colégios passam a ser a moderna expressão de como se
deve tratar as crianças. Ao seu lado se tem os chamados manuais de boas maneiras
ou de civilidade, voltados para o público pueril, que visavam a apresentar as
normas de conduta que deveriam nortear os comportamentos das crianças no
mundo. Alguns desses manuais foram muito bem analisados, especialmente o de
Erasmo, por Norbert Elias em O Processo Civilizador, em que a história dos costumes, focando seu interesse nas mudanças das regras sociais e no modo como o
indivíduo as percebia, gerando mudanças de comportamento e sentimentos. Utilizando como fontes os livros de etiquetas e boas maneiras (editados entre o século
XIII até a década de 1930), o autor mostra que desde a Idade Média, quando o
controle das pulsões era bastante reduzido, até os nossos dias, as classes dirigentes foram aos poucos sendo modeladas pela vida social e a espontaneidade deu
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Concepções de infância e juventude
Nicolau Carissimo.
lugar à regra e à repressão na vida privada. A universalização dos códigos ocidentais de conduta significa que esses passam a ser sinônimos de refinamento e o
padrão a ser seguido por aqueles que almejavam ascender socialmente.
Escola Superior de Agricultura e Veterinária em Viçosa.
De modo geral, pode-se dizer que os humanistas do século XVI rejeitavam com vigor a alternativa escolar. Acreditavam que não se conhecia
a criança direito, não se sabia exatamente como
ela era, o que pensava e quais eram os seus limites. Diante disso, consideravam quase que uma
violência impor-lhe qualquer tipo de educação
formal. Seria uma agressão à sua natureza pura e
àquilo que se comentou – a ideia de insuficiência
ou do caráter incompleto da criança.
Domínio público.
Mas antes disso, tem-se a contribuição de Jean-Jacques Rousseau (17121778) para a discussão das concepções de infância e o surgimento dos colégios.
Rousseau ressalta as relações entre natureza e Jean Jacques-Rousseau.
sociedade e a moral fundada na liberdade; destaca, sobretudo, a primazia do sentimento sobre a razão e acredita na bondade
natural do homem. Diante disso, a civilização é vista por ele como a grande responsável pela degeneração da natureza humana e sua substituição pela cultura
intelectual. Em sua obra mais voltada para essas questões, Emílio, de 1757, planta
as bases da sua filosofia, que por muito tempo influenciaria vários outros autores que estudariam a criança, a infância ou a educação. Defende ardentemente
a pureza infantil e vê o sentimento como o verdadeiro instrumento do conhecimento e o mundo interior (humano) é que deve ser buscado, e não o mundo da
razão, sempre com o objetivo de transformar a criança num adulto bom.
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Sociologia da Educação
Assim, conforme Arbousse-Bastide e Machado (1978, p. 18), Rousseau tem
como pressuposto básico a crença na bondade natural do homem e atribui à
civilização a responsabilidade pela origem do mal. Afirmam que, para o autor de
Emílio, a educação
[...] deve ser progressiva, de tal forma que cada estágio do processo pedagógico seja adaptado
às necessidades individuais do desenvolvimento. [...] Liberta da tirania das opiniões humanas, a
criança por si mesma, e sem nenhum esforço especial, identifica-se com as necessidades de sua
vida imediata e torna-se autossuficiente. Vivendo fora do tempo, nada precisando das coisas
artificiais e não encontrando qualquer desproporção entre desejo e capacidade, vontade e
poder, sua existência vê-se livre de toda ansiedade com relação ao futuro e não é atormentada
pelas preocupações que fazem o homem adulto civilizado viver fora de si mesmo.
É necessário, contudo, prepará-la para o futuro. Isso porque ela tem uma enorme potencialidade,
não aproveitada imediatamente. A tarefa do educador consiste em reter pura e intacta essa
energia até o momento propício. Nesse sentido, é particularmente importante evitar a excitação
precoce da imaginação, porque esta pode tornar-se uma fonte de infelicidade futura. Outros
cuidados devem ser tomados com o mesmo objetivo e todos eles podem ser alcançados
ensinando-se a lição da utilidade das coisas, ou seja, desenvolvendo-se as faculdades da
criança. Apenas naquilo que possa depois ser-lhe útil.
Você conseguiu perceber como algumas dessas ideias acompanham a pedagogia até hoje? Nesse momento, o processo educativo para Rousseau é visto como
algo negativo, no sentido do que não deve ser feito. Para ele, somente quando a
criança cresce um pouco e começa a ter consciência de que interage com as outras
pessoas é que se torna capaz de ser educada formalmente. Na verdade, acredita
que a educação seja um processo contínuo que se prolonga pela vida inteira.
A criança, de acordo com Rousseau, aprende por meio do exemplo, por palavras e por práticas que observa nos adultos. Daí a necessidade dos pais se preocuparem com as normas de civilidade e boas maneiras de seus filhos, que deveriam ser preparados para viver em sociedade e “ser civilizados”.
Entramos no século XIX tendo como premissa básica a proteção da infância,
da criança e do adolescente. Surgem instituições para cuidar disso e a educação aparece como um fator estruturante da sociedade, a partir desse momento.
Kuhlmann (2002, p. 464-465) afirma que
[...] essa distribuição de competências não é algo estanque e corporativo, como se nota pela
ampla gama de setores sociais que interagem em torno das propostas para a infância. Do ponto
de vista da abrangência e do conteúdo das suas propostas, a educação – pelo que é e pelo que
deixa de ser, pelo que significa e pelo que produz – aparece como um fator estruturante da
sociedade “moderna”.
Os cuidados com a infância passam a ser um traço das sociedades e do Estado
moderno e a escola como locus privilegiado para se colocar em prática essa concepção de criança e infância.
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Concepções de infância e juventude
Uma das consequências dessa mentalidade é o fato de que, daqui em diante,
o Ensino Primário e a sua universalização, bem como o saneamento e a higienização, tudo de acordo com a nova racionalidade científica e tecnológica, estarão
a serviço do cuidar, do proteger, do educar e do ensinar a criança.
Ao se pensar a criança/a infância, o adolescente/a adolescência e o jovem/
a juventude, o que se percebe é que houve muitas mudanças na forma de ver,
tratar, analisar e explicar cada uma dessas etapas da vida de um indivíduo.
É interessante observar, também,
que essas análises vêm acompanhadas de certa angústia em relação ao
futuro das crianças e dos jovens. Isso
acontece exatamente pela impressão que se tem de que, novamente,
estão no centro do palco algumas
questões relacionadas à visão que
se tem da criança e da escola. Não
se sabe muito bem o que fazer com
todas as novidades impostas pelo
avanço tecnológico, as novas configurações da família, o aumento da
inserção da mulher no mercado de
trabalho, a falta de tempo disponível por parte dos pais para a criança
e para o jovem, enfim, com o estilo
de vida da sociedade ocidental.
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O avanço da tecnologia, as inovações tecnológicas, a globalização, os novos
arranjos familiares e, até mesmo, as novas funções da família, trouxeram de volta
a discussão sobre qual seria o tempo de duração de cada uma dessas fases da
vida do homem.
Para concluir, depois da humanidade percorrer um longo caminho até perceber que a criança existia e que exigia novas maneiras de organização da vida
social, chegamos aos dias atuais, tendo em mente certas representações da criança e do jovem, que não diferem muito daquelas herdadas dos séculos XIX e XX.
Depois de vários autores, de diferentes áreas do conhecimento, produzirem suas
teorias sobre a criança, seu desenvolvimento mental e psicológico, tem-se uma
ampla gama de imagens e saberes sobre o assunto. Para tanto, procure conhecer
um pouco dos trabalhos de Piaget, Wallon, Montessori, Vygotsky, entre outros.
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Sociologia da Educação
Finalmente, o que não se pode esquecer é que a infância deve ser entendida como um tempo social, construído historicamente, de acordo com as condições materiais e culturais que caracterizam determinado tempo e espaço. Desse
modo, é possível haver diferentes concepções de criança, infância e juventude.
De acordo com as estruturas econômicas e sociais da época, surge uma ideia de
criança e do papel da educação.
O que se observa é que surgem instituições que serão consideradas “adequadas” para a criança e, aos poucos, a escola passa a ser um caminho para “formar”
as crianças e os jovens, tornando-os “aptos” ao convívio social.
Ao longo do tempo, ocorreram várias mudanças tanto no conceito quanto na
forma de organização da família. Esse processo histórico acabou, também, por definir novas formas de se perceber a criança e a infância, dando origem a uma área
específica dentro da sociologia para tratar desses temas: a sociologia da infância.
Texto complementar
Breves reflexões sobre o surgimento
da ideia de infância
(DELGADO1, 2009)
Há inúmeros estudos que resgatam as concepções de infância na história
da humanidade (ARIÈS, 1980; CHARLOT, 1983; SNYDERS, 1984; SARMENTO e
PINTO, 1997). De forma geral, esses estudos esclarecem que crianças sempre
existiram, desde os primeiros registros históricos. Mas o sentimento de infância, de preocupação e investimento da sociedade e dos adultos sobre as
crianças, de criar formas de regulação da infância e da família são ideias que
surgem com a modernidade. Estudiosos do campo da sociologia da infância
têm afirmado que a infância, enquanto categoria social, é uma ideia moderna (Sarmento, 1997; 2002).
Desde a Antiguidade, as crianças, as mulheres e os escravos eram considerados seres inferiores e em relação de dependência com os seus senhores
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Professora adjunta do Departamento de Educação (DECC), da Fundação Universidade Federal do Rio Grande (FURG).
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Concepções de infância e juventude
(ARIÈS, 1981; Snyders, 1984). [...] O que se passou historicamente para que
silenciassem as vozes das mulheres, das crianças, dos escravos, dos negros, daqueles considerados loucos, das filósofas e poetas? Por que alguns textos são
reconhecidos e outros são desprezados? Falo não somente dos textos acadêmicos, mas de outros textos expressos nas diferentes formas de linguagem.
[...] Será que eles têm relação com o que estamos vivendo, com a crise da
ciência moderna e pautada em uma razão universal, masculina e branca? Por
que tentamos resgatar essas vozes, seja nos escritos poéticos, na música, nas
pesquisas, nos espaços acadêmicos? Por que insistimos em ganhar tempo
num mundo que esfacelou nossas experiências e transformou nosso tempo
em coisa, em mercadoria? Por que hoje procuramos resgatar, em inúmeros
estudos, as culturas infantis, as concepções de infância, as vozes das crianças, ou por que hoje falamos e escrevemos sobre pluralidades, relações de
gênero, em uma ciência menos andocêntrica? Essas, seguramente, são questões sem respostas definitivas. É tão somente nas caminhadas que vamos
construindo, nas pegadas que vamos deixando, nos rastros que assinalam
para novos horizontes que encontramos respostas, sem contudo tratarmos
de respostas homogeneizadoras.
[...] é possível recordar o que escreve Ariès (1981) acerca da Idade Média.
Os quadros e a iconografia da época demonstram que ser criança era algo
muito próximo e vinculado ao mundo dos adultos. Tratava-se de promiscuidade? Certamente que não. O que acontecia é que as noções de tempo
e espaço e as existências humanas se organizavam de formas distintas da
modernidade.
Na Europa (séculos XVI e XVII) e um ou dois séculos mais tarde (séculos
XIX e XX) na cidade do Rio de Janeiro (Abreu; Martinez, 1997), as ruas
estavam povoadas de crianças abandonadas, escravos, imigrantes pobres,
enfim, de uma massa de excluídos perambulando pelas ruas, cujos valores,
hábitos e comportamentos eram estranhos ao ideal burguês de sociedade.
Isso provocava um sentimento, qual seja o de moralizar os costumes, confinar, regular essa população e evitar possíveis revoltas. Assim, o sentimento
de infância também surge no Brasil, com a necessidade de instrução e ampliação da escola de massas (Martinez, 1997). O ideal de moralização dos
costumes passava pela família burguesa e nuclear e centralizava na figura da
mãe e mulher a responsabilidade pela amamentação, pelos cuidados e educação das crianças. Nesse período, as condições de higiene eram péssimas e
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Sociologia da Educação
as mães criadeiras, as amas, ou fazedoras de anjos – geralmente vinculadas à
roda dos expostos –, recebiam crianças abandonadas, que, muitas vezes, não
completavam três anos (Marcílio, 1997).
Houve, dessa forma, um longo processo histórico até a sociedade valorizar a infância. Entretanto, a particularidade da infância não será reconhecida
e nem mesmo realizada para todas as crianças. Na prática, esse caráter universal vai perdendo sua extensão com as diferenças de classe, de gênero e
de raça. Todas são concebidas como crianças, no que diz respeito ao dado
biológico, mas nem todas vivem a infância da mesma forma, no que diz respeito às condições sociais, culturais e econômicas.
A infância é construção histórica e por isso nós, profissionais e pesquisadores da infância, também não estamos isentos do processo de construir concepções e representações das crianças, que nos fazem agir de forma preconceituosa, quanto mais estereotipado o corpus de ideias que fomos armazenando
sobre o que significa ser criança. É preciso aprofundar que crianças são essas, o
que elas têm em comum, o que partilham entre si, em várias regiões do Brasil e
em outros países, e o que as distingue umas das outras. É preciso romper com
representações hegemônicas. Elas se distinguem umas das outras no tempo,
no espaço, nas diversas formas de socialização, no tempo de escolarização, nos
trabalhos, nos tipos de brincadeiras, nos gostos, nas vestimentas, enfim, nos
modos de ser e estar no mundo.
O resgate das infâncias e culturas infantis na
formação de educadoras
Partindo dessas reflexões, é possível pensar sobre as repercussões desse
sentimento de infância ou dos significados que nós adultos atribuímos às
crianças e às suas culturas. [...] Compreendo a formação docente como um
conjunto de experiências sociais e culturais, individuais e coletivas, que
vamos acumulando e modificando ao longo de nossa existência pessoal e
profissional. Entendo que esse processo é inacabado e consiste, portanto, de
constantes indagações, incertezas e ambiguidades.
Como professora e pesquisadora vinculada à educação de crianças, percebo o quanto ainda desconhecemos os saberes que as crianças têm sobre
o mundo e até mesmo sobre nós adultos, saberes que são construídos
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Concepções de infância e juventude
socialmente e conferem identidades culturais às crianças. Paradoxalmente, algumas vezes temos negado as experiências e os saberes dos alunos,
que constituem, entretanto, excelentes instrumentos de reflexão sobre suas
concepções de infância e educação. São justamente essas experiências que
viabilizam reflexões sobre as crianças e suas culturas ou sobre nosso “ethos
cultural2 de classe média” quando classificamos algumas experiências sociais
e culturais como estranhas e exóticas, porque são diferentes daquilo que instituímos como verdades.
Segundo Charlot (1983), as pedagogias tradicional e nova se apoiam na
ideia de natureza infantil, e não a partir da condição infantil. Essas pedagogias influenciaram nosso corpus de representações acerca das crianças. Nós
ainda as representamos ora como reis, ora como vítimas, mas somos incapazes de percebê-las como são de fato. Nos tornamos adultos e adultas, mas
esquecemos que nesse processo enclausuramos nossos imaginários. O sentimento de realidade, que nada tem em comum com o sentimento de fantasia vivido pelas crianças (elas não distinguem fantasia da realidade), possivelmente constrange nossa capacidade de perceber as crianças como elas
“são e estão” em interações com seus pares e adultos no mundo.
Profissionais da educação, pedagogas/os, psicólogas/os, sociólogas/
os, enfim todas/os nós esbarramos ora nas representações de paparicação,
ingenuidade, graciosidade, pureza e inocência vividas na poesia de Abreu,
“Oh! Que saudades que tenho/ Da aurora da minha vida/ Da minha infância
querida/ Que os anos não trazem mais [...]”, ora nas representações de futuros
adultos, como vir a ser, incompletos, que necessitam da moralização e da
educação ministrada pelos adultos.
E nem mesmo as lições diárias que a vida nos ensina e que fragilizam uma a
uma das nossas certezas, como peças de um jogo de dominó que vão se sucedendo, nos fazem compreender que a realidade é dinâmica e ainda sabemos
pouco sobre as crianças e suas culturas. É provável que elas saibam bem mais
sobre nós adultos/as, sobre as instituições que ajudamos a construir, embora
ainda não tenhamos parado para escutá-las, para compreender suas ideias
acerca das nossas pedagogias, ou sobre o que elas pensam de nós, das escolas infantis, das creches e pré-escolas, que criamos pensando nelas e nas suas
necessidades.
2
Utilizo a definição de ethos cultural, fundamentada em Bourdieu (1998), como um sistema de valores implícitos e interiorizados, que definem as atitudes face ao capital cultural e à instituição escolar.
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Sociologia da Educação
[...] temos constatado que nossas concepções de infância atravessam
nossas trajetórias de vida e profissão. Debater nossas experiências e culturas
possibilita compreender como nosso espaço profissional é perpassado pelos
espaços de vida, bem como construir práticas pedagógicas de enfrentamento das ideologias que nos moldaram como indivíduos e, assim, entender
como as questões de classe, gênero e raça deixaram marcas sobre nossas
formas de pensar e agir (Giroux, 1997, p. 40).
Temos igualmente percebido que nossas conceituações sobre infância
estão submersas em visões de adultos que viveram suas infâncias em outros
tempos e espaços, principalmente quando trabalhamos com a imaginação e
a realidade de forma a superar os binarismos culturais.
Nos acostumamos a pensar nas crianças enquanto alunas e alunos, geralmente em escolas ou espaços educativos formais ou, ainda, nas crianças
dentro de creches e pré-escolas. Nos acostumamos a pensar em educação
como algo institucionalizado e vivido em espaços escolares. Na verdade,
temos pesquisado e produzido muito pouco sobre outros espaços educativos como a televisão, os jogos de videogame, as salas da internet, os movimentos sociais, as ruas, as vilas e favelas com seus espaços informais e clandestinos de educação, as academias, os shoppings, as escolas de samba ou
as danceterias. Enfim, pouco nos interessamos pelas crianças e suas culturas
interagindo em espaços que nós adultos ainda desconhecemos, ou pelos
quais temos passado sem refletir de forma mais prolongada. São ainda rastros do projeto de modernidade que absorvemos?
No Brasil, temos um longo caminho a percorrer, no que se refere às pesquisas sobre as crianças, suas experiências e culturas. O campo da sociologia da infância tem nos ensinado que as crianças são atores sociais porque
interagem com as pessoas, com as instituições, reagem frente aos adultos
e desenvolvem estratégias de luta para participar do mundo social. Mesmo
assim, ainda necessitamos construir referenciais de análise que nos permitam conhecer esses atores sociais, que nos colocam inúmeros desafios, seja
na vida privada ou na vida pública.
(Disponível em: <http://www.espacoacademico.com.br/034/34cdelgado.htm>.
Acesso em: fev. 2009.)
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Concepções de infância e juventude
Dicas de estudo
Para compensar você por seu esforço, que tal assistir a alguns filmes que, de
alguma forma, retratam o cotidiano infantil e a infância e vários momentos da
história? Escolha um (ou veja todos) e depois tente fazer uma síntese do que
pode perceber do universo infantil. Quais imagens da criança aparecem em cada
um deles? Elas são diferentes umas das outras?
Central do Brasil
Ilha das Flores
Minha Vida de Cachorro
A Vida é Bela
Nem um a Menos
A Princesinha
Sugestões de leituras
O processo histórico que instituiu uma nova concepção de criança, de
infância, de adolescência e de juventude pode ser analisado a partir de diversas abordagens. Assim, apresenta-se uma relação de algumas obras que
hoje são referência nessa área.
FREITAS, Marcos César de. História Social da Infância no Brasil. São Paulo:
Cortez, 2006.
FREITAS, Marcos Cezar de. (Org.). História Social da Infância no Brasil. São
Paulo: Cortez/USF, 1997.
_____; KUHLMANN JR., Moysés. (Orgs.). Os Intelectuais na História da Infância. São Paulo: Cortez, 2002.
KUHLMANN JR., Moysés. Infância e Educação Infantil: uma abordagem histórica. Porto Alegre: Mediação, 2004.
DEL PRIORE, Mary. (Org). História das Crianças no Brasil. 2. ed. São Paulo:
Contexto, 2000.
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Sociologia da Educação
GHIRALDELLI JR., Paulo. Infância, Escola e Modernidade. São Paulo: Cortez,
1997.
GONDRA, José G. (Org.). História, Infância e Escolarização. Rio de Janeiro:
7 Letras, 2002.
NOVAIS, Fernando (Org.). História da Vida Privada no Brasil. São Paulo:
Companhia das Letras, 1997; 1998. (Coleção em 4 volumes)
POSTMAN, Neil. O Desaparecimento da Infância. Rio de Janeiro: Graphia,
1999.
Seria bem interessante se você procurasse conhecer o Estatuto da Criança e
do Adolescente para saber como a Legislação Brasileira procura proteger e garantir os direitos da criança no país. (Lei Federal 8.069 de 13 de julho de 1990).
Atividades
1. O conceito de família sofreu, ao longo do tempo, várias modificações, de acordo com as mudanças que ocorreram na sociedade. Sabe-se também que, mesmo sendo uma criação histórica e cultural, e não algo material, é um conceito
que se relaciona com a sociedade e sua estrutura econômica e política. O mesmo ocorre com a concepção de infância. Como se pode relacionar a ideia de
família moderna com as concepções de criança e infância da atualidade?
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Concepções de infância e juventude
2. Entramos no século XIX tendo como premissa básica a proteção da infância, da
criança e do adolescente. Explique qual é o papel da educação nesse processo.
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Gabarito
Concepções de infância e juventude
1. Depois de muito tempo sem valorizar a criança, quando praticamente
ela não existia, não era “vista” e sem a noção de que a vida do indivíduo
pode ser dividida em etapas, e que a infância seria uma delas, tem-se
uma nova concepção de infância e juventude. A longa trajetória da
concepção de família traz como resultado (ainda que provisório, porque esse é um conceito que está sempre em construção) a imagem da
família nuclear, com funções diversas, relacionadas à privacidade do
lar e a um sentimento de aconchego e domesticidade. Isso colabora
para o desenvolvimento do sentimento de infância e a família começa
então a se organizar e a viver em torno da criança, e das suas necessidades.
2. A tomada de consciência acerca da criança, suas particularidades físicas, biológicas e emocionais provocavam um sentimento, qual seja
o de moralizar os costumes, confinar, regular essa população e evitar
possíveis revoltas. Assim, o sentimento de infância também surge com
a necessidade de educação, de instrução e leva à ampliação da escola
de massas, dentro do ideal de moralização dos costumes e que passava pela família burguesa e nuclear e inicialmente centralizava na figura
da mãe e mulher a responsabilidade pela amamentação, pelos cuidados e educação das crianças.
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SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO